quinta-feira, 30 de julho de 2020

Senhoras e Senhores Professores, calem-se!



FACTO

O PSD, na reunião da Comissão Especializada de Educação, Desporto e Cultura da Assembleia Legislativa da Madeira, inviabilizou a discussão de uma petição pública promovida pelo Sindicato dos Professores da Madeira (SPM). A petição em causa - intitulada “Pela aprovação de medidas que combatam o desgaste e o envelhecimento dos docentes na RAM” - foi assinada por 3.640 professores." A concretização da lei da pré-reforma na Região; a possibilidade de os professores poderem optar pela isenção da componente lectiva a partir dos 60 anos; a redução da componente lectiva para os professores do primeiro ciclo e do pré-escolar e ainda a redução da componente lectiva para os professores com doenças crónicas" são algumas das preocupações dos professores. Fonte: Dnotícias.

COMENTÁRIO

Ao longo de uma legislatura se existe uma forma de participação directa na vida política, uma dessas é a via da petição. Por aí, podem os cidadãos exprimir o que pensam junto dos órgãos de governo próprio. Constitui uma forma de cidadania activa. Ora, quase 60% da classe profissional mostrou-se interessada em ver discutida algumas das suas preocupações. Estou certo que, se outros sindicatos de professores tomassem uma iniciativa semelhante, a(s) petição(ões) atingiria(m) quase os 100%.

Uma coisa é discutir a petição em plenário e, eventualmente, chumbá-la; outra é nem admitir a discussão. Há qualquer coisa aqui que não bate certo no plano de uma democracia aberta à voz do povo.

Não basta tecer elogios pontuais à classe docente, que eles são fantásticos; que perante a pandemia assumiram responsabilidades maiores com enormes sacrifícios pessoais; que a Madeira tem um corpo docente de topo; que o "êxito" do sistema a eles se deve. Enfim, emotivas palavras de circunstância, as quais, aquando do momento em que os próprios solicitam o debate sobre aspectos que os preocupam, parece-me ouvir uma voz lá do fundo a dizer: calem-se!

Ilustração: Google Imagens.

segunda-feira, 27 de julho de 2020

O silêncio que mata


Quem governa não está acima da lei. Mas parece estar. O processo instaurado pelo secretário da Educação ao Dr. Joaquim José Sousa (Escola do Curral) continua a ser uma história de contornos politicamente tenebrosos. Fixo-me, apenas, neste dado que li: "Passaram-se 653 dias depois de ter pedido as atas da escola do Curral das Freiras ao Governo Regional da Madeira - mas "convenientemente" DESAPARECERAM e já passaram 222 dias desde que pedi para chamarem a polícia e apresentarem queixa no Ministério Público por roubo das mesmas".

Pelo que depreendi da leitura de todo o texto, as actas do Conselho Executivo e do Conselho da Comunidade Educativa são fulcrais para qualquer pessoa perceber os alegados erros cometidos ou a trama que envolveu uma punição previamente definida. Sem a sua leitura, independentemente de outros elementos, todo o processo apresenta-se inquinado, pois tais documentos retiram, claramente, a possibilidade de defesa de quem é acusado. Onde estão as actas? Não existem? Desapareceram? Sendo verdade, então, pergunto, se alguém foi visado pelo desaparecimento? Extraviaram-se, porquê, por quem e a mando de quem? 
Certo é que não foi realizada qualquer investigação e, apesar disso, condenaram o Professor a seis meses sem salário? Uma matéria que deve ser esclarecida. O silêncio mata. Da minha parte nunca haverá silêncio enquanto, neste caso, um professor for injustamente condenado por um político de turno.
Toda a história pode ser lida neste endereço

quarta-feira, 22 de julho de 2020

A Educação Física não deveria contar para nada... melhor, apenas deveria contar para a construção plena do ser humano


Tive excelentes professores na minha formação inicial e complementar. Docentes de mentalidade aberta ao mundo e ao conhecimento. Foram eles que deram substância aos quarenta anos de actividade docente. Mantive um profundo relacionamento com algumas personalidades que fizeram toda a sua vida no plano universitário, com um dos quais tive o privilégio de ser Assistente durante oito anos. Li muitos investigadores e autores sobre a matéria que aqui me traz. Talvez um pouco por tudo isto tenha um posicionamento que não se coaduna com a escola e as práticas impostas lá vividas. Não simpatizo, desde logo no ensino básico, com a formatada ideia de ciclos de estudo, com o excessivo número de alunos por estabelecimento de aprendizagem, com a existência formal de turmas, com a clássica ideia de "aulas" e, entre outros aspectos de importância maior, com a obcecada e até doentia preocupação pela avaliação contaminada por um anacrónico processo burocrático.


A escola deve ser sinónima de liberdade e rigor, deve partir de baixo para cima e não sujeita a uma característica verticalizada e centralizadora, deve visar a aprendizagem consistente, deve ir ao encontro dos sonhos e dos interesses, por isso não pode constituir-se em um espaço de pensamento redutor, de rotinas enervantes que transportam o falso princípio que tudo é pensado e elaborado no sentido do interesse dos alunos. Mesmo que eles nunca sejam escutados! 

