terça-feira, 28 de janeiro de 2020

O Sistema Educativo está totalmente desactualizado


"No meu trabalho, que desenvolvo desde 2001, o meu principal objectivo é identificar, explorar e alavancar o potencial das pessoas. Ou seja, muitas vezes as pessoas não se apercebem do seu real talento e estão a seguir um caminho, quando na verdade a sua paixão é outro caminho. O meu trabalho ajuda a identificar isso. O que por vezes é muito desconfortável. Temos de desmontar, em certos casos, décadas de uma profissão que, afinal, foi um erro de "casting" 

(...) costumo dar palestras em escolas secundárias precisamente porque reconheço, e não há aqui nenhuma crítica aos professores, que o sistema educativo está totalmente desactualizado. Num mundo que, se rebobinarmos 40 anos mudou tecnologicamente, no conhecimento e no acesso à informação, como é possível termos crianças fechadas em salas de aula e a aprender da mesma forma, estática e estagnada, o que aprenderam os pais e avós? 

Vou às escolas exactamente para estimular, desde muito cedo, o real poder de começarem a trabalhar para os seus objectivos. Não é preciso esperar para quando acabar a escola. Quando acabar o curso. Não. Hoje podes estar verdadeiramente a construir o teu futuro. (...)"

NOTA
Entrevista publicada na edição de hoje do DIÁRIO, conduzida pela jornalista Tânia Cova. A não perder.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

É a amostra PISA que está errada ou a realidade que se alterou?


Entre 2015 e 2018, os resultados das escolas privadas no PISA baixaram muitíssimo, uma queda que a todos intrigou dado que os colégios privados, aqueles onde estão os meninos das famílias endinheiradas, continuam no top 10 do ranking de exames nacionais e não haveria nenhuma razão para baixarem os seus desempenhos, que tipicamente estavam bem acima da média nacional e que em 2018 deram em alinhar com as escolas públicas.

Para encontrar uma resposta fez-se uma análise a partir dos dados PISA originais por forma a poder dissecá-los nas suas componentes e encontrar o que escondem os números de modo agregado.
O PISA classifica as escolas em Públicas e Privadas de acordo com a propriedade, esta primeira divisão faz com que nas escolas privadas estejam incluídas:
(1) As escolas de propriedade privada financiadas pelo Estado ou outros (Fundo Social Europeu, associações de empresários, sindicatos):
Contratos de Associação – currículo geral administrado por uma escola privada em substituição do Estado, tipicamente localizadas onde a oferta pública é insuficiente para a procura;
Escolas Profissionais – vertente profissional com equivalência ao secundário onde a vertente prática é mais acentuada e os currículos teóricos diferentes do ensino secundário geral;
Escolas de Cursos de Especialização e Formação (CEF), que foram criadas para ajudar a integrar no meio profissional os alunos que iriam abandonar o sistema, invariavelmente marcados por percursos de insucesso.
(2) As escolas estritamente privadas onde os pais pagam uma mensalidade para garantir o funcionamento da instituição e que seguem o currículo do ensino geral.
Desta forma, torna-se muito claro que temos uma grande diversidade de populações a frequentar o ensino cuja propriedade da escola é privada. No entanto, a intriga não se desvanece, pois esta divisão já existia nas amostras anteriores.
Quando se decompôs as escolas por tipologias de financiamento e ensino tornou-se claro que a composição das escolas privadas se alterou bastante na amostra de 2018.
A percentagem de escolas estritamente privadas diminui mais de 30 pontos percentuais. As escolas onde se oferecem cursos CEF, que eram anteriormente inexistentes no privado, representam agora 11% e o peso do ensino profissional com equivalência ao secundário duplicou. Curiosamente, os contratos de associação mantiveram-se estáveis, e seria expectável que tivessem diminuído (Figura 1), pois o anterior governo terminou com grande parte destes acordos. Por outro lado, a estrutura das escolas públicas manteve-se muito similar entre 2015 e 2018 (Figura 2).

A grande questão que se coloca é compreender se esta alteração resulta de um “azar” ligado à aleatoriedade, ou seja, nesta edição foram sorteadas escolas com características distintas, ou se espelha uma nova realidade em Portugal. Eu suspeito que a segunda hipótese possa ser a verdadeira por dois motivos:
(Re)surgimento dos cursos CEF com apoio dos Fundos Sociais Europeus e apoios governamentais, o que pode ter constituído um incentivo para que mais escolas privadas tenham surgido nesta tipologia, porventura através da mudança de estatuto de Contrato de Associação para escola CEF e Profissional.
Mais alunos a optar por cursos profissionais sem ser por motivos de insucesso no Ensino Básico, estando, por tal, um maior número a frequentar esta via aos 15 anos.
Fica por explicar por que motivo os Contratos de Associação não diminuíram, dado que sabemos que este tipo de acordo está em processo de redução para mínimos históricos.
Como consequência da alteração de estrutura, o ensino privado em Portugal passou a servir populações provenientes de estatutos socioeconómicos muito baixos e alunos com percursos de insucesso ou perfis menos académicos, com desempenhos muito inferiores no PISA.
Ao verificar a evolução dos resultados por tipologia de escola (Figura 3), o que se verifica é a ausência de oscilações. De notar que os alunos que frequentam os CEF (1,2,3) estão muito atrasados no seu percurso escolar e que os alunos dos profissionais, apesar de se situarem no ano equivalente ao 10.º, estão pior preparados para resolver os problemas da vida adulta. De notar que a nível dos cursos profissionais e CEF não existem diferenças entre público e privado, com os alunos a atingirem níveis de competência muito similares.
Os alunos que frequentam as escolas estritamente privadas são os que apresentam desempenho médio mais elevado, à semelhança do que vinha acontecendo em anos anteriores, sem esquecermos que são uma pequena parte da população e que se trata da franja dos privilegiados.
O ensino geral da escola pública tem uma média inferior à dos privados, o que se justifica por ter uma base de alunos muito maior e de grande diversidade socioeconómica e cultural, mas fica equiparado aos Contratos de Associação que servem o mesmo tipo de população, pois estão impedidos de selecionar e a sua frequência é gratuita para as famílias.


