sábado, 3 de fevereiro de 2018

UMA SEMANA EM NOVA YORK VALE MAIS QUE TRÊS MESES DE AULAS!


Os professores são vítimas do sistema educativo que integram. Existe uma linha hierárquica bloqueadora da autonomia e de qualquer inovação. Só a muito custo e correndo riscos e incompreensões diversas, aqui e ali, sobretudo quando quem dirige a escola defende um paradigma diferente, alcandoram-se a formatos que ajudam a compreender que há outros caminhos possíveis para o conhecimento. Formatos organizacionais e pedagógicos, olhados de forma enviesada pelos governantes, porque saem do seu absoluto controlo, mas que evidenciam inteligência, sabedoria e capacidade para ver que o sistema que profissionalmente servem, se já não consegue responder aos desafios do presente, o que fará no futuro! Tenho é pena que a generalidade dos professores não se levante contra as aberrações do sistema, manifestando o seu inconformismo.

Na passada semana li, na Visão (páginas 61/67), uma deliciosa entrevista com o Arquitecto Álvaro Siza Vieira. Duas passagens cativaram-me: "Tem de haver tempo para pensar" (...) "O prazer de viajar... extraordinário! Um prazer extraordinário, a viagem. É uma aprendizagem e um prazer". Ora, tempo para pensar é o que a escola não incentiva, tampouco proporciona. A escola tem um programa, tem normativos, tem órgãos que os cumprem e tem uma espécie de polícia, a inspecção, que de lupa em punho, entre outros, vasculha sumários e corrige com processos quem sai da norma! Daí que, desde as primeiras idades, PENSAR*, no quadro da filosofia (elas tornam-se mais poderosas) não faça sentido para o sistema, por um lado, porque o pronto-a-vestir é de tamanho único, por outro, porque existem salazarentos resquícios entranhados que defende a existência de iluminados que pensam pelas crianças e jovens. Quanto ao prazer de viajar, em um sentido lato, é extraordinário. No caso da Madeira é o mesmo que dizer que há mais Mundo para além da Ponta de S. Lourenço. E é possível pô-los a viajar, aqui dentro e lá para fora, não apenas fisicamente, mas também através de uma outra estrutura dos meios disponíveis. E sendo assim, o manual das várias disciplinas é curto, muito curto e até extremamente condicionador. O "conhecimento" enciclopédico é desinteressante e não é fonte de prazer quando não é vivido, participado e sentido.
Na semana em curso o Henrique e o Pedro, meus netos, viajaram até Nova York. Justificaram perante a escola que não levantou qualquer problema. Já não foi mau. Disse-lhes antes da partida: desfrutem, porque uma semana, em Nova York, bem aproveitada para múltiplas visitas (antecipadamente programadas), vale mais que três meses de aulas. "É uma aprendizagem e um prazer" na expressão de Siza Vieira. De tal forma que, aproximando-se o dia do regresso, tenho já relatos do que viram e das experiências que fizeram que os leva a dizer que "gostariam de perder o avião de regresso". Como os percebo, enquanto corolário das nossas conversas. Regressam à ilha pequenina, ao manual, às aulas rotineiras, aos testes, às avaliações, àquele mundo limitado próprio de consciências adormecidas pela imposição da rotina de uma máquina industrial que não pensa.
Feliz ficaria, se, no regresso, a escola, relegando para segundo plano o martírio das aulas, eles pudessem partilhar com todos, em inglês falado, com fotos e vídeo, o que viram, o que sentiram, cruzando no todo e de uma forma única, as múltiplas disciplinas que esta viagem proporcionou. Sem a elas se referirem. A vida é isso, é um todo, não são disciplinas! A vida e a escola deveriam ser vistas pelo ângulo da cultura. Mas não. O que acontecerá, certamente, é fecharem-se no "estudo" (estudar para esquecer) para os testes que foram (re)marcados para os próximos dias. A resposta à pergunta do manual está primeiro que a verdadeira contextualização do conhecimento. A hierarquia assim impõe. O professor é tão-só uma peça da máquina trituradora de talentos. Daí que dê total razão ao alerta de Ilídia Cabral, docente da Faculdade de Educação e Psicologia da Universidade Católica Portuguesa: tal como estão, "as escolas tornam-se, para inúmeras crianças e adolescentes, verdadeiras catedrais do tédio". Alguém terá dúvidas? Siza Vieira, o Arquitecto criador, do alto dos seus 85 anos, não tem.

Há algo em comum entre crianças e filósofos: a capacidade de se maravilhar com o mundo. Aqui.

Ilustração: Google Imagens.

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