segunda-feira, 28 de junho de 2021

Como os países estão a tornar os currículos mais inclusivos?


“Um currículo inclusivo não assume os mesmos padrões para todos os alunos, mas respeita e valoriza as suas necessidades, talentos, aspirações e expectativas exclusivas. Ao fazer isso, esforça-se para remover barreiras à participação de certos grupos de alunos, incluindo aquelas criadas pelo currículo oculto.” É este esforço de remover obstáculos que surge retratado no relatório “Adapting Curriculum to Bridge Equity Gaps: Towards an Inclusive Curriculum” da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).



Há cada vez mais sistemas educativos comprometidos a “não deixar que nenhum aluno fique para trás”. O currículo continua a ser desenhado “em tamanho único”, ou seja, para servir a todos. Mas vai sofrendo alterações. Que em geral, o fazem “ir ao encontro das necessidades de grupos de alunos identificados como vulneráveis”, constata a OCDE. Adaptações que têm em conta aspetos como as capacidades dos alunos, a sua origem e condição económica das suas famílias. Os exemplos são muitos.

Capacidades individuais

Em 92% dos países e economias parceiras da OCDE, os alunos com necessidades educativas especiais têm currículos adaptados. Os professores australianos podem redesenhar áreas do currículo atendendo às capacidades quer dos alunos portadores de deficiências, quer dos alunos com dificuldades de aprendizagem. A sobredotação merece uma atenção especial em 42% dos países.

Em 31% dos países existem disposições curriculares que visam os alunos em risco de abandonar a escola precocemente. Casos da Hungria e do Japão. No primeiro, é feito um esforço para identificar potenciais desistências e é desenhado apoio específico. No segundo, há apoios para compensar a falta de assiduidade.

Em 70% dos países existem serviços ou programas, acessíveis a todos os alunos, que incluem orientação ou aconselhamento profissional. No Quebeque (Canada), todas as direções de escola são obrigadas a oferecer serviços sociais, de psicologia e de orientação vocacional nos diferentes níveis de ensino.

Origem social e cultural

Outro aspeto tido em conta é a origem dos alunos. 72% dos países têm currículos que atendem à diversidade linguística e cultural dos alunos. As crianças e os jovens de famílias de origem estrangeira na Finlândia têm aulas opcionais na sua língua materna. No México, os filhos dos trabalhadores agrícolas migrantes frequentam escolas de múltiplos níveis de ensino. Especial apoio é dado, no Japão e na Coreia, aos alunos em situação inversa: que regressam ao país vindos do exterior.

A maioria dos países (91%) tem políticas de inclusão e antidiscriminação de forma explícita inscritas nos currículos. Como é o caso da lei de educação inclusiva, em Portugal.

Condições económicas

As condições familiares são outro aspeto importante: 28% dos países atendem às vulnerabilidades socioeconómicas e 14% às assimetrias geográficas. As crianças desfavorecidas, dos três aos oito anos, beneficiam de medidas específicas ao abrigo do Plano de Ação para a Educação Inclusiva, na Irlanda. E em Hong Kong (China) os estudantes carenciados têm à disposição subsídios para frequentarem atividades de aprendizagem ao longo da vida.

Centralizado, mas flexível

Na maioria dos países da OCDE (85%) pelo menos uma parte do currículo é centralizada a nível nacional. O objetivo, explica a organização, “é garantir um núcleo comum que proporcione as mesmas oportunidades de aprendizagem a todos os alunos”. O Japão tem um currículo nacional que garante um nível de uniformização educativa a todos os alunos, independentemente da região que habitem.

No caso da Argentina, os currículos são desenhados ao nível federal e contêm conteúdos-chave que todos os alunos devem adquirir desde o pré-escolar ao ensino secundário.

Além do currículo básico, os sistemas educativos podem permitir alguma flexibilidade curricular. Isto acontece em 61% dos países da OCDE. Escolas e professores têm autonomia para adaptar os conteúdos curriculares, os métodos de ensino e avaliação, tanto ao contexto local, como às necessidades dos alunos. Isto acontece em 61% dos países da OCDE.