O PISA 2018 não trouxe nada de novo a nível dos desempenhos, mas revelou que se pode estar a configurar uma nova tipologia do investimento privado em educação que surge para beneficiar dos apoios europeus e governamentais e ocupar um espaço na formação de alunos com percursos alternativos. Assim sendo, vamo-nos habituar a ouvir sem surpresa que os desempenhos entre público e privado são similares, se educação privada significa cada vez menos ser escola para rico.

Isabel Flores
Fonte: Público

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

"Uma mão lava a outra..." e palmas para a "classroom"!

Li no FN: "A Escola Secundária Jaime Moniz inaugurou hoje, no Dia da Escola, a "Sala Luís Miguel Sousa Classroom" (...) graças a um donativo (...) de 40 mil Euros". Tanto que me apetece discorrer sobre este assunto! Vou esperar que outros o façam nos domínios que perpassam pela minha cabeça. E são tantos os que fazem parte desta encenação! Não estarei longe do aforismo: "uma mão lava a outra (...)" o que me leva a ter presente, por se tratar de uma sala de tecnologia, a historieta que se conta de um encontro entre Linus Torvalds, Bill Gates e Steve Jobs. 

"No intervalo de uma palestra sobre informática encontraram-se na casa de banho. Após uma rápida passagem pelo mictório, o Senhor Linus lavou cuidadosamente as mãos e virou-se para Bill Gates dizendo: Nós, da Linux, somos perfeccionistas. Bill Gates que também lavava meticulosamente as mãos, tomando cuidado de esfregar bem entre os dedos, lançou um olhar desafiador para Linus e exclamou: Nós, da Microsoft, somos perfeccionistas e detalhistas! Nesse momento, Steve Jobs, que estava de costas para a ridícula cena, dirigiu-se para a saída do banheiro. Em uníssono, Linus e Gates perguntaram-lhe: Steve, você não vai lavar as mãos? E Steve Jobs respondeu, secamente: Nós, da Apple, não 'mijamos' na mão!"

Sobre aquela sala lembrei-me, ainda, de Carlos Drummond de Andrade - A Mão Suja: 

"Minha mão está suja.
Preciso cortá-la.
Não adianta lavar.
A água está podre.
Nem ensaboar.
O sabão é ruim.
A mão está suja,
suja há muitos anos
(...)"

Nada disto me interessa, o humor corrosivo de Steve Jobs ou o notável poema de Drummond, porque o que mais me prendeu a atenção foi a palavra "classroom" em uma escola que se vangloria de notas brilhantes, inclusive, em Português. Pensem nisso.

De resto, já nada me é estranho. Há patronos de estabelecimentos de aprendizagem que foram políticos regionais, um deles chefe de gabinete, e que apenas foram isso, centros de saúde, idem, e até a toponímia tem sido invadida por nomes que ultrapassam outros de referência maior em tantas áreas. Há por aí nomes atribuídos sem que se lhes conheça qualquer rasgo!
Este breve texto vem a propósito de um telefonema de um Amigo de longa data. Sobre aquela "classroom", secamente, disse-me: "aquela sala deveria chamar-se 'Povo da Madeira', porque tem sido tanta e tanta a marosca nos transportes marítimos, que os quarenta mil euros são uns troquitos em relação ao que já pagámos". Concordando, respondi-lhe mais ou menos isto: tens razão, sobretudo quando o sector público entrega 25 milhões anuais a estabelecimentos privados de educação. Por aqui, meu Amigo, na Educação, há uma tendência para penalizar quem é inovador. Conheces, ou não, o que se passou no Curral das Freiras?
Há, de facto, "mãos sujas"!
Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

A importância da cultura desportiva para a vida


Directo ao assunto: a Educação Física já contou para a média de acesso ao ensino superior, entretanto, julgo que em 2012, deixou de contar e agora voltou à situação anterior. Respeito todas as posições sobre esta matéria que, para mim, não tem nada de complexa. Lendo, estudando e escutando, desde sempre que me posicionei contra a atribuição de níveis ou notas nesta disciplina, infelizmente, ainda, designada por Educação Física. Adiante, certamente, o leitor compreenderá o porquê. Mas, desde logo sublinho que nada justifica a continuada luta por querer manter um estatuto de igualdade a qualquer outra disciplina, aquela que é estruturalmente diferente. Não é pior nem melhor, apenas é diferente e é nessa diferença que ela deve procurar o seu espaço de intervenção. Em síntese, defendo o desporto como um dos bens culturais para a vida, tal como o teatro, o ballet, a música, a dança, aliás, toda a área das Expressões. Neste pressuposto, não fazem sentido avaliações, muito menos fazê-las contar na acessibilidade ao ensino superior, quando o objectivo maior é integrar, desde muito cedo, esse sentido cultural para toda a vida. Entra até no campo do ridículo que se atribuam notas no Ensino Secundário com tamanha relevância e, depois, a esmagadora maioria deixe de praticar seja que actividade for. Atestam-no as taxas de participação que colocam o País na cauda da Europa.

