terça-feira, 10 de outubro de 2023

Quando falam de inclusão


“Um currículo inclusivo não assume os mesmos padrões para todos os alunos, mas respeita e valoriza as suas necessidades, talentos, aspirações e expectativas exclusivas. Ao fazer isso, esforça-se para remover barreiras à participação de certos grupos de alunos, incluindo aquelas criadas pelo currículo oculto.” É este esforço de remover obstáculos que surge retratado no relatório “Adapting Curriculum to Bridge Equity Gaps: Towards an Inclusive Curriculum” da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).



Ora bem, não existe uma política educativa caracterizada pela igualdade de oportunidades, quando as assimetrias são inquietantes, cuja prova está nos 32% de pobres ou em risco. É um erro crasso argumentar a igualdade como se esta pudesse situar-se, apenas, no quadro da acessibilidade à escola. Essa constitui um direito constitucional. Era o que faltava se os governantes não cumprissem a Lei Fundamental! A verdade que contraria a mentira oficial está nos Censos de 2021, divulgada num excelente trabalho do jornalista do Dnotícias, Francisco José Cardoso: 36.485 residentes não terminaram a primeira fase (4º ano); 50,3% tinham escolaridade até ao 9º ano; 15 em cada 100 não tem qualquer nível de escolaridade; 8,1% com 15 ou mais anos não possui nível de escolaridade completo e o analfabetismo continua superior à média nacional. Quase 50 anos depois de Abril! E sabe-se, também, no quadro deste sistema, as subtis pressões sobre a escola no sentido de evitarem retenções. Perguntem aos professores. É a estatística a prevalecer sobre o conhecimento.

"(...) A taxa de abandono escolar ou de atividade de formação entre os jovens dos 18 aos 24 anos era de 13,7% em 2019, segundo dados do Observatório de Educação, sob a tutela da Secretaria Regional, porque o Eurostat, vamos lá saber porquê, deixou de publicar a taxa de abandono escolar precoce na Região a partir de 2016, nessa data, situava-se nos 23,2%. A estrutura de habilitações dos desempregados inscritos atualmente no Instituto de Emprego mostra que cerca de 46% desses cidadãos sem emprego possuem habilitações inferiores ao 3.º ciclo do ensino básico, demonstrando grandes dificuldades em encontrarem trabalho devido à falta de competências e qualificações. E se incidirmos a atenção nos trabalhadores em funções, por conta de outrem, observamos que 31.743 trabalhadores possuíam apenas o ensino básico ou menos. Ao analisarmos a situação dos “nem nem”, jovens com idades entre os 15 e os 34 anos que não se encontram empregados nem frequentam qualquer sistema de educação, formação ou estágio, no final de 2019, a Madeira apresentava uma percentagem de 13,1%. As taxas de escolarização e de conclusão do ensino secundário dos jovens, na Região, entre os 20 e os 24 anos, rondam os 71,2%, isto é, quase 30% dos jovens madeirenses não concluem o ensino secundário. (...)"

Por outro lado, de acordo com "o estudo do Fórum Económico Mundial de 2018, nada menos que 54% de todos os trabalhadores necessitarão de reavaliação e renovação de competências. Como consequência, precisaremos de políticas educacionais aprimoradas que visam elevar rapidamente os níveis de educação e qualificação de indivíduos de todas as idades, particularmente no que diz respeito à ciência, tecnologia, engenharia e matemática e também às capacidades não-cognitivas, permitindo que as pessoas aproveitem as suas capacidades exclusivamente humanas. Os pontos de intervenção relevantes incluem os currículos escolares, a formação e a promoção do papel dos professores e a reinvenção da formação profissional, alargando o seu apelo para além das ocupações tradicionais de baixa e média qualificação".

Para reflectir e cruzar pensamentos!

Ilustração: Google Imagens.

quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Assuntos pela rama!

