Rob Riemen (1962) é um escritor e fundador do Instituto Nexus, um "Instituto que reúne os maiores intelectuais, artistas e políticos do mundo para pensar e falar sobre as questões que realmente importam". Estava eu a reler uma sua entrevista onde combina "conhecimento de história e filosofia com sensibilidade literária e explica o retorno global do fascismo, disfarçado nas falsas promessas de trazer liberdade e grandeza", eis que, quando vou por aí fora, dou com um outro texto arquivado que sublinha: "A classe dominante nunca será capaz de resolver a crise. Ela é a crise".
Rob Riemen é muito claro a este respeito: "(...) E não falo apenas da classe política, mas da educacional, da que controla os media, da financeira, etc. Não vão resolver a crise porque a sua mentalidade é extremamente limitada e controlada por uma única coisa: os seus interesses. Os políticos existem para servir os seus interesses, não o país. Na educação, a mesma coisa: quem controla as universidades está ali para favorecer empresas e o Estado. Se algo não é bom para a economia, porquê investir dinheiro? (...) Estamos a criar seres humanos vazios que querem consumir e ter coisas e que acabam por se vestir e falar todos da mesma forma e pensar as mesmas coisas. E a classe dominante está muito mais interessada em que as pessoas liguem a isso do que ao que importa". - Jornal I.
E dou comigo, hoje, nem por acaso, quase dez anos depois desta entrevista (23/04/2012) a ler um texto sobre um novo espaço designado por "sala de aula do futuro". Quando o problema não reside aí, antes na transformação da escola no seu todo enquanto espaço de verdadeira aprendizagem, reside na reorganização curricular, programática e em uma atitude pedagógica que rigorosamente nada tem a ver com aquilo que andam a oferecer às crianças e jovens. Apenas areia para os olhos! Por mais salas do futuro que espalhem, a constatação é que "estamos a criar seres humanos vazios". Rob Rimen tinha e tem razão, quando sublinhou que os políticos de turno "existem para servir os seus interesses, não o país". O verbo pensar deveria estar primeiro. Mas não está. Pensar o processo histórico-filosófico e os possíveis caminhos a percorrer. Aquele verbo não constitui a primazia do processo. Por isso ele fala de uma sociedade "kitsch, porque a classe dominante teme que as pessoas comecem a questionar tudo". Neste quadro, correspondendo à pergunta da jornalista, ele foi peremptório:
Claro que sim! (...) Todos temos um lado estúpido, frustrado, provinciano. Para alterar o rumo político, temos de encontrar a estupidez em nós. Mas se as pessoas fossem um bocadinho mais espertas, não iriam para universidades estúpidas, nem veriam programas estúpidos na TV. Existe uma elite comercial e política interessada em manter as pessoas estúpidas. E isso é vendido como democracia, porque as pessoas são livres de escolher e blá blá. (...) a essência da democracia é a liberdade, mas a essência da liberdade não é teres o que queres; é usares o cérebro para te tornares num ser humano bem pensante. Se não for assim, se não fores crítico perante a sociedade mas também perante ti próprio, nunca serás livre, serás sempre escravo. Daí que o que estamos a viver não tenha nada a ver com democracia. (...) Vivemos numa democracia de massa, uma mentira que abre os portões a mentirosos, demagogos, charlatães e pessoas más, como vimos no séc. XX e como vemos agora".
Ora bem, o sistema educativo, tal como os outros, não sei se vive se sobrevive desta porta escancarada aos demagogos e mentirosos. Incapazes, não tocam no âmago dos problemas, não apenas aqueles que enquadram a aprendizagem portadora de futuro, mas também e fundamentalmente, nos dramas que se escondem a montante da escola, numa sociedade marcada pela pobreza e por inúmeras iliteracias que uma "sala do futuro" nunca será capaz de esbater.
Na apresentação do livro "A Escola é uma seca" tive a oportunidade de dizer aos que lá me deram o prazer da sua presença e o favor de me ouvirem:
"Hoje, se bem observarmos, continuamos a ter de um lado a Escola e do outro a Vida. Uma Escola acantonada dentro dos seus muros, incapaz de os trepar e olhar para o que se está a passar em todos os outros sistemas. Se a escola fizesse esse esforço de espreitar o mundo, mesmo por uma fresta, perceberia o crescente desencanto daqueles que diz querer formar. Se espreitasse para além do muro perceberia as fragilidades e as causas do abandono e do insucesso. Que tem origem a montante, nas famílias, sublinho. Perceberia, certamente, que pouco vale a imensa tralha de pseudo-conhecimento desarticulado que transmite. (...) A escola se espreitasse para além do muro, daria razão à investigadora Deborah Stipek, quando enalteceu que estamos a produzir especialistas em provas, prejudicando vidas promissoras (…) que este tipo de ensino provoca um verdadeiro extermínio de grandes mentes”. Deborah, conclui no seu estudo transversal de 35 anos: “quantos potenciais vencedores do Prémio Nobel são perdidos antes mesmo da escolaridade básica”. Porque estamos agarrados aos currículos, aos extensos programas e aos formatos pedagógicos que matam a curiosidade e o sonho. Em síntese, confrontamo-nos com uma escola igual para todos, quando todos somos diferentes na origem e nos sonhos". Repito: "a sala de aula do futuro" não resolve. Está mais configurada para repetir o passado do que para dar resposta ao presente.
E assim se chega à conclusão que: "A classe dominante nunca será capaz de resolver a crise. Ela é a crise". Então, vão engodando ou enrolando com o "novo normal"!
Ilustração: Jornal I
O livro A Escola é uma seca pode ser adquirido:
Livraria Esperança - Funchal
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