quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

A ESCOLA VISTA SOB O ÂNGULO DA CULTURA


A Escola já não pode ser aquilo que nos foi legado pela Sociedade Industrial. Uma Escola com uma atividade centrada em objectivos eminentemente pedagógicos, uma atividade centrada sobre si própria. A Escola, no essencial, apesar de utilizar o computador, tem vindo a passar ao lado das mudanças tecnológicas, da televisão, dos jornais, livros e revistas, das redes interpessoais planetárias e, por isso, continua sempre igual e a querer competir com a vida que é sempre diferente. Ora, entendo que a Escola tem de mudar o seu paradigma e passar a ser vista pelo ângulo da CULTURA e não apenas pelo ângulo da transmissão de conhecimentos em sala de aula.



Foto de uma aula no Museu de Belas Artes de Bruxelas.
Quanto valerá uma aula destas para o futuro destes jovens?


A 29 de Março de 2011, teci algumas considerações a propósito de uma notável entrevista que li na revista A Página da Educação. Nessa entrevista ao Professor Catedrático Miguel Guerra retorno e deixo, a propósito do que pretendo escrever, estas passagens: "(...) disse um pedagogo italiano que para ensinar Latim ao João, mais do que saber Latim, é preciso conhecer o João" (...) os alunos aprendem daqueles professores que amam e, por sua vez, quando o professor ama a sua missão e ama as pessoas, torna possível o processo educativo e o processo aprendizagem, porque o verbo aprender, tal como o verbo amar, não se podem conjugar no imperativo. Despertar o desejo de aprender, despertar o desejo de ser uma pessoa melhor, só se consegue com amor". E logo mais adiante: "(...) a educação tem a meu ver, duas componentes: a componente crítica, ser capaz de analisar e de entender o que se passa. Mas para que haja educação, tem de haver uma dimensão ética, que consiste em saber conviver, na solidariedade, em ter compaixão para com os desfavorecidos. A Educação é o principal elemento que nos afasta da selva, onde o mais forte come e destrói o mais débil (...) acho que as aprendizagens seriam melhores se os alunos participassem mais, se não fossem meros aprendizes, profissionais da obediência - vocês têm de fazer o que os outros pensaram, o que decidiram para vocês fazerem, ou seja, ver a Escola mais como um projecto partilhado. Muitos dos problemas de hoje das escolas não se resolvem com mais vigilância, com mais ameaças e com mais castigos. Acredito que se resolvem com mais participação".
Ora bem, grosso modo, é esta a concepção Escola que não temos. A Escola está cada vez mais determinista, errada na sua organização, pois continua a seguir os padrões da Sociedade Industrial que Alvin Tofller configurou na existência de um código oculto de seis princípios: os da maximização, centralização, concentração, padronização, sincronização e especialização. Se olharmos em abstrato para a Escola, na sua organização e nos objectivos que persegue, facilmente encontramos uma matriz orientadora completamente desadequada dos novos tempos. Salvo um ou outro estabelecimento que constitui a excepção, a Escola tornou-se em um espaço impessoal, por ausência de alma, pela arquitetura desadequada, pelas atividades ritualizadas, pela burocracia, pela legislação em catadupa, pelas limitações orçamentais, pela ausência de autonomia pedagógica, pela incultura e má educação e pela desresponsabilização dos pais. Nesta Escola, ensina-nos Rubem Alves, "cumpre-se o ritual e o formal. Para a burocracia o que interessa é o que vem no relatório. Não as crianças". Nesta Escola as crianças tendencialmente ficam para depois. De onde provêm? Que constrangimentos familiares, económicos, familiares, espaciais e religiosos transportam? Nada disso importa.
Ora, a Escola já não pode ser aquilo que nos foi legado pela Sociedade Industrial. Uma Escola com uma atividade centrada em objectivos eminentemente pedagógicos, uma atividade centrada sobre si própria. A Escola, no essencial, apesar de utilizar o computador, tem vindo a passar ao lado das mudanças tecnológicas, da televisão, dos jornais, livros e revistas, das redes interpessoais planetárias e, por isso, continua sempre igual e a querer competir com a vida que é sempre diferente. Ora, entendo que a Escola tem de mudar o seu paradigma e passar a ser vista pelo ângulo da cultura e não apenas pelo ângulo da transmissão de conhecimentos em sala de aula. A Escola não está só no "mercado" das ofertas e se, ontem, a sociedade foi controlada pelo tempo de trabalho, apesar dos constrangimentos, hoje, a sociedade, tendencialmente, está a ser controlada pelo tempo livre. Há um conjunto de megatendências no quadro de uma nova perspectiva do desenvolvimento e, por isso mesmo, a Escola terá de mudar de paradigma face à complexidade da organização do tempo da nova sociedade.

Em uma praça em Tournai, duas turmas ouvindo os professores
e registando apontamentos.

Tudo isto para sublinhar que a Escola que fica pelo pátio e pelas salas de aula não é uma Escola que prepare para o futuro. Nas minhas visitas por essa Europa, cada vez mais me cruzo nas praças e nos museus com turmas acompanhados dos seus professores. É esse tipo de Educação que nos faz falta, uma Educação contextualizada, vivida, que desperta, que enriquece e que constitui a base para a aprendizagem de outros conhecimentos. As rotinas horárias terão de dar lugar à flexibilidade e a vivência de situações externas não podem ficar dependentes de um sem número de autorizações. Estamos, por isso, muito distantes dessa Escola que prepara para o futuro.
Ilustração: Arquivo próprio.

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