Não quero desviar-me, por isso vou directo ao assunto que me preocupa: a avaliação na Educação Física. Independentemente da expressão que considero, no tempo que estamos a viver (há mais de 50  anos), absolutamente limitadora e, como escreveu o Professor Nelson Mendes (no livro A Humanização do Movimento), por ser "estática e não válida", a sua importância, com outra designação, é decisiva na formação de um jovem, primeiro, no desenvolvimento da sua motricidade, depois, nas múltiplas opções de prática física ou desportiva. Ainda há dias, em um debate de relevante significado, o Doutor Carlos Neto, da Faculdade de Motricidade Humana, falou da relevância do brincar no pressuposto que a criança que mais joga torna-se mais bem preparada para todos os outros desafios. Só que o brincar (jogar) não deve ser imposto, deve constituir um acto de descoberta, de vivência e solução de situações múltiplas e inabituais que integrarão aquelas que são as bases do património motor. O professor deve ali estar como estímulo. Só que o adulto, normalmente, condicionado pelo "programa" superiormente definido, impõe, condiciona e estraga o que deveria ser espantosamente libertador.

Numa segunda fase, já no actual segundo e terceiro ciclos (para quê os ciclos de aprendizagem?), o problema agudiza-se. Os "programas" têm de ser cumpridos e sujeitos a uma avaliação por níveis (1 a 5). No secundário, então, é a loucura total: as notas contam para a média geral de curso e de acesso ao patamar superior. É paranóico. Confesso que os níveis e notas nunca me interessaram e sempre os combati. Não é essa a vocação primeira de um professor. Aliás, nunca me senti importante por "dar notas". Antes senti-me desconfortável, porque, o que faz sentido é deixar a semente por uma prática física e ou desportiva para a vida. Vejo-os "preocupados" com  testes e trabalhos que são uma perda de tempo. Por isso ajudei, isso sim, dentro de muitas limitações, pessoais e espaciais, que compreendessem e integrassem princípios e valores na construção do ser humano. Conquistá-los ao invés de afastá-los foi o caminho que escolhi.

Depois de tantos anos, lamentavelmente, continuo a assistir a desempenhos que buscam a Educação Física (com esta ou outra designação) como uma disciplina igual às outras, quando deveriam sustentar a sua actividade e o seu indiscutível valor na DIFERENÇA. Procuram o "ensino" e não procuram a "aprendizagem". Optam pelo cumprimento do programa e não pela construção multifacetada do ser humano. Ora, se o modo como, transversalmente, a aprendizagem é proporcionada está errada na raiz, então, na dita Educação Física, roça o espaço do ridículo. E porque este caminho de insensatez prevalece, com o apoio dos governos, chega-se ao ponto, por um lado, de haver estudantes com 17, 18 e 19 de média nas restantes disciplinas e com um tímido 13, 14, 15 na disciplina de Educação Física; por outro, sobretudo nos colégios privados, assiste-se à inflação das notas, atribuindo 18, 19 e 20 valores para que a média dos alunos melhore, facto que já deu origem a inquéritos e a procedimentos disciplinares. 

Uma e outra situações estão completamente erradas. Melhor seria que aquela disciplina não contasse para nada, ou melhor, apenas contasse para a construção plena do ser humano. O movimento, seja ele qual for, está inscrito em tudo. É sublime. É educação estética. É cultura. E a cultura não se avalia por escalas de 1 a 5 ou de 0 a 20! Depois, lembrem-se do que Coubertin escreveu na Ode ao Desporto: "Ó Desporto, prazer dos Deuses! Essência da vida (...) Ó Desporto, tu és a beleza! És o arquitecto deste edifício que é o corpo (...)"

Ilustração: Google Imagens.

segunda-feira, 20 de julho de 2020

O sector educativo contribui para o descrédito da Autonomia


Não aceito, mas compreendo, a letargia de quem governa. Compreendo o medo perante a emergência da mudança. Compreendo, para além de alguma falta de estudo e de ambição, a existência de um processo histórico que cristalizou consciências. Compreendo, por um leque variado de factores, que seja natural este posicionamento: passei pela escola autocrática, pela escola inquestionável, vivi e integrei um modelo pedagógico, atingi um objectivo académico e, agora, compete-me repeti-lo. E assim o sistema permanece, indiferente ao tempo, eternizando o círculo vicioso. Compreendo, ainda, face às circunstâncias de um sistema político centralizador, a extrema dificuldade de governantes e professores, por razões distintas, fazerem um "reset" no "aprendido" (e assumido como vaca sagrada) a caminho de uma redefinição de processos. Tal exigiria, obviamente, reiniciar o pensamento organizacional e pedagógico, partindo da configuração do mundo que estamos a viver. E isso, claro, por um lado, apavora, por outro, dá muito trabalho. Compreendo!


A dificuldade está aí, na tomada de consciência do erro primeiro. Por isso não me espanta o genérico alheamento dos professores, a ausência de pensamento reflexivo e crítico, não me surpreende a ausência de debate livre e consequente, não me causam surpresa os processos disciplinares, não fico admirado com a atitude de "maria vai com as outras", o encolher de ombros, o assobiar para o lado, pior, ainda, aquele quadro que é sensível e preocupante que se caracteriza desta forma: "o meu está feito": estive presente, preparei e dei a aula do programa, assinei o livro do ponto, marquei as faltas, compareci às reuniões, produzi as actas, atribui notas ou níveis, fiz parte dos júris de exames, corrigi, passei ou excluí, elaborei o relatório, enfim, "o meu está feito".

