terça-feira, 30 de outubro de 2018

OS SINDICATOS E OS PROFESSORES QUE SE CUIDEM. ESTÁ EM MARCHA UM DESPEDIMENTO EM MASSA.


Ainda que o assunto seja muito sério e com ele não se deva brincar ou mesmo gozar, a entrevista do secretário da Educação da Madeira ao Diário de Notícias, para quem dedica atenção a este sector, teve qualquer coisa de anedota política. Não consigo exprimir de outra forma. Li e não foi necessário voltar atrás para entender qualquer coisita eventualmente mais complexa. Foi de enfiada e fiquei esclarecido. Fez-me lembrar um sketch do Herman: "ainda bem que me fez essa pergunta". Razão têm aqueles, tal como eu, que assumem que, de titular em titular da pasta da Educação, é sempre a descer. Muito preocupante! Infelizmente, assisto a uma gritante e arrepiante ausência de visão, tudo se quedando na natalidade, nas fusões de estabelecimentos de aprendizagem e na concomitante dispensa de professores. É o Senhor Bispo com a fé e a caridade e o secretário com uma lengalenga de "papas e bolos...". A ordem é fechar escolas, reduzir professores e apostar no sector privado. O resto é treta!  


A entrevista resume-se a uma página, porque a outra foi preenchida com uma foto de alto abaixo do dito. Muito esquisito! Bem a poderia ter aproveitado para trazer à colação as fragilidades do sistema, sobretudo, se tem, qual o seu pensamento organizacional, curricular, programático e pedagógico e, na esteira disso, como fazer das alegadas fragilidades uma oportunidade para traçar um sistema ajustado ao século que estamos a viver e daí aprendizagens com futuro. O resto, repito, é treta. Dizia-me há dias um colega que é importante, pelo menos "de vez em quando, ler umas coisas". Aliás, é extensa a produção de livros e documentos de investigação, não bastasse isso chegaria um pouco de bom senso e um olhar sereno mas ambicioso, para traçar um rumo concordante com os estudos há muito experimentados e divulgados. Ou, então, mais facilmente, uma simples passagem pelo Youtube.
Disse o secretário nessa entrevista: "Estamos preparados para enfrentar os problemas". Uma frase que, ao querer resumir a complexidade, rigorosamente nada de substancial adiantou. Mas quais problemas, questiono, quando o sistema não deve ser visto pela óptica de mais ou menos professores, de mais ou menos estabelecimentos? Essa é uma parte da dinâmica do sistema. Ele tem múltiplas relações interdependentes. Os sindicatos e os professores em geral que se cuidem, desde já, porque os dados são muito claros: encerramento de escolas, política de desemprego e aposta no ensino privado. A responsabilidade constitucional do direito à Educação ficará a um canto, para os mais pobres, porque, ideológica e politicamente, o caminho está definido.  
Recordo, a propósito, que há mais de dez anos, na Assembleia Legislativa da Madeira, insisti na necessidade de uma profunda e prospectiva revisão da rede escolar e do pensamento acerca da organização do sistema, que implicaria, naturalmente, reformulações significativas a todos os níveis. A maioria política sempre defendeu que a Madeira era um exemplo nacional! No diário das sessões constam as intervenções chamando à atenção que o mundo estava a mudar muito rapidamente, consequência do desenvolvimento tecnológico e da consequente globalização, o que implicaria uma tomada de consciência sobre esta escola, alicerçada nos pressupostos do século XIX, portanto, a necessitar de uma reestruturação enquanto resposta ao mundo que estava a surgir. Cegamente, tudo foi chumbado.       
E eis que, a um ano do final do mandato, depois de 42 anos ininterruptos de governação, ridiculamente, vem o secretário assumir que “estamos preparados para enfrentar os problemas”. É evidente que não está e, solidariamente, não estão e,  pior, não querem. A Educação é cara, há muito assumiram, com um discurso baseado no facto de que sendo constitucional, logo deveria ser a República a pagá-la. Ora, sendo este o pensamento dominante, pensarão, que continue a ignorância como provam os números estatísticos do insucesso, do abandono, das qualificações profissionais, da cultura em abstracto e da mentalidade dominante. É comum nos meandros do exercício da política dizer-se que "o que parece é". Pessoalmente, não tenho grandes dúvidas da intencionalidade.
Em suma, o sistema chegou a um ponto que obriga os professores a tomarem posições muito firmes ou serão literalmente esmagados. Quando acordarem será muito tarde. Basta um olhar para estes três anos de governo no sector da Educação, para constatar que não se registou uma única ideia política para o futuro, antes o controlo de tudo e de todos, a perseguição, o fecho de escolas, a dispensa de professores e a propaganda no sentido de levar as pessoas a acreditarem que tem de ser assim. 
Duas notas finais: primeira, no âmbito da transparência, deve o Tribunal de Contas esclarecer, publicamente, o que o motivou para apresentar um "estudo", tipo fatinho por medida, que, subliminarmente, determina as políticas que devem ser seguidas no sistema educativo; segundo, tenha o secretário presente que aquilo que hoje está a semear, pode vir a colher mais cedo do que pensa.  
Ilustração: Google Imagens.

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