quarta-feira, 25 de novembro de 2020

O que é que a escola faz pelos alunos

 

Ontem assisti a um momento de televisão que me encheu. Foi na SIC, com a jornalista Conceição Lino. O programa: Geração 15/25. Tema: a Educação - O que é que a escola faz pelos alunos? Uma jornalista muito bem preparada e uma mancheia de jovens que mais me pareceram "investigadores" do sector educativo. Falaram, serena e profundamente, sobre um tema, cujas abordagens não oiço nem sinto dos responsáveis políticos capacidade e abertura. Senti orgulho daqueles jovens que, através da sua vivência escolar, perceberam o que de errado está no sistema, perceberam o que é o conhecimento, perceberam o que é a aprendizagem, cumpriram mas têm uma opinião extremamente crítica face a um sistema absolutamente desadequado dos tempos que estamos a viver. 


Governantes, abram os olhos, leiam o mundo, percebam a voz que vem de baixo, saiam dos gabinetes e tenham a coragem de mudar. Face ao mundo que estamos a viver, a vossa política só poderá conduzir ao desinteresse, ao abandono, ao insucesso, às baixas qualificações, enfim, à mediocridade. Para além disso, estão a matar o sonho. Como alguém me disse: senhores, de vez em quando convém ler umas coisitas. Certo?

Deixo aqui uma síntese de uma grande parte do que escutei. Mas convído-os a seguirem este espaço seguinte endereço: https://sicnoticias.pt/programas/1525/2020-11-24-1525.-O-que-e-que-a-escola-faz-pelos-alunos-

"O sistema olha para o aluno como um simples recipiente onde se introduz conhecimento (...) as pessoas ali não pensam, as pessoas ali decoram (...) estamos a estudar para ranking's não para o conhecimento (...) há muito esta pressão para ter notas, custe o que custar (...) a escola está desenhada em torno da matéria e em torno das necessidades dos professores (...) os alunos têm muito pouca importância, esse é um ponto chave (...) gosto de um ensino estimulante, que dê responsabilidade sobre o que queremos aprender, maior valorização da oralidade, da criatividade, menos débito de matéria numa folha de exame e mais exploração das diferentes áreas do conhecimento (...) o mundo mudou menos a escola, a sala de aula, a forma como está organizada é a mesma (...) o espaço para reflectir é fundamental e é daí que vem o nosso crescimento pessoal. Quando não existe este espaço... por isso, culpo as pessoas que fazem os planos curriculares, que fazem os horários e que acham que tem de ser assim e que nós temos de ser tratados como máquinas com o dever de trabalhar para ranking's e não para o conhecimento (...) nós temos professores que não queriam ser professores e isso cria ali um problema: eu quero mesmo fazer isto? (...) há muitos professores que não têm essa capacidade de perceber com o que estão a lidar (...) os alunos precisam hoje de mais motivação para ir para a escola, era melhor irmos para a escola com um propósito (...) a maior parte das coisas que aprendi na escola, se não esqueci já, pelo menos considerei-as inúteis e desinteressantes (...) o sistema educativo foca-se em coisas que não são fundamentais para a vida (...) estamos a criar alunos que não têm qualquer tipo de interesse relativamente à vida que os rodeia... a escola deveria contrariar isso, abrindo o mundo porque há mais vida para além daquela que vivem diariamente (...) nós saímos da escola com muito poucas capacidade para sermos resilientes, para enfrentarmos desafios (...) eu não sou preparada para pagar impostos, para fazer um currículo, uma entrevista de emprego, como posso obter todas as informações para exercer o voto consciente... falta muita coisa (...) muitos alunos não vêem a finalidade daquilo (escola) (...) os programas estão desenhados, por exemplo, para dar gramática... quando o objectivo não deveria ser que as crianças soubessem gramática... o objectivo do Português é que sejamos bons falantes da língua e que se saiba escrever. Saem do ensino e não sabem escrever e muito menos sabem falar e, definitivamente, não sabem olhar para uma obra literária (...) o bom professor é o que nos consegue cativar, que nos estimula constantemente (...) as notas não definem ninguém. Um curso com média de 18 não é melhor que um curso com média de 12. Há quem entre com 18 e esteja contrariado e há quem entre com 12, mas com paixão porque é mesmo aquilo que querem (...) nós já não vivemos num mundo onde faça sentido o professor abrir o manual, ler o que está no manual, fechar o manual, fazer uma ficha e acabou. Estamos a desperdiçar tantas qualidades que os alunos têm, portanto, não faz sentido uma resposta uniforme para a diversidade (...) decoramos para os testes e para os exames e raramente essa matéria fica retida (...) haver debate de ideias e várias perspectivas sobre o mesmo assunto, é muito, muito raro. Eu tive poucos professores que me dissessem: temos este assunto e aqui no livro temos esta solução. Mas vamos lá pensar em mais soluções. É raro, quase não acontece em Portugal (...) a nossa formação é demasiado quadrada, demasiado formatada. É quase um ritual (...) não são os currículos que interessam tanto, pois precisamos de pessoas inovadoras, pessoas que consigam se auto-construir (...) vão-nos retirando a criatividade e a curiosidade. O sistema educativo está muito condicionado por uma força de poder que quer manter a socidade estagnada (...) a EDUCAÇÃO continua a não ser uma oportunidade. Nós deveríamos mudar as coisas antes de se tornarem um problema."

Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Políticas, programas, reflexões para uma educação antirracista


Por Sara R. Oliveira
Educare
19.11.2020

Conselho Nacional de Educação refere que a diversidade étnico-cultural e as estratégias para combater o racismo ainda têm um “tímido papel” na promoção da igualdade nas escolas. O assunto é pertinente. E há muito a fazer.





O racismo existe e persiste. O Conselho Nacional de Educação (CNE) tem refletido sobre o assunto e acaba de lançar várias recomendações para uma educação antirracista. Para o CNE, os problemas do racismo e da educação antirracista devem ser vistos no contexto da educação para a cidadania, uma vez que envolve ameaças à qualidade da vida democrática em valores fundamentais como a liberdade, o pluralismo, a igualdade. E a Educação tem um papel fundamental para a construção de sociedades pacíficas e sustentáveis.

O CNE considera que as questões da cidadania, nomeadamente as que dizem respeito à diversidade étnico-cultural e ao antirracismo, “ainda têm um tímido papel na ampla estratégia de promoção da igualdade na escola”. Escutou direções de escolas, educadores e professores, associações com intervenção nestas temáticas, leu documentos e contributos nacionais e internacionais, e apresentou várias propostas para uma educação antirracista.

O reforço de políticas públicas de combate à exclusão e à pobreza, para condenar de forma clara e sistemática a discriminação e o racismo, e a recolha de dados sobre a etnia dos alunos, para uma efetiva monitorização do impacto de variáveis associadas, são duas recomendações. No último caso, e como são dados sensíveis, esse levantamento deve sempre basear-se na auto declaração, de acesso reservado, e seguir as orientações da Comissão Nacional de Proteção de Dados.

O CNE sugere a promoção de um programa nacional de educação antirracista e para os direitos humanos que envolva atividades curriculares, extracurriculares e de educação não-formal. Além disso, é importante existir um clima democrático nas escolas e um esforço sistemático, sublinha, “na concretização quotidiana dos valores de liberdade, pluralismo e igualdade, o que implica políticas de tolerância zero face a manifestações de racismo e xenofobia, combatendo-se preconceitos, a desinformação e o discurso de ódio”.

A autonomia das escolas é fundamental para contratar equipas educativas que melhor se adequem aos projetos traçados em nome de uma efetiva educação antirracista. “Só se podem desenvolver projetos consistentes, que visem um real impacto a médio e longo prazo ao nível da educação antirracista, com equipas estáveis, que não se alteram por imposições contratuais de ordem diversa, de modo a assegurar a viabilidade dos projetos já iniciados, garantindo a continuidade de quem neles quer trabalhar”. Contratar profissionais especializados, para apoiar estratégias de inclusão e educação antirracista, é mais uma indicação do CNE.

Os currículos devem evitar uma visão etnocêntrica dos fenómenos, o que implica uma forte aposta na formação dos professores e estar atento , especialmente nos manuais escolares, “às formas de representação de pessoas não-brancas, às referências à escravatura e ao comércio de pessoas escravizadas, ao destaque de figuras históricas (…) de diferentes etnias/raças, às narrativas que reconheçam a diversidade da população portuguesa, incluindo referências à história das comunidades ciganas”.

