A pergunta foi feita pelo Professor José Gabriel num artigo publicado na sua página de facebook, o qual tive o prazer de transcrever neste blogue. Concordo com a generalidade do texto, porque muito incisivo, claro e oportuno. No quadro do actual sistema educativo ali ficou o retrato fiel das consequências de muitos anos de ausência de visão sobre o futuro.
Porém, permito-me aprofundar um pouco o problema. Em síntese, o drama que hoje Portugal vive tem causa no pensamento estrutural sobre como deve ser desenhada a escola para os tempos da IV Revolução Industrial. Se o país mantiver o pensamento herdado da I Revolução Industrial é óbvio que, tendencialmente, a situação se agravará. Cada vez serão menos os que estarão na disposição de exercer a nobre profissão que assenta na provocação da curiosidade e, por conseguinte, na aprendizagem.
Este sistema está em "morte cerebral", mas os políticos continuam a acreditar que sobreviverá através dos "cuidados intensivos". Não sobreviverá, digo eu.
O sistema está morto.
Faltam professores, pois faltam, mas atenção, faltam em função de uma escola que continua a basear a aprendizagem no conhecimento fragmentado, na falsa convicção que separando as disciplinas obterá êxito. No livro "A Escola é uma seca" transcrevi o que sublinhou o Professor David Rodrigues: "afirma-se que os jovens devem ser empreendedores, dinâmicos, criativos, autónomos, capazes de resolver problemas (...) mas defende-se a escola transmissiva, directiva e uniformizadora". Compaginando esta posição com o que disse a escritora Clarice Lispector (1920/1957), "o óbvio é a verdade mais difícil de enxergar". Ora bem, mudem a estrutura do sistema e, certamente, o país terá os professores suficientes para as necessidades. O problema é ter coragem política para mudar.
Aliás, tudo isto não é novo. Há mais de 20 anos o jornal Público (28.01.2002) titulou:
O SISTEMA EDUCATIVO PORTUGUÊS TEM DE MUDAR DE ALTO A BAIXO
Texto do Jornal: "Tudo tem de mudar no sistema educativo português e os próximos 20 anos são a grande oportunidade de recuperar 20 décadas de atraso educativo, conclui um estudo exaustivo sobre a educação em Portugal, intitulado "O Futuro da Educação em Portugal, Tendências e Oportunidades - Um Estudo de Reflexão Prospectiva".
Sobre esse estudo escrevi:
"O que mudou? Nada. O pensamento político e a estrutura mantêm-se exactamente iguais. As rotinas são as de ontem, talvez com um pouco de mais burocracia, muita da qual apenas passou do papel para o computador. A sala, a aula, o teste, a avaliação, a retenção ou a progressão de ano, mantém a característica de um sistema qual vaca sagrada! Tudo igual, apenas com umas pinceladas aqui e ali, uns projectos bem intencionados, não digo que não, mas aquilo que é fundamental permanece inalterável.
Tudo igual, não é bem assim. Em alguns aspectos piorou. Hoje temos um sistema educativo onde as crianças estão ao serviço dos adultos e não os adultos ao serviço das crianças. Paulatinamente, roubaram-lhes o tempo para ser criança, fecharam-nas em espaços de tempo inteiro, escolarizando e "curricularizando" o que deveria ser do domínio do lazer e do jogo enquanto mola impulsionadora do crescimento, impondo desde muito cedo uma excessiva ocupação do tempo e uma nociva competição como se a educação fosse uma corrida. Neste arrastão, perpetrado por adultos, levam os pais à frente, eles que acabam por contribuir para o agravamento dos factores de stress (...)".
Tudo isto a propósito do título: "Quem quer ser professor?" A actual preocupação do governo, para suprir as "necessidades", de abrir aos licenciados sem componente pedagógica, a possibilidade de leccionarem (mesmo que em último recurso) disciplinas curriculares, constitui um retrocesso anterior a Abril de 1974. É mais um sinal da falência do sistema educativo, quando se prefere a política do penso rápido em detrimento de uma actuação nas causas do problema. É o sistema que está morto, creiam senhores políticos.
Ilustração: Google Imagens.
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