terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Número de alunos com acção social em queda. A excepção é o 1.º ciclo do ensino básico


O número de alunos a beneficiar de acção social escolar (ASE) está a descer, seguindo uma tendência que se tem observado “ao longo dos últimos dez anos”, diz o relatório Estado da Educação 2019. Mas o documento do Conselho Nacional de Educação aponta uma excepção. No ano lectivo 2018/19 o número de alunos do 1.º ciclo do ensino básico apoiados subiu em relação ao ano lectivo anterior: foram mais 12.317 crianças. Já em relação aos restantes ciclos de ensino houve “menos 8025 alunos no 2.º CEB [abrangidos], menos 11.211 no 3.º CEB e menos 5038 no ensino secundário”.



O balanço anual, que é divulgado nesta segunda-feira, mostra que no ano lectivo 2009/10 havia 494.106 estudantes com ASE, enquanto no último ano foram 365.811. Verifica-se que em quase todos os anos lectivos analisados a maior percentagem de alunos apoiados concentra-se no 1.º ciclo (do 1.º ao 4.º ano), destacando-se o último (2018/19) em que esta proporção foi a maior (34,5% dos alunos abrangidos). Quantos aos restantes ciclos e secundário, as percentagens caíram em relação a 2017/18, estando agora em 28,4% no 3.º ciclo, em 19,4% no 2.º e em 17,6% no secundário.

Olhando apenas para a rede pública, o decréscimo também é visível. Se em 2009/10, dois quintos dos alunos (42,7%) eram beneficiários de ASE e em 2014/15 eram 40,1%, no último ano lectivo ficou-se pelos 34,1%. Neste último ano, o 2.º ciclo foi o que teve maior percentagem de alunos com ASE (41%), seguido pelo 3.º ciclo (37,7%), pelo 1.º ciclo (32,4%) e pelo secundário (27,1%).

Ainda assim, 2018/19 registou o terceiro valor mais alto da década em termos de financiamento de ASE. Foram cerca de 250 milhões de euros, embora menos quase nove milhões em relação a 2016 (valor mais alto). A ASE abrange apoios, por exemplo, para material escolar, refeições e visitas de estudo e o montante dos apoios depende dos escalões de rendimento das famílias.



Aumentar
Questionado sobre a descida geral de alunos apoiados e à subida registada no 1.º ciclo, o Ministério da Educação fala em “três questões fundamentais”. A diminuição da natalidade e a melhoria do sucesso escolar, que “tem vindo a diminuir o número de alunos no ensino básico” e “por isso, a percentagem de alunos apoiados pela ASE tem permanecido estável, ligeiramente acima dos 30% no ensino básico e dos 15% no ensino secundário” e a aproximação da percentagem — “em torno dos 32%” — de alunos apoiados no 1.º e 2.º ciclos em 2018/19, “o que significa que a informação às famílias e os processos de atribuição dos benefícios estão mais céleres do que nos anteriores”.

Por fim, o ministério destaca “a disponibilização dos manuais escolares a todos os alunos”, que deixou de fazer parte do ASE mas que “permitiu a este programa alargar efectivamente outro tipo de apoios aos alunos em condições mais vulneráveis”. Refere ainda que o orçamento da ASE tem aumentado “na ordem dos 3% anuais desde 2016” e para 2021 esse “aumento é de 10% em relação ao ano anterior”.

Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, também destaca o efeito da gratuitidade dos manuais escolares, “que representava uma grande fatia da acção social escolar”. “Mas também sinto que há um conjunto alargado de encarregados de educação da classe média em que pelos rendimentos pode não ter direito a escalão, mas que os alunos deveriam ter algum apoio da acção escolar”, diz.

Metas a cumprir

O relatório lança ainda um olhar sobre as metas estabelecidas pela União Europeia a alcançar até ao final deste ano. Registaram-se melhorias em 2019. Mas, por exemplo, na meta de ter pelo menos 40% das pessoas entre os 30 e 34 anos diplomadas, Portugal ainda está a 3,8 pontos percentuais (pp) do objectivo. E na de ter pelo menos 15% dos adultos a participar na aprendizagem ao longo da vida, o país estava a 4,5 pp da meta. A média da UE 28 [União Europeia] está 3,7 pp do objectivo. “Observam-se alguns progressos desde 2013, mas ainda parece não haver uma clara aposta na aprendizagem ao longo da vida”, diz o relatório.

O Ministério da Educação lembra que “ainda não existem os dados de 2020, mas em vários casos a proximidade que já existia em 2018/19 torna possível alcançar a meta este ano”. Dá o exemplo do abandono escolar precoce. O objectivo definido era reduzi-lo para 10% em 2020. “Em 2019 esse valor foi de 10,6%, o que representa um decréscimo muito significativo, e os valores dos três primeiros trimestres de 2020 são já inferiores a 10%, o que indica que seja possível alcançar este difícil objectivo em 2020.”

Refere ainda o ministério que “Portugal encontra-se perfeitamente em linha com vários outros países europeus, alguns deles, aliás, com um PIB superior” e nota que “quando se alcança um patamar elevado, se torna mais complexa qualquer progressão”.

Fonte: Público

domingo, 13 de dezembro de 2020

Escolas. Demasiado tempo a ouvir o professor


Portugal é um dos países da Europa em que há aulas com maior duração. Na maior parte das escolas, nomeadamente no ensino básico, os conhecidos 90 minutos por aula, que à partida serviriam para proporcionar aos alunos um momento essencial de aprendizagem, acabam por se transformar num verdadeiro pesadelo. E é por isso que há professores que já optaram por aliviar a carga horária, adotando uma estratégia mais eficaz que se afasta completamente do simples facto de debitar matéria durante largos minutos. (...) Rui Correia, professor do ensino básico e secundário, sublinhou que, para os seus alunos, há apenas «15 minutos de atenção máxima» antes de se dedicarem a questões mais didáticas, realçando que ainda existe muito a ideia de que um professor, ao entrar numa sala de aulas, tem apenas de cumprir determinados programas e conteúdos.



«Estar 90 minutos com atenção máxima parece-me um bocado irrealista. Nesse sentido, o que há a fazer, julgo eu, é entender-se que tem de haver espaço para uma certa descontração na sala de aula. Quando estamos a lecionar, é bom perceber se a mensagem está a passar ou não. Fala-se muito desta questão do regime presencial, mas considero que, às vezes, é mais uma aula de corpo presente do que uma aula em regime presencial. Nem sempre o regime presencial é o mais benéfico, porque nos traz pouco retorno em relação àquilo que deve ser feito», começou por dizer, admitindo a importância da «escrita» e também dos «jogos de computador» no que toca à parte mais lúdica.

«É surpreendente ver a forma como os jogos de computador podem ser incrivelmente didáticos e úteis para uma aula de História, por exemplo. Uma aula serve para os alunos estarem ativos e a produzir, seja a pensar ou a escrever. A escrita é uma forma privilegiada de estruturar a informação. Os meus alunos escrevem muito, mas escrevem o que eles querem. Depois desses 15 minutos de aula de atenção máxima, são convidados a explicar-me aquilo que acharam, o que teve mais e menos interesse ou apenas dúvidas que tenham. Uma ideia que acho muito importante é perguntar-lhes se sabem alguma coisa que eu não sei», reforçou. E acrescentou ainda que as aulas não podem ter o foco nos professores, uma vez que se trata de aprendizagem. «A sala de aula não pode ser a nascente do conhecimento, mas sim a foz do conhecimento. A aula não é sobre o professor. O assunto é a aula que os miúdos vão ter. E enquanto não invertermos esta lógica das coisas vamos continuar a assistir a algo que não queremos ver», atirou.