Melhorar o acolhimento de alunos estrangeiros

A expansão portuguesa e o colonialismo devem ser discutidos nas escolas para permitir pensamentos autónomos e críticos dos alunos. “Esta discussão deve reconhecer e integrar pontos de vista complexos e diversos, contextualizados temporalmente, que visibilizem diferentes histórias e atores, incluindo o sofrimento e a resistência e as sistemáticas violações de direitos humanos nos territórios ocupados”, aconselha.

“O momento que se vive a nível mundial exige uma priorização da educação antirracista que assente numa formação de qualidade de todos os que trabalham com crianças e jovens na escola”. Por isso, o CNE propõe um programa nacional de formação contínua de educadores, professores e funcionários não docentes para a inclusão e a educação antirracista e a sua valorização para efeitos de progressão nas respetivas carreiras.

A comunidade, as redes, as parcerias, a articulação entre diversos intervenientes e atores, constroem relações de confiança e o CNE aconselha que as intervenções perante situações discriminatórias sejam reforçadas e que permitam a denúncia de forma segura. A redução dos riscos de encaminhamento de crianças e jovens para dispositivos que limitam o acesso à progressão escolar é outra recomendação.

O CNE quer, desta forma, “garantir que as crianças e jovens de todas as origens tenham acesso igual à educação e sejam totalmente integradas no sistema escolar, não existindo segregação de crianças pertencentes a minorias nas escolas, impedindo-as de serem colocadas em turmas separadas e ajudando as crianças pertencentes a minorias a aprender o idioma de ensino”. “Os processos de encaminhamento e orientação de crianças e jovens devem reconhecer os riscos de seleção social e combater eventuais desigualdades no acesso aos diferentes cursos no Ensino Básico, Secundário e Superior”, acrescenta.

Favorecer estratégias para melhorar o acolhimento de alunos estrangeiros, migrantes, refugiados, deve constar nas orientações dos estabelecimentos de ensino. Para isso, as escolas devem fomentar procedimentos específicos, nomeadamente nos regulamentos internos, para uma interação positiva e combater situações de discriminação ético-racial.

Evitar estereótipos, promover a equidade

Vários estudos e a realidade dão conta de um racismo quotidiano, explícito e sistemático, inclusive em contextos educacionais. O CNE recorda o relatório da Comissão Europeia Contra o Racismo e a Intolerância de 2018, relativo a Portugal, que reconhece importantes avanços no reconhecimento de direitos e no combate à discriminação, mas que, por outro lado, destaca “a intensidade de desigualdades e discriminação educacionais com ampla tradução em fenómenos de abandono, insucesso e dificuldades na progressão escolar de crianças e jovens afrodescendentes e de origem cigana, mas também a manutenção de uma visão heroica e unilateral de acontecimentos históricos relacionados com a expansão marítima, a colonização e a escravatura”.

Há fatores a montante da escola que ajudam a enquadrar a discriminação e o racismo, nomeadamente as dinâmicas segregativas e de exclusão socio territorial, bem como as políticas de habitação e planeamento urbano para diferentes grupos sociais. Há ainda a gestão da diversidade social e uma “visão relativamente unilateral e acrítica dos manuais escolares, em particular no que remete para as narrativas em torno da história nacional, da escravatura e do colonialismo”.

A sociedade portuguesa é cada vez mais multicultural e, segundo o CNE, é preciso pensar nesta questão e no papel da escola como fator de promoção social, que valoriza a diversidade e está aberta a um mundo global e plural. Na sua opinião, já emitida num parecer, “as desigualdades e exclusões são evitadas ou atenuadas quando é contrariada a função de reprodução social e cultural da escola e se promove o acesso e sucesso (emancipatório) de todas e todos ao conhecimento e à aprendizagem”.

Os materiais didáticos e a formação e supervisão de professores, para a promoção dos direitos humanos, de forma a evitar a reprodução de estereótipos e promover a equidade e a não discriminação, não podem ser colocados de parte. “A Educação é cada vez mais uma ferramenta de defesa contra o aumento da violência, racismo, extremismo, xenofobia, discriminação e intolerância”, sustenta o CNE.

O Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória deixa bem claro que a escola deve habilitar “os jovens com saberes e valores para a construção de uma sociedade mais justa, centrada na pessoa, na dignidade humana e na ação sobre o mundo enquanto bem comum a preservar”. E a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, que integra a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, sustenta que a educação para uma conduta cívica tem de assentar na igualdade das “relações interpessoais, na integração da diferença, no respeito pelos Direitos Humanos e na valorização de conceitos e valores de cidadania democrática”.

