terça-feira, 29 de agosto de 2023

A necessidade de repensar tudo


Dos Estados Unidos a vários países europeus, mesmo aqueles reconhecidos como tendo sistemas educativos de reconhecida qualidade, os manuais digitais e outros equipamentos estão a ser colocados em causa e mesmo abandonados. Não significa isto, como aqui já tive a oportunidade de equacionar, o abandono da tecnologia. Não é disso que se trata, aliás, seria um contrassenso, quando se vive num mundo onde os meios tecnológicos ganham cada vez maior relevância nas nossas vidas.



O problema é outro e muito mais profundo. E esse tem de ser estudado. Por que razão "a Suécia está a planear deixar de lado os computadores nas escolas e regressar ao ensino baseado nos livros? O motivo, explicam, é a diminuição das competências de leitura e escrita dos alunos".

Aliás, "a Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, já tinha mostrado dados que levaram a crer "que exagerar nas telas pode levar a: prejuízos na comunicação, problemas no sono e atrasos no desenvolvimento cognitivo".

O plano da Suécia "é dizer adeus aos quadros digitais, ecrãs e dispositivos electrónicos e regressar às ferramentas tradicionais de ensino. A Ministra da Educação, Lotta Edholm, e a Ministra da Cultura, Parisa Liljestrand, consideraram que foi "uma grande experiência", mas anunciaram, planos para regressar ao ensino baseado nos livros". Na Holanda, "os celulares, tablets e relógios inteligentes" serão banidos. E na Finlândia já foi anunciado um projeto quase no mesmo sentido. Nos Estados Unidos, desde há oito anos que se assiste a uma mudança no que concerne à utilização desses meios.

E o curioso desta situação é que, por ausência de estudo prévio, quando os outros já experimentaram e concluíram que existem outros meios de relevância maior na aprendizagem, em Portugal e particularmente na Madeira, estão a ser "investidos" muitos milhões. Quando os outros tendem a abandonar nós começamos. Regresso as palavras de Tony Bates (Microsoft) que transcrevi no meu livro "A Escola é uma seca" (2022): 

"(...) o bom ensino supera uma escolha tecnológica pobre, mas a tecnologia nunca salvará o mau ensino". 


O problema é esse. Seja como for, a questão central está em debater, com rigor científico, a mudança de pensamento que está a acontecer. Não basta fiar-se nos vendedores de tecnologia. Com o receio de perderem no mercado livreiro, apostam, como alternativa, na integração do manual no digital. Como é óbvio, um vendedor nunca abordará a fragilidade do que vende. Vêm aí, são entrevistados, dizem maravilhas, falam em pioneirismo, simplesmente porque são "vendedores". Quem governa não devia entrar em leviandades e "achismos" desta natureza! Bom seria que apresentassem as conclusões dos estudos, se estes foram, previamente, realizados.

Esse debate tem de acontecer com urgência, envolvendo todos, desde investigadores a professores que, nas escolas, são hoje confrontados com novas populações e novos quadros de aprendizagem. O sistema não deve estar entregue a uma "cabecinha pensadora". E se, eventualmente, concluir-se que existem, com rigor científico, repito, outros caminhos mais consistentes, inteligente será reverter o que pensavam ser a via mais adequada. Às certezas contraponho a dúvida e, portanto, estudem no pressuposto que "só os burros não mudam de opinião; ou só os burros não têm opinião sobre as mudanças dos outros".

Paralelamente, há muito, mas mesmo muito a estudar e a mudar no sistema. A utilização da tecnologia, sobretudo como utilizá-la é, apenas, uma ínfima parte. Os currículos, os programas, o processo pedagógico, a mentalidade, a arquitectura das escolas e a característica centralista como estão organizadas, continuam a ser as grandes chagas do sistema. 

