sexta-feira, 7 de junho de 2019

Provas de Aferição - Para quê?


Não encontro uma razão que justifique a realização das designadas "provas de aferição", no 2º, 5º e 8º anos. Diz o Ministro: "servem para que os professores, os alunos e as famílias saibam verdadeiramente os progressos que cada aluno está a fazer, o que já aprendeu e também aquilo em que poderá melhorar. Servem ainda para que tenhamos uma visão de conjunto sobre como estão os alunos a aprender, em cada escola e a nível nacional. (...) O que devemos querer é que os alunos aprendam verdadeiramente."


Estas justificações, e já vamos a algumas outras, partem do pressuposto que ao longo dos anos os estabelecimentos de aprendizagem, à luz dos programas (e não só), não têm qualquer projecto educativo. Dir-se-á que cada escola está, eu diria, por sua conta e risco! Inclusive, os professores. E isso não é verdade. Qualquer estabelecimento dispõe de órgãos próprios, enquanto espaços de debate, de onde surgem os projectos educativos, globais e específicos. A partir dos currículos e dos respectivos programas, os professores transmitem os conhecimentos e, na esteira deste quadro, desenvolvem avaliações regulares que culminam, no final de cada período, no preenchimento de fichas individuais, (e atribuição de níveis em determinados anos), posteriormente entregues aos pais e encarregados de educação. Isto acontece desde o infantário. Os professores de cada escola e de cada turma sabem, portanto, a todo o momento, "o que o aluno já aprendeu e aquilo em que ainda pode e deve melhorar no futuro". E complementa, ainda, o Ministro, "por isso é que, ao contrário de um exame, as provas de aferição dão origem a um relatório individual, em que se destacam os pontos positivos e os desafios colocados nas novas aprendizagens". Ora bem, das duas, uma: ou o Ministro não sabe, dentro do próprio sistema, como estão as escolas organizadas e o que fazem os professores ou, então, existe aqui um pressuposto de falta de confiança nas escolas, nos seus órgãos de orientação pedagógica e na própria acção prática dos professores.

Aliás, esta questão das aferições ou da avaliação interna e externa permanente (exames) já entrou na esfera de uma obsessão de características doentias. Ninguém pára para pensar, equacionar e definir aquilo que deve constituir um sistema consistente, de rigor, que entusiasme alunos, professores e pais e que se reflicta em gerações mais bem preparadas para o futuro. É curioso verificar que ninguém aborda a mudança estrutural do sistema. O sistema vive obcecado pela aferição e pelo exame, não com o CONHECIMENTO. 

De facto, a hierarquia política anda, claramente, desde há muitos anos, entretida em avaliar o que, de forma sistemática, já foi avaliado. No caso dos exames de 9º ano, pergunto, para que servem, quando, grosso modo, ao longo do ano, para além da observação em itens não relacionados directamente com os conteúdos programáticos, por disciplina, um aluno é avaliado, no mínimo, em seis momentos, que no conjunto das disciplinas, por ano, corresponde entre 60 a 70 avaliações. No conjunto de um ciclo, caso do 7º, 8º e 9º atinge um número superior a 200 momentos de avaliação. Para quê o exame de final de ciclo? Então a avaliação, para este sistema, repito, não tem uma característica contínua? 
Depois, pergunto, o que resultou das aferições realizadas nos anos anteriores? Genericamente, digo eu, elaboram-se relatórios que se destinaram, tarde ou cedo, ao arquivo morto. Nunca assisti a uma reunião de um Conselho de Turma onde fosse apresentado um qualquer bendito relatório que servisse de análise e de projecto de trabalho de um aluno para o ano seguinte. Até porque, registo, é falso, excluindo as naturais excepções, que existem, que a generalidade dos estabelecimentos funcionem em uma base de aprendizagem individual. O aluno, pelas características do próprio sistema, é uma peça que vive na margem das preocupações do verdadeiro conhecimento. O aluno é um número e a matéria está definida. O conhecimento, Senhor Ministro, sobretudo no Ensino Básico, não se compagina com uma atitude enciclopédica e de genérico domínio do manual, debitando-o nos testes para, logo depois, esquecer. Ter conhecimento é muito mais  do que isso. E esse está por ser definido!
Julgo, assim, que os políticos continuam a atirar para fora do alvo. Deveriam estar preocupados com a mudança de paradigma e não, como sublinhou o Ministro, no quadro da premissa de "todos ficarem com uma ideia mais específica sobre o que dominam melhor em cada disciplina". 
Ilustração: Google Imagens.
Fonte: Visão/Júnior

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