Aulas de 90 minutos logo de manhã

Em 2012 foi aprovado um decreto-lei que permitiu que as escolas pudessem optar pelos horários que queriam utilizar, tal como revelou (...) o ex-ministro da Educação Nuno Crato. Mas os estabelecimentos escolares parecem não querer livrar-se das aulas mais longas. Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, deixou claro que, na maior parte das vezes, as escolas optam por colocar as aulas de 90 minutos nas primeiras horas do dia, quando os alunos ainda estão «frescos».

«Estas aulas de 90 minutos são dadas mais de manhã, porque os alunos estão menos cansados. Nesse caso, os professores optam por lecionar Matemática ou outras disciplinas que exigem mais dos alunos, sendo mais teóricas. E, ao longo do dia, da parte da tarde, lecionam Educação Física, Educação Visual, ou seja, as disciplinas mais dedicadas às artes», disse (...), explicando, porém, que considera que, mesmo nestes termos, as aulas com esta duração são «duras» tanto para os alunos como para os professores.

«Parece-me ser demasiado tempo seguido, principalmente no 5.º e 6.º anos. No secundário já não, porque são mais autónomos. Há disciplinas em que têm experiência laboratorial. Mas, com alunos mais novos, acho que 90 minutos é, de facto, duro para eles e também para os professores. Manter a atenção dos jovens durante tanto tempo não é fácil», reconheceu Filinto Lima.

O sociólogo Elísio Estanque foi mais longe e, em tempos de covid-19, sublinhou que os problemas já existentes nas escolas antes do aparecimento da pandemia em Portugal podem ter-se tornado ainda mais difíceis de contornar. «Esta situação da covid-19 também pode dar-nos indicações para aquilo que vamos fazer no futuro, em situação pós-covid», começou por dizer (...), salientando que são necessárias pedagogias mais atrativas.

«As aulas de 90 minutos são excessivas para crianças. Mas até na universidade são. Para jovens já com mais responsabilidades, a partir de um determinado momento começa a sentir-se perturbação da parte deles. Há sempre uma parte das turmas que desliga nas aulas. Por isso, entre crianças e adolescentes, ainda é pior. E é necessária a tentativa de conjugar uma componente de ensino, em algumas disciplinas, com a componente lúdica. Nas crianças, a aprendizagem requer uma dimensão lúdica para que o gosto pela leitura, por exemplo, seja encarado por elas na combinação com o jogo, porque facilmente atrai as crianças», disse.

Aulas nos outros países da Europa

Em Portugal, o Ministério da Educação esclareceu (...) que a tutela «introduziu, durante o XXI Governo, o projeto de Autonomia e Flexibilidade Curricular, posteriormente consubstanciado no DL 55/2018, enquadrador do currículo nacional, que visa a promoção de melhores aprendizagens indutoras do desenvolvimento de competências de nível mais elevado, assumindo a centralidade das escolas, dos seus alunos e professores, e permitindo a gestão do currículo e da distribuição de horas de forma flexível e contextualizada». E é este o esforço que tem sido feito ao longo dos últimos anos nas escolas em Portugal. Mas, no estrangeiro, o cenário é distinto.

De acordo com os dados divulgados pela Comissão Europeia, em 2019, as aulas no ensino básico em Espanha, por exemplo, têm a duração de 60 minutos, em geral, e situação semelhante acontece na Bélgica, Áustria e Irlanda, com aulas de 50 minutos. Já na Alemanha há uma duração mínima de 45 minutos por aula – com o máximo de seis aulas por dia – e, na Escócia, de 55 minutos cada. No que toca aos países nórdicos, na Finlândia, a duração das aulas varia entre os 45 e os 60 minutos.

Três países e tudo muito diferente

Matilde, de nove anos, e Sthan, de 11, já frequentaram escolas em três países diferentes: Portugal, Espanha e França. Agora estão no 4.º e 6.º anos de escolaridade, na comuna francesa de Saint-Malo, mas dizem existir muitas diferenças em relação ao tempo em que andavam na escola em Portugal, entre 2017 e 2018. (...) Maria, a mãe das duas crianças, sublinhou que uma das principais diferenças é a carga de trabalhos de casa que, em Portugal, são distribuídos aos alunos.

«Aqui onde estamos, em França, por exemplo, nos primeiros anos escolares, os trabalhos de casa estão proibidos. O que eles podem ter é, no máximo, 20 minutos por dia para terminar aquilo que não conseguiram completar na escola. Mas não há trabalhos de casa. Podem ter uma poesia para rever, duas linhas de um texto que não conseguiram terminar, mas mais do que isso não», começou por relatar, explicando que, no que toca a Portugal, os trabalhos de casa tornam-se um exagero. «No ano em que os meus filhos estiveram em Portugal, eram horas de volta dos trabalhos de casa. Acordavam às 6h da manhã, chegavam a casa quase às 20h e ainda tinham trabalhos de casa para fazer. Os professores exigem imenso. A sensação com que eu fiquei em Portugal foi que os pais fazem o papel dos professores. Os franceses são muito rígidos nesse sentido, ou seja, pai é pai e professor é professor», revelou, antes de salientar também a elevada quantidade de fichas que são entregues aos miúdos em Portugal.

«Em França e Espanha não há fichas. São coisas mais lúdicas e didáticas. No segundo ano já começam a aprender a fazer trabalhos de grupo, por exemplo. Em Portugal adoramos as fichas e, se os professores não completarem o programa escolar, ficam em pânico. Gastei também imenso em livros em Portugal, mais de 200 euros. Depois percebi que o Governo oferece livros, mas não estive nessa situação. Houve livros que eles nunca abriram. Em França, o material até ao 6.º ano é todo oferecido pela escola e pelo Governo, à exceção do estojo», acrescentou.

Além disso, as atividades lúdicas, bem como as artes e a música, são disciplinas que têm a mesma importância do que as outras em França, diz. No País Basco, no norte de Espanha – onde estiveram entre 2014 e 2015 –, a situação é semelhante, com uma ligação muito direta à cultura. «Fazem muita coisa ligada às artes, assim como no País Basco. A música e as artes, em França, têm o mesmo valor das outras disciplinas. Em Portugal estamos muito ligados aos livros, ou seja, muito agarrados ao estudo empírico. No País Basco existe um sistema muito criativo e artístico», concluiu.

Os horários dos pais e dos filhos

Em Portugal há alunos que passam diariamente 12 horas nas escolas por causa dos horários de trabalho dos pais, segundo confirmou Filinto Lima (...), sublinhando ainda que é estritamente necessário ter em atenção a carga horária que não está relacionada com as aulas, mas sim com o tempo que as crianças passam no interior do estabelecimento escolar.

«Entre as 16h, que é quando saem das aulas, e as 19h30, há pais que vão buscar os filhos. Ou vão passear com os avós. Outros, a carrinha do ATL [atividades de tempos livres] vai buscá-los e leva-os para os centros para fazer os trabalhos de casa. E muitos outros ficam nas escolas até às 19h30. Muitos deles fazem os trabalhos de casa logo na escola, mas também há atividades lúdicas. As autarquias ajudam os pais nesse sentido, ou seja, permitem que os pais deixem os filhos mais cedo nas escolas para não chegarem atrasados ao trabalho e depois podem ir buscá-los até por volta das 19h30», esclareceu, dizendo ainda ser um luxo, nos tempos que correm, os alunos saírem das aulas às 16h e os pais estarem lá, à porta, para os ir buscar.

