sábado, 31 de março de 2018

POR GPS FORAM DIREITINHOS AO POTE


Ponto prévio: obviamente que há gente muito séria enquanto proprietários ou meros administradores/gestores dos estabelecimentos de educação e ensino privados. Não é isso que está em causa. A questão é de princípio. A Constituição da República Portuguesa é muito clara sobre esta matéria: se, por um lado, garante a liberdade de aprender e ensinar (Art. 43º), por outro, no Artigo 73º define que "Todos têm direito à educação e à cultura" e, no Artigo 74º, que o Estado "promove a democratização da educação e as demais condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para a igualdade de oportunidades (...)", e que "Na realização da política de ensino incumbe ao Estado: a) Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito; b) Criar um sistema público e desenvolver o sistema geral de educação pré-escolar; c) Garantir a educação permanente e eliminar o analfabetismo; d) Garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística; e) Estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino (...)". O Artigo 75º sublinha que o "Estado reconhece e fiscaliza o ensino particular e cooperativo, nos termos da lei".


Ora, reconhecer é uma coisa, pagar é outra. Ao Estado compete-lhe, apenas, a educação e ensino de natureza pública. O ensino de natureza particular é, neste contexto, alternativo, no quadro da legítima opção das famílias. E sendo assim, só é compreensível a existência de contratos de associação com os estabelecimentos de natureza privada, quando não existe resposta pública em um determinado local. Aí sim, porque ninguém pode ficar excluído do acesso, o Estado tem o dever de contratualizar. Esta é, portanto, a questão de princípio. 
Por aí se evitaria a vergonhosa situação do Grupo GPS que "(...) segundo o MP, os agora arguidos terão alegadamente feito uso indevido de 30 milhões de euros dos mais de 300 milhões pagos pelo Estado no âmbito deste contrato. O dinheiro entregue pelo Estado aos colégios foi ainda usado para pagar férias, carros (65 apreendidos), bilhetes para o mundial de futebol de 2006, jantares, vinhos e até seguros pessoais dos arguidos administradores (...)". Mais: "(...) Os arguidos administradores conseguiram obter do Estado, no âmbito dos contratos de associação (horas fictícias) celebrados com os colégios e nos anos lectivos descritos, a quantia total de 803.519,80 euros", lê-se na acusação. Os arguidos, cinco administradores "estão acusados de crimes como corrupção activa, peculato, falsificação de documentos, burla qualificada e abuso de confiança qualificado".
Há muito que o assunto é conhecido, envolvendo ex-governantes, deputados e outras figuras. O GPS (Gestão de Participações Sociais) foi por GPS direitinho ao pote. Isto revolta, por um lado, pela ausência de honestidade, por outro, quando tanta falta faz o dinheiro à escola pública a braços com crónicas carências financeiras. 
Na Região Autónoma da Madeira, onde essas carências também são evidentes, o governo entrega de bandeja cerca de 26 milhões anuais ao sector privado. Isto significa a crescente desresponsabilização pelo sector público. Pessoalmente, respeito, totalmente, a livre opção das famílias, um direito inalienável, mas não à custa dos impostos de todos os contribuintes. A população goza do direito Constitucional à Educação e esse tem de ser universal, de qualidade e inclusivo. Onde há resposta pública não devem existir contratos de associação. Trata-se de uma questão de princípio, apesar, repito, de não ter dúvidas quanto à existência de pessoas, no sector privado, de comportamento gestionário irrepreensível. 
Fonte: Público.
Ilustração: Google Imagens.  

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