Do estado da Região pouco escutei, pois confesso que já perdi a réstia de entusiasmo que mantive durante anos. Ouvir a mesma lengalenga, os mesmos argumentos e respostas enviesadas, quase sempre fora de contexto, perceber que apontam o indicador para a Lua cheia mas que só conseguem ver a ponta do dedo, é situação cansativa e desinspiradora até da necessária participação cívica. De tanto repetirem a mesma tecla e o mesmo som, alguns, mal abrem a boca, com o salamaleque regimental: senhor presidente, senhores membros do governo, senhoras e senhores deputados, percebe-se o que vêm dizer pela enésima vez. Daí que, sinceramente, mudo de canal e remeto-me às sínteses do dia-a-dia de onde extraio as conclusões. Já não tenho pachorra, depois de 47 anos a escutar a mesma faixa de um disco de 45 rotações cheio de "riscos"!
Mas para tal necessário seria uma elevadíssima dose de conhecimento e de humildade. E o estado da Educação demonstra que aquelas duas palavras de profundo significado não têm lugar. Para muitos, conhecimento significa rotina e a humildade está muito próxima da ignorância altifalante. Abrir-se ao mundo, ser capaz de desafiar o "estado das coisas", questionar se estão ou não num cruzamento sem saber qual a direcção tomar, romper com mentalidades obsoletas, ter pavor de tudo o que é novo e adequado ao tempo que nos coube viver, saber trazer o futuro ao presente antecipando respostas, perceber que este sector precisa de se constituir numa grande mesa de diálogo, de debate, de construção de um novo paradigma, dá trabalho, obviamente que dá muito trabalho. Mas é essa a via que o bom senso aconselha.
Quando os alunos escrevem: "se a escola é a tua casa, foge de casa" e um político com responsabilidades de governo diz "(...) sempre que houver estrada vamos continuar", o que isto significa é que ambos estão e são incompatíveis. Com um pouco de mais atenção o político constataria que esta sua estrada tem um sinal logo no início: "sem saída". E perceberia uma outra coisa que a palavra utopia encerra, tal como referiu a investigadora Doutora Fátima Vieira: "(...) na utopia o que fazemos? Primeiro, definimos a visão: que sociedade quero ter? que escola quero ter? o que quero ser?... Depois de definirmos essa visão, então sim, escolhemos o caminho e tapamos os buracos. Não vale a pena tapar buracos de outros caminhos". É tempo perdido.
Ora bem, tudo isto está nos livros publicados, nas investigações realizadas, nos milhares de documentos académicos de natureza científica, está nas intervenções em seminários, cursos, formações, portanto, questiono, por que raio esta rotina que mata talentos, sonhos e exclui tantos do sistema, permanece por imposição de um modelo que rejeita a inovação, mesmo que parcial, antes afunila e refina tudo quanto é obsoleto. É espantosa esta dicotomia. Preferem manter um sistema gordo, de narrativa sem substância, anafado nas prebendas, como se o mundo girasse em torno do umbigo, quando o que precisamos não é de fazer da educação um espectáculo mediático, desde os "prémios de mérito" às palavras sem o sentido portador de futuro.
Diz o Professor: "(...) quando muitas vezes dizemos educação não formal, deveríamos dizer educação familiar, comunitária, cidadã, cívica, porque todas as educações, de um jeito ou de outro, são formais. Portanto, há que recuperar o sentido da educação como projecto e trajecto comunitário, o que requer repensar a escola, o seu sentido de instituição ao serviço da sociedade e da comunidade (...) a escola não pode ser só escola e as aprendizagens não podem ser só curriculares, se verdadeiramente estamos convencidos de que a educação deve ser um processo permanente, que se estende ao longo da vida e que todos somos participantes de educar e de educar-nos. (...) O desafio é imenso e as políticas educativas, sociais e culturais devem situar-nos nesse horizonte, não só como utopia, mas como realidade, como projecto que vale a pena construir pedagógica e socialmente (...) no fundo, falamos de uma ética pública e de uma ética cívica: como serviço público a nossa responsabilidade é para com as pessoas que se educam connosco, com as quais e para as quais desenvolvemos o nosso trabalho. Especialmente as que estão em situação de pobreza, de exclusão, de vulnerabilidade, as quais, muitas vezes, o sistema educativo etiquetou como fracassadas e que são abandonadas à sua sorte e aos azares (...)