Ilustração: Google Imagens. 

sábado, 26 de agosto de 2023

O conhecimento e a subjectividade das notas escolares

 

Confunde-se o "conhecimento" com "notas escolares" conseguidas através de uma qualquer avaliação. E uma coisa e outra não são compagináveis em todas as suas dimensões. A vida precisa de conhecimento e dispensa o excessivo e frágil foco nas notas (classificação)! O empregador pergunta: "o que sabe fazer" e não a "classificação" que teve na disciplina Y. Note-se que não estou a colocar em causa a avaliação, mas sim as variáveis do processo que conduzem a aprender melhor. Genericamente, salvaguardando as excepções, o que designam por "bom aluno" é aquele que, perante um determinado programa curricular, repete o que lhe foi transmitido pelo docente, o qual, por sua vez, cumpre o que se encontra espelhado no manual. Ora, por essa via, raramente existe uma conexão directa com o conhecimento intelectual, muito menos com o conhecimento científico.



Esta escola oferecida aos portugueses não possibilita o questionamento da própria realidade e não estimula a criatividade nas ideias e conceitos. Trata-se, por isso, de uma aprendizagem que parte, fundamentalmente, do professor e não do aluno. Quase tudo se apresenta repetitivo e estático, cansativo e constrangedor para professores e alunos. 

Aos professores pedem-lhes que elaborem, cumpram as meticulosas "planificações das unidades didácticas" e debitem, escrevam muitos relatórios do extenso e anacrónico processo burocrático e, finalmente, atribuam notas; aos alunos, o sistema preocupa-se em apreciar os dóceis, serenos, não desestabilizadores, por ser mais fácil direccioná-los, desde as primeiras idades, não para a sabedoria, mas para a resposta previamente entendida como certa. Esta lógica de funcionamento diverge de uma aprendizagem consistente, porque mata a curiosidade, não assenta no pensamento, no conhecimento e busca dos porquês, na interpretação das variáveis dos processos, compreendendo-os e favorecendo a transferência para novas situações.

E porquê? Porque a escola que deveria partir do pressuposto da complexidade, continua a preferir uma espécie de prato único, tipo "bife, batata frita e ovo a cavalo" que de tanto engolir causa enfastio, tédio, desinteresse e até rejeição. O que isto significa é que, no mundo que estamos a viver, a aprendizagem, desde início, não deve ser previsível no quadro de uma estrutura clássica próxima do pensamento "industrial". Porque a escola não deve ser entendida como uma fábrica. É um erro admitir que a tradicional segmentação (fragmentação) por disciplinas, mais tarde, as partes se unam no todo. A cognição impõe a opção pela dialéctica, pela capacidade de refutar o que é apresentado como produto acabado. Por aí existe aprendizagem significativa, simplesmente porque as perguntas do aluno devem preceder a resposta constante no manual. Ora, sistema que mata a pergunta é um sistema condenado; sistema que encurrala o aluno, direccionando-o para o que o adulto entende, limita muitas vezes, definitivamente, o conhecimento portador de futuro.


Neste pressuposto a questão parece-me óbvia: que interesse terá a resposta inserta no manual, digital ou não, quando ela não assenta no jogo da curiosidade, da observação e da descoberta? Ou, quando o centro da atenção e preocupação raramente transita do professor para o aluno? Só que o sistema, heterónomo, inflexível, centralizador e cristalizador, prefere manter as rédeas na mão, ao contrário de mostrar-se disponível para olhar de forma sistémica para além dos muros da escola. Não foi com espanto que li, que, da parte governamental, o "planeamento (do próximo) ano lectivo decorre sem falhas". Dir-se-á que a máquina está politicamente oleada e responderá "convenientemente", à semelhança de uma empresa de fornecimento de energia eléctrica. À escola bastar-lhe-á accionar o interruptor! Entretanto, paradoxalmente, falam da autonomia dos estabelecimentos de aprendizagem!

Ser criativo, inovador, dispor de uma consistente capacidade argumentativa, ser curioso e ter a noção que o manual é o menos importante, quando a possibilidade de aprender está espalhada por tantos meios, tecnológicos e outros, tal devia constituir o foco de toda a aprendizagem, jamais a padronização e cristalização do pensamento ("fixação funcional") que eu designaria por anestesia contranatura. Natural é a estimulação do questionamento, é colocar em causa, é dissecar a pluralidade de opiniões, natural devia ser a preocupação de inter-relacionar, induzir no entendimento das causas e nunca, mas nunca, em decorar centenas de respostas destinadas ao esquecimento após uma qualquer avaliação.