«Estamos em Portugal, não podemos esquecer. E, em Portugal, os pais começam a trabalhar cedo e terminam tarde. A escola depende muito do horário e da economia dos pais. Noutros países europeus, tais como a Finlândia ou a Suécia, que são países mais ricos, os alunos saem das aulas e vão para casa, porque os pais conseguem ir buscá-los a essa hora. Mas em Portugal não. Estamos muito longe de conseguir atingir esse patamar», reconheceu Filinto Lima.

Em França, por exemplo, Maria conta que os horários dos pais são ajustados aos dos filhos, com o intuito de evitar que as crianças possam passar muito tempo na escola. «Em França, a hora máxima para ir buscar os filhos à escola é às 19h – entram às 8h30 e saem às 16h30. Eu, por exemplo, começo a trabalhar às 8h e acabo às 13h. E depois, à tarde, faço pequenas coisas que faltam. Às quartas-feiras não há aulas em França e no trabalho dos pais já sabem isso. Há um ajuste que é feito entre o trabalho dos pais e as escolas. Mas isto também acaba por ser muito cultural. Aqui em França, as pessoas revoltam-se muito. Se em Portugal não se manifestarem convenientemente, o Governo não muda nada», atirou, explicando até que a comunicação entre as escolas e os pais é muito mais dinâmica, deixando os encarregados de educação mais descansados e informados.

«Recebo emails de tudo, sobre todas as atividades que os meus filhos fazem nas escolas. Em Portugal, nunca ninguém me consultou. Em França, mesmo que eu não queira, recebo informações das escolas. Até o meu marido recebe», rematou.

Fonte: Sol por indicação de Livresco

NOTA
Publico este artigo, apesar de algumas incoerências que detectei.

sábado, 5 de dezembro de 2020

É para avaliar ou é para aprender?


Desde muito cedo que o desafio entre equilíbrio e gravidade, em cima de rodas, me desafiou! Motas e bicicletas entre outros. Gosto de veículos com rodas! Sendo o filho mais novo de três irmãos, aprender a andar de bicicleta foi uma autoaprendizagem. Não havia tempo para tudo! Ainda hoje ando nos dois. Mesmo quando estou meses ou anos se lhes tocar. Aprendi sozinho! Por vezes ganhou a gravidade, mas a resiliência vencia a gravidade e, rapidamente, o equilíbrio venceu e tornou-se mais constante. O gosto pelas rodas levou-me a vencer o desafio da gravidade. Sou teimoso!



Ter ajuda facilitava? Claro que sim! E evitava algumas nódoas negras também! Como pode esta minha história de vida ser um exemplo pedagógico, no âmbito da educação?

É muito simples! A escola, os professores devem desenvolver atividades que sejam desafiadoras, considerando o gosto de cada aluno (motivações, interesses e capacidades), promovendo a autoaprendizagem (autorregulação). Existe aqui um elemento exclusivo do indivíduo que é a resiliência (a minha teimosia). Mas falta aqui acrescentar um elemento central e inerente ao processo de aprendizagem - a avaliação.

A propósito da avaliação, recordo aqui uma história que o professor Domingos Fernandes conta sobre o professor Sebastião da Gama. Estava Sebastião da Gama a propor um trabalho aos seus alunos, quando um deles pergunta «É para a avaliação?». A esta pergunta, o professor responde «Não! É para aprender!».

O título deste texto deve-se a esta história. Ter alguém a ajudar-me a aprender a andar de bicicleta poderia ter levado a que o processo fosse mais rápido e menos doloroso. Sobretudo se me fosse dito o que eu estava a fazer bem (e deveria manter) e o que estava a fazer mal (e como corrigir). Estou a referir-me à avaliação formativa.

Mas, e se esse «instrutor» me atribuísse constantemente, uma nota? Se me classificasse, de acordo com o que eu fazia ao longo desta aprendizagem, de forma constante. Será que aprendia da mesma maneira?Quero com isto dizer que a avaliação formativa ou avaliação para as aprendizagens é a ação fundamental para a aprendizagem dos nossos alunos. 

É fundamental mobilizar a informação recolhida ao longo do processo de aprendizagem para dar feedback ao aluno. Dizer o que está bem e o que pode ser melhorado. Então, todas as atividades a desenvolver devem servir o propósito da aprendizagem e não o propósito da avaliação. Recordando a história: «É para avaliar?, pergunta o aluno, «Não, é para aprender!», responde o professor».

Claro que, em contexto escolar, temos de traduzir as aprendizagens realizadas em classificações, quer sejam de final de período, quer sejam de final de ano ou ciclo. É também importante classificar noutros momentos sumativos, claro! Mas mesmo estas classificações podem ser mobilizadas para fins formativos.

Voltando à minha história da bicicleta, quando finalmente aprendi a andar, a autoavaliação do processo (ainda que espontânea) surgiu sob a forma de um pensamento, acompanhado por um elevado nível de satisfação pela conquista: «Viste como consegues? Pegaste no guiador, sentaste-te de forma correta, puseste os pés nos pedais e conseguiste pedalar ao mesmo tempo que te equilibravas. Depois de todos os esforços, cá está! Sabes andar de bicicleta. Agora podes melhorar!». 

E o passo seguinte foi aprender a fazer cavalinhos e derrapagens!

Vitor Bastos

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Será a relação avós-netos um porto de abrigo seguro?


Durante o confinamento avós e netos não coabitantes viram as suas casas encherem-se de saudades. Os netos mais pequeninos nem compreendiam a ausência dos avós, o que aumentava mais a mágoa de todos. A relação avós-netos tornou-se tema de muitas crónicas nos meios de comunicação social. E ainda bem! Tanto avós como netos beneficiam com a existência de um relacionamento frequente e saudável. As vantagens alargam-se aos pais das crianças.



- É verdade que os avós sentem mais saudades dos netos do que dos filhos? - perguntou a mãe de um adolescente a uma amiga, avó de um menino de pouco mais de um ano, quando se reencontraram após o confinamento. Estava incrédula e parecia até algo preocupada.

- Sim, foi o que senti. Mas não é possível comparar. O amor pelos filhos não diminui quando se lhe acrescenta o amor pelos netos – respondeu a amiga, procurando tranquilizá-la.

Durante o confinamento avós e netos não coabitantes viram as suas casas encherem-se de saudades. Os netos mais pequeninos nem compreendiam a ausência dos avós, o que aumentava mais a mágoa de todos. A relação avós-netos tornou-se tema de muitas crónicas nos meios de comunicação social. E ainda bem! Tanto avós como netos beneficiam com a existência de um relacionamento frequente e saudável. As vantagens alargam-se aos pais das crianças.

Do que sentiram com a impossibilidade de estarem com os netos durante o confinamento, falam vários escritores numa reportagem do jornal Público do dia 11 de maio: António e Isabel já viram os netos, Alice não vê a hora de os reencontrar.