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Chegar ao 1.º ano a saber ler e somar garante sucesso escolar?

 

Estudo comparado do Conselho Nacional de educação refere efeitos registados nos alunos do 4º ano a literacia, matemática e ciência. Mas há uma diferença entre perceber os mecanismos ou impor a aprendizagem, avisam os especialistas.



Aparentemente, esta é a fórmula do sucesso aos 9 anos. E é uma longa lista de capacidades que devem ser adquiridas nos primeiros anos de vida: as crianças que chegam à primária já a reconhecerem a maioria das letras do alfabeto e a escrevê-las, a ler algumas palavras e frases (até a ler uma história) e que também saibam contar sozinhos, reconhecer números e escrevê-los e a saberem fazer substrações e somas simples terão "maior probabilidade de terem bons desempenhos em leitura, matemática e ciências no 4º ano de escolaridade". Será?

Esta é uma das conclusões do relatório Desempenho e Equidade, do Conselho Nacional de Educação (CNE) e que faz a análise comparadas dos estudos internacionais TIMMS e PIRLS.

Segundo o documento, estas atividades são adquiridas naquilo que o CNE chama de primeira infância e tanto no pré-escolar, como nas atividades promovidas pelos pais. Quanto mais "prolongada" foi a frequência desses programas de educação e cuidados para a primeira infância, "mais elevada" é a pontuação média registada por esses alunos na aquisição de competências no final do 1º ciclo.

Para José Morgado, "é importante que os miúdos tenham experiências neste universo no seu desenvolvimento até aos 6 anos, com intencionalidade, quer em casa quer nas instituiçoes (como forma de atenuar menores níveis de eficácia da parentalidade), mas não transformar isso num ensino formal da leitura e da matematica no jardim de infância." Deve haver espaço à curiosidade, em que cada criança tem o seu ritmo, mas não deve ser impositivo, explica (...) o professor do Departamento de Psicologia da Educação do ISPA - Instituto Universitário.

É, resume o especialista em psicologia da educação, "o trabalho de apróximação ao mundo das letras e dos números — nao para ensinar leitura e matemática — mas para criar uma estrutura onde isso possa assentar. Isto é completamente diferente de dizer que o que eles aprendem no 1º ano é um trabalho que deveríamos começar a fazer a partir dos 5 anos no pré-escolar." O que de deve é estimular a criatividade e não impôr-lhes uma obrigação.

Neste ponto, o diretor do grupo que detém os 55 centros educativos João de Deus em todo o país, está de acordo: nada na introdução da leitura (ou até dos números) deve ser imposto. António Ponces de Carvalho recorda que neste grupo de escolas que iniciou o seu trabalho há mais de um século com o seu bisavô, João de Deus, as crianças tinham o nome cosido no bibe. "Não era apenas para serem chamadas pelo seu nome, era para começarem a aprender que aqueles símbolos ali representavam algo."

José Morgado também sugere esse jogo: que mesmo quando vai na rua e se pergunta a uma criança por um símbolo como o da cadeia de fast-food MacDonald's, se vá estimulando para que ela identifique o símbolo. é a leitura logográfica. Ele conhece a forma e consegue lê-la, tal como reconhece a semelhança entre letras do seu nome e outras. "Quando vir o nome, identifica-o. No jardim de infância, tem lá a escovinha com o nome" e vai acostumando-se. "Não é de mecanismos de leitura no sentido da consciência fonológica, da articulação, da estrutura da palavra", descreve o professor do ISPA.

Jogos para aprender a lógica das letras e das somas

É aqui que o seu ponto de vista sobre que aprendizagem devem as crianças levar para o 1º ciclo diverge de António Ponces de Carvalho, que defende a existência de um método (a Cartilha João de Deus, desenvolvida pelo seu bisavô): "É importante que as crianças sejam capazes de ler histórias. Não vamos estar à espera que uma criança de 6 anos leia Os Lusíadas, mas pegam num livro e vão inventando, não estão a traduzir o fonema, mas compreendem a função da história, compreendem qual a sequência no português, como se lê", diz Ponces de Carvalho.