Tenho presente a "Ode ao Desporto" de Pierre de Coubertin: "Ó Desporto, prazer dos Deuses! Essência da vida (...) Ó Desporto, tu és a beleza! És o arquitecto deste edifício que é o corpo, que pode tornar-se abjecto ou sublime, se degrada na vileza das paixões, ou saudavelmente se cultiva no esforço. (...) Ó Desporto, tu és a Justiça! A equidade perfeita, em vão perseguida pelos Homens nas instituições sociais! (...) Ó Desporto, tu és a audácia! Todo o sentido do esforço muscular se resume numa única palavra: ousar. (...) Ó Desporto, tu és a Honra! Os títulos que tu conferes não têm qualquer valor se adquiridos por meios diferentes da lealdade absoluta. (...) Ó Desporto, tu és a alegria! Ao teu chamamento o corpo alegra-se, os olhos sorriem e o sangue circula. (...) Ó Desporto, tu és a fecundidade! Por vias indirectas e nobres, encaminhas ao aperfeiçoamento. (...) Ó Desporto, tu és o progresso! Para bem te servir é necessário que o Homem se aperfeiçoe no corpo e na alma. (...) Ó Desporto, tu és a paz! Estabeleces relações felizes entre os Povos, aproximando-os no culto da força dominada. (...)". Tudo isto, caros leitores, não se consegue com notas de avaliação, mas com CULTURA.

Não vou escrever um novo texto sobre o que penso relativamente à matéria que aqui me trouxe. Vou, apenas, socorrer-me de dois grandes Amigos: o Filósofo, Professsor Catedrático, Doutor Manuel Sérgio e do Professor Catedrático Doutor Gustavo Pires. O que aqui vou deixar escrevi, em 2012 e 2013, reforçando o que antes tinha assumido no livro que, em 2004, escrevi por ocasião do "Ano Europeu da Educação pelo Desporto".
Enalteceu Manuel Sérgio:

(…) Por mim sou em crer que se a Educação Física, se se deixa aferrolhar na torre de marfim onde virginalmente querem escondê-la, roubando-lhe o acto fecundante do contacto com as ciências do Homem, não excrescerá a mediania (…). - A Prática e a Educação Física, 1985, pág. 11. E o problema é exactamente esse, quando assisto a pessoas que continuam a aferrolhar esta disciplina, como se de uma vaca sagrada tratasse, quando melhor seria deixá-la fecundar-se pelas ciências do Homem. Lembro-me de Manuel Sérgio, em uma das longas e amigas conversas que manteve comigo, em minha casa, ter dito com aquela sabedoria expressa em poucas palavras: "tirem a bola à Educação Física e digam-me lá o que resta!". Nem mais, disse-lhe. E a conversa continuou dissecando um seu artigo de opinião que sintetiza as correntes filosóficas, sociais e o pensamento pedagógico ao longo dos tempos: 

"(...) nem científica nem pedagogicamente existe qualquer educação de físicos (...) a expressão Educação Física está incrustada numa ambiência social onde o estudo desta matéria não é conhecido (...) e, portanto, a Educação Física deve morrer o mais rapidamente possível para surgir em seu lugar uma nova área científica que mereça dos homens de ciência credibilidade, respeito e admiração" (Artigo de opinião publicado no DESPORTO Madeira, 27.06.03). 

E no livro "Da Educação Física à Motricidade Humana" (2002), no qual estive envolvido, o citado autor refere que é no quadro da Ciência da Motricidade Humana que falo de “uma nova Renascença, de uma época de construção de novas ciências, que procura encontrar a teoria da prática dos professores de Educação Física (…) "há que compreender como Heidegger, que existir humanamente é ser tempo. De facto, tudo é tempo e a Educação Física já teve o seu". Ora bem, mas não é apenas Manuel Sérgio que a esta mudança se refere. Entre tantos de uma extensa bibliografia, um outro, de quem também sou amigo pessoal, o Professor Gustavo Pires, catedrático na Faculdade de Motricidade Humana, salienta no livro Desporto e Política – Paradoxos e Realidades, pág. 352 e 353:

"(…) O sistema de valores, os símbolos, a estética, o espaço e a estrutura do tempo são portadores de novas ideias e pensamentos que devem originar outras soluções organizacionais quando se trata de organizar actividades lúdicas, culturais, recreativas e formativas, em ambiente escolar. 

(…) Defender a Educação Física não é, por isso, insistir nos modelos e nas soluções do passado. Defender a Educação Física é sermos capazes de encontrar soluções de acordo com as realidades do nosso tempo. Numa dinâmica de futuro. E o futuro é o ensino do desporto". 

Ora, aqui convergem dois pressupostos: a mudança da instituição escola e, por extensão, a mudança do paradigma que enforma a Educação Física. Como defendo que ela não se deve "aferrolhar na torre de marfim", conhecendo todo o processo histórico e a evolução tecnológica, entendo que a escola portuguesa é hoje uma instituição desadequada da realidade e a Educação Física não faz, por conseguinte, qualquer sentido. Deve ser substituída pela Educação Desportiva. É preciso que assumamos que a Educação Física, hoje, não é nada. Há inquéritos mundiais que testemunham a sua crescente descredibilização e aceitação. E quando escrevo a palavra hoje refiro-me desde os anos 70 para cá. 

Fui aluno, em 1969, do Professor Nelson Mendes, autor do livro "A Humanização do Movimento" (1969). Na parte que consagra à Antropologia – ponto de partida, salienta: "É nossa opinião que a expressão Educação Física é actualmente uma expressão limitadora, estática e não válida. Não está mais em causa o físico ou soma como realidade existente em si própria. O físico não pode, actualmente, existir como objectivo específico de qualquer acção de âmbito educativo" (…) Esta expressão enquanto persistir como expressão actual, limitará forçosamente o seu verdadeiro significado e, portanto, qualquer acção nesse sentido". "(…) Há que situarmo-nos na corrente filosófica actual quanto à natureza do Homem e daí partir". 

Passaram-se 51 anos! Não resisto, porém, de deixar mais esta achega: "(...) A dita Educação Física, porque é física não pode ser raiz do conhecimento, dado que isola o físico do intelectual e moral e, assim, não é uma categoria gnosiológica, nem uma categoria sociológica – é um conglomerado de técnicas, sem qualquer tipo de fundamento válido. Não basta uma prática, precisa é de uma compreensão da prática, ou seja, a unidade prática-teoria: teoria essa que pretende interpretar e projectar a prática". Mais adiante, continua Manuel Sérgio: "(…) Educação Física: libertação ou alienação? Será alienação enquanto for física, pois que esta palavra apresenta uma clara significação ideológica. Na realidade, a Educação Física pode levar a uma definição de homem conformista, imobilizado no tempo (…) sem um projecto global de humanidade" - Algumas Teses Sobre o Desporto, pág. 65 e 66.

