sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

"Se a escola é a tua casa, foge de casa"


Para alguns pode ser cansativa esta luta por um melhor sistema educativo, para mim não é. Jamais deixarei esmorecer a opinião. Porque é o nosso futuro colectivo que está em causa. Serenamente, sem grandes expectativas e até esperança de uma significativa alteração nos próximos tempos, vale sempre a pena continuar a meter um grãozinho na ferrugenta engrenagem. Há dias li um texto da Professora Carmo Machado (revista Visão) que, logo no primeiro parágrafo, salientava: "(...) Se os alunos teimam em escrever no final dos textos – para que não nos esqueçamos – "eu odeio a escola" ou "se a escola é a tua casa, foge de casa", obviamente que este tipo de declarações constrangem quem entende que ali deveria ser um espaço de desejo, felicidade e aprendizagem. 



Preocupa-me a dor e o sofrimento  de uma escola que soçobra, por melhor que seja o esforço dos professores. Entendo o que sentem os alunos e milhares de professores quando se confrontam com um espaço onde a rotina e o desinteresse predominam. E uns e outros, por obrigação têm de lá estar. Alunos à procura de um diploma, professores pela sobrevivência. E ambos aguentam e aguentam. Queixam-se, mas aguentam. Até um dia!

Certo é que, ao longo da minha vida docente e posterior, nunca assisti a tanto queixume, tanto lamento de insatisfação. É crescente e notoriamente público o desconforto. Reclamam os professores, cujas percentagens de exaustão emocional não enganam, pelos penosos e desmotivantes atropelos na carreira onde a avaliação de desempenho é ignominiosa e por uma injustificável carga de trabalho burocrático; lamentam-se os alunos que escrevem, em alerta a quem tem responsabilidades de governo, que estão fartos. Porém, face a este preocupante e desesperante quadro, o político, neste caso, o secretário regional da Educação (Madeira), numa visita a uma escola assumiu: "sempre que houver estrada vamos continuar". Um pouco de mais atenção constataria que esta sua estrada tem um sinal: "sem saída". Os estudos demonstram exactamente isso. E não bastasse o que as verdadeiras estatísticas evidenciam face ao que o futuro nos reserva, seria suficiente um mínimo de atenção ao sentimento que sai pelas canetas dos alunos e pelas vozes, muitas audíveis, outras nem tanto, a dos professores, é verdade, porque refugiadas no silêncio que mata.

O político não está na estrada do sucesso, está no cruzamento com várias estradas em opção. E ali se encontra sem saber qual escolher. Aquela declaração do político fez-me lembrar a Doutora Fátima Vieira, investigadora especializada em estudos sobre a utopia: 

"(...) na utopia o que fazemos? Primeiro, definimos a visão: que sociedade quero ter? que escola quero ter? o que quero ser?... Depois de definirmos essa visão, então sim, escolhemos o caminho e tapamos os buracos. Não vale a pena tapar buracos de outros caminhos". 


O drama é que quem decide não tem visão (não sabe que sociedade quer construir) e não escolhe um caminho (que escola quer ter), prefere andar para trás, para o tempo dos nossos avós... tapando os buracos de outros caminhos que deram no que deram. Para combater isto, então, vale a pena, pelas nossas crianças, ser subversivo. Paul Ricour diz que a utopia é sempre subversiva contra o discurso ideológico dominante. A ideologia legitima, a utopia subverte. Então, por ela, vale a pena ser subversivo, mesmo quando o discurso oficial dominante nos bloqueia e sufoca". É isso, há medo em ser saudavelmente subversivo.

Há dias regressei à minha antiga escola. Falei com alguns colegas, mas dei atenção aos auxiliares de acção educativa. Já não os via há vários anos. Foi agradável o reencontro. Um deles foi claro ao referir-se aos alunos: "isto está cada vez pior". Pois, muita indisciplina, retorqui. Os olhos reviram-se dando a entender que eu nem faço ideia. Pois, percebo, disse. E se percebo! 

Portanto, aquela historieta de "enquanto houver estrada vamos continuar", prognostica, repito, que não sabe que aquela estrada tem o tal sinal de trânsito: "sem saída". É caso para dizer, regresse ao cruzamento e, com visão, escolha outra.

Ilustração: Google Imagens.

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