Aos 3 anos, as crianças do João De Deus "têm atividades em que a brincar vão compreendendo para que serve a leitura, porque é que aqueles símbolos ali estão." Para aquisição de competências matemáticas, também fazem jogos: "Aos 4 anos, a educadora toca os ferrinhos ou uma pandeireta. A criança tem à sua frente palhinhas ou caricas, ouve três pancacas e apanha três palhinhas na mão esquerda, depois a educadora toca duas vezes e põe duas na mão direita." Quando a educadora pergunta quantas palhinhas tem, "a criança pode não ter consciência que está a somar, não está a aprender curricularmente a soma, mas no cérebro está a aprender o cálculo para fazer a operação de soma", descreve António Ponces de Carvalho.

Aos 5, começa a aprendizagem da cartilha maternal, em que as lições e a aprendizagem são feitas de modo individual e em que em vez de reconhecer as letras, é incentivada a reconhecer os sons. É o que Ponces de Carvalho descreve como "a consciência fonológica". E "ao final de 17 lições a criança lê uma história que começa com a frase 'Ó Pedro, que é do livro da capa verde?".

De todas as atividades, é na leitura que esse "efeito [dos bons desempenhos no 4º ano] se manifesta com maior magnitude", refere o relatório do CNE. "A pontuação média de um aluno cujos pais desenvolveram frequentemente atividades relacionadas com a leitura, tais como contar histórias, ouvir canções, ou conhecer letras, é significativamente superior à pontuação de um aluno cujos pais não realizaram este tipo de atividades", lê-se no documento.

Influência do pré-escolar para atenuar desigualdades

O problema, na opinião de José Morgado, é que tal como numa corrida de Fórmula 1, nem todas as crianças conseguem chegar à pole position, ou no primeiro lugar, ao 1.º ciclo. A qualidade das equipas em que correm (leia-se a maior ou menor capacidade e predisposição dos pais para fazerem esse acompanhamento) tem influência nisso. E nesse campo, a ida para o pré-escolar "ajuda a minimizar as experièncias familiares menos ricas e promove um maior nivelamento na grelha de partida".

O relatório do CNE refere que, no caso nacional, "a frequência de três ou mais anos representa um aumento significativo no desempenho em leitura para os alunos com "poucos ou alguns recursos", mas não tem um resultado estatisticamente significativo para o grupo com "muitos recursos". Este efeito é, aliás, "mais relevante para os alunos irlandeses, polacos e portugueses com menos recursos" e é quase indiferente o background dos estudantes noruegueses, finlandeses ou holandeses.

"Faz toda a diferença quando as crianças têm uma educação pré-escolar de qualidade e no 1.º ciclo", concorda António Ponces de Carvalho. "É determinante."

Fonte: Sábado

terça-feira, 17 de novembro de 2020

Capitalismo e desporto

 

"Não há jogo, há pessoas que jogam. Não há chutos, há pessoas que chutam. Não há fintas, há pessoas que fintam. Se não compreendermos as pessoas que fintam, chutam e jogam, nunca compreenderemos os chutos, nem as fintas, nem os jogos" - Manuel Sérgio, Filósofo. Catedrático da Faculdade de Motricidade Humana.


Acabei de ler a primeira parte de um notável artigo do meu grande Amigo, Doutor Manuel Sérgio. Na revista A Página da Educação, o autor fala de um mundo desigual, do capitalismo e desporto e, ainda, da falta de uma ética no discurso. A par de tantos outros, este é de relevante importância no quadro do pensamento. Deixo aqui algumas passagens, aquelas que à Escola dizem respeito e porque se dirigem à Educação de um povo:

(...) Capitalismo e desporto. Na Escola, relativamente ao desporto, quando se hipervaloriza a educação unicamente física sobre a formação integral, a disciplina sobre o espírito crítico, a instrução sobre a cultura e se esconde que a saúde não decorre tão-só de meia dúzia de saltos e corridas, mas de uma sociedade totalmente outra, também se concorre para o estabelecimento, a solidificação da ideologia dominante ou até o anúncio da ideologia típica dos Estados totalitários, que tendem imediatamente a destruir e absorver qualquer assomo de contestação ou de crítica. (...) O culto do sensacionalismo, a ambição da riqueza e o orgulho de ser o primeiro em proezas físicas, tão-só, atentam contra os mais autênticos valores morais, contra os mais autênticos valores democráticos. Conheço com alguma minúcia o que se passa nos grandes clubes portugueses, por generosidade de alguns dirigentes e treinadores de futebol. Desde há 20 ou 30 anos, o desporto - mormente o chamado desporto-rei, o futebol - passou a figurar no roteiro de grandes capitalistas, o que significa que nele encontraram um espaço privilegiado para a implementação das suas convicções. (...)" 

