domingo, 30 de maio de 2021

"Alerta vermelho" na Educação?






FACTO

"Quebra nos nascimentos provoca alerta vermelho na Educação".
Edição de hoje do Dnotícias.

COMENTÁRIO

Todos os anos esta cena repete-se. Lá vem o governo preparar as populações locais para a necessidade de encerrar estabelecimentos de aprendizagem, devido à diminuição do número de nascimentos. Apesar da natalidade ser preocupante a variadíssimos níveis, não apenas no que ao sector escolar diz respeito, o problema é mais complexo do que aquele que tentam, sectorialmente, "vender" como uma inevitabilidade. As razões mais substantivas da diminuição do número de nados-vivos vamos encontrá-las na organização da sociedade tal como a configurámos. Era óbvio que, paulatinamente, chegaríamos a esta situação. Começa com a generalização da entrada da mulher no mundo do trabalho, sem que tenha sido devidamente acautelada, entre outros aspectos, a obrigatoriedade dos direitos de maternidade. Uma coisa é o que consta, vagamente, na lei; outra, o que de facto acontece. Junta-se a esta situação a precariedade laboral, os baixos salários, razões de natureza familiar, cultural e as sucessivas crises de natureza económica geradoras de falta de confiança. Há anos que esta situação está equacionada e prognosticada. Portanto, a redução do número de alunos não constitui novidade, nem para os mais distraídos.

O problema é que os políticos de turno continuam a apontar para a Lua, mas apenas conseguem ver o dedo. A (re)organização social, onde tantos factores se entrecruzam, é coisa de somenos, quando é por aí que a questão da natalidade deve ser analisada. Não é com apoios pontuais de umas centenas de euros por nado-vivo que este drama se resolve. Há, necessariamente, outras razões profundas que devem ser observadas.

Relativamente ao sistema educativo, para já, a questão não é de ter menos 500 ou 600 crianças a menos. É, sobretudo, de "desconstrução" do sistema e de paulatina criação de um paradigma gerador de um novo sentido da aprendizagem. O provérbio chinês aplica-se a esta situação: "Quando o sábio aponta para a lua, há quem fique a olhar para o dedo". Neste contexto, o dedo significa a preocupação pela diminuição do número de turmas e, neste sentido, o encerramento do número de estabelecimentos de aprendizagem e a dispensa de professores. A Lua, também neste contexto, pela grandeza do problema, deveria significar a oportunidade para desconstruir este sistema velho e obsoleto, conduzindo o pensamento para um paradigma de aprendizagem, não apenas consentâneo com a realidade sentida, mas aberto ao mundo real que dispensa esta escola repetitiva e sensaborona. E tanto que está por fazer...

Há uma certa insanidade quando se repete o mesmo há dezenas de anos, acreditando que essa via garantirá novos resultados. Ou, então, quedando-se pelo lamento. Esse é um trabalho inglório. Pode ser agradável quando o político assume a rotina do funcionário público, mas é perturbador e inquietante quando o presente e o futuro se misturam perante a prostração de quem governa. "Quem parte já está no futuro", disse-o o Filósofo Agostinho Silva. De forma tão simples e tão profunda. Este, portanto, poderia ser o momento para partir, desconstruindo e criando, de forma obstinada, o futuro. Aliás, a qualquer político pede-se que seja prospectivo o que implica não ficar agarrado aos cubículos convencionais do passado. E sendo assim, eu diria que o sistema educativo é que está no "vermelho". Pintem-no de novas cores, ou então, porque estão parados no semáforo, aproveitem o verde que se seguirá! 

Ilustração: Google Imagens.

sexta-feira, 28 de maio de 2021

Currículo, Pedagogia e Avaliação para uma Escola mais Democrática


Por
Domingos Fernandes
Professor Catedrático
Instituto de Educação, Universidade de Lisboa


Nunca foi nem será fácil mudar práticas de instituições que, como as escolas, tendem para uma estabilidade e até para um certo imobilismo decorrentes de rotinas pedagógicas que foram sendo construídas e instituídas ao longo de décadas. A grande maioria dos docentes é indubitavelmente bem intencionada, esforçada, conhecedora das suas matérias e claramente envolvida com os seus alunos. Porém, está algo desconectada com questões tais como as que se relacionam com o currículo e o seu desenvolvimento, com perspetivas acerca do ensino e da aprendizagem e com o papel que a avaliação pedagógica pode desempenhar para melhorar a qualidade da educação. Esta situação dificulta a discussão fundamentada acerca do que, por exemplo, está em causa quando se afirma que o principal propósito da avaliação pedagógica é ajudar os alunos a aprender mais e melhor. Consequentemente, um número de profissionais tem dificuldade em reconhecer que nas questões curriculares, pedagógicas e avaliativas, que devem ser discutidas de forma integrada, há opções que se podem tomar com consequências muito diferentes ao nível das aprendizagens dos alunos e, por isso, ao nível do combate por uma educação mais igualitária e democrática. Este texto foi pensado e organizado para ajudar a clarificar as opções com que, presentemente, as escolas estão confrontadas.



Sendo necessário enfrentar desafios nos domínios do Currículo, da Pedagogia e da Avaliação Pedagógica, importa discernir consequências das opções que se fazem. Na verdade, as escolas deverão definir políticas claras e tão articuladas quanto possível nestes três domínios. E, ao fazê-lo, têm de compreender que as suas opções nunca serão neutras e têm consequências muito distintas na vida das crianças e dos jovens. Por exemplo, um currículo que se diz e que se reproduz verbalmente e/ou através de slides do power point, está associado a uma pedagogia em que o ensino e o papel do professor estão no centro do processo educativo e a uma avaliação centrada em testar se os alunos são ou não capazes de reproduzir o que lhes foi primorosamente transmitido através de imaculadas coleções de slides. Nesta visão de currículo e de desenvolvimento curricular os alunos têm sobretudo uma relação verbal e pouco crítica e pouco concreta com o conhecimento, limitando-se, em geral, a reproduzi-lo através de testes. Assim, os alunos não são preparados para observar e para analisar o que se passa à sua volta, nem para experimentar, refletir e escrever com sentido crítico. O sistema escolar, nestas condições, pouco ou nada faz para que se aprenda a pensar e pouco ou nada faz para que todos os alunos se envolvam nos processos de ensino, aprendizagem e avaliação.

Fica assim claro o que se pode esperar de um currículo que se diz, de uma pedagogia centrada no ensino e de uma avaliação que se limita a produzir juízos, muitas vezes definitivos e irreversíveis, sobre os desempenhos dos alunos. E fica igualmente claro que a opção por este tipo de desenvolvimento do currículo mantém afastados do acesso à educação, à cultura e ao conhecimento, largos milhares de alunos. Por uma razão muito simples: é claramente favorecido quem domina o código sociolinguístico que predomina no ensino e é claramente desfavorecido quem provém de meios sociais, culturais e económicos mais pobres. Consequentemente, o sistema escolar mantém e até aprofunda as desigualdades existentes entre alunos, com manifesto prejuízo, é mesmo esta a palavra, dos que são socialmente mais vulneráveis.

As escolas estão confrontadas com a necessidade de desenvolver uma renovada, flexível e dinâmica perspetiva do Currrículo, uma Pedagogia que traduza uma visão integrada, reflexiva e problematizante da aprendizagem, da avaliação e do ensino e uma Avaliação Pedagógica consistente com aqueles desígnios. Trata-se de uma opção que contrasta com a que acima se referiu. Aqui o currículo não é dito! É pensado, é questionado, é discutido e tem a ver com as vidas das crianças e dos jovens e dos seus professores e das suas famílias. O currículo é construído e reconstruído e é Vida, ou não o será de todo, pois o conhecimento e a sua utilização têm a ver com a vida. É um currículo que exige uma gestão mais flexível e inteligente para que todos e cada um dos alunos possam aprender. A pedagogia, nesta opção, prioriza a aprendizagem em vez do ensino e isto significa que os alunos são participantes mais autónomos e ativos em todas as ações que se desenvolvem nas salas de aula. Os professores são profissionais do ensino altamente qualificados que sintetizam o trabalho dos alunos, fazem pontos de situação, orientam, propõem tarefas e proporcionam as condições para que todos possam aprender. São, assim, um inestimável recurso.

A avaliação tem de ser um processo pedagógico cujo propósito fundamental é apoiar os esforços de aprendizagem dos alunos e de ensino dos professores. Por isso se assume que avaliar é diferente de classificar. Avalia-se para tratar das aprendizagens dos alunos, isto é, para lhes distribuir feedback que os torne conscientes acerca de três questões essenciais: a) o que é preciso aprender; b) em que ponto se encontram em relação às aprendizagens a desenvolver; e c) os esforços e as estratégias que têm de utilizar para chegarem lá. Avalia-se também para regular os processos de ensino. Nestes termos, é preciso analisar o currículo, refletir acerca dele, identificar os seus domínios fundamentais, distinguir o essencial do acessório, para definir critérios que, no fundo, indicam aos alunos o que se vai avaliar e, por isso, o que é preciso aprender. Os critérios têm de ser simples, claros, facilmente compreendidos pelos professores, pelos alunos e pelos pais ou encarregados de educação. Idealmente, numa escola, deveria definir-se um conjunto de critérios de natureza transdisciplinar e independente dos níveis de ensino e ano de escolaridade. Imagine-se a simplificação que se introduziria e o que se ganharia em termos de aprendizagem, ensino e avaliação, se os alunos, os professores e os pais pudessem estar todos focados num conjunto limitado, mas muito relevante, de critérios. Obviamente que tudo isto tem de estar fortemente articulado com o currículo e com a pedagogia para que, por exemplo, seja possível gerar diferentes dinâmicas de trabalho nas salas de aula, recolher informação acerca do que os alunos sabem e são capazes de fazer através de uma diversidade de processos e tornar os alunos mais autónomos. É necessário que a avaliação formativa, para aprender, acompanhe os processos de ensino e aprendizagem para que o feedback possa ser distribuído atempadamente, é necessário fazer pontos de situação, balanços, para que, num dado momento, seja possível conhecer o que os alunos sabem e são capazes de fazer, mobilizando essa informação para distribuir feedback (avaliação sumativa sem fins classificatórios) ou para efeitos da classificação dos alunos (avaliação sumativa com fins classificatórios). E vem a propósito voltar a sublinhar que é necessário compreender que a avaliação e a classificação são de natureza muito diferente. A avaliação tem a ver com pedagogia, isto é, com os processos de aprendizagem e de ensino. A classificação é a utilização de um mero algoritmo, mais ou menos inteligente, mais ou menos significativo, que permite, tecnicamente, determinar a nota de um aluno. A classificação determina-se a partir dos dados gerados pelas tarefas de avaliação sumativa que se planearam exclusivamente para fins classificatórios e só essas. Estas tarefas devem ser diversificadas e desenvolvidas de forma a que os alunos tenham oportunidade de mostrar o que sabem e são capazes de fazer no que se refere aos aspetos mais relevantes dos domínios do currículo.

