segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

AINDA SOBRE PISA, A SOCIEDADE E O SISTEMA EDUCATIVO PORTUGUÊS

Li um artigo de opinião da Doutora Isabel Torres, ex-docente universitária e hoje Vice-Presidente da Assembleia Legislativa da Madeira. O título: "E agora Ministro Tiago Brandão"? Texto a propósito dos resultados PISA (Programme for International Student Assessment) 2015, da OCDE. Obviamente que é importante que existam posições completamente divergentes (aqui), quer as que se fundamentam na compaginação de todas as variáveis, quer as de pendor claramente partidário. No plano pessoal e democrático aceito-as todas e retiro, apenas, as minhas conclusões. Neste artigo, de elogio às políticas do ex-ministro Nuno Crato, que não acompanho, retirei duas ideias: "(...) O Mário Nogueira e a Catarina Martins, que não defendem a exigência, mas antes, a felicidade dos professores e das crianças, ainda estarão por certo, a neutralizar a hiperacidez que este facto notável lhes causou" (...) "E agora Sr. Ministro Tiago Brandão, como explica a sua política desastrosa em substituir o que estava bem, os resultados do PISA comprovam-no, por aquilo que não trará nada de bom e de positivo para o ensino e a aprendizagem das nossas crianças?"


Aprendi, com o decorrer dos anos, e transmiti isso aos meus alunos, inclusive na Universidade, duas sínteses que observei dos Mestres com quem muito aprendi e privei: primeiro, só é legítima uma opinião séria e fundamentada quando se faz, também, um esforço sério e fundamentado de estudo das variáveis de um determinado tema; segundo, complementarmente, à partida, todos têm razão, desde que a justifiquem de forma consistente e inequívoca a sua análise. É basilar. Daí que, no que concerne aos resultados PISA, há muito que faço esse esforço de estudo, através do cruzamento de muitas análises, desde investigadores a autores, expurgando das minhas conclusões qualquer posicionamento ideológico e partidário. Ainda anteontem aqui publiquei declarações de Pablo Gentili, Doutor em Educação na Universidade de Buenos Aires e secretário executivo do "Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales (CLACSO)". São dele, entre outras, estas palavras: "La OCDE parte de un principio equivocado, de que hay una forma de pensar el desarrollo y el mundo (...) Las pruebas PISA son el concurso de belleza da la pedagogia". Curiosamente, no dia anterior, tinha eu escrito aqui: "(...) Há, por um lado, diversas realidades históricas, económicas, sociais e culturais, que não permitem, com rigor, comparar o que é incomparável, e, por outro, sabe-se que não é seguro o carácter aleatório de escolha dos alunos que se submetem aos testes. Factos que distorcem e colocam em causa o resultado final. Bastam estes dois aspectos para que se fique de pé atrás na análise dos resultados. Parece-me muito mais importante conhecer a estrutura dos diversos sistemas educativos, se eles estão ou não adequados ao tempo que vivemos, à própria investigação, se transportam ou não um princípio hierárquico contrário à verdadeira autonomia dos estabelecimentos de ensino, o grau de formação dos docentes e a sua disponibilidade para aceitar novos paradigmas pedagógicos, mais ainda, qual a relação entre o sistema educativo (a jusante) e as preocupações de natureza social (a montante). São estes aspectos que determinam se os sistemas são ou não portadores de futuro (...)".
Ora bem, ao contrário do que li e acima reproduzi (Isabel Torres), sublinho agora que se defende a exigência através da felicidade das crianças e dos professores. Crianças infelizes, e este conceito de felicidade envolve múltiplos aspectos económicos, sociais e culturais, não podem demonstrar interesse pela aprendizagem. Da mesma forma que professores sujeitos a uma enervante rotina e a processos que só quem os vive dispõe de uma leitura correcta, acabam por desempenhar menos bem o seu mister. É, por isso, que, por um lado, as taxas de repetência e de abandono são altíssimas e, por outro, um terço dos professores encontra-se em esgotamento físico e mental (Síndrome de Burnout).
Depois, há um outro aspecto que merece reflexão. Enganam-se os que pensam que estes testes PISA, entre outros, não escondem outras subtis, mas profundas intenções. Obviamente que não são inocentes. Tal como não foi o "Processo Bolonha", essa tendencial uniformização da formação (conducente ao pensamento único), do qual resultou, entre outras, a desresponsabilização do Estado pelo 2º ciclo de estudos. Parece-me claro que Bolonha escondeu outras intenções. Há "Mestrados" que custam os olhos da cara! De igual forma, estes "ranking's" de países (PISA), repito, passando ao lado das realidades históricas, económicas, sociais e culturais, trazem no seu bojo uma intenção subliminar conducente à visão do Mundo que a teia deseja operacionalizar. OCDE é uma sigla que significa "Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico". Certo? Portanto, não sejamos inocentes e não façamos de um qualquer "ranking" a radiografia do País para esgrimir, partidariamente, posicionamentos que, tarde ou cedo, rebentam nas próprias mãos. Um País com 30% de repetências, com 30% de pobres, com sérias dificuldades na empregabilidade, com baixos salários, com altíssimas necessidades de Acção Social Educativa, do básico ao universitário, com lacunas graves na mentalidade e usufruto dos bens culturais, é lógico que não pode ser um País cujas crianças, globalmente, sejam felizes e com apetência pelo conhecimento. Mais. Um País com uma estrutura do Sistema Educativo assente no Século XIX não pode ter aspirações ao desempenho de países que ultrapassaram o analfabetismo há mais de um século e cujas economias nada têm a ver com a situação portuguesa. É comparar o incomparável. Esqueçamos os "ranking's ou olhemos para eles de forma distante e preocupemo-nos, sim, com as estruturas em que assenta o sistema educativo nacional. Porque mais escola e mais horas de Português e de Matemática, não significam melhor escola e melhor futuro. PISA, por tudo isto, não "comprova" nada. E para que fique claro, sou pelo rigor e pela exigência, só que através de um paradigma organizacional, programático e pedagógico completamente diferente de tudo quanto enformaram os Séculos XIX e XX.
Ilustração: Google Imagens.

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