quinta-feira, 27 de abril de 2017

O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO REGRESSA A 1932? NA EDUCAÇÃO DESPORTIVA ESTÁ LÁ TUDO!


Li AQUI: "(...) Pela primeira vez na Europa toda uma geração de estudantes - no caso os alunos portugueses do 2.º ano - será sujeita a uma prova de Educação Física. O Ministério da Educação admite que a avaliação de expressão físico-motora, integrada nas aferições de Expressões do 1.º ciclo, revela fragilidades na preparação dos alunos nesta área. "Temos recebido impressões, nas reuniões que temos feito, incluindo com os professores de Educação Física, que vão exatamente no sentido de que esta área específica do currículo não tem sido muito trabalhada" (...) "Mas até agora têm sido impressões. A partir de agora vamos ter dados sistemáticos sobre o que existe". Há já um mês que o Instituto de Avaliação Educativa (IAVE) tem online um conjunto de recursos para a preparação dos testes - que não contam para a nota -, desde um "mapa" do percurso de exercícios que será montado a uma lista de materiais a utilizar e um vídeo - desenvolvido em articulação com professores de Educação Física - ilustrando os exercícios que os alunos terão de fazer. (...) As provas, organizadas turma a turma, decorrem entre 2 e 9 de maio. Nesta quinta-feira será divulgado online o "guião" dos testes - que só costuma ser revelado após a avaliação. Isto, explicou o diretor do IAVE, Helder de Sousa, para garantir que todos os alunos têm a mesma informação antes dos testes. E também porque não é expectável que, em provas que avaliam sobretudo a aquisição de competências físico-motoras, este conhecimento prévio do teste faça a diferença nos desempenhos".


Ao ler esta notícia que consubstancia as preocupações do Ministério, fui levado a ter presente o famigerado Decreto 21.110 de 16 de Abril de 1932. O diploma do Estado Novo que aprovou e mandou pôr em execução o regulamento da Educação Física. Decreto este que, no essencial, "proibiu" o desporto na escola. Tenhamos em atenção algumas passagens da introdução ao citado documento: "(...) Eis porque nas escolas primárias e secundárias os desportos devem ser afastados com toda a energia, porque os organismos infantis depauperados não os suportam sem graves perigos" (...) não podem ser aceites os desportos anglo-saxónicos e os jogos atléticos e os desafios e matchs em geral, especialmente os de foot-ball, visto ser nulo o seu papel educativo e cujos malefícios são óbvios (...)". E isto porquê? Cito, novamente, o DL em causa: "(...) Foi deveras impressionante, ainda há bem pouco tempo, o resultado do apuramento de rapazes para a marinha portuguesa. Os médicos que  que procederam ao exame respectivo pronunciaram-se até publicamente, na imprensa diária, contra o abuso da MANIA DESPORTIVA definindo-a como uma das causas mais importantes do definhamento do nosso povo" (...) A Educação Física tem sido até hoje feita às avessas e prejudicando a educação intelectual e moral (...)"
Salvo as devidas proporções e implicações da decisão do actual ministério face ao Decreto-Lei de 1932, no essencial, coexistem aqui graves erros de avaliação da situação. Pretende o ministério avaliar o quê? E, na decorrência da avaliação, implementar o quê? Este é um assunto sobre o qual tenho, desde há muito, vindo a escrever. Deixo aqui uma parte de um texto publicado no meu blogue www.comqueentao.blogspot.com.    
Decreto-Lei 21.110... uma delícia!
"(...) Há dois caminhos que há muito se cruzam. Um que defende a manutenção da Educação Física curricular que submete os alunos a testes, níveis e notas de avaliação, como se aquela disciplina fosse comparável com as outras disciplinas curriculares. É meu entendimento que é diferente e que é na diferença que terá de buscar o seu caminho; outro, que assume uma ruptura com o passado no sentido da mudança da Educação Física para Educação Desportiva. Eu estou com a mudança. Para quem conhece a longa História das correntes filosóficas e a influência que tiveram no pensamento pedagógico, dominando, sobretudo, as razões mais substantivas desde os primórdios do Século XX até ao seu último quartel (evolução para sociedade da tecnologia e da informação), concluirá que a Educação Física deixou de fazer sentido há muitos anos! Hoje, confronta-se com uma "crise de identidade e de reconhecimento social" (relatório conduzido por K. Hardeman, da Universidade de Manchester, patrocinado pelo Conselho Internacional de Ciências do Desporto e Educação Física e suportado pelo Comité Internacional Olímpico, que teve por objectivo investigar a situação mundial da Educação Física. As respostas ao questionário, aplicado em 126 países, alertou para o facto da Educação Física encontrar-se numa profunda crise de identidade e de credibilidade social). Há vários estudos sobre esta matéria.
O Filósofo Manuel Sérgio disse-me um dia uma frase que, genericamente e qual metáfora, atinge o centro do alvo: "tirem a bola à Educação Física e digam-me lá o que resta". Em um artigo que publicou assumiu: “(...) nem científica nem pedagogicamente existe qualquer educação de físicos (...) que a expressão Educação Física se acha incrustada numa ambiência social onde o estudo desta matéria não é conhecido (...) e que a Educação Física deve morrer o mais rapidamente possível para surgir em seu lugar uma nova área científica que mereça dos homens de ciência credibilidade, respeito e admiração” - O DESPORTO Madeira, 27.06.03. Nem mais. Há treze anos! É, por isso, que um outro investigador e pensador e que muito tem escrito sobre este dilema, o Doutor Gustavo Pires, a 12.09.2008, em um artigo publicado também no "Desporto Madeira" salientou: "(...) Enquanto o governo, este ou outro qualquer, não tiver a coragem de desmantelar a super estrutura de concepção dos actuais programas de Educação Física do Ensino Básico e Secundário, nunca o País há-de ter um sistema desportivo minimamente aceitável e taxas de prática desportiva que não o envergonhem (...). Em um outro artigo: "(...) Defender a Educação Física é sermos capazes de encontrar soluções de acordo com as realidades do nosso tempo. Numa dinâmica de futuro. E o futuro é o ensino do desporto (...)". 
Em Maio de 2008 escrevi neste blogue: "(...) Trata-se, de facto, de uma luta contra um poderoso lóbi corporativista, obsoleto e medíocre, entrincheirado nas universidades e em posições estratégicas de decisão política, que não consegue entender que as respostas encontradas nos anos 30 e melhoradas a partir da década de 70 já não se adequam, por um lado, ao actual conhecimento científico, por outro, às expectativas que o desenvolvimento determinou. Daí que não me espante nem me cause qualquer embaraço que aqueles que consideram que a mudança de paradigma terá de ser operada, sejam muitas vezes visados com graves dislates os quais, penso eu, não são mais do que o estertor de quem perdeu todos os argumentos e, naturalmente, sente que os alunos, paulatinamente, os das universidades e outros de idades mais jovens, estão a voltar-lhes as costas, por sentirem que há um mundo novo de possibilidades de prática que não se restringe ao espaço de uma Educação Física bafienta, repetitiva, desmotivadora e sem futuro (...)" Por tudo isto sou pela mudança de paradigma" (...), até porque na Educação Desportiva está lá tudo. Lamento que o ministério alinhe nesta limitada visão do problema. É caso para deixar a provocação: perguntem ao Ronaldo se ficou a dever alguma coisa à Educação Física!

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