"Uma escola por aluno" é a expressão mais simples, mais profunda e de um enorme significado que alguma vez encontrei para dar consistência a tudo quanto penso sobre o sistema educativo, particularmente, sobre a escola com vida, vivência, convivência e aprendizagem. No essencial, uma escola por aluno significa um estabelecimento de aprendizagem personalizado, que respeita as origens culturais, sociais e económicas dos alunos, que demonstra uma organização comprometida com o sucesso individual assente na diferença e nos ritmos de cada um. A expressão, aliás, é muito mais que um slogan ou uma chamada de atenção metodológica, é, sobretudo, uma atitude que sacode a ideia da aula tradicional, o conceito de turma, a focagem obsessiva na avaliação e centra as preocupações na pessoa, conhecendo-a e indo ao seu encontro. Uma escola por aluno significa que este não é mais um, não é um número na engrenagem traiçoeira de uma escola dirigida para milhares, antes uma escola com um olhar inteligente que sabe como agarrar as margens trazendo-as para o centro das preocupações educativas.
Como é que isso se consegue? Pondo tudo em causa, estudando e mudando, destruindo e reconstruindo, paulatina mas radicalmente, um sistema que está velho, caduco, enervante, imbecil e que mata a esperança. Consegue-se, rompendo com entranhados conceitos tradicionais, partindo para outros mais complexos, ao encontro do desenvolvimento tecnológico e da diversidade dos públicos. Não é possível de outra forma, quando, por um lado, calcula-se que, em 2025, 91% dos portugueses vão estar ligados à internet; por outro, a discrepância já evidente entre um mundo que avançou em turbilhão e uma escola que parou no tempo curricular, programático e pedagógico. Em 2016, o Professor Joaquim Azevedo, investigador da Universidade Católica, sintetizou: "A escola mudou pouco, os adolescentes mudaram muito". É esta tomada de consciência que deve ser colocada em cima da mesa, com coragem, firmeza e inteligência. Basta um olhar atento sobre a iniciativa Web Summit. Será que perante o que ali se passa a escola pode ficar indiferente? Pode alguém ignorar o interesse de 170 países e de 70.000 visitantes? Eu diria que a escola de hoje é um beco perante a interminável avenida da Web Summit.
É óbvio que a construção de um novo paradigma não é possível com escolas com 2.500, 2000, 1.500 ou 1.000 alunos. Infelizmente, há quem se vanglorie disso, ao jeito da minha escola é maior que a tua, ou, então, é a maior do país. Um pouco de reflexão e perceberiam quanto errados estão. A escola não deve ser salas e professores que mudam a cada hora. A aprendizagem para a complexidade guia-se por enquadramentos muito distintos do passado. É possível com estabelecimentos de limitada dimensão. Escolas com aquela vastidão, os alunos e os professores, todos são números por maior que seja o empenhamento e as quase intermináveis reuniões, de repetição em repetição, desde o conselho pedagógico ao de turma. No verdadeiro sentido, ninguém conhece ninguém. Nem os professores entre si. Conhecem, apenas, o vaivém. Com este formato, espécie de linha de montagem, não são possíveis projectos de vida, antes o rigoroso e acéfalo cumprimento do estabelecido, de característica uniforme, quando todos são diferentes. Junta-se a este quadro, a infernal burocracia, o big-brother da hierarquia política, a incapacidade dos quadros intermédios dizerem não, na esteira de José Régio "(...) não vou por aí". E o círculo vicioso fecha-se e recomeça a cada ano, como se o mundo terminasse nos muros da escola.
Uma escola por aluno, enquanto conceito, rompe, necessariamente, com a ideia de "um fatinho igual para todos". Terão de ser feitos por medida, acautelando a diversidade dos interesses e das vocações. A isto eu chamo uma escola de cultura e com cultura. Porque tudo pode ser aprendido, os formatos para lá chegar é que, obviamente, terão de ser diferentes e múltiplos. Não enxergar isto, parece-me grave! Disse Clarice Lispector (1920/1977): "o óbvio é a verdade mais difícil de se enxergar".
Ilustração: Google Imagens.
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