Conheci todos os secretários regionais da Educação desde 1976. Nos diversos períodos, inclusive, nos tempos complexos da negociação da regionalização, decorrente da Autonomia, todos quiseram deixar a sua marca. Ainda bem, porque isso significou alguma coisa como semente. E algumas brotaram. De qualquer forma, globalmente, não foi uma sementeira estruturalmente consistente, mas não nego, ao tempo, algumas acertadas decisões. Hoje, a Região está a pagar a ausência de visão e de ambição. Ora bem, eu escrevi, todos? Corrijo, menos um, o actual. Deste mandato nada fica como pensamento e actos portadores de futuro. A Educação viveu estes últimos quatro anos sob um penoso culto de personalidade, na manutenção de uma repetitiva estrutura organizacional, de uma tendência para a meritocracia balofa e ignorante, viveu em aceleração constante da burocracia e omnipresença e sobreviveu porque introduziu, subtilmente, o medo junto da classe docente. Aquilo que parecia se esbater, pelo contrário, acentuou-se. Hoje, quase não existe classe docente. Foi desintegrada, matando toda e qualquer iniciativa inovadora nascida de baixo para cima, perseguindo e, como aviso à navegação, esmagando a autonomia da escola do Curral, suspendendo o seu director por seis meses e sem salário. A história é sobejamente conhecida. Se existe uma marca, extremamente negativa, é essa, a da ausência de diálogo, movida pelo ciúme, mais ou menos ao jeito de Jorge Jesus no decorrer de uma conferência de imprensa: "aqui quem manda sou eu. Os jogadores valem zero".
Confusão no Sistema Educativo |
Tenho do exercício da política em geral e da governativa em particular, o princípio de um serviço público à comunidade. Quando um governante "joga" contra os outros e não com os outros, presta um mau serviço à comunidade que jurou servir com elevação. Quando um governante se torna um amanuense de serviço ou, mais propriamente, um sinaleiro de papéis, despachando para ali e para acolá, presta um mau serviço à comunidade. Quando um governante não apresenta um sonho, por pouco visionário que seja, não presta um bom serviço à comunidade. Quando um governante vive da propaganda montada, fica, obviamente, em claro défice relativamente ao que os eleitores esperam. Quando um governante mistura, permitam-me, na mesma panela, o sector público com o privado, abrindo os cordões à bolsa em prejuízo do sector público (Constitucional), presta um mau serviço à comunidade, perante a qual "jurou cumprir com lealdade as funções confiadas". Quando um governante se apresenta como um "chefe" e não como um "líder" não gera a necessária confiança.
Quando um governante mantém falinhas mansas, um ar sorridente com professores e sindicatos e diz "lugares comuns" na abertura protocolar de eventos e, logo depois, funciona, na esteira da rubrica de Herman José, como "(...) eu é que sou o presidente da Junta", obviamente que perde toda a credibilidade, porque veste dois fatos incompatíveis aos olhos da comunidade. Quando um governante é motivo de escárnio em determinados blogues, fundamentalmente por anónimos, o que lamento, porque os cidadãos devem ser frontais, pode ser indiciador de pessoas descontentes.
Deste mandato não fica uma ideia estruturada para o futuro. Repetiu o que vinha de trás, juntou uns pós de perlimpimpim, umas tais salas de aula do futuro, uns arremedos de robótica e uns manuais digitais, repido, manuais (!), encerrou estabelecimentos de aprendizagem e fez muita, muita propaganda. Poderia ter avançado com significativas mudanças paradigmáticas no sistema, nos planos organizacional, curricular, programático e pedagógico; poderia ter assumido uma posição frontal contra a lógica dos exames e das aferições, questionando-os no quadro das aprendizagens com rigor e valor; poderia ter assumido uma preocupação central pela descentralização motivando as comunidades educativas para a criação de ambientes de aprendizagem distintivos; poderia ter acabado com as direcções, tipo "duracel", que se eternizam na liderança das escolas, matando outras formas de construção das dinâmicas de aprendizagem; poderia ter iniciado as necessárias alterações arquitectónicas nos edifícios escolares; poderia ter criado experiências-piloto no sentido de alterar os conceitos de turma e de aula; poderia, de forma integrada no governo, desenvolvido políticas para esbater o problema do saldo fisiológico negativo; na mesma linha poderia ter iniciado um combate, a montante da escola, na família, gerador de novas responsabilidades a aprender, enfim, poderia, poderia, poderia... avançar nesse aliciante mundo que está por construir. Porém, ficou pelo "tudo como dantes, no quartel-general de Abrantes".
Ainda hoje, na edição do DN-Madeira, o Professor Universitário Nuno Nunes escreve um oportuníssimo artigo a que deu o título: "Por favor não se esqueçam do futuro". Leiam o artigo tendo sempre presente, comparando, o mundo que aí está e aquele que se adivinha, com a escola que oferecem às novas gerações. É aterradora a falta de visão!
Ainda hoje, na edição do DN-Madeira, o Professor Universitário Nuno Nunes escreve um oportuníssimo artigo a que deu o título: "Por favor não se esqueçam do futuro". Leiam o artigo tendo sempre presente, comparando, o mundo que aí está e aquele que se adivinha, com a escola que oferecem às novas gerações. É aterradora a falta de visão!
NOTA
Escrevo com a experiência de mais de quatro décadas a estudar, viver e sentir o sistema educativo. Não escrevo contra pessoas, que me merecem respeito, mas contra governantes que "não sabem estar".
Ilustração: Google Imagens.
Texto publicado no blogue
www.gnose.eu
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