Nota
Revista A Página da Educação, Edição de Verão 2020, página 107.

sábado, 14 de novembro de 2020

La cruel pedagogía del virus


Este es el interesante título del pequeño libro que ha escrito el portugués Boaventura de Sousa Santos (Coimbra, 1940), autor al que sigo con admiración desde hace muchos años, sobre la crisis que estamos atravesando. Altamente recomendable su lectura. Se puede encontrar en cualquier buscador de forma gratuita.

Después de la crisis seremos distintos, pero no necesariamente mejores. Para ser mejores hará falta algo más que las simples evidencias. Hará falta clarividencia, unidad, solidaridad y voluntad para no repetir los errores. Lecciones duras, difíciles de asimilar. Lecciones que no se aprenden sin esfuerzo y humildad. El aprendizaje tiene que incorporarse a la construcción de una normalidad mejor, de más calidad humana, de más profundidad ética.



En medio del fárrago de fake news, de comentarios frívolos, de textos vacuos, de visiones apocalípticas y de conjeturas varias, es bueno acercarse a pensadores que, en parte por la edad y la experiencia y en parte por la sabiduría y el estudio profundo de la realidad, pueden aportarnos un análisis rico y riguroso de la crisis en la que estamos inmersos.

El virus está desarrollando una intensa pedagogía sobre el planeta. Imparte lecciones cada día para quien quiera aprender. Después de leer ese libro y muchos otros textos sobre la crisis que estamos atravesando quiero destacar diez ideas que considero importantes para comprender lo que sucede y afrontar el futuro de forma realista y positiva. Las tres primeras pertenecen al magisterio del pensador portugués.

Lección primera. La pandemia causa conmoción en todo el mundo, pero de forma desigual. Médicos sin Fronteras advierte, por ejemplo, de la extrema vulnerabilidad al virus de los miles de refugiados e inmigrantes detenidos en centros de intercambio en Grecia. En uno de ellos (campo de Moria) hay un grifo de agua para 1300 personas y no hay jabón. Los refugiados viven hacinados. Familias de cinco o seis personas duermen en un espacio de menos de 300 metros cuadrados. Esto también es parte de Europa, es la Europa invisible. Estas condiciones también prevalecen en la frontera sur de Estados Unidos, hay también allí una América invisible. ¿Nos importa que exista un orden mundial tan discriminatorio?

Lección segunda. El tiempo político y mediático condiciona cómo la sociedad contemporánea percibe los riesgos que corre. Ese camino puede ser fatal. Las crisis graves y agudas, cuya letalidad es muy significativa y rápida, movilizan a los medios de comunicación y poderes políticos, y llevan a tomar medidas que, en el mejor de los casos, resuelven las consecuencias de la crisis, pero no afectan sus causas. Por el contrario, las crisis severas pero de progresión lenta tienden a pasar desapercibidas incluso cuando su letalidad es exponencialmente mayor. La pandemia de coronavirus es el ejemplo más reciente del primer tipo de crisis. Mientras escribo esto, ya ha matado a unas 40.000 personas. La contaminación atmosférica es el ejemplo más trágico del segundo tipo de crisis. Como informó The Guardian el 5 de marzo, según la OMS, la contaminación atmosférica, que es solo una de las dimensiones de la crisis ecológica, cada año mata a 7 millones de personas.

Lección tercera. La extrema derecha y la derecha hiperneoliberal han sido (con suerte) definitivamente desacreditadas. La extrema derecha ha crecido en todo el mundo. Se caracteriza por el impulso antisistema, la manipulación grosera de los instrumentos democráticos, incluido el sistema judicial, el nacionalismo excluyente, la xenofobia y el racismo, la defensa de la seguridad que otorga el estado de excepción, el ataque a la investigación científica independiente y la libertad de expresión, la estigmatización de los opositores, concebidos como enemigos, el discurso de odio, el uso de redes sociales para la comunicación política en menosprecio de las herramientas y los medios convencionales. Defiende, en general, el estado mínimo pero aumenta los presupuestos militares y las fuerzas de seguridad. Ocupa un espacio político que a veces le fue ofrecido por el rotundo fracaso de los gobiernos provenientes de la izquierda que se rindieron al catecismo neoliberal bajo la astuta o ingenua creencia en la posibilidad de un capitalismo con rostro humano, un oxímoron que ha existido siempre o, al menos, que existe hoy.