Apesar de assim ser, lamento que desde ministros a secretários, continuem a querer enquadrar esta disciplina fundamental da formação humana no mesmo patamar de todas as outras. Pergunto, então, que justificação existe para que conte para a acessibilidade ao Ensino Superior? E o teatro, a dança, o canto, o ballet, as artes de uma maneira geral? Porquê a Educação Física? 

Hoje, li, na revista A Página da Educação que me chegou pelo correio, um intemporal artigo do Professor Manuel Sérgio. Deixo-vos com esta frase: "As pátrias fizeram-se com cientistas,  filósofos, mas também com poetas e heróis. O desporto, nas suas horas mais significativas, também".
Ilustração: Google Imagens.

NOTA
Texto publicado no blogue
www.gnose.eu

domingo, 12 de janeiro de 2020

Jaume Carbonell: “Função do professor não é ditar pensamento, mas ensinar a pensar”


Por REDAÇÃO PÁTIO 
9 de Setembro de 2019

A escola precisa fomentar a escuta e o respeito pela opinião divergente. O aluno precisa aprender a respeitar e a argumentar melhor. Enriquecer o pensamento. Portanto, é preciso poder confrontar, conhecer diferentes pontos de vista, dentro de um debate democrático, espirituoso e sobretudo em que os alunos aprendam a argumentar. A função do professor não é ditar o pensamento, mas ensinar como pensar.


O pedagogo Jaume Carbonell: escola precisa fomentar a escuta e o respeito pela opinião divergente. Crédito: Rafaela Paludo/Desafios da Educação.
As pernas cruzadas e o livro na mão lhe dão um ar sábio. Não é para menos. O espanhol Jaume Carbonell é pedagogo, jornalista e sociólogo. Escreveu nove livros, entre eles Pedagogias do século XXI. Também foi diretor da revista Cuadernos de Pedagogía e, atualmente é assessor do El Diari de l’Educació e professor associado na Universitat de Vic (Barcelona).
Carbonell tem mais de 30 anos de experiência na área de Pedagogia e costuma participar de conferências ao redor do mundo sobre temas relacionados a inovação, ensino público, história da educação e o seu futuro.
Em agosto, em passagem pelo Brasil, Jaume Carbonell concedeu a seguinte entrevista ao portal Desafios da Educação. Confira os principais trechos da conversa.

Qual é o papel da tecnologia no ambiente escolar? A escola deve ir em consonância com os progressos culturais, científicos e tecnológicos. As tecnologias contribuem para grandes mudanças, possibilidades e oportunidades para uma melhor aprendizagem. No entanto, esse mundo tão acelerado está gerando um problema: a falta de atenção e concentração. Eu penso que não é o mesmo ler no celular e ler em um livro de papel, porque fazemos isso de maneiras diferentes. Então, o papel ainda precisa existir. Ler em um livro impresso traz uma leitura mais pausada, tranquila, profunda e crítica.

A instituição de ensino deve proteger a infância desse mundo acelerado, deve ser um espaço tranquilo. É deve haver diálogo: a conversação do professor com os alunos é fundamental para que, conjuntamente, façam um bom uso das tecnologias.
As revistas Pátio foram inspiradas na Cuadernos de Pedagogía, publicação da qual o senhor foi diretor durante anos. Cada dia mais o fluxo de informações aumenta e é um desafio para os professores se manterem atualizados. Como o senhor acha que esses profissionais podem equilibrar a quantidade de informações e manterem uma rotina de atualização? Sempre há três objetivos: informar, opinar e praticar. Portanto é necessário dar orientações, práticas e conhecer experiências que ajudem a enriquecer, formar e a crescer como docentes. Precisa existir o intercâmbio de experiências, porque eu não posso estar sozinho numa sala de aula, sem conhecer nada mais em volta. Preciso das outras pessoas, preciso cooperar e trabalhar em equipe. Todas as tecnologias e propostas que contribuem para um trabalho cooperativo são fundamentais.
Outra maneira de se atualizar é lendo. Isso é um compromisso individual, mas também coletivo. Na universidade, reunimo-nos uma vez por semana, antes das aulas e durante uma hora com os professores, para debatermos um texto, um artigo, uma notícia. O interessante é que você coloca sua opinião e pode compartilhar.
Também ajuda muito o trabalho de rede. As tecnologias permitem hoje que nós trabalhemos em rede, sejam presenciais e virtuais. Redes para trocar experiências, para tirar dúvidas e propor reflexões.
O uso de chatbot na educação cresceu. O senhor acha que esse tipo de tecnologia aponta para o que teremos no futuro? Sim. Temos dificuldade de nos reunirmos presencialmente e o virtual facilita isso. Mas não podemos deixar de ter o mínimo de presencialidade.

As tecnologias nunca vão substituir a riqueza de um encontro, onde há espontaneidade, a vivência das interações e das opiniões. Então, é importante não se acomodar exclusivamente às tecnologias.

Em seu último livro, o senhor fala sobre educação e política. Atualmente vivemos tempos polarizados, em que a simples menção dessas duas palavras em uma mesma frase pode esquentar os ânimos de um debate. Qual seria a melhor forma de levantarmos esse debate em sala de aula? Eu parto de um modelo de escola inovadora, crítica e transformadora. A missão do professor é colocar os conhecimentos ao alcance do aluno para que eles possam aprender a estudar o mundo.