Na Dinamarca, esta flexibilização permite que um aluno, de forma excecional, possa receber instrução num nível de escolaridade inferior ou ser dispensado de uma matéria pelo diretor com o acordo dos pais. Em Portugal, exemplifica a OCDE, a “autonomia das escolas permite uma gestão flexível do currículo e dos espaços e horários de aprendizagem, de forma que os métodos, tempos, instrumentos e atividades possam responder às singularidades de cada aluno”.

Promessa do digital

Em matéria de adaptações curriculares, os autores do relatório “Adapting Curriculum to Bridge Equity Gaps: Towards an Inclusive Curriculum” reconhecem as vantagens do digital. “Como a tecnologia permite uma maior adaptação e integração de conteúdos, materiais e atividades, pode ajudar os alunos a ter motivação para aprender, progredir no seu próprio ritmo e continuar a aprender além da sala de aula – a qualquer hora, em qualquer lugar.”

A OCDE reconhece o “esforço considerável” dos países para integrar as tecnologias nas salas de aula. Na Finlândia, os professores recorrem às tecnologias da informação e da comunicação para implementar o currículo em diferentes níveis de escolaridade e disciplinas, inclusive para apoiar métodos de avaliação e cooperação com os pais.

Na Escócia (Reino Unido), os alunos com dificuldades na leitura podem recorrer a um software de leitura de texto durante os exames nacionais para poderem responder às perguntas. Na Dinamarca, é obrigatória a utilização de dicionários digitais para as línguas dinamarquesa e estrangeiras, o uso do GPS para educação física e recursos digitais e bancos de dados para ciências.

Recorrendo às tecnologias digitais, as escolas podem criar mais oportunidades para envolver os pais na educação dos filhos, refere ainda a OCDE. Ontário (Canadá) está a desenvolver uma plataforma de recursos que vai permitir aos pais e aos alunos acederem a recursos educativos em modo “amigo do utilizador” através do telemóvel.

Além do currículo

Além de todas as adaptações curriculares, a OCDE constata que os sistemas educativos procuram outras soluções para tentar remover as barreiras à aprendizagem. Através, por exemplo, da distribuição de manuais gratuitos. Medida que em 62% dos países abrange todos os alunos, em 26% apenas a alunos de escolas públicas e em 26% apenas os alunos desfavorecidos.

A entrega de manuais gratuitos a todos os alunos, muitas vezes, cobre explicitamente todos os níveis do ensino básico ou obrigatório, como acontece na República Checa, Finlândia, Hungria, Coreia e Portugal.

Formar professores para garantir a igualdade de acesso a oportunidades de aprendizagem é algo que acontece em pouco mais de um quarto (27%) dos países da OCDE. Na Nova Zelândia, os professores têm acesso a formação não obrigatória em áreas específicas, como sobredotação e educação especial. A Irlanda define orientações específicas para ajudar os professores a garantirem a qualidade dos currículos dirigidos a alunos com problemas de aprendizagem e necessidades educativas especiais.

Fonte: Educare 

terça-feira, 15 de junho de 2021

Escolas organizadas por semestres: “A aprendizagem ganha”



"Atenção, está muito rápido!”. Na sala Miguel Torga, uma turma do 5.º ano tem aulas de educação musical. Estão na Escola Básica da Trafaria, que tem alunos do segundo e terceiro ciclos e que faz parte do Agrupamento de Escolas da Trafaria onde, desde o ano lectivo de 2019/2020, o calendário escolar se organiza por semestres em vez de períodos. “A aprendizagem ganha com esta oferta semestral, não encontro uma desvantagem”, diz o director Sandro Batista Gonçalves.



