quinta-feira, 19 de outubro de 2017

ENSINAR O PAI-NOSSO AO VIGÁRIO, NÃO, OBRIGADO!


"Nós todos temos a percepção dos resultados, quer da avaliação sumativa interna das escolas, quer da avaliação sumativa externa das escolas, os exames e as provas finais, mas nós estamos no terreno e vamos perceber como é que a escola faz o diagnóstico dos seus problemas, ou seja, para além da folha Excel, perceber que soluções a escola adopta, como é que monitoriza e como é que promove a melhoria na prática, que isto nos parece fundamental", disse Jorge Morgado, um dos intervenientes na II Conferência Diversidades, que decorreu, esta manhã, na Reitoria da Universidade da Madeira." - Fonte: DN-Madeira.


Palavras, palavras e mais palavras, porém, no essencial, nada de novo. Quarenta anos depois, o governo ainda não passou da fase do diagnóstico. Pessoalmente, lamento que um director regional (Inspecção Regional de Educação) pelo que foi referido, ande pelos estabelecimentos de ensino a "ensinar o pai-nosso ao vigário". Um director, advogado, que nem professor é!
A generalidade dos professores, sobretudo os que têm mais responsabilidades, democraticamente atribuídas, seria bom que tomasse consciência, dominam os formatos dos diagnósticos (levantamento da situação) bem como os relatórios que apresentam. Os professores, desde sempre que monitorizam e adoptam, as melhores práticas, no quadro do sistema educativo vigente e imposto. O próprio governo tem feito, de quando em vez, alarde disso mesmo. Quando convém. Portanto, andar de escola em escola constitui perda de tempo. O que deveria preocupar o governo é as outras e estruturantes dimensões do problema: a questão social, a montante, que também está diagnosticada, mas que não há coragem ou saber para arrancar as famílias da pobreza (em sentido lato e a todos os níveis, causa para muitos anos); a estrutura da organização social, onde se enquadram, naturalmente, os tempos de trabalho e a precariedade; a pavorosa escola a tempo inteiro onde, tendencialmente, tudo é motivo de escolarização encapotada, roubando o tempo necessário para ser criança; a responsabilização das famílias no processo educativo, também em sentido lato; a coragem para colocar em debate sério e profundo, a Autonomia da Madeira conferida pelo Estatuto Político-Administrativo (Artigo 40º, alínea o) - Matérias de interesse específico da RAM); a questão da autonomia das escolas, a sua organização e financiamento, neste caso, a liberdade na construção do currículo a partir de uma matriz essencial (não existem duas escolas iguais), o que implica um total respeito pela diferenciação; os programas desarticulados entre os diversos patamares; a tecnologia vs negócio dos manuais escolares e uma nova visão sobre o pensamento pedagógico, onde todo o caminho está por abrir. A "grande obra" é essa! De uma vez por todas, oiça, não se aprende por disciplinas e de uma forma centralizada e padronizada. Esse foi um tempo. Só aqui, qualquer pessoa, apostada no futuro, consegue elencar uma quase infinidade de aspectos que necessitam reflexão aprofundada. Ademais, todos os diagnósticos e monitorizações estão feitos, constam de livros, de dissertações, de teses e das actas das reuniões dos vários órgãos dos estabelecimentos de educação e ensino. Ainda hoje, o Dr. Rui Caetano, líder da Escola B+S Gonçalves Zarco, escreve em artigo de opinião: "(...) Os professores não se limitam a trabalhar o processo ensino-aprendizagem com alunos interessados e/ou desinteressados. Atualmente, a sociedade exige quase tudo à escola e aos professores. Por isso, somos esse “tudo” de várias formas e feitios. Somos: educadores das regras de convivência; formadores para a sexualidade responsável; gestores de conflitos; mediadores familiares de problemas que acontecem entre eles, além de fiscalizarmos e estarmos atentos aos comportamentos de risco dos alunos. Até os problemas pessoais que ocorrem numa discoteca ou no fim de semana, algures, chegam à escola para serem resolvidos, porque ganham novas dimensões. O rol de exigências continua: fazemos o papel de psicólogos; assumimos o lugar de pais, mães, amigos, confidentes, nutricionistas, tutores e promotores de campanhas de angariação de roupas, alimentos, medicamentos e outras carências dos alunos e familiares, além de educarmos também para a necessidade urgente dos hábitos de higiene. (...)". Saberá o governo, concretamente o Senhor Director da Inspecção (!) o que isto significa? Adianto-lhe: que o diagnóstico, a todos os níveis está feito, até porque os professores vão dando a resposta adequada. Não apenas nos aspectos externos à escola e que se repercutem na escola, tal como no processo ensino-aprendizagem. O problema está, portanto, não na elaboração de mais diagnósticos, monitorizações, de acompanhamento e de aconselhamento em processos de raiz errada, mas na mudança de paradigma. Entendeu, Senhor Director? Ensinar o "pai-nosso ao vigário", não, obrigado.
Ilustração: Google Imagens.

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