terça-feira, 30 de outubro de 2018

OS SINDICATOS E OS PROFESSORES QUE SE CUIDEM. ESTÁ EM MARCHA UM DESPEDIMENTO EM MASSA.


Ainda que o assunto seja muito sério e com ele não se deva brincar ou mesmo gozar, a entrevista do secretário da Educação da Madeira ao Diário de Notícias, para quem dedica atenção a este sector, teve qualquer coisa de anedota política. Não consigo exprimir de outra forma. Li e não foi necessário voltar atrás para entender qualquer coisita eventualmente mais complexa. Foi de enfiada e fiquei esclarecido. Fez-me lembrar um sketch do Herman: "ainda bem que me fez essa pergunta". Razão têm aqueles, tal como eu, que assumem que, de titular em titular da pasta da Educação, é sempre a descer. Muito preocupante! Infelizmente, assisto a uma gritante e arrepiante ausência de visão, tudo se quedando na natalidade, nas fusões de estabelecimentos de aprendizagem e na concomitante dispensa de professores. É o Senhor Bispo com a fé e a caridade e o secretário com uma lengalenga de "papas e bolos...". A ordem é fechar escolas, reduzir professores e apostar no sector privado. O resto é treta!  


A entrevista resume-se a uma página, porque a outra foi preenchida com uma foto de alto abaixo do dito. Muito esquisito! Bem a poderia ter aproveitado para trazer à colação as fragilidades do sistema, sobretudo, se tem, qual o seu pensamento organizacional, curricular, programático e pedagógico e, na esteira disso, como fazer das alegadas fragilidades uma oportunidade para traçar um sistema ajustado ao século que estamos a viver e daí aprendizagens com futuro. O resto, repito, é treta. Dizia-me há dias um colega que é importante, pelo menos "de vez em quando, ler umas coisas". Aliás, é extensa a produção de livros e documentos de investigação, não bastasse isso chegaria um pouco de bom senso e um olhar sereno mas ambicioso, para traçar um rumo concordante com os estudos há muito experimentados e divulgados. Ou, então, mais facilmente, uma simples passagem pelo Youtube.
Disse o secretário nessa entrevista: "Estamos preparados para enfrentar os problemas". Uma frase que, ao querer resumir a complexidade, rigorosamente nada de substancial adiantou. Mas quais problemas, questiono, quando o sistema não deve ser visto pela óptica de mais ou menos professores, de mais ou menos estabelecimentos? Essa é uma parte da dinâmica do sistema. Ele tem múltiplas relações interdependentes. Os sindicatos e os professores em geral que se cuidem, desde já, porque os dados são muito claros: encerramento de escolas, política de desemprego e aposta no ensino privado. A responsabilidade constitucional do direito à Educação ficará a um canto, para os mais pobres, porque, ideológica e politicamente, o caminho está definido.  
Recordo, a propósito, que há mais de dez anos, na Assembleia Legislativa da Madeira, insisti na necessidade de uma profunda e prospectiva revisão da rede escolar e do pensamento acerca da organização do sistema, que implicaria, naturalmente, reformulações significativas a todos os níveis. A maioria política sempre defendeu que a Madeira era um exemplo nacional! No diário das sessões constam as intervenções chamando à atenção que o mundo estava a mudar muito rapidamente, consequência do desenvolvimento tecnológico e da consequente globalização, o que implicaria uma tomada de consciência sobre esta escola, alicerçada nos pressupostos do século XIX, portanto, a necessitar de uma reestruturação enquanto resposta ao mundo que estava a surgir. Cegamente, tudo foi chumbado.       
E eis que, a um ano do final do mandato, depois de 42 anos ininterruptos de governação, ridiculamente, vem o secretário assumir que “estamos preparados para enfrentar os problemas”. É evidente que não está e, solidariamente, não estão e,  pior, não querem. A Educação é cara, há muito assumiram, com um discurso baseado no facto de que sendo constitucional, logo deveria ser a República a pagá-la. Ora, sendo este o pensamento dominante, pensarão, que continue a ignorância como provam os números estatísticos do insucesso, do abandono, das qualificações profissionais, da cultura em abstracto e da mentalidade dominante. É comum nos meandros do exercício da política dizer-se que "o que parece é". Pessoalmente, não tenho grandes dúvidas da intencionalidade.
Em suma, o sistema chegou a um ponto que obriga os professores a tomarem posições muito firmes ou serão literalmente esmagados. Quando acordarem será muito tarde. Basta um olhar para estes três anos de governo no sector da Educação, para constatar que não se registou uma única ideia política para o futuro, antes o controlo de tudo e de todos, a perseguição, o fecho de escolas, a dispensa de professores e a propaganda no sentido de levar as pessoas a acreditarem que tem de ser assim. 
Duas notas finais: primeira, no âmbito da transparência, deve o Tribunal de Contas esclarecer, publicamente, o que o motivou para apresentar um "estudo", tipo fatinho por medida, que, subliminarmente, determina as políticas que devem ser seguidas no sistema educativo; segundo, tenha o secretário presente que aquilo que hoje está a semear, pode vir a colher mais cedo do que pensa.  
Ilustração: Google Imagens.

