terça-feira, 6 de dezembro de 2016

O SISTEMA EDUCATIVO PORTUGUÊS TEM DE MUDAR DE ALTO A BAIXO - JORNAL PÚBLICO DE 28.01.2002


Texto do Jornal: "Tudo tem de mudar no sistema educativo português e os próximos 20 anos são a grande oportunidade de recuperar 20 décadas de atraso educativo, conclui um estudo exaustivo sobre a educação em Portugal, intitulado "O Futuro da Educação em Portugal, Tendências e Oportunidades - Um Estudo de Reflexão Prospectiva".


O que mudou? Nada. O pensamento político e a estrutura mantém-se exactamente igual. As rotinas são as de ontem, talvez com um pouco de mais burocracia, muita da qual apenas passou do papel para o computador. A sala, a aula, o teste, a avaliação, a retenção ou a progressão de ano, mantém a característica de um sistema qual vaca sagrada! Tudo igual, apenas com umas pinceladas aqui e ali, uns projectos bem intencionados, não digo que não, mas aquilo que é fundamental permanece no ramerrame. 
Tudo igual, não é bem assim. Em alguns aspectos piorou. Hoje temos um sistema educativo onde as crianças estão ao serviço dos adultos e não os adultos ao serviço das crianças. Paulatinamente, roubaram-lhes o tempo para ser criança, fecharam-nas em espaços de tempo inteiro, escolarizando e "curricularizando" o que deveria ser do domínio do lazer e do jogo enquanto mola impulsionadora do crescimento, impondo desde muito cedo uma excessiva ocupação do tempo e uma nociva competição como se a educação fosse uma corrida. A revista "Science", tem já algum tempo, titulou um interessante trabalho: "A Educação não é uma corrida". Neste arrastão, perpetrado por adultos, levam os pais à frente, eles que acabam por contribuir para o agravamento dos factores de stress. Pelo que vou lendo, e não é pouco, os adultos não sabem o que estão a fazer. Congratulam-se com um ou outro resultado circunstancial, repito, circunstancial e aconselho, para memória futura, a guardarem os últimos resultados das "Tendências Internacionais no Estudo da Matemática e das Ciências (TIMSS)" para comparação nos próximos anos.
O Ensino Básico é de uma importância vital na construção dos saberes. Fazer PENSAR, questionar tudo, procurar respostas, participar activamente, descobrir os porquês, suplanta tanto programa repetitivo que inferniza e pouco acrescenta ao verdadeiro interesse pelo CONHECIMENTO. Guardo uma frase do Professor Alexandre Quintanilha, de 72 anos, que em uma entrevista à Página da Educação, sublinhou: "Eu vivo porque sou curioso". É isto que interessa. Desenvolver a curiosidade de tal forma que aos setenta anos, porque está na matriz, a curiosidade seja uma palavra-chave. Este sistema, pergunto, desenvolve o pensamento e a curiosidade? Não. De todo, NÃO. Antes, mata a curiosidade.
Ilustração: Google Imagens.

NOTA

Foram publicados os resultados PISA 2015 (estudo internacional da OCDE que visa avaliar a literacia em Ciências, Leitura e Matemática dos jovens de 15 anos). Portugal fixou-se, globalmente, um pouco acima da média. De notar, porém, que cerca de 30% dos alunos têm uma história de repetências até aos 15 anos e que este tipo de avaliação entre países merece muitas reservas, entre outras, pelas substanciais diferenças económicas e sociais e porque não é certo que quem se subordina aos testes seja escolhido de forma exemplarmente aleatória. Seja como for, penso que não devem ser confundidos os resultados com a estrutura do sistema educativo. No mínimo, porque a dúvida permanecerá: se outra fosse a estrutura global do sistema, mais adequada às necessidades e  ao tempo que vivemos, tais resultados não poderiam ser melhores? 

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