Lección cuarta. De los 194 países soberanos que existen en el mundo reconocidos por la ONU con autogobierno y completa independencia, solo diez están gobernados por mujeres. Pues bien, esos países han tenido una gestión de la crisis más efectiva, más rápida, más audaz. Pensemos lo que ha pasado en Alemania, Nueva Zelanda, Islandia, Finlandia, Noruega, Dinamarca… Solo el 5% de los países del mundo están gobernados por mujeres. Pues bien, de los 12 más efectivos, 7 están dirigidos por mujeres. No es una casualidad. La gestión de la crisis en estos gobiernos ha sido más eficaz, más valiente, más creativa, más compasiva, más ética. (Hemos pensado alguna vez que no ha habido dictadoras en la historia?). Sobra mucha testosterona en el poder.

Lección quinta. En la mayoría de los países, para salir adelante, la oposición se ha mostrado colaboradora con el gobierno que ha tenido que gestionar una crisis sin precedentes a la que ha habido que hacer frente de forma imprevista y apresurada. Un gobierno aislado, machacado, criticado, y zancadilleado puede conseguir con más dificultad el éxito, que un gobierno apoyado, ayudado, estimulado y comprendido. En nuestro país, la actitud de la oposición ha sido escandalosa. El PP ha dicho una y otra vez que el gobierno es un caos y VOX ha insistido en que la solución a la crisis es la caída del gobierno.

Lección sexta. Hemos podido comprobar la importancia que tiene la sanidad pública. Los recortes que se realizaron y la privatización de los servicios han mermado la capacidad de respuesta ante la gravedad de la crisis. ¿Cómo no pensar en una forma segura y estable de garantizar la protección de la salud de todos los ciudadanos y ciudadanas de nuestra sociedad, sin entregar su suerte a la herencia o al azar?

Lección séptima. Se han presentado varios dilemas durante la crisis. Uno de ellos ha sido el de salud versus economía. Cuidar de la salud suponía destruir la economía. El primer ministro inglés Boris Johnson dijo que había que seguir con la actividad a pesar de que hubiera que pagar el tributo de muchas vidas. Luego, no sé si por la presión social o por qué, tuvo que rectificar. Ha habido otro dilema que se ha adueñado de la opinión pública: derecho a la libertad de expresión versus difusión de bulos y fake news. El derecho a la información se ha llenado de confusión y de mentiras. Un tercer dilema ha sido el de salud versus restricción de libertades. El gobierno ha confinado a la población para conseguir frenar la expansión del virus.

Lección octava. Los docentes han trabajado con esfuerzo, creatividad y coraje desde sus domicilios, en una experiencia jamás imaginada: desplegar un Proyecto Educativo desde una institución virtual que se expande por el espacio y por el tiempo y adaptar nuevas metodologías y formas de evaluación. Están siendo héroes anónimos. Es hora de valorar la importancia de la educación y de la investigación. El impacto de la brecha digital va a agrandar las diferencias durante la crisis y se van a hacer más graves e injustas las diferencias. Habrá que ayudar a los más vulnerables a recuperar el espacio perdido.

Lección novena. Nuestros ancianos y ancianas han sido castigados con crueldad por el covid-19. Muchos de ellos han muerto en condiciones lamentables de soledad y angustia. Las Residencias se han convertido en trampas terribles donde han encontrado la muerte muchos mayores por deficiencias de cuidado y de gestión. El personal sanitario se ha visto expuesto a situaciones de alto riesgo y hemos pagado un tributo elevadísimo de bajas y vidas He recibido una desgarradora carta de Rocío Casto Bertomeu en la que me cuenta que ha perdido en la crisis dos familiares a los que ha despedido en condiciones tristísimas: una sanitaria y una queridísima abuela. Cuánto dolor en sectores tan sensibles de la sociedad..