O sorriso marca a cara dos avós quando pensam nos seus netos ou quando antecipam o momento do novo reencontro. Ir buscá-los à escola, ficar com eles enquanto os pais trabalham ou simplesmente almoçar com um neto já adolescente ou adulto são momentos de prazer correspondido que melhoram o bem-estar emocional de uns e outros. Avós e netos que convivem frequentemente beneficiam de uma rede social alargada a gerações mais distantes, com vantagens para todos. A competência de crianças e jovens para estabelecerem relações interpessoais com pessoas de diferentes níveis etários sai reforçada, a par com uma maior abertura e capacidade para se colocarem no lugar no outro. Quanto aos avós, têm uma melhor possibilidade de conhecer e compreender melhor a geração mais jovem. A nível cognitivo, as vantagens são, igualmente, mútuas: com uma sabedoria acumulada ao longo da vida, os avós podem, por exemplo, ajudar os netos a olhar para um qualquer problema de forma mais abrangente e com um repertório de estratégias de resolução mais diversificado; os netos, por seu turno, poderão, eventualmente, ajudar os avós a lidar melhor com as novas tecnologias. As histórias de vida e da família que os avós não se cansam de contar aos netos dão a estes um enraizamento mais sólido da sua identidade familiar, além de reforçarem os laços de afeto e de constituírem um inestimável acervo de memórias. Os desafios colocados pelo relacionamento com os netos promovem, nos avós, uma estimulação cognitiva bastante protetora das suas capacidades intelectuais.

Mas não são só avós e netos os beneficiários da relação entre ambos. Os pais que podem contar com o apoio dos avós para cuidarem dos seus filhos saem também a lucrar. Que o digam os pais que não precisam de se preocupar com o desfasamento entre o seu horário de trabalho e o horário da escola, ou os casais que gostam de sair de vez em quando e podem contar com os avós para ficarem com os seus filhos.

Finalmente, gostaria de ressalvar a necessidade de os avós respeitarem os princípios educativos dos pais e não quererem sobrepor-se a eles. Infelizmente as relações entre avós e netos ou entre avós e os pais dos netos não são sempre idílicas. As tentativas de sobreposição dos avós aos pais na educação dos netos encontram-se, muitas vezes, na base de conflitos que comprometem essas relações.

Dos seus avós, que considera que eram “heróis perfeitos”, diz Valter Hugo Mãe: “serão sempre o meu porto de abrigo” (In Serei sempre o teu abrigo, 2020, Porto Editora). Vou mais longe: os avós são um porto de abrigo seguro para os netos e os netos são um porto de abrigo seguro para os avós.

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ARMANDA ZENHAS
Professora aposentada. Doutora em Ciências da Educação pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto. Mestre em Educação, área de especialização em Formação Psicológica de Professores, pela Universidade do Minho. Autora de livros na área da educação.
Professora profissionalizada nos grupos 220 e 330. Licenciatura em Línguas e Literaturas Modernas, nas variantes de Estudos Portugueses e Ingleses e de Estudos Ingleses e Alemães, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Professora profissionalizada do 1.º ciclo, pela Escola do Magistério Primário do Porto.

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

O que é que a escola faz pelos alunos

 

Ontem assisti a um momento de televisão que me encheu. Foi na SIC, com a jornalista Conceição Lino. O programa: Geração 15/25. Tema: a Educação - O que é que a escola faz pelos alunos? Uma jornalista muito bem preparada e uma mancheia de jovens que mais me pareceram "investigadores" do sector educativo. Falaram, serena e profundamente, sobre um tema, cujas abordagens não oiço nem sinto dos responsáveis políticos capacidade e abertura. Senti orgulho daqueles jovens que, através da sua vivência escolar, perceberam o que de errado está no sistema, perceberam o que é o conhecimento, perceberam o que é a aprendizagem, cumpriram mas têm uma opinião extremamente crítica face a um sistema absolutamente desadequado dos tempos que estamos a viver. 


Governantes, abram os olhos, leiam o mundo, percebam a voz que vem de baixo, saiam dos gabinetes e tenham a coragem de mudar. Face ao mundo que estamos a viver, a vossa política só poderá conduzir ao desinteresse, ao abandono, ao insucesso, às baixas qualificações, enfim, à mediocridade. Para além disso, estão a matar o sonho. Como alguém me disse: senhores, de vez em quando convém ler umas coisitas. Certo?

Deixo aqui uma síntese de uma grande parte do que escutei. Mas convído-os a seguirem este espaço seguinte endereço: https://sicnoticias.pt/programas/1525/2020-11-24-1525.-O-que-e-que-a-escola-faz-pelos-alunos-

"O sistema olha para o aluno como um simples recipiente onde se introduz conhecimento (...) as pessoas ali não pensam, as pessoas ali decoram (...) estamos a estudar para ranking's não para o conhecimento (...) há muito esta pressão para ter notas, custe o que custar (...) a escola está desenhada em torno da matéria e em torno das necessidades dos professores (...) os alunos têm muito pouca importância, esse é um ponto chave (...) gosto de um ensino estimulante, que dê responsabilidade sobre o que queremos aprender, maior valorização da oralidade, da criatividade, menos débito de matéria numa folha de exame e mais exploração das diferentes áreas do conhecimento (...) o mundo mudou menos a escola, a sala de aula, a forma como está organizada é a mesma (...) o espaço para reflectir é fundamental e é daí que vem o nosso crescimento pessoal. Quando não existe este espaço... por isso, culpo as pessoas que fazem os planos curriculares, que fazem os horários e que acham que tem de ser assim e que nós temos de ser tratados como máquinas com o dever de trabalhar para ranking's e não para o conhecimento (...) nós temos professores que não queriam ser professores e isso cria ali um problema: eu quero mesmo fazer isto? (...) há muitos professores que não têm essa capacidade de perceber com o que estão a lidar (...) os alunos precisam hoje de mais motivação para ir para a escola, era melhor irmos para a escola com um propósito (...) a maior parte das coisas que aprendi na escola, se não esqueci já, pelo menos considerei-as inúteis e desinteressantes (...) o sistema educativo foca-se em coisas que não são fundamentais para a vida (...) estamos a criar alunos que não têm qualquer tipo de interesse relativamente à vida que os rodeia... a escola deveria contrariar isso, abrindo o mundo porque há mais vida para além daquela que vivem diariamente (...) nós saímos da escola com muito poucas capacidade para sermos resilientes, para enfrentarmos desafios (...) eu não sou preparada para pagar impostos, para fazer um currículo, uma entrevista de emprego, como posso obter todas as informações para exercer o voto consciente... falta muita coisa (...) muitos alunos não vêem a finalidade daquilo (escola) (...) os programas estão desenhados, por exemplo, para dar gramática... quando o objectivo não deveria ser que as crianças soubessem gramática... o objectivo do Português é que sejamos bons falantes da língua e que se saiba escrever. Saem do ensino e não sabem escrever e muito menos sabem falar e, definitivamente, não sabem olhar para uma obra literária (...) o bom professor é o que nos consegue cativar, que nos estimula constantemente (...) as notas não definem ninguém. Um curso com média de 18 não é melhor que um curso com média de 12. Há quem entre com 18 e esteja contrariado e há quem entre com 12, mas com paixão porque é mesmo aquilo que querem (...) nós já não vivemos num mundo onde faça sentido o professor abrir o manual, ler o que está no manual, fechar o manual, fazer uma ficha e acabou. Estamos a desperdiçar tantas qualidades que os alunos têm, portanto, não faz sentido uma resposta uniforme para a diversidade (...) decoramos para os testes e para os exames e raramente essa matéria fica retida (...) haver debate de ideias e várias perspectivas sobre o mesmo assunto, é muito, muito raro. Eu tive poucos professores que me dissessem: temos este assunto e aqui no livro temos esta solução. Mas vamos lá pensar em mais soluções. É raro, quase não acontece em Portugal (...) a nossa formação é demasiado quadrada, demasiado formatada. É quase um ritual (...) não são os currículos que interessam tanto, pois precisamos de pessoas inovadoras, pessoas que consigam se auto-construir (...) vão-nos retirando a criatividade e a curiosidade. O sistema educativo está muito condicionado por uma força de poder que quer manter a socidade estagnada (...) a EDUCAÇÃO continua a não ser uma oportunidade. Nós deveríamos mudar as coisas antes de se tornarem um problema."

Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Políticas, programas, reflexões para uma educação antirracista


Por Sara R. Oliveira
Educare
19.11.2020

Conselho Nacional de Educação refere que a diversidade étnico-cultural e as estratégias para combater o racismo ainda têm um “tímido papel” na promoção da igualdade nas escolas. O assunto é pertinente. E há muito a fazer.





O racismo existe e persiste. O Conselho Nacional de Educação (CNE) tem refletido sobre o assunto e acaba de lançar várias recomendações para uma educação antirracista. Para o CNE, os problemas do racismo e da educação antirracista devem ser vistos no contexto da educação para a cidadania, uma vez que envolve ameaças à qualidade da vida democrática em valores fundamentais como a liberdade, o pluralismo, a igualdade. E a Educação tem um papel fundamental para a construção de sociedades pacíficas e sustentáveis.

O CNE considera que as questões da cidadania, nomeadamente as que dizem respeito à diversidade étnico-cultural e ao antirracismo, “ainda têm um tímido papel na ampla estratégia de promoção da igualdade na escola”. Escutou direções de escolas, educadores e professores, associações com intervenção nestas temáticas, leu documentos e contributos nacionais e internacionais, e apresentou várias propostas para uma educação antirracista.

O reforço de políticas públicas de combate à exclusão e à pobreza, para condenar de forma clara e sistemática a discriminação e o racismo, e a recolha de dados sobre a etnia dos alunos, para uma efetiva monitorização do impacto de variáveis associadas, são duas recomendações. No último caso, e como são dados sensíveis, esse levantamento deve sempre basear-se na auto declaração, de acesso reservado, e seguir as orientações da Comissão Nacional de Proteção de Dados.

O CNE sugere a promoção de um programa nacional de educação antirracista e para os direitos humanos que envolva atividades curriculares, extracurriculares e de educação não-formal. Além disso, é importante existir um clima democrático nas escolas e um esforço sistemático, sublinha, “na concretização quotidiana dos valores de liberdade, pluralismo e igualdade, o que implica políticas de tolerância zero face a manifestações de racismo e xenofobia, combatendo-se preconceitos, a desinformação e o discurso de ódio”.

A autonomia das escolas é fundamental para contratar equipas educativas que melhor se adequem aos projetos traçados em nome de uma efetiva educação antirracista. “Só se podem desenvolver projetos consistentes, que visem um real impacto a médio e longo prazo ao nível da educação antirracista, com equipas estáveis, que não se alteram por imposições contratuais de ordem diversa, de modo a assegurar a viabilidade dos projetos já iniciados, garantindo a continuidade de quem neles quer trabalhar”. Contratar profissionais especializados, para apoiar estratégias de inclusão e educação antirracista, é mais uma indicação do CNE.

Os currículos devem evitar uma visão etnocêntrica dos fenómenos, o que implica uma forte aposta na formação dos professores e estar atento , especialmente nos manuais escolares, “às formas de representação de pessoas não-brancas, às referências à escravatura e ao comércio de pessoas escravizadas, ao destaque de figuras históricas (…) de diferentes etnias/raças, às narrativas que reconheçam a diversidade da população portuguesa, incluindo referências à história das comunidades ciganas”.

Melhorar o acolhimento de alunos estrangeiros

A expansão portuguesa e o colonialismo devem ser discutidos nas escolas para permitir pensamentos autónomos e críticos dos alunos. “Esta discussão deve reconhecer e integrar pontos de vista complexos e diversos, contextualizados temporalmente, que visibilizem diferentes histórias e atores, incluindo o sofrimento e a resistência e as sistemáticas violações de direitos humanos nos territórios ocupados”, aconselha.

“O momento que se vive a nível mundial exige uma priorização da educação antirracista que assente numa formação de qualidade de todos os que trabalham com crianças e jovens na escola”. Por isso, o CNE propõe um programa nacional de formação contínua de educadores, professores e funcionários não docentes para a inclusão e a educação antirracista e a sua valorização para efeitos de progressão nas respetivas carreiras.

A comunidade, as redes, as parcerias, a articulação entre diversos intervenientes e atores, constroem relações de confiança e o CNE aconselha que as intervenções perante situações discriminatórias sejam reforçadas e que permitam a denúncia de forma segura. A redução dos riscos de encaminhamento de crianças e jovens para dispositivos que limitam o acesso à progressão escolar é outra recomendação.

O CNE quer, desta forma, “garantir que as crianças e jovens de todas as origens tenham acesso igual à educação e sejam totalmente integradas no sistema escolar, não existindo segregação de crianças pertencentes a minorias nas escolas, impedindo-as de serem colocadas em turmas separadas e ajudando as crianças pertencentes a minorias a aprender o idioma de ensino”. “Os processos de encaminhamento e orientação de crianças e jovens devem reconhecer os riscos de seleção social e combater eventuais desigualdades no acesso aos diferentes cursos no Ensino Básico, Secundário e Superior”, acrescenta.

Favorecer estratégias para melhorar o acolhimento de alunos estrangeiros, migrantes, refugiados, deve constar nas orientações dos estabelecimentos de ensino. Para isso, as escolas devem fomentar procedimentos específicos, nomeadamente nos regulamentos internos, para uma interação positiva e combater situações de discriminação ético-racial.

Evitar estereótipos, promover a equidade

Vários estudos e a realidade dão conta de um racismo quotidiano, explícito e sistemático, inclusive em contextos educacionais. O CNE recorda o relatório da Comissão Europeia Contra o Racismo e a Intolerância de 2018, relativo a Portugal, que reconhece importantes avanços no reconhecimento de direitos e no combate à discriminação, mas que, por outro lado, destaca “a intensidade de desigualdades e discriminação educacionais com ampla tradução em fenómenos de abandono, insucesso e dificuldades na progressão escolar de crianças e jovens afrodescendentes e de origem cigana, mas também a manutenção de uma visão heroica e unilateral de acontecimentos históricos relacionados com a expansão marítima, a colonização e a escravatura”.

Há fatores a montante da escola que ajudam a enquadrar a discriminação e o racismo, nomeadamente as dinâmicas segregativas e de exclusão socio territorial, bem como as políticas de habitação e planeamento urbano para diferentes grupos sociais. Há ainda a gestão da diversidade social e uma “visão relativamente unilateral e acrítica dos manuais escolares, em particular no que remete para as narrativas em torno da história nacional, da escravatura e do colonialismo”.

A sociedade portuguesa é cada vez mais multicultural e, segundo o CNE, é preciso pensar nesta questão e no papel da escola como fator de promoção social, que valoriza a diversidade e está aberta a um mundo global e plural. Na sua opinião, já emitida num parecer, “as desigualdades e exclusões são evitadas ou atenuadas quando é contrariada a função de reprodução social e cultural da escola e se promove o acesso e sucesso (emancipatório) de todas e todos ao conhecimento e à aprendizagem”.