Não é a única escola que prefere organizar o ano lectivo assim. Num universo de mais de 800 agrupamentos de escolas, há, segundo dados do Ministério da Educação, 95 organizados desta forma – mais 10 neste ano lectivo do que no anterior. Deste total, e no âmbito de planos de inovação apresentados, 55 fizeram-no ao abrigo de uma portaria publicada em Junho de 2019; os restantes 40 fizeram-no “no âmbito de contratualização com os municípios”, algo que é “formalizado em conjunto com os municípios junto do secretário de Estado adjunto e da Educação”. São quatro os concelhos que se organizam com calendário semestral: Almada, Amadora, São João da Madeira e Odivelas.

Recentemente, quando apresentou o plano de recuperação das aprendizagens prejudicadas pela pandemia, cuja versão final ainda será publicada, o ministro da Educação notou que o despacho do calendário escolar incluirá a possibilidade de organização semestral, dentro do mesmo município. Fê-lo na cerimónia que decorreu precisamente no Agrupamento de Escolas Dr. Azevedo Neves, na Amadora. À semelhança de Almada, também neste caso foi uma proposta concelhia, ou seja, os diferentes agrupamentos juntaram-se e, em conjunto com a autarquia, apresentaram projectos que incluíam o calendário semestral. A partir do momento em que o despacho incluir esta possibilidade, os agrupamentos, desde que aderindo todos os do município, podem pedir o calendário por semestres e no âmbito do plano de recuperação, que tem uma vigência de dois anos. A medida permitirá avançar para um modelo que, pelo menos a nível concelhio, ainda era residual.

A adesão de todas as escolas de um mesmo concelho é vista como positiva por alguns directores e autarcas: acautela que não haja, por exemplo, constrangimentos na transferência de alunos de uma escola para outra, causados por diferenças nos momentos de avaliação. Mas não só: a opção em bloco também pode ajudar na organização de questões relacionadas com transportes ou refeições. Carla Tavares, presidente da autarquia da Amadora, onde os 12 agrupamentos estão abrangidos, acrescenta, por exemplo, que não fazia sentido, mesmo para as famílias, ter um filho numa escola organizada por períodos e outro numa por semestres.

Não tem dúvidas das vantagens: “Este processo permite uma acção mais focada no aluno. Dividir o ano lectivo em dois momentos mais alargados permite centrar mais as avaliações nas aprendizagens, não só nos testes. Sou mãe de um aluno que também está no 8.º ano e notei diferença, fazem mais trabalhos, mais projectos, não estão apenas focados naquela avaliação sumativa. Dá-lhes mais responsabilidade e ferramentas para gerir esses projectos, por exemplo”, diz. Acrescenta que os três períodos “não são tão equilibrados em termos de tempo”, sendo “mais difícil ter uma avaliação formativa centrada nas aprendizagens”. Carla Tavares considera que o modelo “é mais positivo para a formação dos alunos”, que “reduz a pressão em relação às classificações”, permitindo que “essas classificações tenham mais conhecimento sobre o aluno”.

Estas são também as vantagens elencadas por alguns directores, professores e alunos: argumentam que os três períodos não estavam distribuídos pelo ano escolar de forma equilibrada, que os dois primeiros eram maiores e o terceiro normalmente muito curto; que com a organização semestral há mais tempo não só para trabalhar com os alunos, através de projectos, como também para recuperar de dificuldades.

Sandro Batista Gonçalves nota que, no caso de Almada, o projecto foi construído para três anos (já foi posto em prática no ano lectivo de 2019/2020 e no de 2020/2021) e que, para já, o balanço é positivo. Para este director, o calendário por períodos assentava em três momentos em que se sucediam avaliações, “umas atrás das outras”, o que também aumentava o stress. “Tínhamos aí semanas em que os miúdos tinham de fazer não sei quantos testes”, diz Sandro Batista Gonçalves. Também o director do agrupamento Dr. Azevedo Neves, na Amadora, se refere ao terceiro período como um “sprint”.