Há dois conceitos que eu rejeito: primeiro é a neutralidade, porque ela não existe. Nada é neutro. A segunda é a oposição. Uma coisa são as ideias, outra é a imposição das regras. Eu creio que a política é maiúscula, não é a política dos partidos institucionais. É a política que tem a ver com justiça social, dos deveres humanos, a igualdade, a liberdade. A escola é um espaço autônomo da família e da sociedade, onde a função é poder falar de tudo e ter liberdade de expressão. Na escola, deve-se abordar até temas tabus, pois eles seguem fazendo parte do mundo.

E como fazer isso? Pegamos um exemplo: um debate. O professor não pode começar um debate se posicionando. Ele é uma pessoa que coordena as diferentes opiniões e que oferece elementos de reflexão, para que o aluno encontre mais argumentos para reforçar a sua oposição. Mas o aluno também precisa aprender a escutar o outro.
A escola precisa fomentar a escuta e o respeito pela opinião divergente. O aluno precisa aprender a respeitar e a argumentar melhor. Enriquecer o pensamento. Portanto, é preciso poder confrontar, conhecer diferentes pontos de vista, dentro de um debate democrático, espirituoso e sobretudo em que os alunos aprendam a argumentar. A função do professor não é ditar o pensamento, mas ensinar como pensar.
A escola, cabe frisar, é um espaço de estudo. Portanto, deve fazer pensar de maneira sistemática e contribuir para o pensamento, para que não recaia só sobre a família a missão formativa. A escola deve sempre criar canais de comunicação e de participação com a família, mas com autonomia, pois não pode estar condicionada pelo o que a sociedade faz ou pelo que a família disse.
Como estimular o protagonismo dos alunos, despertando sua curiosidade e seu interesse com os assuntos trabalhados na escola? A riqueza de uma escola ser democrática e plural é que permite metodologias e pedagogias diferentes. As pessoas aprendem melhor quando integram conhecimento e disciplinas distintas.

Nesse sentido, há uma prática pedagógica que vai além dos limites – que é o ensino baseado em projetos. Um projeto não é da disciplina de matemática ou de linguagem: um projeto parte de uma pergunta, de um debate, de um dilema que coloca uma situação a ser investigada e comentada ao longo de um período por todas as disciplinas. Esses comentários usam conhecimentos distintos e vozes distintas. Então, a ideia é como os alunos adquirem conhecimento com distintas fontes e também como o elaboram de forma coletiva.

Outra é a questão da educação inclusiva – que precisa alcançar todos os alunos que tenham alguma deficiência, diferentes línguas e culturas e diferentes contextos sociais. Como todos esses alunos podem ser incluídos em uma escola com iguais condições?
Há sempre que se buscar atender e respeitar a diversidade. A escola é um espaço que busca a igualdade – a equidade, digamos. Somos mais iguais do que diferentes. Então, esse é o caminho: alcançar um lugar em que não exista diferenças por razão de sexo, língua ou situação econômica.
Também tem a ideia de inteligência, que não tem a ver só com o intelectual, mas também com as emoções, sentimentos, solidariedade, respeito, com como nos relacionamos, trabalhamos em equipe e também com a inteligência ética – que todos temos. Portanto, seria adequado que a escola tivesse um programa ou um projeto que cultive todas essas dimensões de inteligência.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Encontros inesperados


Há dias interessantes que nos põem a reflectir. Ontem vivi dois momentos completamente díspares um do outro, mas que acabei por conjugá-los. Entrei em uma superfície comercial para adquirir um equipamento e o colaborador que me atendeu deixou-me surpreendido. Sabia de electrónica aquilo que eu já não vou a tempo de integrar nos meus circuitos! Fomos falando, pensando eu que se tratava de um licenciado em engenharia de sistemas, ali a trabalhar enquanto melhor não surge, quando, a páginas tantas, diz-me que apenas tem o 9º ano, mas que nutre uma paixão pela electrónica, que toca guitarra e bateria. Tudo conseguido de forma autodidacta, lendo, consultando e seguindo os seus interesses. Eu diria, sonhos! 

Ainda questionei, confesso, em tom de provocação: a base aprendeu na escola, certamente! Respondeu de enfiada: a escola foi uma maçada e, para além de "algumas coisas e do convívio", naquilo que eram os meus interesses, nada me deu. 
Saí dali a pensar na "aula" de tecnologia (e não só) que me tinha dado e, sobretudo, no testemunho sobre uma escola que, infelizmente, os jovens ainda têm. Conclusão do circunstancial encontro: continua tudo centrado nos gabinetes, onde adultos avessos à mudança, distantes da realidade, vertem para a escola as suas convicções primárias. E não se contentam com isso: infernizam quem lá trabalha com "paletes" de papelada, onde só em teoria os jovens estão no centro das suas preocupações educativas. 
Mais tarde, cruzei-me com um "velho" Coronel, porém, sempre novo em pensamento. Desde os tempos da Guiné, já lá vão 48 anos, julgo que falámos não mais de três vezes. Foi muito bom revê-lo, pela Amizade construída naquela ex-colónia. A conversa rapidamente entrou pelo âmbito da pobreza institucional em Portugal, pela indisciplina, pela corrupção, pela acentuada irresponsabilidade e degradação, dizia ele, na própria instituição militar, pela ausência de princípios e de valores, sobejamente sensíveis em um salve-se quem puder, pela falta de Homens e Mulheres referências de credibilidade e notoriedade política e social. Um diálogo muito distante, sublinho, de símbolos pessimistas, ao jeito de "no meu tempo é que era bom", mas factual, quando se passa em revista o que por debaixo dos nossos olhos vamos observando. Conclusão do encontro para além da satisfação de estarmos um com o outro: vive-se um tempo de mentira, de aldrabice e de espezinhamento.
Conjugando os dois encontros, o do tal jovem e o do meu distinto Coronel, constato um denominador comum que justifica, senão tudo pelo menos em uma grande parte, a escola que pretensamente "forma" para um falso conhecimento enciclopédico, mas que deixa de lado o estrutural, a pessoa, daí às consequências na factura na sociedade que estamos a viver. O resto, como me disse o jovem da tal superfície comercial, "está na net". Basta procurar. O problema é que a Escola continua a não querer perceber isto.
De facto, há dias que nos deixam a reflectir.
Ilustração: Google Imagens.
Gosto
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domingo, 5 de janeiro de 2020

