quarta-feira, 30 de abril de 2025

O drama de uma morte e as razões escondidas a montante

 

Uma criança de 12 anos, alegadamente, colocou termo à vida. A investigação determinará as causas desta trágica morte. Dizia-se vítima de "bullying" na escola que frequentava. Um desastre seja qual for o prisma de análise. Neste momento, mais do que qualquer outro comentário, importa, pois, abraçar, solidariamente, a família.



Quando li a notícia, fechei os olhos e um turbilhão de pensamentos invadiu-me. Onde residirão as causas? Na família, na escola, na sociedade, neste mundo absolutamente disparatado e assimétrico que estamos a viver? Talvez estejamos face a uma responsabilidade dividida. Todos somos cúmplices de situações desta natureza. Portanto, repito, a hora é de investigação séria e não de opiniões ou especulações sem fundamento. 

Entretanto, li a posição de um partido político que reivindica a colocação de mais psicólogos nas escolas, porque "(...) não basta lamentar depois da tragédia. Enquanto as nossas escolas continuarem sem os meios necessários para garantir apoio psicológico eficaz, continuaremos a falhar às nossas crianças. Ter psicólogos escolares em número suficiente não é um luxo, é uma urgência (...)".

Ora bem, entendo que o problema, sendo tão grave, não se resolve ou atenua com, permitam-me a expressão, "um penso político rápido" que não esbate, sequer, a profundidade da ferida que, aliás, há muito sangra. Numa aproximação ao provérbio chinês, quando se aponta para a lua temos de ver para além da ponta do dedo. Logo, no caso em apreço, é dever de todos olharmos para montante da tragédia. Só por aí podemos encontrar as respostas consistentes que, tendencialmente, evitem dramas como este. Dizia e bem, ainda hoje, o Vereador da Câmara Municipal do Funchal, Engº Miguel Silva Gouveia, "(...) quando uma criança parte desta forma tão dolorosa, é toda a cidade que sofre". Exacto. E a cidade (a sociedade) são as famílias, os estabelecimentos de aprendizagem, a sua organização, os princípios e os valores que as orientam, as suas debilidades a todos os níveis e as políticas que visam combater as injustiças sociais e a respectiva saúde mental de todos.

Neste quadro de pensamento sobre as adequadas respostas, obviamente múltiplas e complexas, permito-me, por momentos, situar-me no espaço escolar, porque o conheço, pois foi nele que exerci a minha profissão durante algumas décadas, testemunhando situações, desabafos e acontecimentos, alguns comoventes. Ora, em síntese, enquanto a escola, do ponto de vista organizacional continuar a ser aquilo que é, enciclopédica, burocrática, programática e desligada da vida real, continuaremos a assistir a dramas, uns que nos esmagam completamente, outros, menos graves, é certo, mas que são de um enorme sofrimento. 

É, por isso, que olho para este sistema educativo, que se diz inclusivo, e nele vejo um claro factor de exclusão social.

Ora, num contexto muito complicado, a presença de psicólogos, só por si, desligados de todas as outras variáveis, concretamente, as políticas de família, de habitação, de saúde, de mentalidade cultural, as relacionadas com o mundo laboral, onde se inserem as políticas salariais, tais especialistas, por maior que seja a sua vontade, rigorosamente nada resolverão. Está em causa a construção inteligente e articulada de toda a sociedade. Não actuar a montante significará atenuar consciências, jamais os dramas que, de quando em vez, continuarão a massacrar-nos.

Ilustração: Google Imagens.

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