Os materiais didáticos e a formação e supervisão de professores, para a promoção dos direitos humanos, de forma a evitar a reprodução de estereótipos e promover a equidade e a não discriminação, não podem ser colocados de parte. “A Educação é cada vez mais uma ferramenta de defesa contra o aumento da violência, racismo, extremismo, xenofobia, discriminação e intolerância”, sustenta o CNE.

O Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória deixa bem claro que a escola deve habilitar “os jovens com saberes e valores para a construção de uma sociedade mais justa, centrada na pessoa, na dignidade humana e na ação sobre o mundo enquanto bem comum a preservar”. E a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, que integra a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, sustenta que a educação para uma conduta cívica tem de assentar na igualdade das “relações interpessoais, na integração da diferença, no respeito pelos Direitos Humanos e na valorização de conceitos e valores de cidadania democrática”.

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Chegar ao 1.º ano a saber ler e somar garante sucesso escolar?

 

Estudo comparado do Conselho Nacional de educação refere efeitos registados nos alunos do 4º ano a literacia, matemática e ciência. Mas há uma diferença entre perceber os mecanismos ou impor a aprendizagem, avisam os especialistas.



Aparentemente, esta é a fórmula do sucesso aos 9 anos. E é uma longa lista de capacidades que devem ser adquiridas nos primeiros anos de vida: as crianças que chegam à primária já a reconhecerem a maioria das letras do alfabeto e a escrevê-las, a ler algumas palavras e frases (até a ler uma história) e que também saibam contar sozinhos, reconhecer números e escrevê-los e a saberem fazer substrações e somas simples terão "maior probabilidade de terem bons desempenhos em leitura, matemática e ciências no 4º ano de escolaridade". Será?

Esta é uma das conclusões do relatório Desempenho e Equidade, do Conselho Nacional de Educação (CNE) e que faz a análise comparadas dos estudos internacionais TIMMS e PIRLS.

Segundo o documento, estas atividades são adquiridas naquilo que o CNE chama de primeira infância e tanto no pré-escolar, como nas atividades promovidas pelos pais. Quanto mais "prolongada" foi a frequência desses programas de educação e cuidados para a primeira infância, "mais elevada" é a pontuação média registada por esses alunos na aquisição de competências no final do 1º ciclo.

Para José Morgado, "é importante que os miúdos tenham experiências neste universo no seu desenvolvimento até aos 6 anos, com intencionalidade, quer em casa quer nas instituiçoes (como forma de atenuar menores níveis de eficácia da parentalidade), mas não transformar isso num ensino formal da leitura e da matematica no jardim de infância." Deve haver espaço à curiosidade, em que cada criança tem o seu ritmo, mas não deve ser impositivo, explica (...) o professor do Departamento de Psicologia da Educação do ISPA - Instituto Universitário.

É, resume o especialista em psicologia da educação, "o trabalho de apróximação ao mundo das letras e dos números — nao para ensinar leitura e matemática — mas para criar uma estrutura onde isso possa assentar. Isto é completamente diferente de dizer que o que eles aprendem no 1º ano é um trabalho que deveríamos começar a fazer a partir dos 5 anos no pré-escolar." O que de deve é estimular a criatividade e não impôr-lhes uma obrigação.

Neste ponto, o diretor do grupo que detém os 55 centros educativos João de Deus em todo o país, está de acordo: nada na introdução da leitura (ou até dos números) deve ser imposto. António Ponces de Carvalho recorda que neste grupo de escolas que iniciou o seu trabalho há mais de um século com o seu bisavô, João de Deus, as crianças tinham o nome cosido no bibe. "Não era apenas para serem chamadas pelo seu nome, era para começarem a aprender que aqueles símbolos ali representavam algo."

José Morgado também sugere esse jogo: que mesmo quando vai na rua e se pergunta a uma criança por um símbolo como o da cadeia de fast-food MacDonald's, se vá estimulando para que ela identifique o símbolo. é a leitura logográfica. Ele conhece a forma e consegue lê-la, tal como reconhece a semelhança entre letras do seu nome e outras. "Quando vir o nome, identifica-o. No jardim de infância, tem lá a escovinha com o nome" e vai acostumando-se. "Não é de mecanismos de leitura no sentido da consciência fonológica, da articulação, da estrutura da palavra", descreve o professor do ISPA.

Jogos para aprender a lógica das letras e das somas

É aqui que o seu ponto de vista sobre que aprendizagem devem as crianças levar para o 1º ciclo diverge de António Ponces de Carvalho, que defende a existência de um método (a Cartilha João de Deus, desenvolvida pelo seu bisavô): "É importante que as crianças sejam capazes de ler histórias. Não vamos estar à espera que uma criança de 6 anos leia Os Lusíadas, mas pegam num livro e vão inventando, não estão a traduzir o fonema, mas compreendem a função da história, compreendem qual a sequência no português, como se lê", diz Ponces de Carvalho.

Aos 3 anos, as crianças do João De Deus "têm atividades em que a brincar vão compreendendo para que serve a leitura, porque é que aqueles símbolos ali estão." Para aquisição de competências matemáticas, também fazem jogos: "Aos 4 anos, a educadora toca os ferrinhos ou uma pandeireta. A criança tem à sua frente palhinhas ou caricas, ouve três pancacas e apanha três palhinhas na mão esquerda, depois a educadora toca duas vezes e põe duas na mão direita." Quando a educadora pergunta quantas palhinhas tem, "a criança pode não ter consciência que está a somar, não está a aprender curricularmente a soma, mas no cérebro está a aprender o cálculo para fazer a operação de soma", descreve António Ponces de Carvalho.

Aos 5, começa a aprendizagem da cartilha maternal, em que as lições e a aprendizagem são feitas de modo individual e em que em vez de reconhecer as letras, é incentivada a reconhecer os sons. É o que Ponces de Carvalho descreve como "a consciência fonológica". E "ao final de 17 lições a criança lê uma história que começa com a frase 'Ó Pedro, que é do livro da capa verde?".

De todas as atividades, é na leitura que esse "efeito [dos bons desempenhos no 4º ano] se manifesta com maior magnitude", refere o relatório do CNE. "A pontuação média de um aluno cujos pais desenvolveram frequentemente atividades relacionadas com a leitura, tais como contar histórias, ouvir canções, ou conhecer letras, é significativamente superior à pontuação de um aluno cujos pais não realizaram este tipo de atividades", lê-se no documento.

Influência do pré-escolar para atenuar desigualdades

O problema, na opinião de José Morgado, é que tal como numa corrida de Fórmula 1, nem todas as crianças conseguem chegar à pole position, ou no primeiro lugar, ao 1.º ciclo. A qualidade das equipas em que correm (leia-se a maior ou menor capacidade e predisposição dos pais para fazerem esse acompanhamento) tem influência nisso. E nesse campo, a ida para o pré-escolar "ajuda a minimizar as experièncias familiares menos ricas e promove um maior nivelamento na grelha de partida".

O relatório do CNE refere que, no caso nacional, "a frequência de três ou mais anos representa um aumento significativo no desempenho em leitura para os alunos com "poucos ou alguns recursos", mas não tem um resultado estatisticamente significativo para o grupo com "muitos recursos". Este efeito é, aliás, "mais relevante para os alunos irlandeses, polacos e portugueses com menos recursos" e é quase indiferente o background dos estudantes noruegueses, finlandeses ou holandeses.

"Faz toda a diferença quando as crianças têm uma educação pré-escolar de qualidade e no 1.º ciclo", concorda António Ponces de Carvalho. "É determinante."