Ao fazer-se uma opção desta natureza ao nível do Currículo, da Pedagogia e da Avaliação Pedagógica estaremos a contribuir decisivamente para diminuir as desigualdades entre alunos provenientes de meios social, cultural e economicamente diferenciados. Estaremos a incluir e não a excluir milhares de alunos. Tem sido esta a opção das atuais políticas públicas materializada numa diversidade de programas nacionais (e.g., Autonomia e Flexibilidade Curricular, Plano Nacional de Promoção do Sucesso Escolar, Plano Nacional das Artes, Projeto de Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica – Projeto MAIA) que constitui um ambicioso desafio para todas as escolas.


É preciso prosseguir os esforços para que as escolas vão eliminando ou reformulando drasticamente as listas e as grelhas infindáveis de tudo e mais alguma coisa, disciplina a disciplina, com poucas relações entre si. É importante criar condições para que os professores, em vez de listas e grelhas de questionável utilidade, criem autênticas comunidades de estudo e aprendizagem para dialogar, pensar, refletir e trabalhar em conjunto acerca das coisas do currículo, da pedagogia e da avaliação pedagógica. Professores profissionais do ensino, intelectuais, gente da cultura e da educação, que se assume integralmente como tendo um papel insubstituível neste duro e difícil combate social pela democratização da escola. Uma escola em que cada um dos seus alunos possa ter reais oportunidades para aprender mais e melhor, com mais profundidade e compreensão.

segunda-feira, 24 de maio de 2021

Desigualdades

 

Três pilares fundamentais no equilíbrio, inclusão e desenvolvimento de uma sociedade: a saúde, a educação e a segurança social. Junta-se, naturalmente, o direito ao trabalho. Quando este entra em derrapagem persistente e falha a segurança social, então aí, o caldo entorna-se. Multiplicam-se os estados de pobreza e o círculo vicioso tende a eternizar-se. Para contrabalançar este estado vegetativo social surgem os discursos políticos emaranhados, aguerridos e, por vezes, ofensivos, mas também envoltos em cores esperançosas, dando sempre a entender que se vive em estabilidade e paz social. Invariavelmente, pioneiros nisto e naquilo e, mor das vezes, abafam o descontentamento com promessas de dinheiro a fundo perdido.



Vive-se em um "cocktail" explosivo limitador da construção de uma sociedade democrática, menos assimétrica, estável e livre. Por maior que seja o controlo, directo e indirecto, sobre o funcionamento global da sociedade, creio que chegará o momento do insuportável, por incompatibilidade entre os direitos de uns e os deveres de outros. 

Leio: "nunca houve tanta espera no SESARAM", isto para dizer que, em 2020, 117.691 pessoas (mais 9,6% que no ano anterior) aguardavam resposta para as necessidades detectadas na saúde. Números assustadores e só tornados públicos depois de um partido (JPP) os ter solicitado pela via judicial. Manter o silêncio parece  constituir lei! Leio, também, que 20.188 pessoas procuravam emprego e que destes apenas 7.454 (37%) recebiam apoio da segurança social. Com outras particularidades à mistura: duas em cada três empresas não sobrevivem mais de cinco anos e que seis mil subsistem com o Rendimento Social de Inserção. Portanto, dados sumários que levam a predizer que este é um terreno fértil para o crescimento da pobreza, que já vai em 32,9% (cerca de 80.000) que sobrevivem, sabe-se lá como, na vida difícil que enfrentam. De que vivem, perguntar-se-á. Do biscate, do trabalho pontual não facturado, da agricultura de subsistência, da caridade das instituições e de alguns expedientes que uma sociedade equilibrada não deveria tolerar. 

Lanço um olhar sobre o outro pilar, o da Educação. É um completo desastre. Escrever sobre as taxas de abandono e de insucesso tornou-se recorrente, tal como relativamente às baixas qualificações profissionais. Preocupante é ter presente que cerca de 30% não conclui o ensino secundário e que cerca de 46% dos cidadãos sem emprego possuem habilitações inferiores ao 3º ciclo do ensino básico. Mais, ainda, quando se constata que mais de 13%, entre os 15 e 34 anos não estão empregados nem frequentam a escola, em formação ou estágio, o drama é, então, arrepiante. E perante isto que, aos poucos, se acentua, ninguém desperta para a realidade e não apresenta adequadas soluções estruturantes.

O sistema vive do folclore da propaganda pensada e alimentada, que começa no titular da pasta, passa pelo coro da Assembleia e acaba na comunicação social. Pensar um sistema com pontes articuladas entre os diversos sectores (a montante e a jusante da escola), desenvolver um pensamento estratégico de antecipação do futuro, libertar o sistema dando aos estabelecimentos de aprendizagem a autonomia necessária na criação de organizações diversificadas, colocar em causa, provocando o debate, os currículos e os programas em função da vida real, alterar, substancialmente, a agulha da burocratização que fere e mata, isto e muito, muito mais, não pertence ao universo das preocupações dos políticos de turno. Por esta via, o sistema não tem possibilidades de regeneração, pelo que os factos, consubstanciados nas evidências, tenderão a agravar-se. Falta pensamento, conhecimento, coragem, humildade e determinação. 

Ainda hoje, a edição do Dnotícias escreve sobre os manuais escolares em versão digital, os quais, diz o governo, são motivo de "estudo internacional" no que concerne à segurança. Quem fica pelas gordas do título dirá que o sistema está na vanguarda, e isso não é verdade. Ora, à Samsung, obviamente, o que lhe interessa é vender. Certo? Não falam do conteúdo, não têm em conta o que T. Bates (Microsoft) sublinhou: que "(...) o bom ensino supera uma escolha tecnológica pobre, pelo que a tecnologia nunca salvará o mau ensino". Falam de salas de aula do futuro, quando o futuro começou há muito. Desprezam o âmago de como aprender e deixam-se enlear pela futilidade, pelas aparências, pelas insignificâncias, preferindo propagandear o irrelevante em detrimento de um pensamento estruturado.

Decorre de tudo isto que acresce a necessidade de uma redobrada atenção de todos sobre os pilares de uma sociedade decente onde não existam mais direitos do que justiça social. Pelo futuro da escola e de uma sociedade portadora de futuro.

Ilustração: Google Imagens.

domingo, 23 de maio de 2021

Homenagem aos "Vencidos Vencedores"



Nunca foi cronologicamente tão inoportuna, objectivamente tão desadequada e qualitativamente tão deprimente uma fasquia como esta que, todos os anos, empresas parceiras dos mesmo interesses expõem no estendal das folhas diárias para gáudio de uns (os privilegiados) e escárnio de outros (a maioria).




Os advérbios modais que acabo de enunciar estão bem à vista: perante um ano escolar atípico, como 2019/2020, marcado pelo depauperamento insuperável da arte de ensinar e aprender, em virtude das condições anómalas impostas pela pandemia, qualquer campeonato académico seria, no mínimo, inoportuno. Consequentemente, o objecto da causa – resultados finais – sairiam desadequados, para não dizer, falseados. Em termos de produção efectiva e justeza de apreciação (falo da profundidade de análise e não das ‘caravelas portuguesas’ à tona de água) a tabela classificativa não poderia ter saído tão deformada e tão fútil.

É a Educação vendida a metro. É a função do lucro marginal em pleno campo da economia do mercado escolar. Nem me demoro na dissecação crítica que docentes e sociólogos já fizeram e que se sintetiza na veleidade (direi mesmo, desonestidade) de comparar o incomparável, como seja a dicotomia privado-público, com a mais que escandalosa geometria variada que lhe está subjacente. Apenas limito-me a transcrever a análise de um director de escola, relativamente bem posicionada: “Nesta escola, primeiro debruçamo-nos sobre os condicionamentos económicos do aluno, depois pesamos os factores sociais que o determinam e, só depois disso, enfrentamos o seu processamento académico”. Melhor ninguém diria! Focalizada sob a tríplice objectiva deste campo laboratorial, a Educação nunca será suficientemente revelada, nem sequer valorativamente apreciada, se tais parâmetros forem obliterados ou, pior, deliberadamente escamoteados.


Dois items, porém, pretendo destacar: Enquanto em determinadas escolas de elite se arregimentam os futuros presidenciáveis, os ministeriáveis, os neo-banqueiros, noutras verga-se a cerviz dos cidadãos de amanhã para servirem de escabelo e tapete aos privilegiados. Por outro lado, não entendo por que legítimas razões tem o governo obrigação de subsidiar os colégios particulares, onde nada falta, em prejuízo de tantas escolas públicas onde tudo ou quase tudo escasseia.

Passo ainda mais importante a considerar nestas fasquias oficiais é saber distinguir o que pretende a Escola: fabricar robôs ou formar homens e mulheres para a futura freguesia, para a futura cidade, para o futuro país?!

E aqui reside o núcleo essencial da avaliação dos programas educativos, nos quais avulta a prestigiante figura do Docente. Por isso, expresso a minha mais elevada consideração por milhares de professores que cumprem conscientemente os princípios constitutivos do seu mandato: EDUCAR!

Do étimo e-ducere, isto é, conduzir/construir, partindo de uma margem estreita para o largo rio da vida – louvo o esforço dos construtores do amanhã que, em inúmeros casos, erguem do chão ingrato da sociedade crianças e jovens para fazer deles gente válida, Povo gigante, seja qual o seu lugar nos quadrantes sociais. E destes não vão falar os empolados ranking’s.

Serão os vencidos nas tabelas classificativas feitas, como as sondagens, ao gosto dos patronos. Mas, na verdadeira Contabilidade Nacional ou Regional, serão os lídimos Vencedores deste campeonato !!!

