“Um currículo inclusivo não assume os mesmos padrões para todos os alunos, mas respeita e valoriza as suas necessidades, talentos, aspirações e expectativas exclusivas. Ao fazer isso, esforça-se para remover barreiras à participação de certos grupos de alunos, incluindo aquelas criadas pelo currículo oculto.” É este esforço de remover obstáculos que surge retratado no relatório “Adapting Curriculum to Bridge Equity Gaps: Towards an Inclusive Curriculum” da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).
Há cada vez mais sistemas educativos comprometidos a “não deixar que nenhum aluno fique para trás”. O currículo continua a ser desenhado “em tamanho único”, ou seja, para servir a todos. Mas vai sofrendo alterações. Que em geral, o fazem “ir ao encontro das necessidades de grupos de alunos identificados como vulneráveis”, constata a OCDE. Adaptações que têm em conta aspetos como as capacidades dos alunos, a sua origem e condição económica das suas famílias. Os exemplos são muitos.
Capacidades individuais
Em 92% dos países e economias parceiras da OCDE, os alunos com necessidades educativas especiais têm currículos adaptados. Os professores australianos podem redesenhar áreas do currículo atendendo às capacidades quer dos alunos portadores de deficiências, quer dos alunos com dificuldades de aprendizagem. A sobredotação merece uma atenção especial em 42% dos países.
Em 31% dos países existem disposições curriculares que visam os alunos em risco de abandonar a escola precocemente. Casos da Hungria e do Japão. No primeiro, é feito um esforço para identificar potenciais desistências e é desenhado apoio específico. No segundo, há apoios para compensar a falta de assiduidade.
Em 70% dos países existem serviços ou programas, acessíveis a todos os alunos, que incluem orientação ou aconselhamento profissional. No Quebeque (Canada), todas as direções de escola são obrigadas a oferecer serviços sociais, de psicologia e de orientação vocacional nos diferentes níveis de ensino.
Origem social e cultural
Outro aspeto tido em conta é a origem dos alunos. 72% dos países têm currículos que atendem à diversidade linguística e cultural dos alunos. As crianças e os jovens de famílias de origem estrangeira na Finlândia têm aulas opcionais na sua língua materna. No México, os filhos dos trabalhadores agrícolas migrantes frequentam escolas de múltiplos níveis de ensino. Especial apoio é dado, no Japão e na Coreia, aos alunos em situação inversa: que regressam ao país vindos do exterior.
A maioria dos países (91%) tem políticas de inclusão e antidiscriminação de forma explícita inscritas nos currículos. Como é o caso da lei de educação inclusiva, em Portugal.
Condições económicas
As condições familiares são outro aspeto importante: 28% dos países atendem às vulnerabilidades socioeconómicas e 14% às assimetrias geográficas. As crianças desfavorecidas, dos três aos oito anos, beneficiam de medidas específicas ao abrigo do Plano de Ação para a Educação Inclusiva, na Irlanda. E em Hong Kong (China) os estudantes carenciados têm à disposição subsídios para frequentarem atividades de aprendizagem ao longo da vida.
Centralizado, mas flexível
Na maioria dos países da OCDE (85%) pelo menos uma parte do currículo é centralizada a nível nacional. O objetivo, explica a organização, “é garantir um núcleo comum que proporcione as mesmas oportunidades de aprendizagem a todos os alunos”. O Japão tem um currículo nacional que garante um nível de uniformização educativa a todos os alunos, independentemente da região que habitem.
No caso da Argentina, os currículos são desenhados ao nível federal e contêm conteúdos-chave que todos os alunos devem adquirir desde o pré-escolar ao ensino secundário.
Além do currículo básico, os sistemas educativos podem permitir alguma flexibilidade curricular. Isto acontece em 61% dos países da OCDE. Escolas e professores têm autonomia para adaptar os conteúdos curriculares, os métodos de ensino e avaliação, tanto ao contexto local, como às necessidades dos alunos. Isto acontece em 61% dos países da OCDE.
Na Dinamarca, esta flexibilização permite que um aluno, de forma excecional, possa receber instrução num nível de escolaridade inferior ou ser dispensado de uma matéria pelo diretor com o acordo dos pais. Em Portugal, exemplifica a OCDE, a “autonomia das escolas permite uma gestão flexível do currículo e dos espaços e horários de aprendizagem, de forma que os métodos, tempos, instrumentos e atividades possam responder às singularidades de cada aluno”.
Promessa do digital
Em matéria de adaptações curriculares, os autores do relatório “Adapting Curriculum to Bridge Equity Gaps: Towards an Inclusive Curriculum” reconhecem as vantagens do digital. “Como a tecnologia permite uma maior adaptação e integração de conteúdos, materiais e atividades, pode ajudar os alunos a ter motivação para aprender, progredir no seu próprio ritmo e continuar a aprender além da sala de aula – a qualquer hora, em qualquer lugar.”
A OCDE reconhece o “esforço considerável” dos países para integrar as tecnologias nas salas de aula. Na Finlândia, os professores recorrem às tecnologias da informação e da comunicação para implementar o currículo em diferentes níveis de escolaridade e disciplinas, inclusive para apoiar métodos de avaliação e cooperação com os pais.
Na Escócia (Reino Unido), os alunos com dificuldades na leitura podem recorrer a um software de leitura de texto durante os exames nacionais para poderem responder às perguntas. Na Dinamarca, é obrigatória a utilização de dicionários digitais para as línguas dinamarquesa e estrangeiras, o uso do GPS para educação física e recursos digitais e bancos de dados para ciências.
Recorrendo às tecnologias digitais, as escolas podem criar mais oportunidades para envolver os pais na educação dos filhos, refere ainda a OCDE. Ontário (Canadá) está a desenvolver uma plataforma de recursos que vai permitir aos pais e aos alunos acederem a recursos educativos em modo “amigo do utilizador” através do telemóvel.
Além do currículo
Além de todas as adaptações curriculares, a OCDE constata que os sistemas educativos procuram outras soluções para tentar remover as barreiras à aprendizagem. Através, por exemplo, da distribuição de manuais gratuitos. Medida que em 62% dos países abrange todos os alunos, em 26% apenas a alunos de escolas públicas e em 26% apenas os alunos desfavorecidos.
A entrega de manuais gratuitos a todos os alunos, muitas vezes, cobre explicitamente todos os níveis do ensino básico ou obrigatório, como acontece na República Checa, Finlândia, Hungria, Coreia e Portugal.
Formar professores para garantir a igualdade de acesso a oportunidades de aprendizagem é algo que acontece em pouco mais de um quarto (27%) dos países da OCDE. Na Nova Zelândia, os professores têm acesso a formação não obrigatória em áreas específicas, como sobredotação e educação especial. A Irlanda define orientações específicas para ajudar os professores a garantirem a qualidade dos currículos dirigidos a alunos com problemas de aprendizagem e necessidades educativas especiais.
Fonte: Educare
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