Fonte: Sábado

terça-feira, 17 de novembro de 2020

Capitalismo e desporto

 

"Não há jogo, há pessoas que jogam. Não há chutos, há pessoas que chutam. Não há fintas, há pessoas que fintam. Se não compreendermos as pessoas que fintam, chutam e jogam, nunca compreenderemos os chutos, nem as fintas, nem os jogos" - Manuel Sérgio, Filósofo. Catedrático da Faculdade de Motricidade Humana.


Acabei de ler a primeira parte de um notável artigo do meu grande Amigo, Doutor Manuel Sérgio. Na revista A Página da Educação, o autor fala de um mundo desigual, do capitalismo e desporto e, ainda, da falta de uma ética no discurso. A par de tantos outros, este é de relevante importância no quadro do pensamento. Deixo aqui algumas passagens, aquelas que à Escola dizem respeito e porque se dirigem à Educação de um povo:

(...) Capitalismo e desporto. Na Escola, relativamente ao desporto, quando se hipervaloriza a educação unicamente física sobre a formação integral, a disciplina sobre o espírito crítico, a instrução sobre a cultura e se esconde que a saúde não decorre tão-só de meia dúzia de saltos e corridas, mas de uma sociedade totalmente outra, também se concorre para o estabelecimento, a solidificação da ideologia dominante ou até o anúncio da ideologia típica dos Estados totalitários, que tendem imediatamente a destruir e absorver qualquer assomo de contestação ou de crítica. (...) O culto do sensacionalismo, a ambição da riqueza e o orgulho de ser o primeiro em proezas físicas, tão-só, atentam contra os mais autênticos valores morais, contra os mais autênticos valores democráticos. Conheço com alguma minúcia o que se passa nos grandes clubes portugueses, por generosidade de alguns dirigentes e treinadores de futebol. Desde há 20 ou 30 anos, o desporto - mormente o chamado desporto-rei, o futebol - passou a figurar no roteiro de grandes capitalistas, o que significa que nele encontraram um espaço privilegiado para a implementação das suas convicções. (...)" 

Nota
Revista A Página da Educação, Edição de Verão 2020, página 107.

sábado, 14 de novembro de 2020

La cruel pedagogía del virus


Este es el interesante título del pequeño libro que ha escrito el portugués Boaventura de Sousa Santos (Coimbra, 1940), autor al que sigo con admiración desde hace muchos años, sobre la crisis que estamos atravesando. Altamente recomendable su lectura. Se puede encontrar en cualquier buscador de forma gratuita.

Después de la crisis seremos distintos, pero no necesariamente mejores. Para ser mejores hará falta algo más que las simples evidencias. Hará falta clarividencia, unidad, solidaridad y voluntad para no repetir los errores. Lecciones duras, difíciles de asimilar. Lecciones que no se aprenden sin esfuerzo y humildad. El aprendizaje tiene que incorporarse a la construcción de una normalidad mejor, de más calidad humana, de más profundidad ética.



En medio del fárrago de fake news, de comentarios frívolos, de textos vacuos, de visiones apocalípticas y de conjeturas varias, es bueno acercarse a pensadores que, en parte por la edad y la experiencia y en parte por la sabiduría y el estudio profundo de la realidad, pueden aportarnos un análisis rico y riguroso de la crisis en la que estamos inmersos.

El virus está desarrollando una intensa pedagogía sobre el planeta. Imparte lecciones cada día para quien quiera aprender. Después de leer ese libro y muchos otros textos sobre la crisis que estamos atravesando quiero destacar diez ideas que considero importantes para comprender lo que sucede y afrontar el futuro de forma realista y positiva. Las tres primeras pertenecen al magisterio del pensador portugués.

Lección primera. La pandemia causa conmoción en todo el mundo, pero de forma desigual. Médicos sin Fronteras advierte, por ejemplo, de la extrema vulnerabilidad al virus de los miles de refugiados e inmigrantes detenidos en centros de intercambio en Grecia. En uno de ellos (campo de Moria) hay un grifo de agua para 1300 personas y no hay jabón. Los refugiados viven hacinados. Familias de cinco o seis personas duermen en un espacio de menos de 300 metros cuadrados. Esto también es parte de Europa, es la Europa invisible. Estas condiciones también prevalecen en la frontera sur de Estados Unidos, hay también allí una América invisible. ¿Nos importa que exista un orden mundial tan discriminatorio?

Lección segunda. El tiempo político y mediático condiciona cómo la sociedad contemporánea percibe los riesgos que corre. Ese camino puede ser fatal. Las crisis graves y agudas, cuya letalidad es muy significativa y rápida, movilizan a los medios de comunicación y poderes políticos, y llevan a tomar medidas que, en el mejor de los casos, resuelven las consecuencias de la crisis, pero no afectan sus causas. Por el contrario, las crisis severas pero de progresión lenta tienden a pasar desapercibidas incluso cuando su letalidad es exponencialmente mayor. La pandemia de coronavirus es el ejemplo más reciente del primer tipo de crisis. Mientras escribo esto, ya ha matado a unas 40.000 personas. La contaminación atmosférica es el ejemplo más trágico del segundo tipo de crisis. Como informó The Guardian el 5 de marzo, según la OMS, la contaminación atmosférica, que es solo una de las dimensiones de la crisis ecológica, cada año mata a 7 millones de personas.

Lección tercera. La extrema derecha y la derecha hiperneoliberal han sido (con suerte) definitivamente desacreditadas. La extrema derecha ha crecido en todo el mundo. Se caracteriza por el impulso antisistema, la manipulación grosera de los instrumentos democráticos, incluido el sistema judicial, el nacionalismo excluyente, la xenofobia y el racismo, la defensa de la seguridad que otorga el estado de excepción, el ataque a la investigación científica independiente y la libertad de expresión, la estigmatización de los opositores, concebidos como enemigos, el discurso de odio, el uso de redes sociales para la comunicación política en menosprecio de las herramientas y los medios convencionales. Defiende, en general, el estado mínimo pero aumenta los presupuestos militares y las fuerzas de seguridad. Ocupa un espacio político que a veces le fue ofrecido por el rotundo fracaso de los gobiernos provenientes de la izquierda que se rindieron al catecismo neoliberal bajo la astuta o ingenua creencia en la posibilidad de un capitalismo con rostro humano, un oxímoron que ha existido siempre o, al menos, que existe hoy.


Lección cuarta. De los 194 países soberanos que existen en el mundo reconocidos por la ONU con autogobierno y completa independencia, solo diez están gobernados por mujeres. Pues bien, esos países han tenido una gestión de la crisis más efectiva, más rápida, más audaz. Pensemos lo que ha pasado en Alemania, Nueva Zelanda, Islandia, Finlandia, Noruega, Dinamarca… Solo el 5% de los países del mundo están gobernados por mujeres. Pues bien, de los 12 más efectivos, 7 están dirigidos por mujeres. No es una casualidad. La gestión de la crisis en estos gobiernos ha sido más eficaz, más valiente, más creativa, más compasiva, más ética. (Hemos pensado alguna vez que no ha habido dictadoras en la historia?). Sobra mucha testosterona en el poder.