domingo, 28 de outubro de 2018

ESCOLA DO FUTURO

O secretário da Educação da Madeira disse, hoje, no DN-Madeira: "Estamos preparados para enfrentar os problemas". Quais os verdadeiros problemas? O das fusões de escolas? Ou preparados para enfrentar os desígnios de um sistema que não pode ser aquilo que é? Ah, já percebi, preparados para fechar estabelecimentos de aprendizagem e mandar professores para fora do sistema. Lindo!

 

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

O SONHO



"Não se esqueçam do sonho. 
Quem esquece do sonho envelhece depressa" - Rubem Alves

Estive a reler textos de alguns pedagogos. Cruzei-me com esta frase, simples, mas profunda. E fiquei a pensar nos sonhos que ficam pelo caminho, porque há adultos políticos que matam o sonho das crianças logo nas primeiras idades, no tempo que deviam desenvolver a curiosidade. 
Ilustração: Google Imagens.

sábado, 20 de outubro de 2018

"HÁ QUEM QUEIRA FECHAR AS ESCOLAS PRIVADAS". É ESPANTOSO COMO O SECRETÁRIO TENTA GENERALIZAR UMA QUESTÃO DE BASE IDEOLÓGICA!


A declaração em título é do secretário regional da Educação da Madeira. Esta espécie de "sentença" é totalmente gratuita e, talvez, por isso mesmo, enquadra-se na lógica de uma propaganda política de trazer por casa. É pobre. Melhor e mais compreensível seria dizer que se trata de uma opção ideológica que corresponde ao pensamento dominante no partido ao qual o governante pertence. Competiria, depois, no momento do julgamento, no acto eleitoral, o povo decidir se deseja que trinta milhões dos seus impostos sejam aplicados em um sector que não é prioritário à luz do texto constitucional. As questões políticas, esclarecidas junto dos eleitores, decidem-se no plano democrático. Ora, o governo tem maioria absoluta no parlamento, entende que deve oferecer trinta milhões ao sector educativo privado, pois bem, está no seu pleno direito. Não deve é colocar na consciência de outros aquilo que entende ser correcto.   


Não conheço um professor ou um sindicalista que seja contra a existência de um segmento privado na Educação. Até os corpos sociais dos sindicatos contam com a presença de representantes das escola ditas privadas. Pode existir, eu é que não conheço! Todos com quem me cruzei ao longo da vida são favoráveis à existência de estabelecimentos de aprendizagem privados, complementares do sector público, na esteira da livre opção das famílias. Daí que, repito, seja gratuito dizer que "há quem queira fechar as escolas privadas". É um tiro de pólvora seca! Politicamente, um desastre e uma desonestidade intelectual.
O que está em causa são três aspectos essenciais: primeiro, a questão ideológica, isto é, o privado é bom, o público não serve. Tudo, ou quase, deve ser privatizado! Daí, a crescente tendência para a desresponsabilização do sistema constitucional público passando-a para a esfera do privado; segundo, em contraponto, perguntar-se-á, se é bom para o privado, que razões sustentam que não seja bom para o público? Terceiro, trata-se de uma questão economicista (também ideológica, claro), porque reduz os encargos orçamentais públicos ao mesmo tempo que transfere para os pais e encarregados de educação uma "dupla tributação", isto é, pagam em sede de IRS para que tenham direito à Educação e, depois, voltam a comparticipar na escola privada.
O interessante disto é que de privado a maioria das escolas têm muito pouco. Quem subsidia tem a faca e o queijo na mão, simplesmente porque quem paga, tendencialmente controla. Coloca uma parte dos professores, supervisiona e até interfere na organização pedagógica. Afinal, onde está a pureza do privado, questiono? Ora, pessoalmente, nada tenho contra o sector privado na Educação. É um  sector com existência legítima. Outra coisa é quem paga a legitimidade de alguns poderem optar. São trinta milhões, montante significativo, quando as escolas públicas andam com atrasos relevantes nos pagamentos a fornecedores, quando o dinheiro é escasso para cumprirem os seus projectos educativos, quando se sabe que há associações de pais que recolhem dinheiro para ajudar com algum material e quando se sabe que até papel higiénico, pasme-se, tantas vezes falta. 