Porque isso é o que encontramos na vida real. Ela não nos pede respostas estanques, antes solicita conglomerados, partes distintas que se ajustam na resposta a uma dada situação. E isso trabalha-se no processo de aprendizagem. As próprias especializações assentam nesse pressuposto que devem excluir tanta tralha que nada acrescenta. Está em causa o conhecimento interligado e com robustez. A propósito, diz-nos Edgar Morin que a fragmentação de saberes constitui um erro, por isso propôs o conceito da complexidade. Sendo assim, é inexplicável a crónica indiferença dos governantes perante o pensamento de um dos maiores intelectuais do nosso tempo. "É preciso educar os educadores", sublinhou. É verdade! 


Sublinhou Mustafá Ali Kanso (1960/2017): "Numa primeira análise, a complexidade é um tecido de constituintes heterogéneos inseparavelmente associados: coloca o paradoxo do uno e do múltiplo. Na segunda abordagem, a complexidade é efectivamente o tecido de acontecimentos, acções, interacções, retroacções, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo fenomenal". É isso. Portanto, "a sua principal proposta é a abordagem transdisciplinar dos fenómenos e a mudança de paradigma (...)".
 
De onde concluo que a Escola deve ser culta e deve estimular a cultura. A voz dos alunos dispensa uma escola redutora, fechada sobre si própria, preconceituosa e feita de crenças, que não consegue evoluir na missão que lhe compete, que não enxerga a vida, uma escola sem pensamento crítico, que sobrevive no meio de múltiplos medos, submetida aos princípios que enformaram o passado, uma escola que olha para ontem e não para o futuro, pedagógica e didacticamente parada no tempo, que não consegue perceber a população a quem se dirige, uma escola que não respeita sonhos e talentos, que não contribui para a felicidade de alunos, dos professores e que se divorcia da cultura geral e específica, repito, dizem os alunos, é perfeitamente dispensável.  É pela cultura e não pelas definições e respostas pré-definidas que vamos. A partir da cultura, no sentido lato do termo, tudo se agrega. Portanto, conhecimento é uma coisa, notas escolares outra, às quais, infelizmente, continuam a dar uma muito discutível relevância. Porque continuam a confundir avaliação com classificação, conhecimento com notas. Daí o surgimento de uma meritocracia balofa que traz para dentro da escola as taras da sociedade! 

Ilustração: Google Imagens.

quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Educação: podíamos ter feito mais e melhor!


Por
Paulo Alves - Professor
Deputado do JPP

A definição das políticas educativas regionais é da responsabilidade de quem governa a Região. No âmbito da nossa Autonomia, é responsabilidade da tutela definir as estratégias e opções governativas adequadas à realidade educativa e social que carateriza a nossa sociedade, sempre com o objetivo de promover uma melhor qualidade de vida aos cidadãos. Ao longo dos anos de governação PSD, e agora em coligação com o CDS, sempre se ouviu dizer que o “nosso modelo” educativo (regional) é o melhor! O “nosso sistema de ensino” é o melhor do país! 



Os nossos “governantes com a tutela de Educação” foram e são do melhor que há no país em matéria de “gestão e administração do nosso modelo/sistema escolar e ensino” - quem o diz, na maioria das vezes, desconhece o “perfil” de alguns deles ou nunca estiveram em debate com os mesmos, para ter o privilégio de lidar com a sua soberba e arrogância! Mas, diz a coligação PSD/CDS que valorizaram os professores (devolvendo-lhes o que lhes era de direito!) através da contagem do tempo de serviço (que estava congelado!). 

Quando sabemos que aquilo que foi feito não foi mais do que cumprir um dos direitos dos professores: devolver aos professores o que lhes haviam tirado no passado! Em relação a outras opções governativas em matéria de políticas educativas, não diz a tutela da Educação que é contra a limitação de mandatos dos diretores e presidentes dos conselhos executivos da escola pública, quando 81% dos professores são a favor! Não diz a tutela que o processo de fusão de escolas falhou em algumas situações e que este ano, por ser ano eleitoral, ninguém fala em fusão ou encerramento de escolas! 