Só que a escola é muito mais do que isso. Não é um local de instrução, mas de aprendizagem. E apenas este pressuposto implicaria colocar tudo em causa, desde a assembleia de escola às direcções executivas, passando pelos conselhos pedagógicos, pelos departamentos até aos grupos de disciplina. Em cima da mesa deveria estar, permanentemente, como gerar uma escola que respeite os alunos, as suas origens, os seus sonhos e interesses, capaz de romper com práticas seculares, as quais, por mais importantes que tenham sido em um determinado momento histórico, apresentam-se completamente desadequadas face à quarta revolução industrial, marcada pela convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas. Esse mundo que está aí aos olhos de todos exige ruptura com a velha escola e com o velho sistema de ensino. Não são compagináveis. 

Já nos primórdios dos anos 80, para não recuar ainda mais, ao "Admirável Mundo Novo", escrito em 1931, por Aldous Huxley, o romance que prognostica sérios desenvolvimentos, entre outros, na tecnologia, que revolucionaria, profundamente, a sociedade, Alvin Tofller chamava a atenção: "(...) não podemos meter à força o mundo embrionário de amanhã nos cubículos convencionais de ontem" (...) "está a emergir na nossa vida uma nova civilização e por toda a parte há cegos que tentam suprimi-la. Esta nova civilização traz consigo novos estilos de família; modos modificados de trabalhar, amar e viver; uma nova economia; novos conflitos políticos e, além de tudo isto, também uma percepção modificada".

Tofller, em uma curiosa entrevista mais tarde publicada na revista Executiv Digest, a páginas tantas, referindo-se aos estabelecimentos de aprendizagem, acabou por concretizar:

“(...) o Sistema Educativo assemelha-se a uma fábrica que produz informações obsoletas de forma obsoleta; não por não ter os manuais académicos actualizados, mas porque, simplesmente, não estão relacionados com o futuro dos estudantes. Se o modelo de produção que lhes é ensinado é a produção em linha, eles ficarão preparados para trabalhar em processos de rotina, repetitivos, que ignoram o indivíduo. Já foi moda, mas nos últimos 100 a 150 anos”. E diz mais: quando iniciou a sua actividade profissional o seu chefe “não queria o seu cérebro, mas sim os seus músculos”. Compaginado com este posicionamento, Tom Peters, um guru da gestão, mais tarde viria a sublinhar: “bem vindos ao mundo do soft e da massa cinzenta”.

No actual sistema, a escola que permanece, configura aquilo que não deveria ser. Desde há muitos anos. Ali impera, ainda, uma absurda rotina e um discurso aberrante, todos os anos pintados de fresco (leia-se, com acertos marginais) e, depois, paradoxalmente, pedem inovação a quem viveu, durante anos, castrado no pensamento. É por isso que acompanho o significado mais profundo das posições do Professor José Pacheco que, há dias, de forma séria, emotiva e provocante dizia: "(...) numa aula nada se aprende" (...) "uma prova nada prova" (...) existe "um genocídio educacional" promovido "por múmias pedagógicas" (...) "quem dá aula está fora da lei". Ora bem, o que é que isto significa? Muito. 
Há que esmiuçar fugindo à leitura fácil e literal das palavras.

Então, genericamente, perguntar-se-á, como operacionalizar a mudança de um paradigma de instrução para um outro de aprendizagem? Desde logo estudando em grupo fazendo das escolas grandes mesas de diálogo de produção de pensamento; acreditando que os professores são capazes; libertando as escolas através da descentralização e do respeito pela sua autonomia; reduzindo ao essencial aquilo que hoje constitui a paranóia burocrática; despindo-se de antigas convicções; colocando em causa o sistema organizacional de ciclos, os currículos, os programas, os manuais e os formatos pedagógicos; errando e prosseguindo, sempre no pressuposto que não existem "modelos únicos", tal como não existem duas escolas iguais, dois públicos iguais e dois grupos de professores iguais. Enfim, no quadro da Autonomia, lutando pela existência de "um país três sistemas". Sempre com rigor, porque não se deve brincar com a Educação.

Se assim não acontecer, politicamente, no caso específico da Região Autónoma da Madeira, estará em causa a própria Autonomia. Para que serviu a regionalização? Apenas para criar edifícios? Essa é a parte mais fácil, convenhamos. Ora, o sistema não precisa de uma pesada e complexa secretaria regional que funcione, por um lado, como "caixa de correio" do ministério, por outro, como fonte de peitos cheios de ar viciado. Tenham presente que a Educação não é gerível através de um piloto automático. Mas é isso que, anualmente, está a acontecer, com chefias cegas relativamente ao que já está a acontecer um pouco por todo o país, onde estão a emergir escolas sem turmas, sem aulas, nem "fatinhos à medida". Existe aprendizagem de sucesso.

Publicado no blogue:
www.gnose.eu






Ilustração: Google Imagens.

sábado, 18 de julho de 2020

A NECESSIDADE DE PASSAR DO PARADIGMA DA INSTRUÇÃO PARA O PARADIGMA DA APRENDIZAGEM


PORQUE HÁ ANO LECTIVO E CICLO?
PORQUE QUE HÁ AULA?


Estava ansioso por escutar, uma vez mais, o Professor José Pacheco e também, o Professor Adelino Calado, agora, no quadro da iniciativa "Abrir a Mente - Educa Diferente". Na sessão de ontem esteve em causa a "Emergência na Educação". Ficaram-me algumas frases que muito dão para pensar: 

"(...) numa aula nada se aprende" (...) "numa prova nada prova" (...) existe "um genocídio educacional" promovido "por múmias pedagógicas" (...) quem dá aula está fora da lei" (...) 