A escola pública é a prioridade, porque é Constitucional, é pois um dever do Estado. E essa escola pública tem o dever de ser universal, inclusiva, de rigor, de qualidade e assente na excelência. Não entendo a escola de outra maneira. 

E há aqui um facto muito curioso que, aliás, já reportei: "Investigadores compararam notas do curso e avisam: pagar pelo ensino pode valer acesso à faculdade, mas não garante uma preparação de qualidade". "(...) Os estudantes de Medicina provenientes do Ensino Secundário privado reprovam mais do que os colegas que vieram das escolas públicas. (...) O estudo, que comparou os resultados de 1700 alunos que frequentaram a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) entre 2007 e 2014 (...) A análise dos resultados revelou que, no primeiro ano do curso, a taxa de reprovação a pelo menos uma unidade curricular dos estudantes provenientes do privado foi de 43%, enquanto a dos alunos do público foi de 34%."Além disso, os alunos do privado apresentaram, em média, notas inferiores aos do público até ao quinto ano." 
Finalmente, perante este estudo (existem outros) o secretário da Educação deveria então assumir que se trata de uma  mera aposta ideológica e, já agora, dizer, publicamente, "quem é que quer fechar as escolas privadas"?
Ilustração: Google Imagens.
Fonte: DN-Madeira, edição de hoje.

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

INOVAÇÃO E LIDERANÇA. BEM PREGA FREI TOMÁS...



FACTO

O secretário da Educação da Madeira esteve presente na abertura de um encontro sobre "Inovação e Liderança Educacional". O secretário definiu a “inovação como a capacidade de correr riscos” e a liderança como a soma de “todos os processos que necessitam de visão” (...) e pediu aos professores: "tenham a capacidade de liderar essa mesma inovação”. Fonte: DN.

COMENTÁRIO
E PERGUNTAS

Frontalmente, não gosto de governantes faz-de-conta. Em todo o lado, sublinho. Não aprecio as frases feitas, muito menos quem apregoa uma coisa e pratica o contrário. De forma muito directa: nestes três anos de mandato, onde estão os factos que provam a inovação política no quadro do sistema educativo? 
E antes de mais, inovação prende-se com o processo criativo, transformador e de ruptura com o passado; a capacidade de correr riscos, neste contexto, tem um significado diferente. O que tem sido evidente é uma política de não querer enfrentá-los (os riscos) antes eliminá-los ou contorná-los.
Por outro lado, salientou, que é necessário ter "visão". Tê-la, significa possuir a capacidade para prognosticar o futuro, ser prospectivo e planear em função dos objectivos pretendidos. "Visão" não tem nada a ver com optometria! E aqui, pergunto: que objectivos inovadores quando não existe liderança capaz de os enfrentar? Só mais uma pergunta: como é possível pedir aos estabelecimentos de aprendizagem para que sejam inovadores, quando as "lideranças" estão, maioritariamente, sob controlo de uma enorme burocracia que impede que o "cordão umbilical" possa ser cortado, concedendo espaço à gestão e administração com liberdade e responsabilidade?
Ocorre-me "frei Tomás...". Tenho presente aquele estabelecimento de aprendizagem do Curral das Freiras que tentou a inovação com visão de futuro, porém, o que aconteceu foi a liquidação do processo de liderança. Morreu!
Por aqui fico, embora muito tivesse por escrever.
Ilustração: Google Imagens.

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

É TÃO BOM QUANDO UM EX-ALUNO RECONHECE O TRABALHO REALIZADO!