Projecto em torno das pandemias


De uma forma geral, nestes dois exemplos de Almada e da Amadora, em vez de três momentos de avaliação final quantitativa, passou a haver dois momentos, em paralelo com dois momentos de avaliação intercalar e qualitativa, e privilegiando-se a avaliação contínua. Além disso, deixou de haver coincidência entre momentos importantes de avaliação e períodos festivos como o Natal e a Páscoa. Aposta-se também mais em trabalhos de projecto, de grupo, em mais carga experimental em disciplinas como Física e Química ou Ciências. Há mais tempo para isso. “E os alunos têm também mais tempo para receber feedback e recuperar, não desmotivam tanto”, diz a professora de Matemática do 3.º ciclo, da Escola Básica da Trafaria, Benvinda Carvalho. Também Edna Guerreiro, professora de Inglês do 3.º ciclo neste estabelecimento, nota que mesmo os professores têm mais tempo para a recolha de elementos para a avaliação e para conhecer os alunos.


No caso da Trafaria, por exemplo – que é um Território Educativo de Intervenção Prioritária, à semelhança da Dr. Azevedo Neves –, este ano os alunos têm em mãos um projecto em torno das pandemias. Mariana Martins, Natalia Ivan e Tomás Martins, que estão entre o 5.º e o 9.º ano, contam que estão a trabalhar o tema em diferentes disciplinas. Fazem pesquisas relacionadas com História, Ciências, até Matemática: investigam sobre a gripe espanhola, sobre pessoas que a viveram, sobre a época, procuram informações sobre medicamentos, dados e números sobre o assunto. Também preferem o calendário semestral, sentem que andam menos cansados e mais motivados, entendem que, se algo correr mal, têm mais tempo para reagir.

Ainda assim, e apesar do optimismo que estes directores e professores mostram em relação ao modelo, considerando que promove o sucesso e que o balanço até agora é positivo, é preciso cautela na análise, porque, em ambos os agrupamentos, os anos que em que o projecto correu foram afectados pela pandemia, pelos confinamentos e pelas dificuldades do ensino à distância. O presidente do Conselho de Escolas, José Eduardo Lemos, tem, aliás, dúvidas de que seja uma medida eficaz para recuperar as aprendizagens prejudicadas. Por escrito (...), começa por ressalvar que “a eficácia de qualquer medida que as escolas venham a tomar dependerá do objectivo que pretendem atingir e da forma como a implementam”: “Pode haver directores que entendam, e eu respeito, que a organização do ano lectivo em semestres pode ajudar a recuperar aprendizagens, todavia eu não partilho desse entendimento. Não me parece uma medida útil para recuperar aprendizagens, desde logo, porque também houve aprendizagens perdidas nas escolas que já funcionavam em semestres. Portanto, se a semestralidade não foi capaz de impedir que a pandemia causasse estragos nas aprendizagens, também não creio que seja solução para as recuperar.”

Já para o director Bruno Santos, do Agrupamento de Escolas Dr. Azevedo Neves, na Amadora, que tem alunos até ao secundário, o modelo permite não só “períodos de trabalho relativamente equitativos”, mas também um “período de avaliação de diagnóstico mais alargado”, bem como mais tempo para “conhecer os alunos”. E também este director entende que possibilita apostar mais na avaliação contínua e na metodologia de trabalho por projecto: “Para desenvolvermos o projecto, temos de ter tempo.” Apesar de considerar que todos os ciclos beneficiam do calendário, Bruno Santos admite que aqueles em que se nota um maior impacto sejam o 3.º ciclo e o secundário, uma vez que os alunos têm mais autonomia para se envolverem em projectos e trabalho de investigação.

Mas o modelo também ajuda mais os alunos que enfrentem dificuldades ao longo do ano, diz, argumentando que o terceiro período acabava por ser apenas “uma recta final” que não ajudava à “promoção do sucesso”. Porquê? Porque os alunos ficam desmotivados: “Diziam ‘o terceiro é tão pequeno, já venho com negativas do segundo período, por que razão vou estar aqui a fazer um sprint no terceiro período se isto não me vai valer de nada?”. No modelo semestral, “a lógica passou a ser mais alargada, os alunos passaram a ter uma opção de um percurso de recuperação maior, há mais tempo, há mais trabalhos em que são accionados”, nota. Não nega que foi preciso vencer algumas resistências, mas que, à medida que o tempo passou, os professores passaram a abraçar cada vez mais ferramentas de ensino e instrumentos de avaliação que não exclusivamente os testes.

Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, lembra que esta associação sempre se bateu pela possibilidade de as escolas se poderem organizar desta forma, de maneira a combater um “calendário bipolar”, com um “mini terceiro período”. Ressalvando que não se trata de afirmar que “os semestres vão salvar a pátria”, admite que um calendário mais equilibrado na divisão do tempo é mais propício “ao sucesso escolar”.

Fonte: Público

segunda-feira, 7 de junho de 2021

Visões de Ensino e Gente de Palavra(s)*


Por
Domingos Fernandes
©Instituto de Educação, Universidade de Lisboa


Na minha vida de professor, profissional do ensino, tenho mantido sempre viva a ideia de que ensinar é um processo que pode ser encarado como uma Arte e como uma Profissão, visões mais densas, elaboradas e criativas, que contrastam com as visões mais técnicas, empírico racionalistas e burocráticas que veem o ensino como Ofício ou como Trabalho.



Sou um professor privilegiado pois cedo encontrei mestres que, através das suas publicações, me ensinaram a ver e a sentir o ensino como tendo uma natureza imprevisível, inovadora e não convencional. Um processo em que a dramatização, a improvisação, a criatividade e a própria intuição são mobilizadas e integradas para desenvolver uma alargada diversidade de dinâmicas de sala de aula.

Assim, o currículo não é algo que se diz ou que se reproduz. Não se ensina através de qualquer procedimento algorítmico e preciso ou com base num conjunto de regras previamente definidas. Ensinar não é uma ciência ainda que, para ensinar, se utilize a ciência. O que nós, professores, fazemos normalmente nesta perspetiva é mobilizar, integrar e utilizar uma diversidade de conhecimentos, de recursos e competências pessoais, para comunicar com os alunos de forma única. Isto remete-nos para a ideia do professor cosmopolita, um profissional que abre as portas e as janelas das salas de aula para que os alunos possam ver e estudar o mundo que os rodeia. Para que possam compreender aquilo que constitui a sua mais funda razão de existir. O currículo, nestes termos, constrói-se e reconstrói-se, inventa-se e reinventa-se, vive-se! Confunde-se com a própria vida e só assim pode fazer real sentido. Nestes termos, os professores não são meros funcionários ou burocratas do currículo, nem meros utilizadores acríticos de manuais escolares e de toda a panóplia de produtos prontos a usar que lhe está associada. Não! São intelectuais, artistas, homens e mulheres da educação e da cultura, que pensam e se interrogam acerca das suas práticas, que alimentam relações pedagógicas fortes e significativas com os seus alunos e que suscitam a sua participação ativa e autónoma nas atividades das aulas. Ensinar é assim um exigente e complexo processo de mobilização, integração e utilização do sofisticado conjunto de conhecimentos e competências dos professores.

A palavra é indissociável do ensino, da relação/comunicação pedagógica. Na visão do ensino como Arte e/ou como Profissão, o seu lugar é central, único e insubstituível. Como nos disse Lauren Resnick no seu seminal ensaio Education and Learning to Think, a palavra, escrita ou falada, deve estar no cerne do desenvolvimento das aprendizagens de todos e de cada um dos alunos. É um meio de combate à exclusão, à segregação social e às desigualdades. É um meio de promoção da democracia social e da liberdade.


Num tempo em que vivemos sob uma catastrófica calamidade, a palavra nunca foi tão importante em meio escolar. Dificilmente poderá ser doutra maneira e a gente de palavra(s) tem aqui um papel insubstituível. O discernimento na seleção das tarefas, a definição do que é relevante e a criteriosa escolha do que é importante ler e escrever são elementos fundamentais para a integração de todos e de cada um dos alunos.