Lección décima. La crisis ha sacado lo mejor y lo peor de nosotros. En la crisis ha habido actuaciones heroicas sin límite, se ha desplegado un inmenso abanico de acciones generosas. Personas que ha arriesgado la vida para salvar a otros. Personas y grupos que han dedicado su tiempo, su conocimiento y sus bienes a la lucha por la recuperación. La ciudadanía ha respondido con responsabilidad y sacrificio a las exigencia que imponía el bien común. Pero también ha permitido mostrar lo más negativo de nuestro ser: personas que, con irresponsabilidad inconcebible, han contagiado a otras personas, individuos que se han enriquecido de forma injusta…

Después de la crisis seremos distintos, pero no necesariamente mejores. Para ser mejores hará falta algo más que las simples evidencias. Hará falta clarividencia, unidad, solidaridad y voluntad para no repetir los errores. Lecciones duras, difíciles de asimilar. Lecciones que no se aprenden sin esfuerzo y humildad. El aprendizaje tiene que incorporarse a la construcción de una normalidad mejor, de más calidad humana, de más profundidad ética.

Miguel Ángel Santos Guerra
Artigo publicado no blogue El Adarve [https://mas.laopiniondemalaga.es/blog/eladarve/], a 8 de maio de 2020.

terça-feira, 10 de novembro de 2020

As Escolas têm mesmo que se reinventar




Estou a iniciar a leitura da última revista "A Página da Educação". Logo a abrir uma entrevista ao Professor Domingos Fernandes, Catedrático na Escola de Sociologia e Políticas Públicas do ISCTE:

"A Escola, tal como hoje existe está esgotada; a sua lógica estruturante vem do século XIX e nós estamos no século XXI. Na verdade não estamos a ir ao fundo das questões, dos problemas, quer ao nível da organização e funcionamento das escolas, quer dos modos através dos quais crianças e jovens podem aprender (...) O que me parece é que temos os sistemas escolares numa espécie de cuidados paliativos, em que vamos experimentando/tentando algumas soluções para ver se aguentamos as coisas (...)".

Trata-se de uma síntese perfeita. Lamento, por isso, que depois de tantos e pertinentes alertas, os decisores políticos continuem a percorrer um caminho insustentável, onde as designadas "salas do futuro" e manuais em tablets constituem areia para os olhos. 
Certamente que regressarei a esta entrevista, pela clarividência de um Professor que não se acomoda perante os sinais destes "cuidados paliativos" na Educação.

domingo, 8 de novembro de 2020

Global Teacher Prize


Excerto de uma entrevista a Rui Correia, professor de História, vencedor do Global Teacher Prize (2019) - Jornal I, edição de 06.11.2020:

"Há miúdos de 10, 11, 12 anos que não têm quem lhes diga que valem alguma coisa (...) aulas de 90' são uma barbaridade (...) Reduzi as aulas para 15' (...)"

terça-feira, 3 de novembro de 2020

As escolas matam a aprendizagem




Sobre o tema Escola-Educação li o seguinte comentário: "Eu vi uma prova em que a professora pediu: Descubra no texto, três dígrafos, três monossílabos, três dissílabos, três polissílabos, três encontros consonantais, três encontros vocálicos ... enfim, eram 32 itens tendo três solicitações para cada um. Pobres crianças!!! - Maria Helena Finazzi.

Leandro Karnal, historiador brasileiro, escreveu: "Educar é seduzir para o conhecimento". O conhecimento é, portanto, muito mais do que dissílabos e encontros vocálicos. Aliás, podem responder certo à pergunta, mas não é através dessas respostas que dominarão a escrita com pensamento! Acabo por ficar com o Professor José Pacheco quando enaltece que "a prova, não prova". Não é possível SEDUZIR para o CONHECIMENTO, repetindo as lógicas pedagógicas do passado. Tenho para mim, mesmo com todas as minhas assumidas limitações, que tento escrever de uma forma mais ou menos escorreita, mesmo sem saber o que são "dígrafos, encontros consonantais e encontros vocálicos". Se me transmitiram essa matéria quando era criança, não me recordo. Porventura, em linguagem informática, fiz "delete". Por isso, por curiosidade, tratei de saber o que eram. Não me adiantou nada. Rigorosamente nada.
 
Que um professor Licenciado, Mestre ou Doutor, na sua formação tenha de saber, muito bem. Na formação básica, a opção pelo despertar para o conhecimento exige, necessariamente, uma outra via. Como disse Murilo Gun: acostumámo-nos a não ser "aprendedores", apenas "estudantes".