21.Mai21
Martins Júnior

sábado, 22 de maio de 2021

A hipocrisia do Ministério da Educação

 



Todos os anos regressa a história do ranking das escolas. E todos os anos há quem valorize o que não deve ser valorizado. Repito, aqui, parte do que escrevei, já tem uns anos:

"(...) Curiosamente, ninguém se lembra de dizer que há estudos que provam que os alunos oriundos do sector privado, nos primeiros três anos de curso superior universitário, chumbam mais que os alunos vindos do sector público. Interessante, não ? (...) Apenas a realidade que nunca é assumida. Uma coisa é o domínio da acessibilidade a um curso superior; outra, o desempenho dos alunos depois de lá entrarem. No privado, porque estão em causa pesadas mensalidades, qualquer instituição tende a forçar a aprendizagem no que interessa em detrimento de uma formação mais globalizante. Isto para além do recurso aos explicadores; no sector público são sensíveis outras preocupações. E a verdade é que, ao longo do superior, os alunos do sector público conseguem uma melhor adaptabilidade e sucesso, consequência de algumas capacidades que terão sido trabalhadas. Lamento é que muitos fiquem à porta do ensino superior por falta de recursos.

Mas, em tudo isto existe uma grave hipocrisia do Ministério. Ao mesmo tempo que assume que os "ranking's são redutores", a verdade é que são publicados. Quem os disponibiliza? Para o ministério, digo eu, os níveis ou notas de exame, deveriam assumir uma característica reservada (não publicável) visando um sério estudo (global) sobre o sistema. Nunca para colocar escolas e professores sob suspeita. Os bons e os maus. É disso que se trata. E se assim não é, pergunto, de que valeu a publicação de todos os "ranking's" anteriores? O sistema melhorou? Não. Aliás, o ministério ao possibilitar a publicação dos resultados sob a forma de ranking's, desprestigia-se a si próprio e dá um sinal (errado) à população de que o privado é melhor que o público. Não é. 

Ilustração: Google Imagens.

quinta-feira, 20 de maio de 2021

Forest School: escolas na floresta, salas sem paredes, crianças lá fora


A metodologia condiz com o conceito, nascido nos anos 50 do século XX na Escandinávia, de levar as crianças para o campo, para a floresta. Aprendizagens a céu aberto em contacto permanente com a natureza, sem esquecer a individualidade de cada ser e a importância de brincar. Sem descurar a descoberta, a observação, a partilha, a colaboração. A Forest School surgiu num ambiente natural para que as crianças assumam riscos, desenvolvam atitudes positivas, e se tornem adultos confiantes, independentes, ativos. As componentes sociais, emocionais e físicas são valorizadas todos os dias.



A Escola Lá Fora desenvolve os seus projetos Forest School desde o ano passado com um conjunto de iniciativas de aprendizagem e lazer ao ar livre de forma a reforçar a ligação das crianças com a natureza. O respeito pela individualidade e pelas características de cada criança é um dos seus princípios, bem como o respeito pelo tempo de desenvolvimento natural de cada uma. As aprendizagens acontecem na cooperação e ligação com os outros e fora de portas, na zona florestal da Quinta das Conchas, em Lisboa.

Ana Passos e Sousa, diretora técnica da Escola Lá Fora, psicóloga, com experiência na gestão e implementação de modelos pedagógicos em creches e jardins de infância, explica o que move o projeto. “Baseamo-nos no modelo Forest School, em que há uma exploração do meio natural, um grande respeito pela individualidade de cada criança – a criança como única com características muito específicas - que é importante respeitar”, refere. Uma aprendizagem ativa numa mata que as crianças conhecem e andam à vontade.

É um espaço ao ar livre como uma sala sem paredes que permite um sem fim de atividades, além de pinturas, colagens e recortes. “Fazemos muitas atividades de transformação de materiais naturais, folhas, paus, pedras, uma diversidade enorme. Há muita margem para trabalhar criativamente e na resolução de problemas”, adianta Ana Passos e Sousa. “Há muitos desafios motores pelo contexto natural, mas também construído por nós”, acrescenta.

A descrição das atividades tem espaço nas redes sociais. “Com as pás, escavámos uns buracos na terra. Juntámos água. Primeiro, batemos com as botas, depois as pernas. Depois, o resto. É um bocadinho como quando ouvimos uma música de que gostamos e não conseguimos ficar quietos. De repente, éramos todos iguais, criaturas de lama”. “Temos uma biblioteca lá fora que não tem paredes. Às vezes está numa lona à nossa espera, outras sobre rodas, num carrinho (…). Podemos consultá-la ou pedir que a leiam e não há limite: pode ser para um, para dois, ou para todos”. Há também sestas lá fora com o som dos passarinhos e os ramos das árvores a balançar.

O planeamento das atividades é definido com as crianças. “O que dá margem para tudo e mais alguma coisa”, diz a diretora técnica. A Escola Lá Fora tem pré-escolar para crianças dos três aos seis anos, a meio tempo e tempo inteiro, como um jardim de infância que funciona no exterior, e ainda atividades extracurriculares, de final de tarde, para alunos até aos 12 anos. O playgroup para bebés dos zero aos três anos, acompanhados por um cuidador, foi suspenso devido ao contexto de pandemia, e será retomado em setembro. E há ainda campos de férias.


Ana Passos e Sousa e Ana Galvão, diretora pedagógica da Escola Lá Fora, consideram que este movimento de aprendizagens ao ar livre devia ser a regra e não a exceção e defendem “uma revisão legislativa para se enquadrar as sessões educativas ao ar livre”. “É um caminho que está a começar”, repara Ana Passos e Sousa. “Este tipo de modelo não devia ser reservado a uma elite que consegue pagar uma escola privada, devia ser mais regular e acessível a todos. Devíamos levar este modelo ao maior número de crianças possível”, sublinha.

Sentir, fazer, observar, pensar

A Escola da Floresta do Movimento Bloom, associação ambiental sem fins lucrativos, quer reconectar as crianças à natureza através de experiências emocionais e divertidas, através do brincar. É um processo inspirador e uma pedagogia que permite um contacto permanente com o meio exterior e trabalha competências sociais e emocionais, o pensamento criativo, a comunicação, a resiliência, a resolução de problemas.

É uma escola que tem por base a filosofia Forest School e implementa atividades da Sharing Nature Worldwide, através da metodologia lúdico-criativa Flow Learning centrada em despertar o entusiasmo, experiência direta, focar a atenção, partilhar a inspiração. A Escola da Floresta Bloom surgiu em 2018, depois de uma candidatura a uma bolsa da Gulbenkian, com 16 turmas do 1.º Ciclo da Escola Básica da Várzea, em Sintra. A Quintinha de Monserrate, em Sintra, é a escola.

Mónica Franco trabalha com crianças e com escolas há vários anos, é coordenadora da Escola da Floresta e uma das fundadoras do Movimento Bloom. “Sentimos que as crianças estão cada vez mais desligadas da natureza e têm o seu tempo estruturado pelos adultos”, constata. E assim surgiu esta oferta que privilegia atividades ao ar livre, contacto com a natureza, construção de abrigos, jogos sensoriais e criativos, arte com objetos que o meio exterior oferece. Tudo de uma forma orgânica e natural.

“A natureza é a melhor sala de aula possível”, garante Mónica Franco. Não há um currículo definido e fechado para crianças do pré-escolar e 180 alunos do 1.º Ciclo de 10 escolas de Sintra. Por cada cinco, seis crianças, há um adulto, para que os mais novos corram, saltem, explorem a natureza, corram riscos, descubram, aprendam. “É um acompanhamento para apoiar e sustentar a aprendizagem”. As crianças são protagonistas do que aprendem.


Vinte de maio é o Dia de Aulas ao Ar Livre. Todas as escolas, de todos os níveis de ensino, Superior incluído, podem dedicar algumas horas ou o dia inteiro a atividades no exterior, em contacto com a natureza. O Movimento Bloom está na organização da iniciativa, juntamente com mais 13 países, e já há mais de 38 mil crianças e jovens inscritos. É um dia para levar as turmas para o recreio ou para a floresta, para uma mata ou bosque, para atividades lúdicas. Há várias dicas no site deste movimento global que trabalha todo o ano para que os mais novos passem mais tempo ao ar livre a aprender, a explorar, a aproveitar tanto que o mundo natural tem para dar. Carlos Neto, professor catedrático e investigador na Faculdade de Motricidade Humana, autor do livro Libertem as crianças. A urgência de brincar e ser ativo, é o embaixador do Dia de Aulas ao Ar Livre em Portugal [ler entrevista ao EDUCARE.PT].

Cátia Lopes deu aulas em Portugal durante cinco anos, licenciada em 1.º Ciclo do Ensino Básico e pós-graduada em Ensino Especial, há nove partiu para Inglaterra, passou por inúmeras escolas com os mais diversos métodos de ensino, e há ano e meio cofundou uma escola na floresta. Chama-se Being Free Being Me para crianças entre os dois e os cinco anos e fica no sudeste de Londres. É um projeto educacional e democrático ao ar livre focado “na autoaprendizagem e na criação de relacionamentos positivos e de respeito mútuo”. Cátia Lopes prepara-se para voltar para Portugal, previsivelmente ainda durante este ano, para criar uma escola na floresta em Ourém, sua terra natal. Agora, à distância, dá formação a educadores e professores portugueses e interessados no modelo Forest School.

A lista de vantagens deste modelo é extensa. “É enorme e as pessoas não têm noção”, comenta. Cátia Lopes fala do desenvolvimento emocional – e lembra que a semana dedicada à saúde mental no Reino Unido tem como foco a natureza -, destaca a parte motora e os ganhos em termos de motricidade grossa e fina também. “O facto de subirem árvores, correrem, terem os pés na terra, apanharem chuva”. Combate-se a obesidade e desenvolve-se a linguagem, o vocabulário. “As crianças que passam muito tempo no exterior desenvolvem a curiosidade natural”.


Reconectar crianças e adultos com a natureza e pensar na educação e na parentalidade de uma forma mais consciente e positiva. Estes são alguns dos objetivos do seu projeto escola na floresta. Cátia Lopes explica, no seu site, o que acontece. “As crianças decidem o que querem aprender e nós proporcionamos um ambiente seguro onde elas se conectam com outras crianças e adultos para partilhar, negociar, resolver problemas e aprender novas competências. As nossas atividades planeadas são flexíveis no sentido em que acomodam os desejos e as ideias dos mais novos”.