A sessão gerou, em determinados momentos, um conjunto de emoções muito fortes que, inclusive, tocou, profundamente, os moderadores do painel, os Professores Mário Fortes e Luísa Paolinelli. 
Paradoxalmente, esta manhã, ao ler o Dnotícias, dei comigo não a perceber as preocupações da Secretaria Regional da Educação sobre a aprendizagem, mas a grande "novidade": a escola abre a 7 de Setembro e irá até 30 de Junho, com períodos de avaliação e de exames. A cantilena de sempre. Do importante, daquilo que deveria acontecer na aprendizagem, zero.
Deixo aqui a partilha do vídeo. Uma vez mais, senhores responsáveis políticos, professores, pais e comunidade em geral, assistam a este debate. 
Parabéns aos organizadores.

quinta-feira, 16 de julho de 2020

Quer que os seus filhos tenham boas notas a Matemática? É a brincar que se começa


Um terço dos alunos entra com negativa a Matemática no ensino secundário. Se andarmos uns anos de escolaridade para trás, a disciplina é também o calcanhar de Aquiles dos alunos do 6.º ano, é aquela que tem os piores indicadores no 2.º ciclo. Muito se tem falado da formação inicial dos professores do 1.º ciclo e a necessidade de terem maior sensibilidade para esta ciência. E os pais, o que podem fazer antes mesmo de a criança chegar à escola? Brincar, respondem os especialistas.

Pedro Palhares, professor do Instituto de Educação da Universidade do Minho, defende que a situação tem melhorado, baseando-se nos estudos da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE): “Se compararmos a situação de Portugal no fim do século passado com a de agora, há diferenças consideráveis na comparação internacional no PISA (alunos de 15 anos) e no TIMSS (4.º ano). Vemos inclusivamente que na comparação no 4.º ano estamos muito acima da média dos países analisados e poucos são os países ocidentais à nossa frente.” 

Joana Brocardo, do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa e ligada à formação de professores do ensino básico, começa por salvaguardar que os docentes do 1.º ciclo são “generalistas” pois ensinam da Língua Portuguesa à Matemática, passando pelo Ensino Experimental das Ciências, mas acrescenta que o trabalho feito junto dos futuros docentes tem sido essencial para a melhoria dos resultados dos alunos. 

“A investigação em educação indica que as famílias são uma parte essencial do processo de aprendizagem”, declara Pedro Palhares. Por isso, podem dar o seu contributo desde cedo, defende, por seu lado, Carlos Grosso, professor de Matemática da Escola Secundária Pedro Nunes, em Lisboa, e ligado à formação de professores do 1.º ciclo na Escola Superior de Educação João de Deus.

1. Falar de Matemática

As crianças gostam “naturalmente de contar, de resolver problemas, de aprender”, constata Joana Brocardo. Por isso, cabe aos pais incentivar esse gosto, mas de forma natural e não como uma obrigação. “Falem sempre da Matemática de forma positiva”, propõe Pedro Palhares.

O “encorajamento dos pais assegurará que as crianças não desenvolvam bloqueios mentais sobre a disciplina”, acrescenta o professor do Minho. Por isso, há que introduzi-las nas conversas de forma descontraída. Carlos Grosso dá um exemplo: Ao descascar uma peça de fruta, o pai vai dizendo “toma 1/4 da maçã” e está a introduzir as fracções. Ou, “vai buscar dois copos. Quantos estão na mesa?” e a criança vai aprendendo a contar. Pedro Palhares reforça: os pais devem encorajar as crianças a contar objectos reais, as bolachas, as moedas, os brinquedos. Desta forma, “descobrem que a contagem é mais do que uma repetição musicada quando contam objectos reais”, diz.


“As sementes para muitos conceitos matemáticos são lançadas quando as crianças são muito novas e as primeiras experiências podem determinar como é que as crianças olham para a matemática para o resto das suas vidas”, afirma Pedro Palhares (...).

2. Transformar a Matemática numa actividade de família

Fazer jogos de tabuleiro ou puzzles ajudam a estimular o cérebro. Carlos Grosso lembra que este órgão deve ser estimulado. Além dos jogos, há actividades do dia-a-dia que podem contribuir para a percepção da importância da Matemática, por exemplo, fazer um bolo e medir os ingredientes ou ir às compras e “fazer pequenas continhas”, propõe o professor de Lisboa.

Pedro Palhares dá outros exemplos como, em casa, separar os brinquedos pelo tamanho, tipo ou cor; descobrir quantos copos de leite há na embalagem de um litro. “No resto da casa, as crianças poderão encontrar o comprimento e a largura do chão de um quarto. Ou a sua capacidade. Ou desenhar um diagrama para refazer a mobília num quarto. Ou desenhar um mapa da casa”, continua o investigador do Minho. 

3. Jogar jogos matemáticos

"Os jogos em geral constituem uma boa oportunidade de aperfeiçoar estratégias”, aponta Pedro Palhares. Muitos jogos de tabuleiro envolvem contagens ou, por exemplo, o Monopólio permite contar dinheiro. E assim vai aprendendo a adição, aponta Carlos Grosso.