E não façamos confusão. Antes do mais estamos perante uma questão eminentemente Pedagógica, Social e Política. A Tecnologia jamais substituirá a(s) palavra(s) dos professores que veem o ensino como arte e como profissão. Mas é incontornável para que, nesta calamidade, as palavras possam continuar a circular. E isso pode ser fundamental para a sobrevivência dos valores por que lutamos nas sociedades democráticas.

Domingos Fernandes

sexta-feira, 4 de junho de 2021

Unicef defende programas para encarregados de educação sobre bullying

 

“A violência contra as crianças é real e diária”, alertou o Comité Português para a Unicef, lembrando que metade dos alunos em todo o mundo, com idades entre os 13 e os 15 anos, disseram ter sido vítimas de violência de colegas quando estavam na escola ou nas suas imediações.



A violência atinge cerca de 150 milhões de jovens em todo o mundo, segundo números do estudo internacional realizado pela Unicef e divulgado em 2018 e hoje recordado pelo comité português.

Na semana em que foi divulgado um vídeo de um aluno que é atropelado perto da escola, no Seixal, ao tentar fugir de um grupo de colegas que, alegadamente, lhe estariam a fazer bullying, a Unicef Portugal defendeu que “a ação é urgente e necessária”.

A organização das nações unidas apelou à criação de programas dirigidos a encarregados de educação ou cuidadores que “promovam comportamentos e atitudes parentais positivas, de não violência, de respeito e empatia, e o acesso a informação que os ajude a detetar sinais de alerta de bullying e ferramentas para apoiar os seus filhos”.

Em declarações à Lusa, também a Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação (CNIPE) defendeu esta semana que é essencial envolver e responsabilizar os pais nestes processos.

A Unicef defendeu ainda a criação de uma campanha nacional de sensibilização e programas que envolvam as crianças na prevenção da violência, garantindo que os mais novos conhecem os seus direitos e sabem atuar para os defender e proteger os outros.

A PSP, através das equipas da Escola Segura, tem vindo a desenvolver há vários anos ações junto da comunidade escolar, sendo uma delas precisamente sobre o bullying.

Também o Ministério da Educação lançou um “Plano de Prevenção e Combate ao Bullying e ao Ciberbullying” nas escolas, destinado a erradicar este fenómeno.

Para a Unicef Portugal é preciso dar aos professores e restantes profissionais da educação ferramentas que permitam “promover a criação de relações seguras e positivas, o respeito, a tolerância e a não discriminação, prevenindo e atuando, de forma articulada e atempada, em situações de perigo ou risco”.

O bullying é uma forma de violência em que todos os envolvidos, incluindo quem testemunha os atos, são afetados “de forma profundamente negativa e prejudicial, enquanto o ambiente escolar se deteriora significativamente”, alertou a organização em comunicado.

Para a criança que o pratica, pode ser uma “manifestação de situações de frustração, humilhação ou raiva, ou para alcançar reconhecimento ou um determinado estatuto social, e as suas ações podem causar danos físicos, psicológicos e sociais”, alerta a organização internacional.

Já para a criança vítima de bullying estes atos podem manifestar dificuldades nas relações interpessoais, ser sinal que se sentem sozinhos ou ansiosos ou terem “baixa autoestima, com decisivo impacto no seu bem-estar e aproveitamento escolar.

Se a Convenção sobre os Direitos da Criança reconhece o direito a todas serem protegidas contra todas as formas de violência, cabe ao Estado desenvolver políticas e programas para a prevenção dos abusos e proteção das vítimas, lembrou a Unicef.

“Não garantir às crianças um lugar seguro para aprender, para além de ter um custo social e económico, com impacto nas famílias e sociedades como um todo, põe em causa o bem-estar e o pleno desenvolvimento das crianças”, alerta.

A violência pode manifestar-se de várias formas e acontecer em vários contextos, não apenas no interior das escolas, mas no caminho ou nas suas imediações e de forma crescente também através da Internet, lembrou.

“É urgente acelerar os esforços para pôr fim à violência que diariamente compromete o desenvolvimento e a proteção das crianças”, apelou o Comité Português da UNICEF.

Fonte: Educare