Uma forma de estar, uma filosofia de vida

Em 2017, surgiu a Associação Escola da Floresta – Forest School Portugal para estimular e alimentar a abordagem desse movimento. Formação, cooperação em rede e disseminação são os três grandes pilares desta estrutura que defende o programa de educação ao ar livre, no sentido de reaproximar as crianças da natureza e devolver-lhes uma “forma de vida mais harmoniosa e em contacto com o mundo que as rodeia”. É uma forma de estar, é uma filosofia de vida.

Mais recentemente, em março deste ano, surgiu o Movimento de Aprendizagem ao Ar Livre (AAL) e seu manifesto. Um movimento composto por profissionais de educação, especialistas em desenvolvimento na infância e famílias, que defende a autonomia no contexto educativo, mais oportunidades de as crianças estarem ao ar livre. Um movimento que pretende que o atual paradigma da educação seja alterado para derrubar barreiras ao desenvolvimento físico e emocional dos mais novos. Ana Passos e Sousa, Ana Galvão, Cátia Lopes, fazem parte do movimento e assinam o manifesto. Carlos Neto também.

As crianças já não vão a pé ou sozinhas para a escola, as crianças já não brincam na rua, e as estruturas familiares sofreram mudanças profundas. “Está na altura de, em Portugal, tornar acessíveis a todas as crianças respostas educativas mais diversificadas, que desenvolvam as atividades pedagógicas e curriculares ao ar livre, viabilizando que estas sejam consideradas serviços educativos formais pelo Ministério da Educação”, lê-se no manifesto. Há bastante literatura científica e dados que comprovam os benefícios do contacto com o exterior, impactos no bem-estar e desenvolvimento físico, cognitivo e emocional dos mais novos, nas competências e capacidades inatas de experimentar e cooperar, na exploração e conhecimento do mundo à volta.

A resiliência, a colaboração, a resolução de conflitos, a comunicação, o raciocínio, a capacidade de interação, a autorregulação, saem a ganhar com o contacto com o mundo exterior. O movimento lembra que o enquadramento legal não contempla o funcionamento de serviços educativos no pré-escolar sobretudo ao ar livre, nomeadamente ao nível de instalações. Por isso, pede que a legislação seja revista para, sustenta, “tornar viável a existência de novos serviços educativos menos dependentes de infraestruturas e que funcionem essencialmente no exterior, cumprindo todos os requisitos pedagógicos atuais”.


O movimento avança com várias propostas, nomeadamente condições de segurança para atividades ao ar livre, um rácio máximo de seis crianças por adulto e grupos máximos de 18 crianças, e que todas as escolas do 1.º Ciclo tenham, no mínimo, cinco horas semanais ao ar livre com estratégias que promovam a cooperação e a livre exploração do contexto exterior. Na Escócia, exemplifica o grupo, a educação pré-escolar pode funcionar exclusivamente ao ar livre com o apoio do Governo. E a Alemanha é, adianta, “o país com o sistema formal de escolaridade ao ar livre mais amplo do mundo”, onde as atividades decorrem essencialmente ao ar livre no pré-escolar.

Fonte: Educare

sábado, 15 de maio de 2021

Apregoam-se valores, praticam-se conveniências


Por
Santana Castilho*
no Público, 12/5/2021

1. O Supremo Tribunal Administrativo deu razão a Joaquim Sousa, professor de geografia e antigo director da Escola Básica 123 do Curral das Freiras, e mandou pagar-lhe os vencimentos relativos a seis meses de suspensão, com que foi castigado na sequência de um procedimento disciplinar.



Joaquim Sousa foi o obreiro principal do projecto educativo que levou a escola da vila mais pobre e isolada da Madeira a ser considerada, em 2016, uma escola modelo, tão-só a melhor escola pública no exame de Português do 9.º ano de 2015. De nada lhe valeu o apoio da opinião pública e os apelos feitos ao Presidente da República, aos partidos com assento no parlamento regional e respectivo governo. Os burocratas de serviço falaram mais alto.

Do meu posto de observação segui o kafkiano processo e fui lendo testemunhos de professores e alunos de uma escola profundamente humanizada por Joaquim Sousa. E se nada disse na altura foi porque Bárbara Reis, aqui, em 29 de Março de 2019, disse tudo. A Joaquim Sousa pagaram agora os salários, injustamente sonegados. Mas mandaria a decência mínima que lhe pedissem desculpa pela violência indizível que manchou a honra de um Professor, que acertou, num reino de desacertos. Tanto mais que, por ele, marcaram-lhe, também, a mulher e dois filhos e extinguiram, por via escabrosa, a sua escola modelo. Tudo o que dela resta piorou. Mas tudo parece cumprir, agora, a bíblia dos imprestáveis: o regulamento.

Esta saga mostra que, 47 anos depois, na mente capta de muitos dirigentes públicos, persistem os três grandes princípios da administração pública de outrora: não te rales mas não te entales, a iniciativa vem sempre de cima e nunca ninguém foi castigado por não fazer nada.

2. Inês Trindade, doutorada em Psicologia Clínica e investigadora em medicina comportamental, emigrou aos 30 anos, revoltada por não conseguir sobreviver em Portugal. Contou aqui a sua história (Balada de despedida: a insustentabilidade das carreiras científicas em Portugal, Público de 12.3.21). A balada de despedida desta cientista é um libelo acusatório (mais um) à Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), que acusa, com exemplos graves, de controlar de modo iníquo e arbitrário a maior parte do financiamento para a ciência. Referindo-se a um concurso de que saiu vencida (Estímulo ao Emprego Científico), disse Inês Trindade que as suas “métricas científicas eram equivalentes às dos cinco investigadores melhor classificados, juntos”, coisa que acontece, afirmou, constantemente, há anos. E falou de outros cientistas que “ficam largos meses desempregados à espera de burocracias infindáveis, ou simplesmente a trabalhar gratuitamente na esperança de um dia obter uma posição”.

3. Estes dois flagrantes da nossa vida colectiva, somados ao debate sobre o Novo Banco ou sobre os acontecimentos de Odemira, são um retrato do país. As crises sucessivas do nosso viver colectivo, da bancarrota de Sócrates à pandemia de Costa, passando pela troika de Passos, mostraram que os gananciosos e os oportunistas políticos apenas tiveram de alterar as formas de manter os seus indecorosos lucros e poder. Porque a demagogia dos discursos esconde sempre que, na política, a única coisa que a dita são os interesses e o poder.

Bem pode António Costa fazer a apologia da solidariedade social, para a Europa ouvir, que a boçalidade consentida de Eduardo Cabrita e a grunhice ignorada de João Galamba dizem o quê e quem ele protege. Bem pode Tiago Brandão Rodrigues, também para a Europa ouvir, proclamar que Portugal “é orgulhosamente conhecido como país que está na vanguarda da inclusão” que, quando já ninguém se lembrar dele, ainda todos estaremos a pagar o custo das suas medidas paroquiais, que criaram um sistema de ensino cada vez menos fermento de espírito crítico e alforge de competências para ler o mundo de forma livre, mas cada vez mais vergado a teorias pedagógicas datadas e às necessidades de um deus mercado de serviços de baixo valor.

Apregoam-se valores, praticam-se conveniências. A propósito, António Costa poderia estar mais atento à imprensa internacional, antes de dizer que não há capacidade de produção de vacinas. Se as patentes fossem levantadas, há fábricas disponíveis para produzir centenas de milhões. Tem a lista aqui: AP News, 1.3.21 e The Guardian, 24.4.21.

*Professor do ensino superior

sexta-feira, 14 de maio de 2021

Novos corpos gerantes do Sindicato de Professores

 

O Sindicato de Professores da Madeira iniciará, no próximo dia 19, um novo triénio na sequência das eleições ontem realizadas para os corpos gerentes. A liderança continuará assegurada pelo coordenador Dr. Francisco Oliveira.



Tive o privilégio de pertencer a esta equipa nos últimos dois mandatos, enquanto presidente da mesa da Assembleia Geral de Professores. Acompanhei-os nessa difícil tarefa, não a minha, porque circunscrita às assembleias gerais, mas a da Executiva. Concluí, no dia-a-dia, aquilo que há muito sabia: não é fácil o trabalho sindical. É complexo e exigente porque faz apelo, a todo o momento, à leitura política e jurídica de tudo o que envolve os educadores e professores, a permanente negociação, normalmente de sentidos contrários e, naturalmente, a formação permanente dos associados. 

Acresce dizer que os tempos e os ventos não são de feição. As incompreensões do poder são enormes, falam muito mas cumprem pouco, a intolerável pressão exercida sobre os profissionais da educação através de uma inexplicável burocracia, a centralização do poder e a concomitante estrangulamento da autonomia das escolas, o bloqueio da Assembleia Legislativa às propostas de debate do sindicato, apresentadas pelos partidos da oposição, as questões relacionadas com a extensa listagem de âmbito legislativo, a precariedade, eu sei lá a extensão do rol de tarefas diárias com as quais os sindicalistas se confrontam.

Mas "é preciso acreditar" como escreveu o Coordenador do Sindicato, Dr. Francisco Oliveira: "(...) ao contrário do que muitos mais pensam, também não é fácil ser sindicalista; não é fácil carregar com os problemas de toda uma classe profissional e fazê-la acreditar que os direitos não caem do céu, antes se conquistam, quase sempre, em longas lutas; não é fácil fazer ver que os direitos profissionais fundamentais são inegociáveis; não é fácil, nos dias de hoje, a vida dos sindicatos, em geral, e dos sindicalistas, em particular. Na verdade, a opinião pública está repleta de ideias deturpadas em relação à realidade laboral, com tendência a apresentar os sindicatos como organizações cristalizadas num tempo que já não existe, lutando por ideais há muito alcançados e em que já poucos se reveem. Falso, os sindicatos continuam a ser essenciais para o equilíbrio das tensões laborais e para a garantia de direitos que já deveriam estar consagrados, mas não estão. É isso o que tem feito, desde 1978, o SPM (...)".