Não diz que, após mais de quatro dezenas de anos de governação PSD, os Censos de 2021 revelaram as falhas no modelo educativo na Região. Ao fim de mais de quatro décadas de Autonomia, a Madeira continua a ser uma Região do País com uma elevada percentagem de pessoas, com 15 ou mais anos de idade, com um grau de escolaridade de 4 a 9 anos. São exatamente 40,5% da população em idade ativa, perfazendo um total superior a 75 mil habitantes, com o seguinte registo: com apenas 4 anos de escolaridade (24,3%), até 9 anos (16,2%). Apenas 22,5% concluíram o 12º ano e 16,5% têm formação superior. Existem, ainda, 10.433 madeirenses que não têm qualquer grau de ensino, o que pode ser considerada população analfabeta. 


Face a estes dados, verificamos que poderíamos ter feito mais e melhor em matéria de Educação! Que, ao longo dos anos, se optou por satisfazer alguns lobbies ou interesses instalados em áreas económicas (de todos conhecidas!) em detrimento de uma aposta forte no Ensino, na Educação e Formação do nosso Povo. 

Paulo Alves - Deputado JPP

terça-feira, 22 de agosto de 2023

Políticos e Professores leiam, por favor!


Por 
Víctor Cerqueira
Psicólogo Clínico

Nota
O meu Amigo Professor José Sacadura fez-me o favor de remeter este texto sobre Educação, sugestivamente baseado na afirmação: Portugal falha, porque falha a Educação. Vale a pena ler.


Portugal falha, porque falha a educação 1


Sempre me fez confusão, ninguém perguntar a razão de tantos e tantos relatórios (diagnósticos) ficarem nas gavetas ministeriais, ou outras.
Ficam na gaveta porque nós não temos capacidade de análise, síntese e de avaliação.

Nunca desenvolvemos estas capacidade no ensino. O nosso ensino tem como base a memória.
Pergunte a si mesmo o que é que mais lhe exigiam na escola?

E esta capacidade, a memória, em termos de taxionomia dos objetivos educacionais, no domínio cognitivo (Bloom e outros) é, digamos, o mais básico. Segue, a compreensão, (percebem porque temos dificuldade na matemática?) a aplicação, (percebem porque os médicos pedem tantos exames complementares?) a análise, (percebem porque há decisões judiciais com milhares de páginas?) a síntese e a avaliação.

Sempre de exigência superior em termos cognitivos.

Estas questões são pouco ou nada consideradas no ensino/aprendizagem, (já tenho escrito sobre o assunto em diversos fóruns), pois o que mais temos são "eruditos" na educação. Muitos no ministério, (alguns até foram ministros e secretários de estado) outros na formação (?) de Professores, outros ainda nas Universidades e ainda, na comunicação social.

Mas será que têm orgulho nos resultados? Já alguma vez tiveram a humildade de os avaliar?

Pois, não sabem como fazer...nem lhes interessa.

Portugal falha, porque falha a educação 2


Quando referi, no texto anterior, o processo didático referente ao desenvolvimento cognitivo defendido por Bloom e outros (taxionomia dos objetivos educacionais, no domínio cognitivo) tentava chamar a atenção para a questão didática na formação de Professores sem as quais não alteraremos este estado de coisas.

(didática – Ciência que estuda os métodos e técnicas para ensinar (Priberam ))

Que didáticas são utilizadas nas Escolas Superiores de Educação e nas Universidades no que diz respeito a formação de Professores?

Desenvolve-se processos de ensino/aprendizagem que promovam, tanto quanto possível, a individualização do ensino na sala de aula? Desenvolve-se processos didáticos que promovam o raciocínio critico? Mas também o raciocínio prospetivo? Desenvolve-se competências, enquanto futuros docentes, de autodesenvolvimento pedagógico/didático promovendo a sua autonomia? Desenvolve-se competências para a promoção, efetiva, do sucesso escolar/educativo dos alunos? Desenvolve-se competências nos futuros docentes para serem promotores efetivos de mudanças socias dos seus alunos, sem influencias político/partidárias, enquanto futuros agentes sociais promovendo e sensibilizando para a necessidade de que o elevador social esteja(sempre) presente no ato de educar?

