quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Esta Escola está esgotada


Qualquer cidadão, escolarizado e com pensamento estruturado, a quem se pergunte quais as maiores preocupações entre os vários sectores do desenvolvimento social dirá, presumo, que a Saúde, a Educação e a Segurança Social constituem os pilares essenciais na construção da sociedade. Não entendo, por isso, que sejam exactamente os sectores que apresentam lacunas preocupantes. Deixo a Saúde e a Segurança Social para os mais abalizados, os que estudaram e que manifestam aprofundado conhecimento. Por isso, não me atrevo a comentá-los até porque nunca fiz um esforço mínimo e sério para perceber e compreender todas as suas variáveis. 



No sector educativo, aí atrevo-me, porque nele fiz a minha caminhada profissional e porque, desde há muitos anos, faço esse esforço de leitura e de compreensão compaginada com a História, com a percepção que as crianças e jovens têm da escola, com os desabafos dos professores, com a minha vivência em dezenas de conselhos pedagógicos, com aquilo que tantos autores, empresários, psicólogos e sociólogos de referência manifestam. Transporto, assim, e digo-o com humildade, algum conhecimento estruturado que, aliás, assiduamente, partilho com os que fazem o favor de o ler.

Posso não ser acompanhado por outros (ainda bem), posso ser, até, considerado leviano em algumas das minhas considerações, mas isso pouco me rala. Não sou nem outros são portadores de uma qualquer verdade, por mais credíveis que sejam as suas fontes, pelo que, o que escrevo e em alguns momentos assumo perante plateias, não é mais do que o meu posicionamento marcado pela exigência de honestidade de pensamento. Aliás, é na compaginação de posições divergentes que podemos encontrar os caminhos mais adequados, nesta encruzilhada onde as lógicas do passado se apresentam dissonantes relativamente ao futuro expectável.

Especifico melhor: entendo que o conceito de aula e de turma há muito que não fazem sentido; da mesma forma a ideia de uma aprendizagem segmentada por disciplinas, quando a vida é um todo; repudio o sistema de avaliação, cada vez mais obsessivo e cego, quando ela deve servir, fundamentalmente, o aluno; não aceito os exames, porque deles não emerge o conhecimento poderoso de que falou Michael Young; nego a organização da própria escola, marcada por decisões centralistas e, abstrusamente, burocráticas, que matam o direito à concretização do sonho e olvidam o talento de cada um; os currículos, superiormente decididos, que não respeitam as desigualdades e se esquecem das especificidades regionais e locais, quando deveriam ser, sensatamente, elaborados ao nível de escola (um dia lá chegaremos); os programas, inexplicavelmente, cada vez mais extensos e complexos desde as primeiras idades, que ajudam a matar a vivência da infância e da juventude, conduzindo, mais tarde, a pessoas magoadas com a vida. É tanto o que me divide neste sistema repetitivo que tem vindo a tornar a escola, não num espaço de prazer pelo conhecimento, mas de obrigação e castigo, onde se "aprende" para logo esquecer, pouco ou nada restando. 

A escola e a aprendizagem devem nascer de necessidades sentidas. Como recentemente sublinhou o meu Amigo Professor Catedrático Domingos Fernandes, Presidente do Conselho Nacional da Educação, "É pelo sonho que vamos" - Sebastião da Gama (...) precisamos de escolas com projectos, pois sem eles não é possível melhorar e transformar as realidades" (...) "temos de trabalhar para desenvolver uma cultura de inovação pedagógica, sem a qual corremos o risco de a escola se tornar entediante, de ser uma pasmaceira, quer para professores e educadores, quer para alunos". Mas para que a transformação aconteça, enalteço agora, o sistema não deveria estar invadido por políticos de circunstância, "os que acham que", sem consistência técnica, científica e distantes do que os grandes pensadores, desde académicos a empresários, passando pelas múltiplas experiências práticas, sugerem como necessidade de uma escola aberta ao mundo, universalista, distante de sinais dogmáticos, feliz, de rigor e que rejeite matar talentos.