Palhares dá mais dois exemplos, os jogos de cartas e o dominó. No primeiro, há jogos que envolvem marcar pontos ou a separação em naipes. Já o segundo “é óptimo para transformar a Matemática num jogo, porque podem usá-lo de várias maneiras. Os dominós tradicionais podem ajudar na contagem, correspondência, reconhecimento de números pares e ímpares, adição e subtracção”, explica.

4. Observar a Matemática no mundo que nos rodeia

A Matemática está em todo o lado, na nossa casa, mas também em tudo o que nos rodeia, refere Carlos Grosso. As férias do Verão são uma boa altura para ajudar as crianças a descobrir a “utilidade da Matemática” na natureza ou num monumento.

“Quando estiverem fora de casa, procurem formas de mostrar Matemática: Que forma é que aquela árvore parece ter? Qual a forma de um campo de futebol? Qual a distância de baliza a baliza?”, exemplifica Pedro Palhares.

5. Construir expectativas altas para os filhos

Todas estas propostas devem entrar na vida das crianças de forma natural, reforça Carlos Grosso. Aos pais cabe fazê-lo com descontracção e naturalidade, “na brincadeira” e não forçar a criança ou castigá-la.

Por exemplo, a criança pode usar os dedos para contar. “Não se preocupe que a criança use os dedos. Os humanos desenvolveram-se mais por causa do uso dos dedos”, diz Palhares. Aliás, o sistema de base decimal assim se chama precisamente porque temos dez dedos, acrescenta Grosso, que incentiva os pais a introduzir os meninos na multiplicação porque não há dedos que cheguem para dizer, por exemplo, quanto são 4 x 7. “A tabuada reforça o treino da memória”, defende.

“Tenham confiança que os vossos filhos podem aprender Matemática e dêem-lhes um suporte activo na sua aprendizagem”, diz Pedro Palhares aos pais.

Regresso à escola

À ideia é que quando as crianças cheguem ao 1.º ciclo já tenham algumas destas noções e não olhem para a Matemática como um bicho-papão. À medida que os meninos vão crescendo, o papel dos pais não deixa de ser importante. “Procurem programas e actividades matemáticas para os vossos filhos”, propõem o professor Pedro Palhares.

Agora, por altura das férias, Carlos Grosso não vê mal que as crianças, sobretudo as que já estão na escola, façam algumas actividades dos manuais. Quando regressarem às aulas, cabe aos encarregados de educação conversarem com os filhos, saberem o que estão a estudar, se têm trabalhos de casa, podem até ajudá-los nalgum projecto, considera Palhares, que também defende que os pais devem conversar com os professores, de maneira a acompanharem melhor o desenvolvimento das aprendizagens.

“Muitos pais preocupam-se por não saberem a matemática que os filhos estão a estudar. Neste caso o melhor é perguntar e ouvir a criança com atenção”, recomenda o professor da Universidade do Minho. “Quando se dá a oportunidade às crianças de falarem sobre a Matemática, muitas vezes elas conseguem lembrar-se do que aprenderam na aula e vêem a solução por elas próprias. Uma boa pergunta pode despoletar o raciocínio da criança sobre o problema”, justifica, salvaguardando que cabe aos pais manter a calma.

“Os miúdos sabem pensar muito bem e não se pode matar essa curiosidade”, conclui Joana Brocardo.

Fonte: Público

terça-feira, 14 de julho de 2020

Educação em emergência pandémica: é possível não deixar nenhum aluno para trás?


Mais de metade dos professores inquiridos numa auscultação recente não conseguiu contactar uma parte indeterminada de crianças e jovens seus alunos, pelo menos durante as primeiras semanas de educação de emergência, à distância. Podemos, com certa segurança, assumir que, naquela fração de estudantes, se contam cerca de 50.000 que não disporiam de ligação à Internet, bem como aqueles que, mercê de múltiplas barreiras, têm uma mais frágil participação na aprendizagem e na escola.


Podemos ainda admitir que boa parte desses alunos incontactáveis, há 10 ou 15 anos, viriam a integrar as estatísticas do abandono escolar precoce; se em fevereiro tal não aconteceria é porque foram sendo (re)mobilizados para a aprendizagem e para a escola pela ação coletiva organizada de professores e outros técnicos, em coligação com famílias e demais intervenientes na escola e na comunidade. As bases desta ação com jovens, famílias e comunidades estão hoje fragilizadas e reduzidas as possibilidades que iam permitindo mitigar barreiras à participação na aprendizagem enfrentadas por esses alunos.

Estudos recentes exploratórios e provisórios [1] sugerem que a aprendizagem, nesta educação remota de emergência em casa, aparenta depender dos meios de acesso à interação pedagógica, da capacidade de estudar autonomamente e do apoio doméstico com que o estudante pode contar; igualmente sabemos há décadas que quanto mais a aprendizagem dos alunos depender dos recursos e apoio familiares, mais se ampliam as desigualdades educativas. Assim, é expectável que a educação de emergência à distância, acentuando a influência do contexto familiar e reduzindo o leque e a efetividade de oportunidades institucionais para aprender, aprofunde desproporcionadamente o fosso da progressão nas aprendizagens.

Neste momento de preparação do próximo ano letivo, as crianças e os jovens incontactáveis e as barreiras que nessa condição os colocaram, bem como as pronunciadas desigualdades nas aprendizagens resultantes, terão de estar necessariamente no topo das prioridades que definem opções, meios e recursos para organizar o serviço da educação pública de emergência que não deixe nenhum aluno para trás. Como em muitas outras situações, serão a política e a pedagogia a alicerçar os contextos de interação em que a aprendizagem e a educação de emergência vão ser materializadas.

