sábado, 8 de maio de 2021

Formação - fazer de forma diferente é complicado!

 

Termina esta tarde o VII Web Seminário da Educação: Educar, Inovar e Incluir – Ousar o impossível pela Educação, organizado pela Câmara Municipal de Câmara de Lobos - Madeira, em parceria com a Universidade Aberta. Trata-se de um título motivador. Tem espaço para escutar e debater as grandes questões que se colocam ao sistema educativo. Só que, a formação, sendo de uma importância fulcral, só o é se for consequente. E a realidade é esta: a esmagadora maioria das formações destinadas a professores não são consequentes. São desenvolvidos pensamentos estruturantes, os professores somam uns créditos, obrigatórios, para a progressão na carreira, mas muito pouco ou nada acrescentam à necessária e imprescindível mudança. Porque o "patrão" não quer!




Aliás, a par de tantas e tantas acções de formação que todos os anos acontecem, se olharmos para o filme de décadas, a questão que se coloca é esta: o que restou no sentido da transformação de uma situação real em uma situação ideal? Portanto, obviamente que dou parabéns às organizações de eventos desta natureza, particularmente à Câmara Municipal de Câmara de Lobos, mas olho para isto com tristeza pela incapacidade ou indisponibilidade do governo para uma alteração substantiva no processo de aprendizagem.

No convite da autarquia li sobre um dos oradores: "Alex Beard estará presente na sessão de abertura com a temática: "A revolução na aprendizagem: uma aventura à volta do mundo e adentro (rumo) do futuro da educação. (...)  É autor do livro Natural Born Learners (2018), um guia do utilizador para transformar a aprendizagem no século XXI. (...) Num mundo em que tudo se está a esgotar, a inteligência humana é nosso último e ilimitado recurso. Se quisermos superar os desafios globais da automação, globalização, da crescente desigualdade e da mudança climática, precisamos de aproveitá-la ao máximo. Mas o que é que os nossos filhos devem aprender? Como é que a próxima geração poderá realizar da melhor forma o seu potencial? Qual será o papel das novas tecnologias? O que é que as mais recentes teorias da educação nos poderão ensinar? Qual é o futuro do ensino?"

Ora bem, perguntas, eu diria, perfeitas. Há anos ditas e repetidas. Só que de  inconsequentes respostas, pois esbarram na mentalidade política reinante, onde a rotina, a circular, o ofício, o despacho, o telefonema e o controlo exercido através da burocracia acabam por matar, completamente, qualquer ímpeto que brote daqueles que sentem a necessidade de colocar a aprendizagem com os olhos postos no futuro. Juntam-se, ainda, os currículos, os programas, a noção de turma e de aula, a arquitectura dos edifícios, o número de alunos por escola, a inspecção "big brother" e sei lá mais o quê, e tudo isto acaba em um cocktail amargo que impede a resposta cabal à pergunta dos organizadores: "como é que a próxima geração poderá realizar da melhor forma o seu potencial?" Dos adultos, sinceramente, pouco ou nada espero. Talvez a pergunta deva ser colocada aos jovens. Os adultos, após ouvirem vários palestrantes, saem de cabeça e coração cheios, porém, no dia seguinte, regressam à maldita e enervante rotina, aos procedimentos que a linha hierárquica superior determina do alto do seu nefasto pódio. E tudo regressa ao mesmo. Repito, talvez os jovens pudessem dar uma ajuda aos adultos políticos, sobretudo porque eles sabem o que não querem que o sector educativo seja. Ou, então, tais personagens deviam seguir o documentário, de 13 episódios "A Outra Escola", produzido pela RTP2. Seria um bom passo. Ou então, ainda, procurar a série Merlí onde é assumido que "há qualquer coisa de podre na Educação".


"Ousar o impossível pela Educação". A frase agrada-me, aliás, há mais de cinquenta anos que leio tantos autores com idêntica preocupação. Contextualizo e bem a palavra "ousar", já nem tanto a palavra "impossível", apesar de reconhecer a sua abrangência neste contexto. Porque na aprendizagem não existem impossíveis, mas saudáveis utopias que sugeram caminhos sem fim. Trago em memória Fernando Birri, citado por Eduardo Galeano in Las palabras andantes?, de Eduardo Galeano, publicado por Siglo XXI, 1994: "A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar." É este sentido, o sentido de caminhar, que não existe na mentalidade política, talvez porque dê muito trabalho e, portanto, pensarão, mais vale manter a actual configuração do sistema, com as rédeas na mão, com alguns acertos de pormenor, nas margens, é certo, mas sempre com a preocupação de não mexer no âmago.

A palavra "ousar" não é permitida. Neste sistema, quem ousa, pode ter à perna um qualquer burocrata da inspecção, supervisionado pelo "patrão". O sistema precisa de arrojo e coragem, isto é, precisa de arriscar sem medo mas com ponderação, isso é determinante, porém o problema é que as escolas estão organizadas com um determinado formato, "uma ou outra andorinha não fazem Primavera", as direcções, genericamente, são obedientes e sentem que a sua autonomia apenas está no papel, logo, o efeito de absorção dá-se com naturalidade. E tudo continua no quadro de uma paz podre e sem futuro.

É impossível ser prospectivo neste sistema. Olhar para o futuro e trazê-lo ao presente, implicaria transformar, eu diria, radicalmente, todo o sistema, para que a Escola fosse portadora de futuro. Não há coragem para "deitar o sistema no divã", qual metáfora, para uma psicanálise que resgate a História e todo o processo mental condicionador. Enquanto não se optar por um debate sério e profundo, conducente a uma mudança, paulatina mas segura, enquanto não se puser em causa a Escola e o que lá acontece, jamais se conseguirá sair do labirinto e jamais existirá a resposta à pergunta dos organizadores: "Qual é o futuro do ensino?" A continuar assim, por mais formações que aconteçam, o futuro do ensino é não ter futuro.

Ilustração: Google Imagens.

Sem comentários:

Enviar um comentário