 

Acabo de ler aquilo que, para mim, são dois "não assuntos" ou, no máximo, temas vistos pela rama. O primeiro, sobre os alunos que, na Região Autónoma da Madeira, ainda não dispõem dos "manuais digitais". Porque não foram entregues em tempo desejável face ao calendário escolar!; o outro, subordina-se à razão média entre o número de alunos e o de professores. Muita parra e pouca uva. A seriedade implicaria que tais temas fossem trabalhados de outra maneira e com outras importantes variáveis.



Os "manuais digitais" naquele quadro, são um não assunto simplesmente porque a APRENDIZAGEM bem os pode dispensar. Várias são as vias para que, mesmo no âmbito deste ultrapassadíssimo sistema educativo, todos os alunos possam aprender. Aliás, seria bom que a secretaria regional da Educação, as direcções executivas e os professores debatessem a importância ou não dos "manuais digitais", eventualmente de um sistema híbrido, a partir do livro de Michel Desmurget, "A Fábrica de Cretinos Digitais". 

O sucesso da aprendizagem não passa nem nunca passou pelos manuais em papel, e não melhora porque, agora, os alunos podem dispor de um equipamento digital onde os mesmos conteúdos estão instalados. O problema da APRENDIZAGEM e do sucesso na vida está directamente relacionado com um novo sentido de ESCOLA (organização) que rompa com os tradicionais conceitos curricular, programático, PEDAGÓGICO, de turma, de aula, de avaliação e de exames. Tudo isto tem de ser debatido e generalizado a partir do actual conhecimento científico, competindo aos políticos o dever de escuta e de actuação em conformidade. Nunca com "achismos". Há leviandade política ou talvez mesmo ignorância, quando se implementam processos que não correspondem às preocupações da ciência. O livro de Michel Desmurget, que tem o prefácio do Professor Catedrático Jubilado Carlos Neto, devia constituir um importante ponto de partida. Anteontem escutei-os na RTP1 e as preocupações dos dois são de tal forma preocupantes que me questiono: como é possível a secretaria regional estar tão empenhada no digital quando os factos demonstram que há a necessidade de arrepiar caminho. O digital, da forma como o interpretam, traz consequências negativas no sucesso escolar e no plano da saúde. Portanto, só resta uma saída: estudar o problema para que não se escancarem as portas "à desgraça", como escutei. Ao contrário do estudo, uma autarquia até já avançou para um computador por aluno. Loucura total ou, então, uma lógica de "quem dá mais"!

O segundo aspecto que constitui, pelo menos para mim, um assunto a merecer outro tipo de análise, é a proporcionalidade entre o número de alunos e o de professores. Li a peça que, em título, assume que tal razão é melhor na Madeira que no Continente. Independentemente da propaganda política do secretário regional, ao estabelecer, por exemplo, comparações entre a Madeira e o Continente (1º ciclo: na Madeira, 6,6 alunos por professor  / 12,4 no Continente; 2º ciclo: 6,8 - 9,2; 3º ciclo e secundário: 6,6 - 8, respectivamente), verifico que em parte alguma do texto é referido se as várias centenas de professores destacados em diversas instituições contaram para as aludidas percentagens. É que este facto distorce a realidade. A seu tempo se saberá.

E esta questão é, ainda, mais profunda e traiçoeira para o político: eu que sou um radical opositor aos "ranking's" nacionais, porque não se pode comparar o que é incomparável, seria bom que o secretário regional explicasse como é que tendo uma proporcionalidade tão boa entre o número de alunos e o de professores, nos tais "ranking's" as escolas da Madeira aparecem em posições extremamente modestas. Em média e em princípio, menos alunos por professor deveria corresponder, repito, em média, a um melhor sucesso. Porém, não é isso que acontece. É legítimo que se pergunte: que outras variáveis estão a condicionar o sucesso? Factores de ordem social, os alunos, os professores, o "modelo" pedagógico!

Ora bem, os problemas da Educação, no quadro da aprendizagem, são muito mais profundos do que estas historietas de entretenimento e propaganda política. Por isso, considero assuntos analisados pela rama!

Ilustração: Google Imagens.