Porque os reportórios de ação pedagógica dos professores podem ser alargados e a ação organizada da escola para superar velhas e novas barreiras à participação de crianças e jovens na aprendizagem depende de condições e opções políticas que lhe sejam favoráveis. E, neste sentido, as políticas económicas e orçamentais para a educação são tão decisivas quanto outras opções nessa matéria: os custos sociais tendem a elevar-se desmesuradamente, sobretudo para os mais frágeis, quando a escolha fica determinada pela política educativa mais barata.

Hoje, parece indispensável um forte investimento nas condições humanas e materiais de acesso à participação na aprendizagem, garantindo que nenhum estudante é excluído; na constituição de turmas promotoras de condições e oportunidades acrescidas de aprendizagem junto de alunos que enfrentam severas barreiras a essa participação; na organização da escola para criar modalidades de apoio adicional, individual e em pequenos grupos, a crianças e jovens academicamente mais frágeis; no reforço da formação para ampliar o reportório de ação pedagógica dos professores em situação de educação de emergência.

Por aqui passará a contenção do sofrimento e de outros custos individuais, coletivos e sociais da pandemia. Porque cada um daqueles alunos incontactáveis que não regresse à escola significa regredir quase todo o caminho que desde há 15 ou 20 anos, coletivamente, a sociedade portuguesa avançou para que em educação cada vez menos pessoas fiquem para trás.

Fátima Antunes
Centro de Investigação em Educação/CIEd Universidade do Minho


Fonte: Público

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Continuam a "brincar" com a Educação


FACTO

JSD-Madeira debate ‘Educação num mundo pós-covid-19’ no próximo dia 16 de Julho. O debate será feito através de videoconferência e conta com o antigo Ministro da Educação, Nuno Crato. A ideia desta iniciativa é “discutir e analisar quais os modelos que devem ser seguidos, de que forma a educação terá de adaptar-se a esta nova realidade e qual o papel que a comunidade educativa – professores, alunos, encarregados de educação, entre outros – terá de assumir para ultrapassar, da melhor forma, esta nova realidade e todas as alterações ao modelo que a mesma veio introduzir”. Fonte: Dnotícias.

COMENTÁRIO

Todas as estruturas partidárias, obviamente, devem debater os temas que a toda a sociedade diz respeito. A política educativa é um dos temas de maior relevância. Só que, neste momento, cheira-me que esta iniciativa constitui um contraponto a uma outra em curso, do Professor Universitário Mário Fortes, com figuras de elevadíssimo conhecimento, sob o título genérico “Abrir a Mente / Educa Diferente” - "Educação Horizontes XXI".

No dia 06 aconteceu um excelente debate subordinado ao título "A Natureza do Brincar/Emoções à Solta"; ontem, um novo painel abordou "Sonhar Acordado, Criatividade na Escola"; para o dia 10 de Julho está agendado o tema "O Ensino a Distância"; a 13 de Julho "Contra a Indiferença"; a 15 de Julho o tema "Ciência na Escola" e, finalmente, a 17 de Julho o debate sobre a "Emergência na Educação". Neste último debate (estou ansioso por acompanhá-lo) estarão presentes os Professores José Pacheco e Adelino Calado.  

Face à excelência dos temas e dos convidados, pergunto, qual o significado político (e prático) de uma iniciativa partidária marcada para o dia 16? Estão no seu pleno direito de a realizar, mas traz água no bico! Bom seria que os jovens e menos jovens, políticos e governantes) ficassem atentos àqueles debates. Aliás, um debate com o Professor Nuno Crato, um ex-ministro de má memória que nada, rigorosamente nada, adiantou relativamente a uma necessária e urgente mudança no sistema educativo, certamente que nada adiantará. Terá mudado de opinião? Duvido.
Ademais, o problema da Educação não está no pós-Covid19. O problema é de pensamento estrutural, de reorganização da escola, é de liberdade, está nos currículos, nos programas, na cultura e nos dramas sociais. Não está, como li, na criação de um "modelo", mas na vontade política de criar um novo PARADIGMA que conduza ao sucesso. Sinceramente, com todo o respeito pela iniciativa, não perco um segundo com o Professor Nuno Crato! Ele é uma figura do passado, não é uma figura do futuro.

quarta-feira, 8 de julho de 2020

Para escutar, reflectir e actuar...

Em uma iniciativa, extremamente louvável, do Professor Universitário Mário Fortes, está em curso uma série de debates, com figuras de elevadíssimo conhecimento, sob o título genérico “Abrir a Mente / Educa Diferente” - "Educação Horizontes XXI". Segui o primeiro que contou com a excelente moderação da Professora Universitária Luísa Paolinelli. 
O tema, confesso, escorregou-me garganta abaixo como mel. Quer o autor, quer o Professor Rui Mendes, quer o Professor Carlos Neto, deram uma lição sobre “A natureza do Brincar, Emoções à Solta”.
Uma lição que deveria ser escutada pelos governantes da Educação na Região e no País, pelos professores, educadores, pelos pais e já agora pelos deputados. 
Chamo particularmente a atenção para as intervenções do Professor Carlos Neto, Catedrático da Faculdade de Motricidade Humana. Fantástico!
Carlos Neto foi meu colega de turma na formação inicial da hoje designada Faculdade de Motricidade Humana. Há cinquenta anos, tivemos professores de um nível de conhecimento excepcional e lembro-me da curiosidade que todos tínhamos em seguir a problemática da infância, do corpo e do jogo. O Professor Carlos Neto tem, nesta área, uma obra fabulosa, que me leva a lamentar, profundamente, que não tivesse sido aproveitada pelos políticos. Teríamos, hoje, certamente, uma ESCOLA diferente, mais amiga das crianças e mais centrada nos caminhos do futuro. 
Parabéns Professor Mário Fortes pela iniciativa. 
Vale a pena escutar este debate. AQUI: https://www.facebook.com/joaoandreescorcio/
Postado no dia 07 de Julho de 2020.