UM FATINHO IGUAL PARA TODOS

No passado dia 03 de Janeiro fez dois anos que publiquei um texto baseado na série televisiva "10 segundos para o futuro - O Mundo em 2077". "(...) Este primeiro programa de uma série de quatro, deixou-me completamente pregado ao sofá. Emocionante. Permitiu-me, por extensão, reflectir sobre o Sistema Educativo que, teimosamente, continua, parece que alegremente, a repetir o passado longe de se constituir como uma fonte prospectiva do futuro. Esta série deveria ser, "obrigatoriamente", vista por governantes, professores, responsáveis pelos estabelecimentos de ensino, motivo de reflexão que coloque em causa todo o sistema organizacional, os currículos, os programas e toda, toda a organização pedagógica. Estamos face à inteligência artificial, porém, o sistema educativo continua lá para trás na era industrial. Que pobreza! (...)"
A animação que aqui reproduzo, no essencial, transmite a preferência da Região pela "formatação" da aprendizagem, tal qual um "fatinho igual para todos". Com algumas mexidas nas margens, porque o miolo continua sempre igual. 
É a Escola sem pensamento crítico que prevalece.


Evolução das tecnologias na Educação

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Secretaria Regional da Educação recorre da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal


Recorrer de uma decisão é um direito que lhe assiste. Porém, em função dos factos apurados pelo Tribunal, inequívocos e que espelham, apenas, perseguição ao docente em causa, eu diria que é necessário ter uma descomunal lata para continuar uma luta que, já não falo no plano da Justiça, mas no ético, é demonstrativa da pobre mentalidade de quem a Educação está entregue. Aqui fica um texto (integral) que me foi enviado (Forum Sociedade).



3. Secretaria Regional de Educação recorre da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, continuando a pressão sobre o professor Joaquim José Sousa e a sua família, até quando o dinheiro dos contribuintes será usado para prejudicar os mesmos.

4. Porque não disponibiliza a Secretaria Regional de Educação as Atas da escola do Curral das Freiras, que foram pedidas pela trabalhador a 4 de janeiro de 2019.

Síntese:

1ª A injustiça do processo teve consequências danosas para a comunidade (extinção da escola) e calamitosas para a família do visado (pobreza e humilhação social) https://www.jm-madeira.pt/capa/ver_edicao/2194 https://www.facebook.com/search/top/?q=Ricardo%20Araujo%20Pereira&epa=SEARCH_BOX;

2ª A pena injusta e ilegal teve consequências injustas para a vida do profissional de educação e para a sua família (das quais dificilmente recuperará) https://www.dnoticias.pt/impressa/hemeroteca/diario-de-noticias/esta-a-destruir-me-e-a-minha-familia-IL3782486;

3ª Como é possível que a Administração Educativa Regional saia impune depois de todo o mal que foi feito à comunidade, ao profissional de educação e à sua família https://sicnoticias.pt/pais/2019-03-26-Ex-diretor-da-Escola-Basica-do-Curral-das-Freirassuspensopor-seis-meses-e-sem-direito-a-salario;

4ª O estado não pode nem deve continuar a fragilizar a administração escolar, que é responsabilizada pelos recursos que não têm, pela legislação que não conhece, pela burocracia que entulha as secretárias, sendo culpabilizada numa autonomia onde só é autónoma dentro do que já decidem por ela https://www.publico.pt/2018/04/18/sociedade/noticia/director-de-escola-modelo-alvo-de-processo-disciplinar-1810755.

O Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal mandou anular os atos cometidos contra o Prof. Joaquim José Sousa pela Secretaria Regional de Educação da Madeira, no dia 17 de dezembro de 2019, devido a erros de vicio no decorrer do processo, a defesa evocou:

Ø PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO⇒ANULABILIDADE DA DECISÃO;
Ø VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE (ART. 9.o, DO CPA E 32.o DA CRP)⇒NULIDADE DA DECISÃO;
Ø ILEGITIMIDADE DA SENHORA INSTRUTORA;
Ø PARCIALIDADE DA ACUSAÇÃO;
Ø OMISSÃO DE PRONÚNCIA;
Ø A DESCONTEXTUALIZAÇÃO E ERRADA APRECIAÇÃO DOS FACTOS.

Não obstante a extensa e raramente vista acusação (com 388. Artigos) os artigos onde se imputam comportamentos ao professor, resumem-se aos artigos: 371.º a 382.º.

- Onde se encontram acusações como:

Enviar os horários por e-mail (decisão lavrada em ata de direção setembro de 2017 e em ata de Reunião Geral de Professores – em ambas aprovada por unanimidade);

Solicitação de não juntar turmas de ano no 1º ciclo à administração educativa (decisão lavrada em ata de conselho pedagógico, executivo e da comunidade educativa);

Atribuição de horas extraordinárias compensadas com descanso compensatório para que os alunos em virtude da falta de docentes pudessem terminar os respetivos cursos no ano letivo (com a concordância de todos os docentes e aprovado em sede de conselho executivo e de conselho pedagógico – decisão aprovada por unanimidade e lavrada em ata de ambos os órgãos e autorizada por escrito pelos docentes), o próprio presidente do órgão de gestão foi lecionar para suprimir a falta de docentes (decisão aprovada por unanimidade e lavrada em ata do conselho executivo);

Anulação de matrícula a um aluno que findo o 3º ciclo se candidatou a várias escolas e tendo entrado numa (CEFAD em Palmela), não anulou a candidatura na escola do Curral das Freiras, quando comprovadamente o encarregado de educação pediu a anulação da matrícula – a mesma foi anulada pelo conselho administrativo (decisão aprovada por unanimidade e lavrada em ata do conselho executivo);