Ou como me parece, continuamos com uma elevada “carga” de mais do mesmo? A verdade é que a novas e menos novas gerações de encarregados de educação continuam num registo em que se valoriza a nota, sobre todas as coisas, muito associada a uma competição que afasta, quem por razões, muitas vezes (quase sempre), tem mais dificuldade (s) de aprendizagem ou outras.
Continua a haver as disciplinas mais e menos importantes. Façam um esforço de honestidade intelectual pessoal, e imaginem que o vosso filho/a ficava retido/a por não ter notas às disciplinas seguintes: música, educação física e educação visual e tecnológica.

Sinceramente como reagiriam?

Seria assim tão fora do contexto se eu dissesse que estas disciplinas (e outras) só estão no currículo porque é suposto e seria um escândalo mundial se não estivessem, mas que nas cabeças de muitíssimas pessoas “não interessam para nada”?

Afinal o que mudou na nossa mentalidade nos últimos 60/70 anos?

O que de FACTO mudou nas nossas escolas e nos processos didáticos de uma maneira geral no nosso País?

Quando você, Pai/Mãe vai à Escola, que diferenças substanciais nota em relação à escola onde andou?
Nota: há bons exemplos de escolas com didáticas ativas e inovadoras (para o sistema habitual) mas, infelizmente, são excepções.

Porque se admiram que não avancemos vigorosamente para um melhor futuro??

Portugal falha porque falha a educação 3


A questão da avaliação dos alunos.

O ensino/aprendizagem no nosso país tem como centro de todas, mas todas as preocupações, a avaliação dos alunos.

O nível de insucesso dos nossos alunos ronda os 30% (talvez menos actualmente, fruto das dificuldades burocráticas que se levantam para a retenção dos alunos) e, segundo os Professores, não é real. Ou seja; se os Professores tivessem total autonomia na avaliação dos alunos o insucesso seria MUITO maior.

Vejamos alguns, poucos, exemplos lá de fora.

A Dinamarca instituiu sete anos (7) anos de escolaridade obrigatória em 1814. Há mais de 200 anos. A Suíça, obrigou a nove (9) anos de escolaridade em 1872.

Portugal implementou o ensino obrigatório do 7º 8ºe 9º no decorrer da última década do século passado. (José Afonso Baptista, Público 22 de outubro 1995).

Aqueles países acabaram com o insucesso escolar. A progressão dos alunos é automática e, no entanto, a exigência é muita e a selecção também.
A questão que sempre me pôs, é o de que as crianças daqueles países devem ser muito mais inteligentes e capazes do que as nossas.
Será?!

Quando se retém (chumba) um aluno o que é que se vai fazer com ele no ano de repetição? Na (grande) maioria dos casos MAIS DO MESMO!

Quais os alunos que chumbam mais? De uma maneira geral os mais carenciados sócio/economicamente.

As consequências psicológicas são visíveis e nada agradáveis. Se já se vem com o estigma da origem social a reprovação acentua a baixa estima: “não dou para os estudos”, por vezes esta baixa estima que é interpretada (e bem?) como exclusão, desenvolve a agressividade e a violência.

Esta violência, muitas vezes funciona como uma “arma” de afirmação e de “poder” sobre os outros.

Países como: Suécia, Noruega, Finlândia, Dinamarca, Japão…aboliram radicalmente a reprovação. Outros admitem-na em condições excepcionais (José Afonso, Público 22 de Outubro 1995) e nem por isso deixaram de fazer selecção.

A propósito do desenvolvimento cognitivo que referi no primeiro artigo, permitam-me chamar a atenção para o seguinte: Trump foi acusado de 37 crimes o documento de acusação TEM 40 PÁGINAS.