Para quem exerce(eu) a docência é gratificante quando um ex-aluno reconhece o trabalho realizado, isto é, a influência positiva que o professor teve na sua vida. Não há palavras que exprimam as sensações. Significa que foi deixada uma semente que germinou. A "carta do leitor" que hoje li, assinada por Luis Andrade, teve o condão de levar-me a relê-la com todo o cuidado. Uma carta que não fala das múltiplas, quase infindáveis disciplinas curriculares, não fala de programas e conteúdos e não coloca o acento tónico na, por vezes, execrável mexeriquice da hierarquia política. É uma carta que destaca o que um professor lhe deixou: sonho, vida, esperança, ousadia, futuro, sociedade justa, liberdade, democracia, solidariedade, causas, princípios, convicções e muita inquietação. Tudo palavras que estão no texto de elogio ao seu ex-professor Joaquim Sousa, da Escola do Curral. Mais do que aquilo que designam por "conhecimento" na ponta da língua, para debitar no dia do teste ou do exame e, mor das vezes, para logo ser esquecido, no aluno ficou a perenidade de um conjunto de padrões de conduta, base determinante na formação e afirmação do ser. Eu diria que, neste caso, a ESCOLA funcionou. A CULTURA funcionou! E a partir dali, naturalmente, o professor acaba por ter o mérito porque possibilitou a abertura da grande janela do conhecimento que, sublinho, se encontra muito para além da escola.


A escola, enquanto estabelecimento de aprendizagem, deveria ser todas aquelas palavras e outras mais, inculcadas de uma forma transversal, enquanto alicerce estrutural do edifício da formação. Como dizem vários autores, o resto, felizmente, está na net. O que lá não está é a empatia, o saber colocar-se no lugar do outro, a compreensão e a capacidade de constituir-se como o mediador entre o ser e o mundo. 
A propósito, li, há muitos anos, um livro cujo autor, julgo que Gusdorf, G., dizia que "ninguém ensina nada a ninguém", apenas tocamos e fazemos despertar o conhecimento adormecido. Ou então, na esteira de Paulo Freire, "(...) ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo". O que lá não está, na net, é o fazer despertar o pensamento crítico e o gosto pela curiosidade. Aí não existe tenologia que substitua o professor. Deixo-vos, então, com esta carta que é o melhor tributo que um ex-aluno pode fazer a um professor.

"Pensei que não passaríamos mais por estes tempos.
Nem parece que já vai fazer quarenta e cinco anos que renasceu a Liberdade em Portugal!
E depois de tudo o que se tem sabido que a Secretaria Regional de Educação tem feito a esse grande Homem que é o Professor Joaquim Sousa, não posso deixar de prestar a minha homenagem ao Homem que me ensinou que nunca é tarde para ser feliz nem para sonhar.
Fui aluno do professor e ainda hoje sou influenciado por este Homem, a quem muito devo. Obrigado por nunca me ter deixado desistir professor!
Porque se há pessoas em que profissão e a vida se confundem, ele é um deles.
Não havia aula que não transmitisse, passo a passo, a essência da vida, a esperança num mundo melhor, mais igual, mais amigo do ambiente, um ambientalista, um sonhador.
Mas quem era este jovem, que tinha mais 10 anos do que eu e era mais novo que o meu irmão, que nos dizia que podíamos ser mais do que nos diziam, que podíamos sonhar com as melhores universidades, com profissões que víamos na televisão, que podíamos poder ousar sonhar.
Ao longo dos anos fui acompanhando a sua inquietação.
Disse-me um dia que estes meninos iriam surpreender o país, a escola do Curral seria a curto prazo a escola com melhores resultados da Madeira e ainda seria a melhor escola portuguesa nos exames nacionais, na altura ri-me era como a académica ser campeã nacional.
No 20 de fevereiro atravessou as montanhas a pé e esteve com os alunos e aí mostrou a sua capacidade de estar com os seus.
Ao fim de quase 20 anos vejo o Professor como um viajante infatigável, como alguém que prefere perder a abdicar dos seus princípios, que acima de tudo acredita que pode contribuir para uma sociedade mais justa. São raros esses Homens.
Um dia perguntei-lhe porque não vinha para o continente e ele respondeu-me que estava no solo em que edificaria as suas raízes. Tentei demovê-lo, disse-lhe que a Madeira era uma terra perdida para além dos poderosos ninguém poderia crescer, fez-me uma proclamação de esperança.
E, um a um, foi alcançando os objetivos que se propôs. No Natal de 2015 disse-lhe para ir embora, tinha conseguido o que se propusera e as invejas eram muitas. Disse-me que ia sair, mas não saiu e está a acontecer esta vergonha. Também por isso não volto, a liberdade e a democracia ainda não chegaram verdadeiramente à Madeira.
A sua voz e entusiasmo sempre nos ligou ao futuro.
É de enaltecer que passados vinte anos continue o mesmo. Apaixonado por causas. Desligado dos interesses. Valente nas convicções. Intransigente na solidariedade, arrojado nas refregas e uma incessante capacidade de sonhar.
Continua fiel a si próprio. Sempre fiel como muitas vezes nos dizia.
Obrigado Prof. Joaquim Sousa
Luís Andrade"

sábado, 13 de outubro de 2018

"ESTAMOS PREPARADOS" PARA O FURACÃO! E PARA A EDUCAÇÃO?