Abertura da escola às 07.30 para acolher em espaço quente e acolhedor as crianças da creche, da pré e do 1º ciclo, monitorizado voluntariamente por docentes (em virtude da falta de funcionários) https://www.dnoticias.pt/madeira/e-imprescindivel-provir-as-escolas-com-funcionarios-de-carreira-CX3101747 https://www.dnoticias.pt/impressa/hemeroteca/diario-de-noticias/escolas-com-falta-de-funcionarios-YY2133166 que promoviam atividades lúdico-pedagógicas (com a concordância de todos os docentes, proposto pelo Departamento de Expressões e aprovado em sede de conselho executivo e de conselho pedagógico – decisão aprovada por unanimidade e lavrada em ata de ambos os órgãos e autorizada por escrito pelos docentes);

O Tribunal analisou o processo e mandou anular os atos praticados contra o Prof. Joaquim José Sousa por a Secretaria Regional da Educação não ter cumprido os prazos para investigar acusar e julgar o docente.

Porquê:

Acusação inicial - requisição a mais de professores de informática e economia para o ano de 2017/2018.
Acusação não contemplada na acusação final.
11 das 12 acusações são sobre factos que ocorrem posteriormente à abertura do processo disciplinar.

Factos:

O órgão de gestão era colegial – votações por maioria – em ata está plasmado que várias vezes o presidente do órgão votou vencido;

Existia um regimento interno com tarefas atribuídas - apenas uma das acusações estava sob a alçada do presidente do órgão (plasmado em regimento interno do conselho executivo e em atas do mesmo)

Apenas um membro foi acusado e punido – sem nunca ter sido ouvido em sede de instrução ao contrário dos restantes membros do órgão de gestão

Ao longo do processo foi privado:

Ø - do direito ao recurso hierárquico (o secretário da Educação que era o recurso quis ser ele a aplicar a pena e não o diretor da administração educativa que era a quem o competia fazer por lei);

Ø - da presunção de inocência (desde o início a administração tudo fez para o condenar, inclusive contar mochilas);

Ø - do acesso à informação que o ilibava (foi condenado antes de receber as atas solicitadas que estão em poder da administração);

Ø - do direito ao seu bom nome (enxovalhado publicamente pela Secretaria Regional de Educação);

Ø - do direito à saúde (teve de recorrer a empréstimos para pagar casa, escola, saúde aos filhos de 4 e 6 anos);

Ø - do dever de alimentar os filhos (só com o salário da esposa);

Ø - do direito de exercer a profissão (confinado ao riso e ao descredito dos pares);

Ø - do direito a viver em segurança e em liberdade – foi ameaçado e condenado em praça pública por fonte da SRE;

O que provocou que o mesmo tenha sido suspenso sem vencimento por 6 meses e sujeito a uma profunda humilhação pública por parte da Administração Regional de Educação da Madeira.

Para ver os seus direitos reconhecidos pagou um elevado preço, enquanto a administração usou o dinheiro dos contribuintes para perseguir, humilhar e destruir a honra, o prestígio e o seu bom-nome, o que coloca em causa o futuro da família do Prof. Joaquim José Sousa.

Joaquim José Sousa é um profissional que nos últimos dez anos recebeu três louvores, obteve quatro avaliações de excelência, cuja gestão foi reconhecida como de excelência a nível regional e nacional, que elevou a qualidade da educação regional a patamares nacionais, que sempre respeitou a escola democrática e a descentralização que a lei preconiza – pena – SUSPENSÃO POR SEIS MESES SEM VENCIMENTO

A Secretaria Regional de Educação continua a gastar fundos públicos e recorreu da decisão do Juiz a 30 de dezembro de 2019.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Educação (sem) paixão?


Por
Dnotícias - 31 DEZ 2019 

1. No início do passado mês de novembro, o Governo nacional, perante a nova controvérsia de acabar com os chumbos até ao 9º ano, sucessivos pedidos de esclarecimento a António Costa sobre o seu ‘plano’ para combater as retenções e desistências – cerca de 50 mil alunos, de acordo com os números ostentados – e diante a possibilidade de haver passagens administrativas (logo negadas) de alunos, levantou, na reta final da segunda década do milénio, mais uma vez, aquele que é talvez o maior problema cultural do nosso tempo: a Educação.