Alguém acredita que isto seria possível por cá?

O problema é que não sabem porquê.

A razão é simples; NÃO DESENVOLVEMOS A CAPACIDADE DE ANÁLISE E DEPOIS DE SINTESE e não temos consciência disso por que não nos interrogamos do porquê de certas situações.
Simplesmente NÃO mudamos!!!

Portugal falha porque falha a educação 4


Ao jeito de conclusão

Uma das grandes virtudes do Portugal de abril, talvez a mais importante na minha opinião, foi ter conseguido por TODAS as crianças na escola.

Mas a massificação do ensino acarreta as suas dificuldades: desde logo o abaixamento do nível de aprendizagem, passar de um sistema eminentemente elitista e selectivo para um sistema de acesso de todos à aprendizagem, naturalmente, trouxe um abaixamento de nível.

Nada importante, considerando o facto de termos TODOS os meninos e meninas na escola.

A questão da massificação do ensino, nunca levantou um verdadeiro debate de como teriam de funcionar as escolas para incorporar todas as crianças, oriundas de diversos contextos sociais e económicos. Muitas destas crianças, nomeadamente das zonas rurais do interior, nunca tinham bebido leite ao pequeno almoço, nem sabiam o que isso era…

Como sempre, lá fomos “desenrascando” com mais ou menos qualidade, com muitíssima dedicação, e muito AMOR. Também com muito pouca reflexão (?) sobre a formação dos Professores e quem os devia formar.

Foram os estágios nas escolas, depois a formação em exercício, mais tarde vieram das ESES e das Universidades. Vieram os Professores com a formação “integrada”. Qual a qualidade? Diversa, e dependendo muito das Escolas e Universidades de onde vinham.

Teorias? Muitas, e supermodernas, maioritariamente originárias de países que para além de nada terem a ver connosco em termos sócio/económicos e de desenvolvimento, tinham feito a sua massificação há muitos anos atrás, alguns, séculos atrás. (ver artigos anteriores) NOTA: aos chamados estágios funcionaram BEM!!

NUNCA houve um verdadeiro programa para a educação no nosso País. Que devia começar pela formação dos Professores, até à organização das escolas e turmas, passando naturalmente pelos currículos escolares que são uma “manta de retalhos” que também vai sendo mudado conforme os “apetites” de quem está no momento no poder. Ou seja; um programa de cima a baixo.

Uma das razões desta situação é que as discussões (?) são quase sempre (?) inquinadas por (pre)conceitos ideológicos sabendo nós que a educação NÃO é neutra.

Pensar que meter nas escolas crianças (muitíssimas) que veem de lares disfuncionais, com déficits brutais de competências sociais (até de linguagem) numa escola, ela própria (progressivamente) disfuncional foi acender o fósforo num lago de gasolina.

A escola foi-se degradando ano após ano, com problemas sérios de disciplina, diria, quase generalizados.

E nada, mas mesma nada, de fundo foi sendo feito. E, também, sem uma avaliação RIGOROSA da formação de Professores em TODAS as instituições. Avaliação essa que deve deve ser PERMANENTE.

A autonomia pressupõe RESPONSABILIDADE e escrutínio.

E agora?

Não sei, sinceramente não sei, mas penso que o retorno ao essencial é fundamental, ou seja, a formação dos Professores nomeadamente em termos didáticos tendo em conta a nossa realidade e as nossa necessidades de desenvolvimento.

Vem-me sempre à memória o que o Marquês fez na (minha) Universidade de Coimbra. Promoveu todos os Padres a cónegos, e depois reformou-os, contratou novos docentes, muitos deles estrangeiros…

Victor Cerqueira
22/08/2023

sábado, 19 de agosto de 2023

Futebol - quando falta a formação básica!


Ontem, ao final da tarde, enquanto fazia a minha actividade física, fui seguindo uma partida de futebol. Desastre total para os meus olhos. 