segunda-feira, 6 de julho de 2020

Comparar o incomparável (!)


Vítor Colaço Santos assina, hoje, no Dnotícias, uma "carta do leitor" que vem na sequência dos "ranking's" das escolas. Mais um a colocar o dedo na ferida. Entretanto, na mesma edição (pág. 2), o secretário regional da Educação fala sobre "inclusão e flexibilidade" e de dois diplomas que foram "fundidos" para melhor garantir tal meritória finalidade. Ora bem, trata-se de mais "poeira para os olhos" que turva um olhar correcto sobre uma verdadeira política inclusiva e de oportunidades. A inclusão não se garante à porta da escola por decreto e a flexibilidade só faz sentido quando enquadrada em uma ideia maior do que se pretende para a Educação. Como essa ideia maior não existe e como não existem políticas que quebrem, a prazo, o grave ciclo da pobreza, pois bem, pode o secretário muito "decretar" que apenas conseguirá mexer na roda do prato, deixando o âmago inatingível. Mais uma bola para fora!

Entretanto, fica a "carta do leitor" que termina com esta frase: "Assim haja vontade política... que não tem havido!"

"Anualmente há um campeonato entre as escolas públicas e privadas para eleger as melhores, com resultado final recente. Faz sentido as escolas entrarem em competição, ao invés de se entreajudarem pela troca de experiências, de conhecimento, de complementaridades?
É sério comparar escolas públicas, com um alto índice de alunos filhos da desigualdade social, com escolas privadas onde estudam alunos oriundos das classes altas a quem nada falta? Não, não é!
À partida, a disputa já está distorcida a favor dos privados...
Quem quer rankings, primeiro estabeleça a igualdade de oportunidades.
O campeonato da escola pública melhorará quando os professores forem mais respeitados, credibilizados, usufruírem de melhores condições de trabalho e remuneração condizente. Deve-se reconhecer que são eles quem prepara o futuro deste país instruindo os estudantes.
Assim haja vontade política... que não tem havido!"

Ilustração: Google Imagens.

sábado, 4 de julho de 2020

Então o ensino a distância não foi um sucesso?


FACTO

"Aumentamos o número de dias de aulas do próximo ano, encurtando, por um lado, a pausa lectiva da Páscoa e prolongando a duração do ano lectivo para os anos de escolaridade que não estão sujeitos a exame" -  Tiago Brandão Rodrigues. Segundo o ministro, o alargamento do próximo ano lectivo serve, sobretudo, para permitir que os alunos e professores tenham mais tempo para recuperar e consolidar aprendizagens.

COMENTÁRIO

A primeira reflexão que me assalta é a propalada história do enorme sucesso que foi o "ensino a distância". Isso mereceu visitas, inflamadas declarações, muitas palavras de enaltecimento ao trabalho dos professores, eu sei lá quantas foram as cores que pintaram a resposta do sistema à pandemia. Mesmo sem meios informáticos para todos. Fico perplexo quando, agora, o mesmo ministro anuncia um maior número de dias de actividade no próximo ano lectivo para, note-se bem, "os alunos e professores tenham mais tempo para recuperar e consolidar aprendizagens". Esquisito. Nada bate certo. Em linguagem informática eu diria que vai dar "erro". Só posso deduzir que, realmente, até o próprio ministro admite que o "ensino a distância" foi uma farsa!

O ministro ainda não percebeu  aquilo que há tantos anos é salientado: "mais escola não significa melhor escola". Portanto, na incerteza do que a pandemia reserva, mais avisado teria sido, no quadro do actual sistema educativo, a definição de dois grandes objectivos: primeiro,  o de caminhar, paulatinamente, para uma série de mudanças estruturais no pensamento estratégico no que concerne à organização dos estabelecimentos de aprendizagem, currículos, programas e exercício de uma pedagogia motivadora; segundo, o de sugerir, repito, no quadro do actual sistema, a aprendizagem do fundamental de cada disciplina no contexto interdisciplinar. No fundo, em uma lógica do que é animador, encorajador, incentivador e portador de futuro.