Ainda há dias, a Psicóloga Drª Manuela Parente, em artigo de opinião no Dnotícias, referiu "(...) que a escola tradicional tem de ser repensada, integrada e adaptada de forma a poder, a médio prazo, colaborar para a felicidade dos seus alunos (...) há uma mudança de paradigma que a escola tradicional ainda está longe de integrar e talvez mesmo de aceitar". E na edição de hoje do mesmo matutino, o ex-governante João Carlos Abreu enalteceu: "(...) os seres humanos não se podem limitar a uma temática. Podemos ser eruditos numa temática, mas termos uma mentalidade universal, uma cultura aberta ao mundo (...) engenharia e medicina podem ter poesia, literatura e música, porque são bases para o desenvolvimento intelectual do ser humano".

Ora, a escola, desde há muito, por efeito de currículos, programas e de uma centralização de processos castradores, nunca foi capaz de, na esteira de Gaston Bachelard, estabelecer um corte epistemológico, antes preferiu manter-se na subjectividade, divorciando-se da cultura, eu diria da Vida, o que a conduziu a respostas erráticas concordantes com a mediocridade política. Fixaram-se nas modas, no mediático e não no estrutural.  Ora, político que se fixa no palavreado desengonçado, na verbosidade ardilosa, como esta que li no quadro da importância dos computadores, não é nem nunca será um político visionário: "(...) razão pela qual a escola não pode, naturalmente, alhear-se da sua utilização nas suas salas de aula, aproveitando o seu enorme potencial educativo, seja pela intencionalidade pedagógica na dinâmica da aprendizagem seja de motivação dos alunos e dos professores". Porque o problema não reside aí, mas no pensamento sobre o que se quer fazer com um dos sectores mais importantes da sociedade. Os computadores são apenas a margem (instrumento) de um processo. Por maior que seja o seu número a escola nunca se transformará. Político que só olha para o computador torna-se incapaz de olhar para o Homem em constante reconstrução.

Ilustração: Google Imagens.

sábado, 4 de fevereiro de 2023

Ausência de memória


Quem passou pelo exercício da política, sobretudo por cargos de enorme responsabilidade governativa, deveria ter a memória, sempre fresca, do que fizeram e do que ficou por realizar. A mim, enquanto observador, no sector a que me dediquei, deixa-me um rasto de perplexidades quando assisto ao discurso de ex-ministros a perorarem sobre assuntos face aos quais não tiveram nem engenho nem arte para mudar o curso da História. Lembro-me de todos eles e a poucos, muito poucos, reconheço a tentativa de gerar caminhos dissonantes com a “liturgia” de uma escola marcada pela rotina.



Fazem-me lembrar um meu professor, envolvido até ao pescoço com o Estado Novo, que uns tempos depois de Abril de 1974, em conversa de circunstância, disse-me: “André, sabes que nunca tive nada a ver com aquela gente”. Respondi-lhe: “pois... é verdade”. De que valia dizer-lhe o contrário! Ele ficou feliz e eu não deixei de fazer a leitura histórica. Assim me fazem lembrar esses ex-ministros que surgem a falar de Educação (e não só), sem memória do que foram, do que disseram e do que não produziram.

É a história da metáfora de um prédio que ruiu: areia, cimento e ferro foram chamados a tribunal. Perante o juiz, a areia defendeu-se dizendo por a+b que era da melhor e mais consistente; o cimento argumentou a qualidade provada nos laboratórios e através de inúmeras obras; chamado o ferro à presença do juiz, começou por dizer: senhor dr., pergunto-lhe, o que faço aqui? Eu nem lá estava! Ora bem, há ex-governantes que falam como se lá nunca tivessem estado.