Entendo que não devo comentar o que ali se passou (porque o futebol nunca foi a minha praia), apenas quero manifestar que a quase totalidade dos jogadores da equipa "madeirense" não possui o domínio dos gestos técnicos básicos do futebol: a recepção, o passe, o drible e o remate (estes quatro elementos em múltiplas situações) e, conjugado com estes, entre outros, o domínio do próprio corpo, a percepção do espaço e do tempo, o sentido de marcação, de desmarcação e o táctico, para além de uma boa capacidade física de resposta ao esforço, enfim, um alargado conjunto de aspectos que eu, em síntese, diria que envolvem desde a cabeça aos pés. E tudo isto é treinável no tempo certo de formação. Mais tarde, tudo se complica. No encontro que segui, valha a verdade, a bola parecia um elemento estranho, tão maltratada que foi por tais profissionais.

Quem não tem uma adequada formação básica não pode ser um profissional de futebol. Apenas uma caricatura. Pode e deve jogar com os amigos, ao fim de semana, distante das exigências que o rendimento elevado configura. Ademais, para ser profissional não bastam umas tatuagens, um corte de cabelo esquisito e umas chuteiras debaixo do braço. Ah, e perante a derrota dizer que agora "é preciso levantar a cabeça". Exige-se muito mais. Depois, sim, pode ganhar, empatar ou perder, que é sempre uma consequência natural do jogo.

A páginas tantas exclamei para comigo próprio: qualquer das equipas da fase de grupos do Campeonato do Mundo de Futebol Feminino, despachava estas equipas com muitos "olés" de permeio.

Ilustração: Google Imagens.

sábado, 12 de agosto de 2023

A ESCOLA QUE NÃO ENXERGA O MUNDO, MATA A CURIOSIDADE E A COMPLEXIDADE



Regressei à leitura do Filósofo Edgar Morin, hoje com 102 anos. Perguntaram-lhe: "O senhor fala de um mundo padronizado, uniformizado. Como ficam o pensamento e a arte?"

Resposta: "Vivemos uma crise do pensamento. Aprendemos no nosso sistema de ensino a conhecer separando as coisas de maneira hermética, segundo disciplinas. Os grandes problemas, porém, requerem associar os conhecimentos vindos de disciplinas diversas. (...) Temos uma crise do pensamento que se manifesta no vazio total do pensamento político, ainda que, há coisa de um século, houvesse pensadores políticos que, mesmo quando se equivocavam, tentavam compreender o mundo, como Karl Marx e Tocqueville. O meu esforço nas minhas obras é tentar efetivamente esse pensamento. O que estamos vivendo? O que está acontecendo? Para onde estamos indo? Claro que não posso fazer profecias, mas vejo o risco nas possibilidades que se abrem diante de nós."

Qual, então, o maior desafio do ensino?

"Não inserimos no programa temas que podem ajudar os jovens, sobretudo quando virarem adultos, a enfrentar os problemas da vida. Distribuímos o conhecimento, mas não dizemos que ele pode ser uma forma de traduzir a realidade e que podemos cair no erro e na ilusão. Não ensinamos a compreensão do outro, que é fundamental nos nossos dias, não ensinamos a incerteza, o que é o ser humano, como se nossa identidade humana não fosse de nenhum interesse. As coisas mais importantes a saber não se ensinam."

102 anos! O pensador incentiva-nos a descobrir o mundo, quebrando as amarras impostas; outros, com menos de metade da idade, preferem assumir-se dogmáticos e cristalizadores. É o que temos!

Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 1 de agosto de 2023

A sociedade pagará caro se na Escola permanecer a rotina



"As crianças e a Educação que recebem definem o futuro das sociedades"

Haldis Holst / Revista A Página da Educação - 2023. 

Torna-se imperativo inovar para mudar a Escola, reativar estratégias dialógicas, cooperativas, e assim fazer germinar uma cultura de responsabilidade, de compromisso, de subsidiariedade e de crescente participação interpessoal e interinstitucional. A intenção é sempre a melhoria do ensino e das aprendizagens, gerando contextos desafiadores e potenciadores do bem comum. Uma visão fundeada em comunidades de aprendizagem que se desafiam e desafiam os seus docentes (...)"

Cristina Palmeirão / Revista A Página da Educação - 2023.