Disse o presidente do governo, a propósito da tempestade "Leslie", que estávamos "preparados". Uma declaração infeliz se considerarmos a força devastadora que este tipo de fenómenos ocasiona. Mas admitamos, em um sentido mais tolerante, que se referia estar tudo a postos para acudir às populações. Bom, digo eu, nada de mais, pois constitui um dever dos eleitos com responsabilidades. Entretanto, vasculhando e visionando vídeos sobre EDUCAÇÃO, dei com este que coloquei nos meus prioritários. Sem que nada tenha uma coisa a ver com a outra, ainda assim, questiono: e no sistema educativo estamos "preparados" para os desafios de hoje e do futuro? Não,  não estamos, claramente!

 

A NECESSIDADE DE UM SÉRIO E ALARGADO DEBATE


Se, no Básico, do meu ponto de vista, à luz de muitas análises, sobretudo de um novo conceito de aprendizagem, não faz sentido a realização de exames, já no acesso ao Superior, embora sendo, para já, mais complexo, não significa que, em uma perspectiva mais globalizante de todo o percurso escolar, não se caminhe em um sentido que promova a qualidade. Julgo ser necessário, a par de uma mudança estrutural do sistema educativo, do pré-escolar ao 9º ano, um sério e alargado debate entre o secundário e o acesso ao superior. O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior entende que não. Falta-lhe coragem para debater e rever o processo. 


Deixo aqui um excerto de um texto publicado no Público e no blogue Incluso.

"(...) Nos últimos tempos, professores e pais têm insistido na necessidade de rever este regime de modo a que os exames nacionais do ensino secundário deixem de ser determinantes no acesso ao ensino superior, condicionando assim tudo o que faz no secundário. Esta posição foi reforçada pelo diagnóstico feito em fevereiro pelo diretor da Educação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, Andreas Schleicher. O sistema de exames nacionais ligado ao acesso ao ensino superior é um dos “principais problemas” do sistema educativo português pela pressão que exerce sobre professores, alunos e famílias e pela uniformização do ensino que promove (...)".

Em matéria de avaliação, questiono: quem fracassa, o aluno ou a instituição?

segunda-feira, 8 de outubro de 2018

ENTRE UM PRESIDENTE DO GOVERNO QUE CONSENTE E EXECUTIVOS DE PROFESSORES QUE VIRAM COSTAS, VENHA O DIABO E ESCOLHA!


Tenho a plena consciência que levei uma vida profissional a defender os professores e uma vida a combater os sucessivos estados de letargia no sistema educativo. Continuo nesse rumo, mas não me calo perante os sinais de injustiça e a manifesta indiferença. Por isso retorno à Escola do Curral, ao Dr. Joaquim José Sousa e ao processo que este secretário da Educação lhe moveu. Li, com avidez mas contextualizando e decifrando, a entrevista que o professor concedeu, hoje, ao Diário de Notícias. Os factos foram ali escarrapachados, tim-tim-por-tim-tim, com passagens de quem se sente vítima de uma perseguição suja e doentia que abala o equilíbrio, até, no plano familiar. 

Desde logo emergem dois aspectos que ressaltam nesta oportuna entrevista: primeiro, que não se trata de incumprimentos de natureza burocrática, mas de uma lamentável e grotesca perseguição a um professor. Retiro da entrevista: "(...) basta verificar o processo de extinção, enviam-nos o documento para realizarmos as eleições, as mesmas são realizadas, ganhámos e, 24 horas depois, a escola é extinta, sem qualquer comunicação com a direção ou com a comunidade educativa, em total desrespeito pela autonomia da escola, pela democracia, pelos eleitores e pelos eleitos. Isto, depois de uma reunião, em Maio, em que foi dito que até 2025/2026 a escola era viável"; o segundo aspecto tem uma natureza de pendor pessoal: 

"(...) o processo está como a secretaria regional da Educação quer que esteja, está a destruir-me e à minha família (...)" e complementa: "(...) todo o processo, da maneira como foi instaurado e conduzido, pela discriminação e pela perseguição que representa, é desprestigiante para a educação, para a região e para o país. Tendo como cereja no topo do bolo a proteção a alguém que é co-responsável pelos atos e que, premeditadamente, adultera, acusa, engana, que mente e que é premiada pela secretaria regional da Educação".


