Menos de metade dos alunos do 6.º e 9.º ano mostrou ter o nível esperado em conhecimentos elementares no diagnóstico feito pelo Instituto de Avaliação Educativa (Iave), destinado a aferir o impacto do primeiro confinamento nas aprendizagens. Os testes incidiram sobre Matemática, Leitura e Ciências. Os resultados, apresentados esta segunda-feira, são ligeiramente melhores no 3.º ano, o outro nível de ensino avaliado.
NOTA
Estes resultados têm pouco a ver com o "confinamento". As razões são mais profundas e há que explicá-las à luz do sistema organizacional, curricular, programático e sobretudo pedagógico.
Na Leitura, só 47,1% dos alunos do 9.º ano passou a “linha de corte”, demonstrando ter os conhecimentos esperados no nível 1. Este é o nível mais elementar que avalia a capacidade de “identificar informação explícita num texto”. Já no 6.º ano, foram 41,9% os alunos a atingir o nível esperado para os conhecimentos de nível 1.
O Iave hierarquizou as questões feitas aos alunos em Janeiro em quatro níveis, em função da sua dificuldade. Por exemplo, no 6.º ano só 27,4% dos alunos consegue atingir o patamar de conhecimentos desejado no nível mais elevado.
Na apresentação dos resultados do estudo diagnóstico, o secretário de Estado da Educação, João Costa, sublinhou que as dificuldades demonstradas pelos alunos nos níveis mais elevados “não é diferente” da registada em outros instrumentos de avaliação, nomeadamente em testes internacionais como o Programme for International Student Assessment – PISA. No entanto, o governante manifestou a sua preocupação com as “percentagens elevadas” de alunos com uma performance inferior ao esperado “em itens de nível mais simples”.
Esta tendência é comum às três áreas que foram avaliadas – Leitura, Matemática e Ciências –, tanto no 6.º como no 9.º anos. Por exemplo, na Literacia Científica há apenas 44,1% dos alunos do 9.º e 48,7% dos alunos do 6.º ano a demonstrar os conhecimentos esperados no nível mais elementar. Na Matemática, 39,5% (9.º ano) e 44,4% (6.º ano) atinge esse patamar no nível 1.
É preciso, no entanto, notar que o Iave colocou a “linha de corte”, como lhe chamou o presidente daquele organismo, Luís Pereira dos Santos, num patamar que classificou de “exigente”. Ou seja, os alunos tinham que responder correctamente a dois terços das tarefas para serem colocados em terreno positivo.
Os resultados são melhores no 3.º ano, onde a maioria dos alunos esteve acima do patamar de conhecimentos esperado tanto a Ciências (62,3%), como a Matemática (62,6%) e na Leitura (51,4%).
Peritos propõem soluções
Estes testes de diagnóstico foram promovidos para avaliar o impacto do primeiro confinamento nas aprendizagens dos alunos. A forma como foram desenhados avalia transversalmente as literacias. Por isso, alguns dos resultados são obtidos “independentemente da pandemia”, reconheceu o secretário de Estado da Educação. Ou seja, correspondem a debilidades estruturais dos alunos.
No entanto, João Costa considera que os indicadores permitem já perceber que “há um impacto” do ensino remoto no nível de conhecimento. São já “dois anos bastante perturbados pela pandemia”, o que “implica uma acção para os próximos anos”, sustenta o governante.
O secretário de Estado diz, no entanto, que “é prematuro neste momento estar a apontar para qualquer solução”, tendo o Ministério da Educação nomeado um grupo de trabalho que, até ao final do mês de Abril, vai desenvolver um plano para a recuperação das aprendizagens, que terá especial incidência nas escolas no próximo ano lectivo.
Uma das pessoas convidadas pelo Governo para este grupo de trabalho é a professora da Nova School of Business and Economics (Nova SBE) Susana Peralta, uma das economistas que, na semana passada, apresentou um plano de recuperação das aprendizagens dos alunos que inclui escolas de Verão e um reforço de tutorias. A implementação desse programa custaria, pelo menos, 200 milhões de euros.
No grupo têm também assento a especialista em Saúde Mental Margarida Gaspar de Matos e a vice-presidente da Ordem dos Psicólogos, Sofia Ramalho, sinal da preocupação do Ministério da Educação de centrar o plano “não só nas aprendizagens, mas também nas competências emocionais” que possam também ter sido afectadas pela pandemia, de acordo com o secretário de Estado.
Neste grupo estão outros académicos como Domingos Fernandes (ISCTE), João Pedro da Ponte (Universidade de Lisboa), Sónia Valente Rodrigues (Universidade do Porto) e professores do ensino básico e secundário – José Jorge Teixeira, professor de Física e Química no agrupamento de Escolas Dr. Júlio Martins, em Chaves, e vencedor do prémio Global Teacher Award 2020, David Sousa, director da escola Frei Gonçalo de Azevedo, em Cascais, e Júlia Gradeço, directora do agrupamento de escolas de Oliveira do Bairro.
O relatório divulgado esta segunda-feira é o primeiro resultado do estudo diagnóstico conduzido pelo Iave. Os testes feitos em Janeiro vão permitir análises mais aprofundadas, permitindo nomeadamente cruzar estes resultados com indicadores socio-económicos. O Ministério da Educação anunciou também a intenção de “ouvir a voz dos professores” neste exercício de avaliação dos efeitos da pandemia sobre as escolas.
13 mil respostas
Este estudo de diagnóstico foi anunciado para o 1.º período e chegou a ter as duas primeiras semanas de Dezembro previstas para a sua realização, mas acabou por ser adiado para Janeiro. Estava previsto que participassem 30 mil alunos, 10 mil por cada um dos anos de escolaridade em que este será realizado (3.º, 6.º e 9.º anos). O período de avaliação acabou por ser encurtado porque as escolas foram encerradas a 22 de Janeiro, o último dia para o qual estava prevista a aplicação dos testes de diagnóstico.
A amostra foi, por isso, reduzida a 23 mil estudantes, mas só 12.960 responderam. O número ficou “ligeiramente abaixo da taxa de resposta esperada”, admite o presidente do Iave, Luís Pereira dos Santos, que garante que esse facto “não coloca em causa a representatividade da amostra”.
O diagnóstico dos impactos da pandemia nas aprendizagens vai ser prolongado. As provas de aferição do 2.º, 5.º e 8.º anos, previstas para os meses de Maio e Junho, foram oficialmente canceladas devido às mudanças no calendário lectivo, mas serão aplicadas nas mesmas datas, apenas a uma amostra de alunos, como forma de avaliação do impacto do segundo confinamento.
Os enunciados serão os mesmos, que já se encontravam finalizados, e que estão “perfeitamente adequados” para cumprir a função de diagnóstico das aprendizagens agora pretendida, assegura o presidente do Iave.
Fonte: Público
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