Ora, se o princípio de acabar com os chumbos se distendesse até ao 12º ano de escolaridade e estivesse em vigor, então, no corrente ano letivo todos os alunos que frequentam o ensino básico e secundário seriam já nascidos no século XXI, e todos os professores são, impreterivelmente, do século XX. Isto significa, como é evidente, que existiu um hiato de tempo (alguns autores falam de uma a duas gerações) e uma aceleração desse mesmo tempo – só possível com a tecnologia, inovação, informação, conhecimento, tudo efeitos do fulgor da globalização – que a escola procurou acompanhar para preparar os jovens para um mundo em permanente mudança e que prossegue para a era digital, a ciência dos dados, robotização e inteligência artificial. Contudo, se esta mudança e evolução é agora uma evidência, pois irá (melhor, já está) acontecer, também neste processo tudo é uma questão de oportunidades e prazos, e as instituições de ensino (e os professores que nelas trabalham) necessitam e exigem, agora mais do que nunca, de uma atenção especial, acompanhada de mais formação, novos meios materiais e “incentivos”, pois só assim conseguirão executar os compromissos profissionais agendados pelas oscilantes diretrizes políticas e prover as dinâmicas exigidas de visam corrigir desigualdades sociais, a que acresce o indispensável progresso do país.
2. Os “Millennials”, isto é, os cidadãos que nasceram durante os anos 80 e início dos 90, talvez ainda se recordem de um ex-Primeiro-ministro, agora Secretário-Geral da ONU, que encabeçou os XIIIº e XIVº Governos Constitucionais e utilizou um slogan deveras emocional para revigorar uma área que precisava (e continua a necessitar) de reformas e de um forte investimento público: refiro-me à famosa “Paixão pela Educação”, proferida por António Guterres.
René Descartes, por muitos considerado o ‘pai’ da época moderna da história da Filosofia e representante do racionalismo, antecipou o resultado desta “paixão”, na medida em que para ele “as paixões são todas boas por natureza e nós apenas temos de evitar o seu mau uso e os seus excessos”. Guterres tinha uma paixão com razão. Era (e continua a ser) um homem de diálogo, fazedor de pontes, um humanista, visionário, alguém que sabe que os resultados na área da educação não surgem de um dia para o outro, de forma rápida e mágica, e que a educação deve ser uma prioridade e um desígnio nacional que deve unir, mobilizar e não dividir ou ser motivo de disputa político-partidária. Mas não foi preciso esperar muito para que esta “sensibilidade apurada” e paixão pela educação – desde o primeiro ciclo até ao ensino superior, e não esqueço aqui Mariano Gago, referência incontornável de uma geração, quer como ministro quer o papel fulcral que teve na divulgação científica e no aumento da cultura científica dos portugueses sem paralelo na história – desse lugar a um divórcio espinhoso e conflituoso com os professores. Quem não recorda ainda o dia 8 de novembro de 2008, data da mega manifestação que juntou perto de 120 mil professores, em Lisboa, contra as políticas educativas de uma ministra (Maria de Lurdes Rodrigues) que proferiu a célebre frase “perdi os professores, mas ganhei os pais e a população”, a mesma responsável política que atacou, denegriu, desuniu e dividiu (entre professores e professores titulares) uma classe profissional que até então era dotada de respeitável credibilidade e autoridade junto da opinião pública.

O ministro Nuno Crato, aquele que considerou o Dr. Passos “um herói nacional”, não reativou a paixão pela educação, pior, desinvestiu na área e entregou-se cegamente a um impulso que a arrastou para o excesso de burocracia, a elitização do sistema educativo (sobrevalorização dos exames, resultados e rankings); congelou as progressões nas carreiras, propagou a desconsideração social dos professores, alterou currículos e modelos de avaliação dos alunos várias vezes, em suma, foi um ministro que contribuiu ativamente para deterioração das condições de trabalho nas escolas e a redução inopinada e desequilibrada de custos e de professores, que agora tanto escasseiam em algumas áreas científicas e que as muitas escolas procuram contratar. 

Tiago Brandão Rodrigues, a escolha de António Costa, também não reavivou a “paixão pela educação” enquanto titular da pasta no XXIº Governo Constitucional, e nem parece querer fazê-lo nesta sua segunda passagem enquanto ministro. Assiste, de modo impávido e sereno, ao naufragar do sistema público de ensino e, depois de 4 anos no poder, ainda acusa e responsabiliza o seu antecessor no cargo, por exemplo, pelas oscilações negativas nas áreas das ciências e leitura, registadas pelos alunos portugueses na última edição do PISA (Programme for International Student Assessment). Ao mesmo tempo, nada declara nem concebe para inverter uma realidade anunciada que é a de que a maioria dos grupos de recrutamento vão perder mais de metade dos docentes do quadro até 2030; que algumas disciplinas poderão inclusive desaparecer dos currículos com a aposentação de mais de 90% dos seus respetivos professores; que continuam a existir turmas sem professor a certas disciplinas ao fim de mais de três meses de aulas; que apesar da redução, a taxa de abandono precoce na educação e formação, em Portugal, ainda ronda os 12%; para não mencionar que mais de 60% dos professores portugueses estão desmotivados e sofrem de “exaustão emocional”, não esquecendo aqui os mais recentes dados sobre a violência (e a indisciplina dos alunos) contra professores, creio que agora talvez “mais reais”, apesar de muitos silenciarem os factos e não apresentarem queixa por receio de represálias e de serem acusados de não demonstrarem ‘orgulho’ em pertencer a uma determinada instituição de ensino.
3. Em Portugal, se a paixão pela educação ainda existe, ela não passa já há alguns anos nem pela 5 de Outubro (agora transferida para a Avenida Infante Santo) nem pelo Palácio de São Bento, mas encontra-se sim nas milhares de escolas do país onde educadores, professores, pessoal técnico e auxiliar (verdadeiros “mestres” incógnitos), no seu quotidiano, continuam a demonstrar um profissionalismo – com elevado sentido de vocação – e uma dedicação muito especial à missão que lhes foi confiada, despertando nos alunos “poderes e sonhos além dos seus” (George Steiner), ou seja, está patente nas salas de aula, anfiteatros, laboratórios, ginásios e até os corredores e pátios escolares, onde o trabalho diário exercido pelos profissionais da educação visa fundamentalmente que todos os alunos alcancem os seus objetivos e sejam felizes, e só assim podemos falar verdadeiramente de sucesso educativo que não tem “um dono”.
É um facto indubitável que hoje se assiste a uma desvalorização do trabalho realizado pelos professores, que são assim os únicos responsabilizados pela situação da educação em Portugal. No entanto, a necessidade de transmitir conhecimentos, competências e até valores, e de os adquirir, são uma constante da natureza humana e, portanto, a relação de ensino-aprendizagem entre professor-aluno(s), reconhecida numerosas vezes pelos próprios alunos, deverá continuar a subsistir pelo menos enquanto existirem sociedades e humanidade. Els não esquecem o impacto dos verdadeiros mestres sobre o presente e o seu futuro e, adaptando a célebre frase de Bernardo de Chartres, mencionada por João de Salisbúria (Metalogicon III), se hoje “podem ver mais e mais longe não é porque a sua visão seja mais aguda, mas porque eles os carregaram no alto e os levantaram acima da sua altura”.