O trabalho continuará nos próximos três anos. Desejo a todos as maiores felicidades ao mesmo tempo que lhes agradeço a simpatia destes seis anos em que fiz parte da equipa. Muita determinação é o que desejo. Em função das minhas profundas convicções, gostaria que, neste mandato, fosse dada uma ênfase especial na formação dos professores, na de base técnico-científica, obviamente, mas sobretudo na mudança de mentalidade que conduza a escolas que pugnem por uma aprendizagem consequente. E que as crianças e jovens dos estabelecimentos de aprendizagem passem a gostar da escola. Isso implica muita mudança estrutural e de PENSAMENTO. Felicidades.

Ilustração: Google Imagens.

quinta-feira, 13 de maio de 2021

Dificuldades de leitura dos jovens são "preocupantes"

 

O Ministério da Educação considera preocupantes as dificuldades de leitura dos jovens portugueses, mas acredita que é possível aprender, estando em curso projetos para recuperar hábitos e capacidades de leitura.

Nota
A pergunta que coloco é esta: não será este um indicador, claro, da falência do sistema educativo, dos currículos, dos programas e da própria organização dos estabelecimentos de aprendizagem? Estou convicto que se assim continuarem, Portugal não apresentará melhores resultados, mesmo que recorram a mais escola, simplesmente porque, processos iguais resultam em resultados iguais.



Metade dos alunos portugueses de 15 anos não consegue distinguir entre facto e opinião quando está a navegar na Internet, segundo o relatório "Leitores do séc. XXI: desenvolver competências de leitura num mundo digital", divulgado esta terça-feira pela OCDE, que mostra que o interesse pela leitura tem vindo a diminuir nos últimos anos.

"São resultados preocupantes quanto temos maus desempenhos, mas são também fontes para continuarmos alguns caminhos que já tínhamos iniciado ou para iniciar novas frentes", disse o secretário de Estado Adjunto e da Educação, João Costa, em declarações à Lusa, referindo-se ao novo relatório do Programme for International Student Assessment (PISA) de 2018.

Sobre os novos projetos, o responsável explicou que está em curso, para começar no próximo ano, um projeto de recuperação de aprendizagens e que já "é unânime que tem de haver um esforço muito grande na recuperação de hábitos de leitura e de capacidades de leitura, que são fundamentais".

Em 2018, a percentagem de alunos portugueses com computador e Internet era superior à média da OCDE, mas esse acesso nem sempre significa melhores aprendizagens: "Tem de estar associado a saber ler em vários suportes e à capacidade de criar ambientes ricos em leitura", salientou João Costa.

"Nós vivemos num meio de montanhas e montanhas de informação, mas informação não significa conhecimento. O papel da escola é transformar a informação em conhecimento", disse, sublinhando que a "escola é cada vez mais um lugar de validação e fiabilidade do conhecimento científico".

O relatório do PISA hoje divulgado mostra que os jovens, identificados como nativos digitais, têm dificuldades em selecionar informação e perceber quais as fontes credíveis.

"Aprender a ser leitor nesta realidade diferente, em que não há livros únicos nem pontos de informação únicos, implica também trabalhar a crítica, a avaliação e o contraste entre diferentes fontes. Isto é uma forma diferente mas urgente de trabalhar a leitura", explicou João Costa.

Sobre a incapacidade de distinguir entre o que é um facto e uma opinião, quando se está a ler um texto, o governante e linguista defendeu que "se aprende".

João Costa deu como exemplo os professores de Português que ensinam os alunos a identificar o que são factos e opiniões assim como as iniciativas na área da literacia de informação e dos media nas aulas de cidadania.

Também o diretor da OCDE para a Educação, Andreas Schleider, defendeu hoje "as escolas podem mudar esta realidade".

Mas, para o diretor da OCDE, esta é uma missão em que "não basta transmitir conhecimento, é preciso cativar os jovens", até porque quando se interessam por um assunto "têm uma energia infinita e conseguem passar horas seguidas envolvidos num tema".

Em Portugal, pouco mais de metade dos alunos (55%) disse ter recebido formação na escola sobre como reconhecer se uma informação é ou não tendenciosa e, contrariando a tendência dos países da OCDE, foram os alunos de escolas desfavorecidas quem mais aprendeu sobre competências de literacia digital nas escolas.

O estudo do PISA alerta também para o facto de os jovens que mais livros leem estarem mais preparados para navegar na Internet. O problema é que o gosto pela leitura está a diminuir entre os jovens, alerta o documento.

Incentivar o gosto pela leitura é outro dos projetos no terreno desde 2018, com as aprendizagens essenciais na área do Português.

As aprendizagens essenciais vieram tornar "mais explícito que há duas dimensões no próprio currículo": por um lado a educação literária, que permite aos alunos conhecer diferentes momentos da história da literatura e diferentes autores; e por outro os contratos de leitura, para que possam ler aquilo que gostam, lembrou o secretário de estado.

Neste último caso, a sala de aula transforma-se num espaço de troca de impressões em que se pode "ler o livro que apetece ler", explicou João Costa, lembrando que esse contrato de leitura remete, em primeira instância, para as listas do Plano Nacional de Leitura, que apresentam milhares de livros de autores portugueses, mas também estrangeiros.

A reformulação do Plano Nacional de Leitura, a formação de comunidades leitoras nas escolas e a rede de bibliotecas escolares são alguns dos projetos para fomentar a leitura por prazer.

"Porque é que isto está nos programas? Porque gostar de ler não é como gostar de futebol ou de batatas fritas. Quero que os alunos gostem de ler porque a competência leitora é uma condição para a sua liberdade, cidadania e capacidade de ter sucesso e um bom desenvolvimento ao longo da vida", sublinhou João Costa.


Fonte: RR por indicação de Livresco. Blogue: Incluso.

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Oiçam...


Não se constrói o futuro com os manuais digitais. Esses são uma mistificação. Tampouco, nas pomposamente ditas "salas de aula do futuro". O problema é mais profundo, é de mentalidade e de projecto politicamente sério e honesto. É de autonomia e limitação da burocracia. É de formação adequada. O problema está em gerar pensamento sobre este importantíssimo sector: o da Educação. Que não existe! Ademais, não se antecipa o futuro com atitudes isoladas e descontextualizadas. Oiçam...


sábado, 8 de maio de 2021

Formação - fazer de forma diferente é complicado!

 

Termina esta tarde o VII Web Seminário da Educação: Educar, Inovar e Incluir – Ousar o impossível pela Educação, organizado pela Câmara Municipal de Câmara de Lobos - Madeira, em parceria com a Universidade Aberta. Trata-se de um título motivador. Tem espaço para escutar e debater as grandes questões que se colocam ao sistema educativo. Só que, a formação, sendo de uma importância fulcral, só o é se for consequente. E a realidade é esta: a esmagadora maioria das formações destinadas a professores não são consequentes. São desenvolvidos pensamentos estruturantes, os professores somam uns créditos, obrigatórios, para a progressão na carreira, mas muito pouco ou nada acrescentam à necessária e imprescindível mudança. Porque o "patrão" não quer!




Aliás, a par de tantas e tantas acções de formação que todos os anos acontecem, se olharmos para o filme de décadas, a questão que se coloca é esta: o que restou no sentido da transformação de uma situação real em uma situação ideal? Portanto, obviamente que dou parabéns às organizações de eventos desta natureza, particularmente à Câmara Municipal de Câmara de Lobos, mas olho para isto com tristeza pela incapacidade ou indisponibilidade do governo para uma alteração substantiva no processo de aprendizagem.

No convite da autarquia li sobre um dos oradores: "Alex Beard estará presente na sessão de abertura com a temática: "A revolução na aprendizagem: uma aventura à volta do mundo e adentro (rumo) do futuro da educação. (...)  É autor do livro Natural Born Learners (2018), um guia do utilizador para transformar a aprendizagem no século XXI. (...) Num mundo em que tudo se está a esgotar, a inteligência humana é nosso último e ilimitado recurso. Se quisermos superar os desafios globais da automação, globalização, da crescente desigualdade e da mudança climática, precisamos de aproveitá-la ao máximo. Mas o que é que os nossos filhos devem aprender? Como é que a próxima geração poderá realizar da melhor forma o seu potencial? Qual será o papel das novas tecnologias? O que é que as mais recentes teorias da educação nos poderão ensinar? Qual é o futuro do ensino?"

Ora bem, perguntas, eu diria, perfeitas. Há anos ditas e repetidas. Só que de  inconsequentes respostas, pois esbarram na mentalidade política reinante, onde a rotina, a circular, o ofício, o despacho, o telefonema e o controlo exercido através da burocracia acabam por matar, completamente, qualquer ímpeto que brote daqueles que sentem a necessidade de colocar a aprendizagem com os olhos postos no futuro. Juntam-se, ainda, os currículos, os programas, a noção de turma e de aula, a arquitectura dos edifícios, o número de alunos por escola, a inspecção "big brother" e sei lá mais o quê, e tudo isto acaba em um cocktail amargo que impede a resposta cabal à pergunta dos organizadores: "como é que a próxima geração poderá realizar da melhor forma o seu potencial?" Dos adultos, sinceramente, pouco ou nada espero. Talvez a pergunta deva ser colocada aos jovens. Os adultos, após ouvirem vários palestrantes, saem de cabeça e coração cheios, porém, no dia seguinte, regressam à maldita e enervante rotina, aos procedimentos que a linha hierárquica superior determina do alto do seu nefasto pódio. E tudo regressa ao mesmo. Repito, talvez os jovens pudessem dar uma ajuda aos adultos políticos, sobretudo porque eles sabem o que não querem que o sector educativo seja. Ou, então, tais personagens deviam seguir o documentário, de 13 episódios "A Outra Escola", produzido pela RTP2. Seria um bom passo. Ou então, ainda, procurar a série Merlí onde é assumido que "há qualquer coisa de podre na Educação".


"Ousar o impossível pela Educação". A frase agrada-me, aliás, há mais de cinquenta anos que leio tantos autores com idêntica preocupação. Contextualizo e bem a palavra "ousar", já nem tanto a palavra "impossível", apesar de reconhecer a sua abrangência neste contexto. Porque na aprendizagem não existem impossíveis, mas saudáveis utopias que sugeram caminhos sem fim. Trago em memória Fernando Birri, citado por Eduardo Galeano in Las palabras andantes?, de Eduardo Galeano, publicado por Siglo XXI, 1994: "A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar." É este sentido, o sentido de caminhar, que não existe na mentalidade política, talvez porque dê muito trabalho e, portanto, pensarão, mais vale manter a actual configuração do sistema, com as rédeas na mão, com alguns acertos de pormenor, nas margens, é certo, mas sempre com a preocupação de não mexer no âmago.