A longa história que a edição do DN publica levanta-me ainda, dois outros aspectos complementares: primeiro, o silêncio do presidente do governo regional, jurista de profissão, que olha para isto como se nada tivesse a ver com o que se está a passar. Das duas, uma: ou não tem mão nos seus secretários, ou existem aqui indecifráveis cumplicidades e medos que conduzem a este lavar de mãos. O segundo aspecto tem uma outra natureza. Todos somos diferentes, pelo que, diferentes são, também, os princípios e os valores que conduzem na vida uns e outros. Eu, por exemplo, nunca, repito, nunca, aceitei em benefício próprio, uma situação que soubesse estar a desagradar ou a pôr em causa outrem. É, por isso, que não entendo como é que a solidariedade entre colegas parece extinta. Não dei conta que uma única direcção de escola da Região, neste e em outros casos, tenha vindo a público solidarizar-se e demonstrar repúdio pela maquiavélica engrenagem de perseguição a uma escola, a um director e a uma comunidade educativa. Sepulcral silêncio. Mais ainda. Questiono-me, como é que a direcção da escola de S. António, no Funchal, "sem tugir nem mugir" aceitou a anexação da escola do Curral das Freiras, conhecendo todo este obscuro processo. Falo por mim: confrontado com essa situação, colocaria o meu lugar à disposição. Daria 24 horas para me substituírem. Simplesmente porque, muito acima de qualquer interesse, medo foi coisa que nunca tive e a palavra SOLIDARIEDADE sempre teve para mim particular significado.
Ilustração: Google Imagens.

sábado, 6 de outubro de 2018

NA ESCOLA OS JOVENS TÊM DE "METER A MÃO NA MASSA"


Estava a jantar, em amena cavaqueira, quando, a propósito de uma figura, hoje empresário de sucesso na região norte, veio à baila a sua avó que um dia disparou: "o Francisco (nome fictício) todos os dias entra na escola; a escola é que não entra nele". Rimos, naturalmente, porque encaixava como a última peça do puzzle que a nossa conversa acabava de construir. Falávamos da escola, da desmotivação dos alunos, do insucesso, mas sobretudo da dissintonia entre a escola que estes jovens dispõem e aquela que deveriam ter. Em um tempo tecnológico, infelizmente, há cérebros políticos tão pequeninos que teimam em manter as estruturas organizacionais e pedagógicas do passado. Fazem-me lembrar o Raul Solnado quando, com refinado humor, dizia que há testas tão pequenas que para as ideias entrarem têm de ir de gatas!


Aliás, esta história das crianças que entram na escola, mas a escola não entra nelas, já começa a cansar tantos são os autores e especialistas em educação que têm vindo a se debruçar sobre o tema. Vêm agora falar de percentagens na iniciativa curricular. Um pronto-socorro para um enorme incêndio. Deixem-se, por favor, de tretas, porque o êxito não passa por aí. A questão reside na aparência de uma mudança, mas que mantém as mesmas características, ou semelhantes, do ensino tradicional. O que deve ser colocado em cima da mesa, enquanto reflexão séria, não é a manutenção de um modelo, mas a configuração de um novo paradigma pedagógico que conduza à aprendizagem e não ao ensino. De que vale, pergunto, dizer a uma escola que pode dispor de 25% na gestão do currículo se, na prática, o formato pedagógico é o mesmo ou idêntico? 
Sejamos claros, há uma diferença entre modelo e paradigma. O modelo tem uma característica estática, que respeita, escrupulosamente, as fases de construção de qualquer coisa que os adultos entendem como necessária; o paradigma tem um significado diferente, pois é qualquer coisa global pela qual me guio mas, permanentemente, me adapto. O modelo não permite adaptações. Portanto, a escola não precisa de modelos, precisa de um novo paradigma organizacional e pedagógico, onde as crianças possam aprender distantes do modelo de ensino. Eu diria que elas precisam de "meter a mão na massa" e, para isso, exigem, para serem felizes na escola e aprenderem a desaprender, de um sistema mais horizontal e colaborativo do que de um verticalizado e castrador do pensamento. É, por isso, que hoje se fala de estabelecimentos de aprendizagem e não de estabelecimentos de ensino.