Falam de cátedra, agora, sobre o que o governo devia fazer, criticam, severamente, quem ocupa a cadeira onde outrora se sentaram, sem que a memória do que não fizeram os perturbe. Isto quando é sabido que qualquer investimento estratégico, no caso em apreço, no sector educativo, só alguns anos depois produz efeitos. Se os professores estão na rua em protesto justo, essa manifestação tem, pois, origem em trinta e tal anos de políticas erráticas e dos melhores da sociedade nunca terem sido chamados a repensar o sector. Esta não é uma questão exclusiva dos sindicatos. É, sobretudo, dos grandes pensadores da Educação. É uma questão de Filósofos, que os há no nosso país, com uma extensa produção científica e obra publicada. Chegámos aqui por via da incompetência, da mediocridade partidária, da ausência de pensamento que possibilitasse desenhar e antecipar o futuro, do domínio das crenças e do “achismo” que sempre foi preferível ao pensamento portador de futuro.

Pior ainda, quando os pregadores de circunstância ultrapassam as generalidades e caem nas banalidades. Ainda anteontem escutei a palavra de um ex-ministro da Educação. Sei que só esteve dois anos como ministro e, portanto, um tempo que não deu sequer para aquecer a cadeira. Mas dois anos são suficientes para perceber onde um governante deseja chegar. A par de tantos outros, desse não me recordo de uma única medida devidamente enquadrada num projecto a doze/dezasseis anos, porém tem o desaforo de aparecer na televisão para dizer umas coisas, ainda por cima, do meu ponto de vista, completamente desfasadas de uma política educativa de resposta aos grandes desafios deste século.

Estamos a viver um tempo de irracionalidade, atrevo-me a dizer, de mediocridades, de discursos para entreter, de paradoxos entre o que dizem e a prática, de mentira dita com a tez séria, de acentuada partidarite em desfavor do pensamento dos que podem alumiar o caminho, de rotina e mais rotina como se este sector não tivesse de ser reinventado na plenitude desta palavra, de desconfiança e atropelos na dignidade na nobre missão de fazer aprender, de governantes impreparados que trazem apenas em memória a sua experiência alimentada pela frase “no meu tempo é que era bom”. E assim repetem, não acrescentam pensamento.


Desta vez, não mudei de canal, mas para com os meus botões, acreditem, vociferei revoltado. Há pessoas a quem o Pai Natal lhes deveria oferecer um espelho! Porque, tal como o ferro… parece-me que ele nem lá esteve!

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

Inconcebível


Não se trata de saudosismo, quanto muito de memória e de oferta educativa. Ali se fizeram campeões nacionais, internacionais e um olímpico. Naquela piscina viveram-se momentos fantásticos quer na competição regional quer nacional. Milhares de crianças aprenderam a nadar oriundas dos infantários do Funchal. E por ali passaram milhares de alunos do estabelecimento de aprendizagem Dr. Ângelo Augusto da Silva.





Não quiseram recuperar todo o sistema de aquecimento e a instalação foi-se degradando até ao ponto de "umas cabecinhas", lamentavelmente, terem decidido que ali acabaria a natação para dar lugar a um espaço multiuso. Multiuso?! Neste momento encontra-se na fase do aterro. Não sei qual é o orçamento, nem me interessa saber, se é mais barato ou mais caro, certo é que uma escola, com mais de 1.200 alunos, deixará de poder oferecer a aprendizagem da natação.

Lamento que sendo o secretário regional da Educação professor de Educação Física, não tenha partido do princípio que qualquer outra modalidade pode ser praticada no pavilhão e nos diversos espaços que a escola dispõe (melhorando-os, substancialmente), mas que a prática da natação implica água e pistas!

A propósito, li um artigo, no Jornal da Madeira, assinado por Eduardo Freitas, que dá muito para reflectir. Pessoalmente, gostaria de saber qual foi a posição da Associação de Natação da Madeira, se foi ouvida, claro.

Ilustração: Arquivo pessoal