A palavra "ousar" não é permitida. Neste sistema, quem ousa, pode ter à perna um qualquer burocrata da inspecção, supervisionado pelo "patrão". O sistema precisa de arrojo e coragem, isto é, precisa de arriscar sem medo mas com ponderação, isso é determinante, porém o problema é que as escolas estão organizadas com um determinado formato, "uma ou outra andorinha não fazem Primavera", as direcções, genericamente, são obedientes e sentem que a sua autonomia apenas está no papel, logo, o efeito de absorção dá-se com naturalidade. E tudo continua no quadro de uma paz podre e sem futuro.

É impossível ser prospectivo neste sistema. Olhar para o futuro e trazê-lo ao presente, implicaria transformar, eu diria, radicalmente, todo o sistema, para que a Escola fosse portadora de futuro. Não há coragem para "deitar o sistema no divã", qual metáfora, para uma psicanálise que resgate a História e todo o processo mental condicionador. Enquanto não se optar por um debate sério e profundo, conducente a uma mudança, paulatina mas segura, enquanto não se puser em causa a Escola e o que lá acontece, jamais se conseguirá sair do labirinto e jamais existirá a resposta à pergunta dos organizadores: "Qual é o futuro do ensino?" A continuar assim, por mais formações que aconteçam, o futuro do ensino é não ter futuro.

Ilustração: Google Imagens.

quinta-feira, 6 de maio de 2021

E o secretário continua fechado em copas!


Comunicado 

Recebi da parte da defesa do Professor Joaquim José de Sousa o comunicado que aqui deixo, uma vez que pode interessar a todos os que têm acompanhado este processo. O comunicado constitui uma resposta às posições (também em comunicado) que têm vindo a ser assumidas pela secretaria regional da Educação.



A família do Professor Joaquim Sousa esclarece:
 
a. O Supremo Tribunal Administrativo negou provimento ao recurso da Secretaria Regional de Educação da Madeira e manteve a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal. O que significa que GANHAMOS o diferendo que mantínhamos com a Secretaria Regional de Educação da Madeira desde 11 de Março de 2019, data em que esta suspendeu o Prof. Joaquim José Sousa por 180 dias sem vencimento. 

b. A Secretaria Regional de Educação no seu comunicado, como o fez no processo contra o Prof. Joaquim José Sousa infere, conclui e divulga que: 

c. Ponto 2 – A SRE chama Joaquim Batalha ao Prof. Joaquim Sousa retirando-lhe personalidade e procurando menorizá-lo; 

d. Ponto 4 – A SRE afirma que o processo consistia numa Providência Cautelar – não é verdade, a providência cautelar visava interromper a suspensão do Professor (suspensão que o TAFF decidiu e que o próprio Secretário inviabilizou com o argumento que o Professor representava um perigo para a Comunidade Educativa) tendo no entanto a defesa solicitado ao Tribunal que para além de analisar o mérito do processo, analisasse o próprio processo – tendo a defesa junto documentos que poderiam “levar o tribunal a antecipar o juízo sobre a causa principal e a proferir decisão que constitua a decisão final do processo, tão simples e notória é, a prescrição que desde logo fulmina todo o processo (1)” o que Tribunal constatou; 


e. Ponto 5 – A SRE afirma que “a pena iniciou-se sem que o Tribunal, oportunamente, se tenha pronunciado” – omitindo que a 9 de maio o Tribunal pronunciou-se “pela suspensão do ato administrativo (vulgo suspensão) sob o professor (2)” que o próprio Secretário contestou afirmando/ escrevendo ao Tribunal que a suspensão da pena “irá acima de tudo penalizar o pessoal discente e os pais e encarregados de educação” (3) o Secretário da educação conscientemente conduziu a sua resposta para ir contra um direito (a presunção de inocência) intervindo no exercício das suas funções, com a intenção de por essa forma prejudicar o professor e a sua família; 

f. Ponto 6 – Não só Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal como o Tribunal Central Administrativo do Sul e o Supremo Tribunal Administrativo; 

g. Ponto 9 – errado - efetivamente a primeira sentença do Tribunal Central Administrativo do Sul foi essa, tendo o mesmo tribunal corrigido a sua própria sentença tendo “O TCA/S confirmou o juízo que havia sido firmado pelo TAF/F” (4); 

h. Ponto 12 – efetivamente todas as decisões dos diferentes tribunais foram de encontro ao que o professor sempre disse, o processo foi mal instruído (escolheram a instrutora por fidelidade e não por competência) e no decorrer do processo, direitos fundamentais foram suprimidos, como tal se não fosse pelos prazos seria por outra razão que levaria à ANULABILIDADE DA DECISÃO. 
 
  • PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO (5) – as normas existem, a SRE tem juristas, inspetores e sabe bem disso, não cumpriram porque colocaram a fazer o processo alguém que não sabia nem tinha competência para o fazer. 1. In providência cautelar – 153/19.4BEFUN – Acção Principal 2. In processo cautelar 153/19.4BEFUN do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal; 3. In Resolução Fundamentada do Secretário Regional de Educação de 29 de maio de 2019 - processo cautelar 153/19.4BEFUN 4. In apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 5. – cfr. n.º 5, do art. 178.º, da LTFP 
  • VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO GERAL DE IMPARCIALIDADE 6 – desde o início que a instrução definiu o culpado e depois tudo o que foi feito, foi para dar a ideia de uma culpa que sabiam não existir, quando as provas não o comprovaram – desapareceram – e a partir daí temos um processo fundamentado em (penso que, entendo que, acho que , interpreto como) e as testemunhas bem deu jeito ter em 26 testemunhas uma contrariasse as outras todas (que testemunharam pelo Prof. Joaquim José Sousa) e disse tudo o que a professora requisitada queria – professora essa que tem um processo disciplinar na IRE e queixa no Ministério Público por ter mentido em quase tudo o que disse ( doc em anexo) – como prémio ficou no gabinete onde estavam as atas da escola do Curral das Freiras que convenientemente desapareceram; 
  • ILEGITIMIDADE DA INSTRUTORA (7) – a lei é clara se a instrução não for feita por um inspetor de carreira terá de ser feita por um superior hierárquico do visado – não, foi feita por uma “professora requisitada para o efeito”; 
  • ACUSAÇÃO PARCIAL (8) – o órgão era colegial, mas apenas 1 foi acusado de atos que nem sequer estavam sobre a sua responsabilidade direta como atestam regimentos da escola e as atas que convenientemente desapareceram; 
  • OMISSÃO DE PRONÚNCIA (9) – que para lá da violação repetida do princípio da imparcialidade desde o início marcou o processo, pedi diferentes vezes para ser ouvido e nunca fui, os restantes membros do conselho executivo foram; i.  
Ponto 13 – efetivamente todas as decisões dos diferentes tribunais foram de encontro ao que o professor sempre disse, o processo foi mal instruído; 

Ponto 14 – O professor não tem culpa da “incompetência da instrutora” nem da sanha persecutória do próprio Secretario Regional de Educação, que levou a que desconsiderassem os procedimentos legais e optassem pelo faz-se assim porque eu quero. No entanto o Senhor Professor considera-se lesado com a incompetência aferida e está disponível para debater em canal aberto e em direto todo o processo com o Sr. Secretário da Educação ou com o Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira; 

Funchal, 4 de maio de 2021 

6 ART. 9.º, DO CPA E 32.º DA CRP 7 n.º 1, do art. 208.º, da LGTFP 8 princípio da igualdade constitucionalmente resguardado no art. 13.º, da CRP 9 Nulidade da sentença por omissão de pronúncia; alínea d) do n.º1, do artigo 615º, do código de processo civil (de 2013); ordem de conhecimento das excepções; inimpugnabilidade do acto; legitimidade activa; artigo 89º do código de processo nos tribunais administrativos (de 2002)

segunda-feira, 3 de maio de 2021

Ana Benavente - a Mulher que desejou refundar a escola que herdámos


É um desespero assistir ao que se passa na política educativa. Está em contraciclo à velocidade dos tempos. Talvez, por isso, há muito que tenho na minha agenda uma nota no sentido de escrever sobre a Doutora Ana Benavente, figura que foi Secretária de Estado da Educação. Tenho por ela uma enormíssima consideração, porque acompanhei as funções que desempenhou, estima essa pelo seu percurso de vida e também pelos valores sociais que a definem. Isto, apesar dos nossos contactos pessoais terem sido escassos. Um dia, a propósito de um convite para uma palestra que a Escola Gonçalves Zarco lhe dirigiu, sessão essa que também tive a honra de participar por convite do Dr. Rui Caetano, ao tempo presidente do Conselho Directivo, acabámos por jantar na minha casa. Foi uma noite extremamente agradável onde pudemos trocar ideias sobre a complexidade da profissão que nos une e das políticas que seriam necessárias o país desencadear. 



Desde logo, tenho pena que esta Mulher de princípios e de valores, que olha a Escola a montante da sociedade e a sua organização a jusante, não esteja ao mais alto nível na condução da política educativa. Lamento, pelo que ela fez no tempo que assumiu responsabilidades governativas, em função do marasmo no qual figuras políticas seguintes deixaram o sistema mergulhar. Entregou-se a responsabilidade da Educação a pessoas menos qualificadas para tal exercício. Entregou-se a quem estava a seguir na lista partidária e não pela competência.