Ora, ter a capacidade de configurar uma determinada percentagem na gestão do currículo, significa que a hierarquia política não quer perder a mão sobre o controlo das escolas e dos professores. Trata-se de uma mistificação, pelo que não faz qualquer sentido meter o mundo que os adultos idealizam e querem na cabeça de crianças que não o desejam.

Eu sei que tudo isto é muito complexo e que a conjugação de todas as variáveis não se resolve com um simples estalido de dedos. Tem muitas implicações, directas e indirectas. Mas de uma coisa estou certo, é que não vale a pena jogar com a sorte do talvez dê, como quem "atira barro à parede". Há necessidade de estudo, planeamento e muita assertividade. E isso leva tempo, muito tempo, desde a conceptualização de um novo paradigma até à formação dos professores. Só neste âmbito, no caso dos professores, convenhamos, que, genericamente, não estão sensibilizados para a imprescindível mudança. São muitos anos, cada um na sua disciplina, em um "dá e avalia", "chumba ou passa", quando hoje o caminho já não pode ser esse, envolve uma enorme transversalidade no conhecimento que em nada se assemelha à segmentação por disciplinas.
E tenham a certeza de um outro aspecto: quanto mais retardarem a partida pior será. A classe dos professores está cada vez mais envelhecida e cansada e os mais novos, uns, estão arredados do sistema, outros andam com a casa às costas, deambulando pelo país "vendendo" aulas. Muitos dos mais novos, os que desejaram ser professores e que, por necessidade, procuraram alternativas de vida, se porventura um dia regressarem, das duas uma, ou perderam o fulgor ou estão desactualizados face às novas dinâmicas. Assim, é grande a probabilidade do sistema ficar confrontado e refém de novos dilemas. Não ver o que se está a passar é grave, muito grave. É caso para dizer que, a continuar desta forma, "o(s) Francisco(s) (nome fictício) todos os dias entra(rão) na escola; a escola é que não entra(rá) neles".
Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 2 de outubro de 2018

OS TPC AOS TRÊS ANOS - "FAZER RISCOS"


Achei muita graça, mas fiquei a pensar. Saí de casa para dar, apenas, setenta passos em direcção à escola do meu neto mais novo, de três anos. Cheguei à sala, vi-o divertido, obviamente. Olhou-me e correu ao meu encontro. O ritual seguiu-se: ir à sala onde estão penduradas a mochila, o casaco e a lancheira. Tudo preparado e ala para casa. Foi-me falando do dia com os amiguinhos. Relatório feito e, já em casa, colocada a "bagagem" no sítio certo, olhou-me e disse naquela voz infantil: "vou fazer os tpc". Os tpc?, retorqui. A "pessoura" mandou fazer riscos, concluiu. E lá foi fazê-los em cores variadas.


Achei muita graça, repito, pelo quadro vivido, pois trata-se de um neto, mas aquilo, de acordo com o que estudei sobre o desenvolvimento motor e a importância do jogo, deixou-me a reflectir. Isso levou-me a reler um texto que publiquei há muitos anos: "(...) entrávamos na escola a 7 de Outubro, agora um mês antes, e havia tempo para o jogo em um sentido lato, tempo para brincar de forma muito séria. Como sublinhou Jean Chateau (1961), "se o jogo desenvolve as funções latentes, compreende-se que o ser mais bem dotado é aquele que mais joga" (...) "para ela quase toda a atividade é jogo, e é pelo jogo que ela descobre e antecipa as condutas superiores". Para Claparède, in Psychologie de l'enfant e pédagogie expérimentale (não tinha eu ainda nascido), "o jogo é o trabalho, o bem, o dever, o ideal de vida. É a única atmosfera em que o seu ser psicológico pode respirar, e, consequentemente, pode agir" (...) Perguntar por que joga a criança, é perguntar por que é criança". Ou então, na palavra de Schiller "o Homem não é completo senão quando joga". 
Ora, isto desperta-me duas reflexões complementares: "fazer riscos" entendo como uma preocupação pela motricidade fina que antecipa, por exemplo, a escrita, só que isso deve ser concretizado no leque das múltiplas actividades do estabelecimento de aprendizagem. Não em casa. Outra, que trago como preocupação maior, é a crescente tendência, que começa muito cedo, para a desestruturação social que conduz a uma certa escravização do mundo da criança, levando-a a passar horas a mais em um mundo que não deve ser o seu. O seu mundo é o jogo. Hoje, menos "ipad" e mais, muito mais, o tal jogo onde possa "descobrir e antecipar as condutas superiores". 
Este dado deveria ser motivo de reflexão: relativamente a Portugal, as crianças finlandesas passam, na escola, menos 40% do tempo e, no entanto, conseguem melhores resultados. Fazem menos "riscos", digo eu!
Mas que achei graça ao sentido de responsabilidade, claro que achei!
Ilustração: Google Imagens.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