Sabe-se que muito do que é transmitido destina-se ao teste e logo ao esquecimento. Há muita tralha nos programas. Ora, manter, como objectivo, a transmissão de toda tralha acaba por ser do tipo "timex": não adianta nem atrasa. Daí que, mais dias de aulas, mais trabalho para os professores, mais testes de avaliação, mais burocracia e mais reuniões não acrescentarão rigorosamente nada. Tornar-se-á, apenas, penoso para toda a comunidade escolar. A não ser que o objectivo continue a ser o da escola enquanto "armazém" de crianças e jovens e não o espaço determinante da formação. 
Ilustração: Google Imagens.

quinta-feira, 2 de julho de 2020

Ranking's, a derrota da secretaria Educação e o caso do Professor Joaquim Sousa


Alguns governantes habituaram-se a mentir ou a contornar a verdade. Sempre que lhes dá jeito. Um dado assunto, não sendo mentira, no entanto, pode esconder uma montanha de fragilidades. Por isso, divulgam o que interessa e mascaram  ou esquecem tudo o resto, no pressuposto que uma larga maioria engolirá com relativa facilidade. Ontem foi, novamente, dia de mascarar e de auto-elogio. Talvez porque, na véspera, tinham sido divulgados os "ranking's" dos resultados obtidos nos exames nacionais, os quais, globalmente, deixaram os estabelecimentos da região em posições nada agradáveis. Daí, terão sentido a necessidade de falar de "mais casos de sucesso em todos os ciclos de ensino", de uma "inspiração e motivação para procurar melhorar", de uma enorme "qualidade dos projectos educativos" e até da "grande motivação dos alunos". Não bate certa uma coisa com a outra!


Tratou-se, claramente, de um contraponto político, para esconder a realidade factual do dia anterior. Quem se apresenta contra os "ranking's", naturalmente que não precisa de se justificar com números estatísticos que têm muito que se lhe diga. Não precisa se, por acaso, está certo do caminho que escolheu. 

Aliás, já aqui o referi, há um livro clássico "Como mentir com a Estatística", escrito por Darrell Huff, onde o autor sublinha: "(...) A linguagem secreta da estatística, tão atraente no quadro de uma cultura baseada em factos, é usada para causar sensacionalismo, para amplificar, para confundir e para simplificar o mais possível. Os métodos e termos estatísticos são necessários para comunicar um grande volume de dados sobre tendências socioeconómicas, condições de mercados, pesquisas de opinião e recenseamentos. Todavia, sem autores que usem as palavras com honestidade e sentido e sem leitores que saibam o que elas querem dizer, o resultado só poderá ser um completo disparate semântico (...) Como se fossem uns pozinhos de perlimpimpim, as estatísticas fazem muitos factos importantes parecerem aquilo que, de facto, não são (...)". 

Ora, por mais voltas que possa o secretário dar, lamentavelmente, o facto é este: "(...) 65% da população da Madeira, com 15 ou mais anos, tem apenas até o 9º ano de escolaridade. (...) A Madeira continua a estar pior do que a média nacional, naquela que é a taxa de abandono precoce de educação e formação (jovens dos 18 aos 24 anos que estão fora do sistema de ensino e sem o secundário): 23% na Região e 14% no País" (22.07.2019

Coexistem múltiplas razões, não apenas as organizacionais do sistema, isto é, de pensamento relativamente à Educação. Mas basta pegar em um indicador, o tal que aponta para 30% de pobreza, para percebermos que se a sociedade não está bem, a escola não pode estar melhor! Concordo com o que disse o Senhor Presidente da Assembleia Legislativa da Madeira no dia 1 de Julho: 

“Não podemos continuar a ser uma das Regiões com mais desigualdades territoriais e sociais”. Um tiro certeiro que a caridade não resolve.


Mas nesta semana assisti a uma outra situação, penosa e de mau gosto, em que a secretaria da Educação tentou passar uma imagem de vitoriosa no processo judicial da Escola do Curral das Freiras, o tal que envolveu o Dr. Joaquim José de Sousa. O caso, segundo julgo saber, está em fase de recurso, mas o que se depreende da leitura de um texto, é que a única justificação para essa dita "vitória" está no facto da contestação ter sido apresentada "fora de prazo" (um dia). Ora, o governante, do meu ponto de vista, quer ganhar na secretaria uma monumental derrota que teve em todo o processo que conduziu à perda da autonomia da Escola do Curral e à respectiva incorporação como "anexo" da Escola de S. António. Os Acórdãos são manifestamente favoráveis ao Professor Joaquim Sousa.

Curiosamente, a Escola do Curral, onde o Professor em causa ajudou a levá-la ao topo nacional, com vários prémios ganhos, depois de anulada a sua autonomia e a respectiva integração, no contexto da nova escola (S. António), diz o "ranking" que esta se classificou em 599º lugar. 

Não me interessa a classificação para nada, porque uma escola é muito mais que um "ranking", mas não deixo de dizer que aquela posição, sim, foi a derrota de quem, por inexplicável ciúme ou seja lá o que for, acabou com o trabalho que vinha a ser realizado, com amor, na recôndita escola do Curral. A maldade, conduziu, relembro, o Professor Joaquim, por ninharias (ridículas) administrativas, a seis meses sem salário (vergonha), sem acesso aos documentos administrativos que o podiam inocentar, através de um processo maquiavélico em que nem a instrutora era inspectora. Decorrente deste aspecto, continuo incrédulo como é que a Inspecção Regional de Educação tenha reconhecido, a 17 de Dezembro de 2019, que as ACTAS, assinadas pelos membros do executivo da escola, tinham sido perdidas e, como tal, o "arguido" não as poderia utilizar como defesa. Coloco a questão: se desapareceram é que alguém as desviou e, neste caso, pergunto, se a secretaria comunicou tal situação às autoridades policiais? 
Destas trapaças e ofensas à dignidade de um Professor, o governante queda-se pelo silêncio. Lamento.
Ilustração: Google Imagens.