Ana Benavente é uma Mulher de mão cheia. Teve a coragem, no tempo da ditadura, de viver na clandestinidade. Exilou-se na Suíça, país onde mais tarde se doutorou, em Ciências da Educação, pela Universidade de Genève. Li em uma entrevista, que, em Genève, nos primeiros tempos, "trabalhou sempre para estudar (fábricas, escritórios, dactilografia de sebentas, empacotar jornais, um pouco de tudo) e só no terceiro ano conseguiu uma pequena bolsa para refugiados que permitiu então trabalhar apenas durante as férias. Nessa primavera, viveu o Maio de 68 e tais acontecimentos marcaram a sua plena integração na Universidade - era aluna de psicologia no Institut Jean-Jacques Rousseau, dirigido por Jean Piaget." Nessa entrevista, conduzida por Margarida Louro Felgueiras e Anabela Amaral, achei curiosa esta passagem: "(...) já no meu 7º ano "fugia" do liceu para ir ao Estádio Universitário assistir aos comícios da luta estudantil - crise académica de 1962 - que ficaria para a história como a primeira revolta estudantil pela liberdade e cujos ecos nos iam chegando em surdina pelas colegas de liceu que tinham irmãos. Logo nos meus primeiros dias na Faculdade, inscrevi-me na Pró-Associação de Letras, cujo presidente era o José Medeiros Ferreira."

Mais tarde, após o seu regresso a Portugal, do seu cv consta que "conduziu projectos de investigação-acção e vários estudos sobre exclusão escolar e coordenou o primeiro Estudo Nacional de Literacia. Foi Vice-presidente (eleita pela Europa) do Conselho Geral do BIE (Bureau International de I’Education), UNESCO, Genève (2001-2005). Membro do Comité do CERI (Centre pour la recherche et l’innovation) da OCDE (1996-2002). Deputada à Assembleia da República (1995-2005) e Secretária de Estado da Educação (1995-2001), nos XIII e XIV governos constitucionais. (...) Foi representante governamental junto de agências internacionais na Europa, África, América, Austrália e Japão. Tem uma vasta obra publicada e centenas de participações em Colóquios, Conferências e Congressos, nacionais e internacionais. Actualmente, ainda prossegue actividades de consultoria internacional e é professora na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, nos cursos de mestrado e doutoramento".

Pergunto, quantos em Portugal, apesar desta ser uma síntese de tudo quanto fez na Educação, podem apresentar semelhante currículo. Não está a governar, esta é a minha leitura, porque tem uma coluna rígida e não se arrasta pelos corredores dos interesses político-partidários.


Ao contrário de outros, Ana Benavente sabe do que fala. É investigadora. Estudou a sociedade e, portanto, assume no quadro da necessária mudança de paradigma que: "A Escola é socialmente produzida e, portanto, socialmente transformável". É essa luta pela transformação que sempre a guiou. Reproduzo aqui uma parte da entrevista que acima referi, porque define bem o seu posicionamento relativamente a diversas matérias:

No desempenho do cargo de Secretária de Estado da Educação que prioridades definiu com base na sua experiência de viagens e no seu ideário de liberdade? 

Não foi difícil estabelecer prioridades que continuo a considerar actuais: uma Educação para Todos (EPT) com qualidade, o que exige assegurar autonomia às escolas, desburocratizar o sistema, apoiar as escolas nas comunidades (científicas, económicas, sociais), enraizá-las não apenas nos saberes "sábios" mas nos saberes libertadores que permitem continuar a aprender ao longo da vida. Assim, destacarei, a esta distância, cinco pedras de toque do trabalho que desenvolvi, em equipa, durante seis anos (de 1995 a 2001) e sobre o qual publiquei vários textos, nomeadamente na Revista Ibero-Americana de Educação (OEI) que nos diz respeito a todos, ibéricos, e que pode ser lida on-line. 
1. O desenvolvimento da educação pré-escolar para todas as crianças foi um avanço inquestionável para uma escola pública que quero democrática de facto e não apenas nas palavras. Educação pré-escolar como espaço e tempo inteligentes de desenvolvimento e de socialização e não de anticipação das aprendizagens escolares. 
2. Proposta de um "Pacto Educativo para o futuro" (ver Revista da OE!) que garantisse a continuidade política de eixos estruturantes das necessárias transformações da escola sem a deixar, como hoje continua, prisioneira dos tempos políticos e das fantasias e ignorâncias de quem ocupa os cargos executivos. Sabemos que a inovação educativa é de lenta construção (para ser sustentável e significativa) e que os seus resultados só podem, de facto, ser avaliados, no espaço de uma geração. É um tempo institucional contraditório com os tempos eleitorais, rápidos e bruscos, imprevisíveis e sempre preocupados com o show-off das campanhas. Garantir a descentralização e a autonomia das escolas, o desenvolvimento da educação pré-escolar, a valorização dos docentes e outros técnicos e funcionários, flexibilizar os curricula sem perder um núcleo nacional estruturante, garantir oportunidades de formação aos mais excluídos, eis alguns dos objectivos desse Pacto. Recusado no Parlamento e pelos Sindicatos de Professores, permitiu, no entanto, celebrar protocolos com autarquias, associações de pais e outros parceiros. Mas falhou, no país latino e velho que somos, pouco dado a trabalho sério, silencioso e continuado. 

3. Definimos, em documentos publicados e debatidos nas escolas, orientações de médio e longo prazo para o ensino básico e para o ensino secundário (assim como para o ensino superior, não sendo este da minha responsabilidade directa). Qualquer caminho é bom quando não sabemos onde queremos chegar. Sabíamos então o que queríamos e como caminhar: envolvendo todos os parceiros e, em primeiro lugar, os professores e outros actores da escola e da educação. Criar condições para a sua valorização social e profissional, assegurando o apoio ao trabalho de qualidade. Romper (ir rompendo) alguns tabus da escola tradicional que a tornam produtora de exclusão: a rígida divisão disciplinar herdada de séculos passados, os horários tayloristas, com o toque de campainha de 50 em 50 minutos, as aulas expositivas e tradicionais em que se quer ensinar o mesmo, ao mesmo tempo e da mesma maneira a todos os alunos, as representações profundamente enraizadas, nomeadamente as que que identificam exigência e rigor com insucesso e com exclusão. Estas orientações alimentaram processos inovadores que se iniciaram com 10 escolas e envolveram, quatro anos depois, mais de 200 escolas. A "gestão curricular flexível'; assim ficou conhecido esse processo, baseou-se nas "boas práticas" construídas nas escolas e criou condições para a sua consolidação e o seu desenvolvimento. 


4. O quarto ponto que quero destacar é o da luta imediata contra a exclusão. A escola pública não pode conviver com a expulsão (quer se designe insucesso ou abandono) escolar de quem mais precisa da escola. Assim, diversas medidas, desde os currículos alternativos à criação de Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, foram desenvolvidas para assegurar a aprendizagem dos mais vulneráveis e daqueles que, pela sua origem, história ou condições de vida, não se integravam no padrão único da escola única (sendo que igualdade, como sabemos, não significa ser "indiferente às diferenças" mas sim praticar a equidade, assegurando a todos, por caminhos diversos, as mesmas aprendizagens e diplomas - refiro-me aqui, evidentemente, à escolaridade obrigatória). No caso do ensino secundário, em que os processos de exclusão, sendo menos escandalosos são igualmente selectivos, procedeu-se a uma reorganização e revisão curriculares assegurando a todos percursos que, continuados ou não de imediato no ensino superior, lhes permitissem voltar à formação ao longo da vida. Curiosamente, quando a selecção é mais invisível e escondida, convive-se melhor com ela. Quando se assume que, após o 9º ano, há orientações diferentes, grita-se que se estão a introduzir desigualdades. Hipocrisias sociais que vivemos em muitos espaços, sendo a escola apenas mais um. O que é lamentável é serem muitas vezes os que deviam lutar pela escola democrática- e falo aqui de sindicalistas e de responsáveis académicos - os primeiros a preferir a ignorância, com medo de sujarem as mãos na luta pela Educação para Todos, de facto e não apenas como um slogan para tranquilizar consciências. 
5. Como quinto ponto das minhas prioridades, destacarei a educação de adultos. Num país de baixo nível de literacia, era urgente ultrapassar as tradicionais barreiras de territórios entre educação e formação. Isso foi feito com a criação dos cursos EFA (Educação e Formação de Adultos) e com a criação do sistema de Reconhecimento, Validação e Certificação de competências adquiridas durante a vida. Criaram-se, com todo o rigor e com critérios académicos e pedagógicos claros, os primeiros centros de RVCC. A Agência de Educação e Formação de Adultos protagonizou esta área de actividade. Duas notas finais de resposta a uma pergunta sem fim: 1• nota - o desporto escolar, a educação para a saúde (incluindo a educação sexual), o ensino do português no estrangeiro não apenas como língua de emigração mas como língua europeia de seu pleno direito, a formação contínua de professores, formação para a mudança e para a reflexão crítica sobre as práticas foram também áreas em que investi muito do meu imenso querer e dos meus (mais limitados) saber e poder. 2• nota - este trabalho foi desenvolvido em equipa, com colaboradores preciosos, uns mais convictos do que outros. Quero destacar o Prof. Alberto Melo, meu querido amigo, cujo trabalho foi fundamental na educação de adultos e o Prof. Paulo Abrantes, querido colega da Universidade de Lisboa, modesto e brilhante, que já nos deixou e que foi a alma do trabalho realizado no ensino básico. Uma referência ainda a Philippe Perrenoud, meu colega em Genève que aceitou, com amizade, ser consultor das mudanças que se foram construindo na escola portuguesa durante os seis anos em que tive responsabilidades executivas. E obrigada aos alunos e aos professores, evidentemente, sem os quais a escola não tem qualquer sentido. Se me perguntarem hoje o que ficou destes anos direi que ficou muito e que ficou muito pouco. Ficou muito porque a história se constrói com avanços pioneiros e nada nem ninguém pode apagar o valor das experiências vividas. Ficou muito pouco porque logo os responsáveis governativos que se seguiram, quer do Partido Socialista quer do Partido Social Democrata, se apressaram em impor de novo o controlo burocrático e centralista sobre a escola, em desbaratar os esforços dos docentes mais profissionais, em promover a mediocridade e até, no caso da educação de adultos, em impor metas quantificadas de modo a que o país, mudando ou não, ficasse melhor no retrato das estatísticas europeias e da OCDE. Quanto mais complexo é o mundo e quanto mais "invisíveis" se tornam os mecanismos sociais (D. Innerarity), mais sedutoras se tornam as estatísticas, querendo alguns acreditar que assim aprisionam e conhecem a realidade. Muito do que foi feito entre 1995 e 2001 foi certamente "engolido'; nas escolas, pela força do statu-quo, mas não duvido do valor do trabalho então realizado e, nem que fosse pelos meninos que se salvaram da exclusão e dos diversos modos de expulsão escolar, valeu a pena. 