O MAIOR "TIRO" DA SEMANA... DO MÊS... DO ANO!


Um artigo 
do Padre José Martins Júnior 
Blogue Senso&Consenso - 21 de Setembro de 2018

Ocupe-se quem queira com os badalos macroeconómicos do PIB, preocupe-se quem entenda com as quezílias da nomeação das Procuradora Geral da República ou entretenha-se, nas franjas domésticas do burgo, com o “Armas” cargueiro todo o ano. Hoje não vou por aí. Nem tão-pouco me comovem os abraços norte-sul coreanos nem me abalam as bombas pneumáticas que saem da bocarra ‘russa’ da Casa Branca.


Desde a última segunda-feira, ocupa-me e preocupa-me, transcende-me e galvaniza-me o “tiro” que assinala a partida para um Outono que traz consigo todo o fulgor da Primavera. É do regresso às aulas que hoje escrevo, para completar a emoção expressa em A Criança de Mochila(17.IX.18). Não imaginam quanto me enternece e, paradoxalmente, me transtorna a imagem de uma criança posicionada no mini-rectângulo da sua mesa de aula! Vejo-a ali, dona da sua pista, atleta no seu estádio, soberana do seu trono.
Diante dela, o Mestre, os Mestres, mãos cheias do ouro da ciência, braços de todas as latitudes, enfim, o mundo todo pré-fabricado para enchê-la, vesti-la, calçá-la e armá-la na visão estratégica dos embates futuros. Magnânimo, inexcedível o caudal de quem ensina para quem recebe!
Para quem recebe!... É aqui, na foz, no destinatário último da sua acção que o Magister descobre a nascente da sua intuição. Porque o “pequeno-grande ser” que tem à sua frente “não é uma massa disforme (ou informe) a ser moldada pelo Professor” (Jean Piaget). Não é o Livro em Branco nem a praia virgem de uma Ilha Encantada.
Ousarei dizer, sem hipérbole alguma, que se o Pedagogo traz o manual na mão, o aluno (criança ou jovem) traz uma biblioteca no coração. Se o Docente oferece um dicionário, o Discente tem a sua enciclopédia. Recorro a Fernando Pessoa: “O binómio de Newton é tão belo como a Vénus de Milo. O que há é pouca gente a dar por isso”. No regresso às aulas, dentro da própria sala, diante do petiz (tenha ele o tamanho que tiver) o que é preciso é “dar por isso”.
Alvíssaras, cânticos e poemas aos Professores que intuem o ADN dos seus pupilos, que os transfiguram descobrindo-lhes a sua real dimensão, o seu olhar, o seu sentir, o seu pulsar. Quantas vezes na penumbra de um silêncio de criança se esconde e se reprime um vendaval de traumas e convulsões! E outras tantas vezes, num lampejo aparentemente intempestivo se anuncia uma onda de optimismo construtivo! “O que há é pouca gente a dar por isso”. Na vida quotidiana e no currículo escolar.
É este o “tiro” da semana, do mês, do ano, da vida. Porque dos bancos da escola sairão os caminhos do futuro. Os trabalhadores oficinais, os servidores públicos, os orçamentos, as engenharias nucleares, os presidenciáveis, os magistrados, os santos e os demónios. Agora, penso Louis Pasteur: “Diante de uma criança (um aluno) sinto-me cheio de ternura por aquilo que ela é, mas cheio de respeito por aquilo que poderá vir a ser”.
A minha efusiva e entusiástica saudação aos Homens e Mulheres, mediadores entre dois mundos: o da Ciência e o da Inocência, querendo com isto significar o Mestre Emissor e o Discípulo Receptor. Sejam quais a idade, o lugar e o volume de teres e saberes.
Por isso também é que me consola olhar e ver que hoje, no “21 de Outono” recomeça a Primavera de Abril!
21.Set.18
Martins Júnior