Como "reformadora'; como define o seu discurso educativo? 

O meu discurso fundamenta a minha prática de docência, de investigação, em cargos políticos, executivos ou no Parlamento, e nos projectos de luta contra a pobreza que hoje me ocupam em África e na América Latina e tem um só propósito: refundar a escola que herdámos. Trabalho lento e difícil, partilhado e persistente, é o único digno do nosso esforço. Considero a escola como a "instituição mais generosa da democracia';


 já o disse, pois, apesar das desigualdades sociais - que a escola, enquanto instituição, não pode resolver só por si, como é óbvio - o conhecimento é património de todos e de cada um e não apenas de alguns "eleitos': Embora a escola não possa "escapar" totalmente aos mecanismos de normalização que sobre ela pesam - e quero acrescentar que as comparações internacionais estilo "PISA'' são dos efeitos mais perversos e nefastos da história da escola no final do sec. XX - pode ser também um espaço de socialização universal, de apropriação do conhecimento, de democratização das relações e dos saberes, um espaço de cidadania e de libertação. Eis o fundamento da minha acção pedagógica e cívica. A escola é uma instituição fundamental na luta contra a pobreza e contra as desigualdades mas apenas e só se se transformar considerando que os seus alunos são PESSOAS e não recursos humanos, conceito que se banalizou mas que retirou todo o sentido de humanidade à vida social democrática. Democratizar a democracia e as suas instituições é uma tarefa de todas as gerações, da minha (da nossa), das que me antecederam e das que continuam hoje, num período histórico preocupante (quer pelos fundamentalismos que julgávamos ultrapassados quer pelos novos deuses sem rosto: o Mercado, a Bolsa, a Alta Finança) o percurso por mais e melhor educação, por um mundo mais justo, em que a vida humana tenha o mesmo valor, seja a de um israelita seja a de um palestiniano. (...)"

O problema, Caríssima Ana Benavente é que entregam(ram) a responsabilidade política a quem nada sabe de Educação. Falta-lhes conhecimento transversal, maturidade e abrangência. Apenas funcionam, administrativamente, também tal como se a escola fosse uma fábrica que abre às 08:00 e encerra às 18:00!

Um grande abraço de muita Amizade e estima.

Ilustração: Arquivo pessoal e Google Imagens.

sábado, 1 de maio de 2021

No Dia do Trabalhador


FACTO

"(...) Não falhou nada", é o título de uma peça hoje publicada no Dnotícias relativamente ao caso da punição ao Professor Joaquim José de Sousa -  Declaração do secretário regional da Educação.



COMENTÁRIO

Insiste o secretário que "nada falhou" e que foi dada a razão ao Professor Joaquim José de Sousa, (malevolamente designado por "Joaquim Batalha") apenas por questões processuais no âmbito do cumprimento dos prazos. Cumprimento dos prazos, questiono, por parte de quem, da secretaria ou do visado?  Se foi por parte da secretaria, pior ainda. E disse mais: que o Tribunal não analisou a matéria de facto: "(...) não houve nenhum julgamento por parte daquilo que era o essencial da acção". Até falou em "prescrição".

Ora, coisa que me tira do sério é a mentira, a camuflagem, a aldrabice, é ter presente Joseph Goebbels, esse que teve papel decisivo na adesão da sociedade alemã ao projeto nazista de Hitler, que dizia que "uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade". Não suporto quem assim se comporta, em qualquer situação da vida, pública ou não, sobretudo quando, intecionalmente, para salvar a pele, repete e repete o mesmo, daí originando na comunidade, primeiro, a dúvida, depois, a razão e a justiça das atitudes assumidas.


Mas porque hoje é Dia do Trabalhador... esqueçamos a problemática dos prazos e consideremos mesmo a suposta prescrição. Não deixa de ser curioso que o secretário nunca fale da designada "matéria de facto", isto é, onde está a CAUSA de tudo isto. Fui aos meus arquivos e, sumariamente, confrontei-me com as seguintes situações:

01. O Professor Joaquim José de Sousa e a sua equipa, conseguiram resultados escolares que fizeram passá-la, em poucos anos, do fundo da tabela do "ranking" dos exames (1.207º) para uma das melhores do país;
02. Consequência deste facto, o professor recebeu três louvores, obteve quatro avaliações de excelência, tendo a sua gestão sido reconhecida como de excelência ao níveis regional e nacional, por ter elevado a qualidade da educação regional a patamares nacionais;
03. Ainda resultado desse trabalho, no quadro de uma escola de excelência, em nome dos seus colegas, participou no programa da RTP (Nacional) "Fronteiras XXI";
04. Que esta sua exposição nacional se tornou, alegadamente, desconfortável para o secretário que não terá gostado de não ter sido ele o protagonista nesse programa;
05. Que ganhou, juntamente com a sua equipa, as eleições para um novo mandato de gestão da escola do Curral das Freiras, pela expressiva margem de 78% dos votos da comunidade educativa;
06. Que após o acto eleitoral e conhecidos os resultados, desenvolvido segundo as regras e autorização da secretaria, a escola foi fundida, a escola perdeu a sua autonomia e foi anexada a uma outra (S. António);
07. Simultâneamente, foi iniciado um processo de inquérito, depois disciplinar, conduzido por uma figura "não inspectora", ultrapassando, assim, todos os inspectores de carreira, pertencentes à Inspecção Regional da Educação;
08. Que daí resultou uma acusação, salvo erro, com 388 pontos, com imputação de responsabilidades entre os artigos: 371.º a 382.º.
09. Acusações como: (entre parêntesis, o que a defesa assume) 

Enviar os horários dos professores por e-mail (decisão lavrada em acta de direcção, em Setembro de 2017 e em acta de Reunião Geral de Professores – em ambas as situações aprovada por unanimidade); não solicitação à administração educativa para juntar turmas (decisão lavrada em acta dos conselhos pedagógico, executivo e da comunidade educativa); atribuição de horas extraordinárias compensadas com descanso compensatório, para que os alunos, em virtude da falta de docentes, pudessem terminar os respetivos cursos no ano lectivo (com a concordância de todos os docentes e aprovado em sede de conselho executivo e de conselho pedagógico – decisão aprovada por unanimidade e lavrada em acta de ambos os órgãos e autorizada por escrito pelos docentes), tendo o próprio presidente do órgão de gestão lecionado para suprimir a falta de docentes (decisão aprovada por unanimidade e lavrada em ata do conselho executivo); a anulação de matrícula a um aluno que findo o 3º ciclo se candidatou a várias escolas e tendo entrado  no CEFAD, em Palmela, e não ter anulado a candidatura na escola do Curral das Freiras, (quando, comprovadamente, o encarregado de educação pediu a anulação da matrícula – a mesma foi anulada pelo conselho administrativo, tendo sido a decisão aprovada por unanimidade e lavrada em acta do conselho executivo); abertura da escola às 07.30 para acolher em espaço quente e acolhedor as crianças da creche, da pré e do 1º ciclo, monitorizado, voluntariamente, por docentes (em virtude da falta de funcionários) os quais promoviam atividades lúdico-pedagógicas (com a concordância de todos os docentes, proposto pelo Departamento de Expressões e aprovado em sede de conselho executivo e de conselho pedagógico – decisão aprovada por unanimidade e lavrada em acta de ambos os órgãos e autorizada por escrito pelos docentes). Por aí fora. Aqui estão uma série de "crimes" cometidos e que justificaram seis meses sem salário.

Entretanto as actas desapareceram


10. O secretário não aborda o facto de ter sido impedido o direito ao recurso hierárquico (o secretário da Educação quis ser ele a aplicar a pena e não o director da administração educativa que era, legalmente, a quem competia; não aborda a presunção de inocência (desde o início a administração tudo fez para o condenar (e continua); não aborda o acesso à informação que o ilibava (foi condenado antes de receber as actas solicitadas que estavam em poder da administração e que, entretanto, desapareceram; não aborda o direito ao bom nome do professor (enxovalhado publicamente pela Secretaria Regional de Educação); não aborda o direito a viver com dignidade (o professor teve, segundo li, de recorrer a empréstimos para pagar casa, escola, saúde aos filhos de 4 e 6 anos; não aborda o dever de alimentar os filhos (viveu só com o salário do cônjuge); o direito a exercer a profissão (ficou confinado a alguns "risos" e ao descrédito dos pares; o direito a viver em segurança e em liberdade – foi ameaçado e condenado em praça pública; não aborda que o  órgão de gestão era colegial – votações por maioria – e que em acta está plasmado que várias vezes o presidente do órgão votou vencido em algumas assuntos; não aborda o facto de, apesar de ser colegial, apenas um membro ter sido acusado e punido – sem nunca ter sido ouvido em sede de instrução ao contrário dos restantes membros do órgão de gestão. E mais e mais... muito mais. Isto é que deveria o secretário abordar, para esclarecimento da comunidade.

Portanto, não é de prazos que o secretário deve falar, mas das CAUSAS que deram origem a este monstro. Mas admitamos que, administrativamente, neste sistema centralizado, NADA AUTÓNOMO, "alguma coisa estava fora do seu lugar", pergunto, seria motivo para seis meses sem salário? Em circunstância alguma, digo eu! Em vez do diálogo e dos resultados da escola esteve a soberba e uma inexplicável perseguição. Meteu-se em um labirinto do qual continua a não saber sair. Portanto, tudo parece denunciar que se tratou de um acto de inaudita vingança e de quero, posso e mando. Vingança, porquê? Só o próprio poderá explicar.

Esquece-se o secretário que a vida dá muitas voltas e, amanhã, deixará de ser secretário, regressará à escola (tantos são os políticos que caem em desgraça) e será mais um entre os demais. E que pode vir a ser vítima de um qualquer "sujeitinho" que não vá com a cara dele. É este o estado a que a (dese)educação chegou.

E se isto aqui deixo é porque, hoje, é Dia do Trabalhador. Tal como em 1886, nos EUA, quando mais de 500 mil trabalhadores saíram às ruas de Chicago, este triste exemplo local, diz-nos que todos devemos continuar atentos. Os "patrões" apenas são outros.

E não é colocando flores no monumento ao trabalhor que se defende o trabalhador. É com actos.

Ilustração: Google Imagens.