Lección quinta. En la mayoría de los países, para salir adelante, la oposición se ha mostrado colaboradora con el gobierno que ha tenido que gestionar una crisis sin precedentes a la que ha habido que hacer frente de forma imprevista y apresurada. Un gobierno aislado, machacado, criticado, y zancadilleado puede conseguir con más dificultad el éxito, que un gobierno apoyado, ayudado, estimulado y comprendido. En nuestro país, la actitud de la oposición ha sido escandalosa. El PP ha dicho una y otra vez que el gobierno es un caos y VOX ha insistido en que la solución a la crisis es la caída del gobierno.

Lección sexta. Hemos podido comprobar la importancia que tiene la sanidad pública. Los recortes que se realizaron y la privatización de los servicios han mermado la capacidad de respuesta ante la gravedad de la crisis. ¿Cómo no pensar en una forma segura y estable de garantizar la protección de la salud de todos los ciudadanos y ciudadanas de nuestra sociedad, sin entregar su suerte a la herencia o al azar?

Lección séptima. Se han presentado varios dilemas durante la crisis. Uno de ellos ha sido el de salud versus economía. Cuidar de la salud suponía destruir la economía. El primer ministro inglés Boris Johnson dijo que había que seguir con la actividad a pesar de que hubiera que pagar el tributo de muchas vidas. Luego, no sé si por la presión social o por qué, tuvo que rectificar. Ha habido otro dilema que se ha adueñado de la opinión pública: derecho a la libertad de expresión versus difusión de bulos y fake news. El derecho a la información se ha llenado de confusión y de mentiras. Un tercer dilema ha sido el de salud versus restricción de libertades. El gobierno ha confinado a la población para conseguir frenar la expansión del virus.

Lección octava. Los docentes han trabajado con esfuerzo, creatividad y coraje desde sus domicilios, en una experiencia jamás imaginada: desplegar un Proyecto Educativo desde una institución virtual que se expande por el espacio y por el tiempo y adaptar nuevas metodologías y formas de evaluación. Están siendo héroes anónimos. Es hora de valorar la importancia de la educación y de la investigación. El impacto de la brecha digital va a agrandar las diferencias durante la crisis y se van a hacer más graves e injustas las diferencias. Habrá que ayudar a los más vulnerables a recuperar el espacio perdido.

Lección novena. Nuestros ancianos y ancianas han sido castigados con crueldad por el covid-19. Muchos de ellos han muerto en condiciones lamentables de soledad y angustia. Las Residencias se han convertido en trampas terribles donde han encontrado la muerte muchos mayores por deficiencias de cuidado y de gestión. El personal sanitario se ha visto expuesto a situaciones de alto riesgo y hemos pagado un tributo elevadísimo de bajas y vidas He recibido una desgarradora carta de Rocío Casto Bertomeu en la que me cuenta que ha perdido en la crisis dos familiares a los que ha despedido en condiciones tristísimas: una sanitaria y una queridísima abuela. Cuánto dolor en sectores tan sensibles de la sociedad..

Lección décima. La crisis ha sacado lo mejor y lo peor de nosotros. En la crisis ha habido actuaciones heroicas sin límite, se ha desplegado un inmenso abanico de acciones generosas. Personas que ha arriesgado la vida para salvar a otros. Personas y grupos que han dedicado su tiempo, su conocimiento y sus bienes a la lucha por la recuperación. La ciudadanía ha respondido con responsabilidad y sacrificio a las exigencia que imponía el bien común. Pero también ha permitido mostrar lo más negativo de nuestro ser: personas que, con irresponsabilidad inconcebible, han contagiado a otras personas, individuos que se han enriquecido de forma injusta…

Después de la crisis seremos distintos, pero no necesariamente mejores. Para ser mejores hará falta algo más que las simples evidencias. Hará falta clarividencia, unidad, solidaridad y voluntad para no repetir los errores. Lecciones duras, difíciles de asimilar. Lecciones que no se aprenden sin esfuerzo y humildad. El aprendizaje tiene que incorporarse a la construcción de una normalidad mejor, de más calidad humana, de más profundidad ética.

Miguel Ángel Santos Guerra
Artigo publicado no blogue El Adarve [https://mas.laopiniondemalaga.es/blog/eladarve/], a 8 de maio de 2020.

terça-feira, 10 de novembro de 2020

As Escolas têm mesmo que se reinventar




Estou a iniciar a leitura da última revista "A Página da Educação". Logo a abrir uma entrevista ao Professor Domingos Fernandes, Catedrático na Escola de Sociologia e Políticas Públicas do ISCTE:

"A Escola, tal como hoje existe está esgotada; a sua lógica estruturante vem do século XIX e nós estamos no século XXI. Na verdade não estamos a ir ao fundo das questões, dos problemas, quer ao nível da organização e funcionamento das escolas, quer dos modos através dos quais crianças e jovens podem aprender (...) O que me parece é que temos os sistemas escolares numa espécie de cuidados paliativos, em que vamos experimentando/tentando algumas soluções para ver se aguentamos as coisas (...)".

Trata-se de uma síntese perfeita. Lamento, por isso, que depois de tantos e pertinentes alertas, os decisores políticos continuem a percorrer um caminho insustentável, onde as designadas "salas do futuro" e manuais em tablets constituem areia para os olhos. 
Certamente que regressarei a esta entrevista, pela clarividência de um Professor que não se acomoda perante os sinais destes "cuidados paliativos" na Educação.

domingo, 8 de novembro de 2020

Global Teacher Prize


Excerto de uma entrevista a Rui Correia, professor de História, vencedor do Global Teacher Prize (2019) - Jornal I, edição de 06.11.2020:

"Há miúdos de 10, 11, 12 anos que não têm quem lhes diga que valem alguma coisa (...) aulas de 90' são uma barbaridade (...) Reduzi as aulas para 15' (...)"

terça-feira, 3 de novembro de 2020

As escolas matam a aprendizagem




Sobre o tema Escola-Educação li o seguinte comentário: "Eu vi uma prova em que a professora pediu: Descubra no texto, três dígrafos, três monossílabos, três dissílabos, três polissílabos, três encontros consonantais, três encontros vocálicos ... enfim, eram 32 itens tendo três solicitações para cada um. Pobres crianças!!! - Maria Helena Finazzi.

Leandro Karnal, historiador brasileiro, escreveu: "Educar é seduzir para o conhecimento". O conhecimento é, portanto, muito mais do que dissílabos e encontros vocálicos. Aliás, podem responder certo à pergunta, mas não é através dessas respostas que dominarão a escrita com pensamento! Acabo por ficar com o Professor José Pacheco quando enaltece que "a prova, não prova". Não é possível SEDUZIR para o CONHECIMENTO, repetindo as lógicas pedagógicas do passado. Tenho para mim, mesmo com todas as minhas assumidas limitações, que tento escrever de uma forma mais ou menos escorreita, mesmo sem saber o que são "dígrafos, encontros consonantais e encontros vocálicos". Se me transmitiram essa matéria quando era criança, não me recordo. Porventura, em linguagem informática, fiz "delete". Por isso, por curiosidade, tratei de saber o que eram. Não me adiantou nada. Rigorosamente nada.
 
Que um professor Licenciado, Mestre ou Doutor, na sua formação tenha de saber, muito bem. Na formação básica, a opção pelo despertar para o conhecimento exige, necessariamente, uma outra via. Como disse Murilo Gun: acostumámo-nos a não ser "aprendedores", apenas "estudantes".

sábado, 31 de outubro de 2020

A arrogância, tarde ou cedo, paga-se, com juros!

 


FACTO

Através do Sindicato de Professores da Madeira (SPM), 3.640 docentes que exercem a docência na Região Autónoma, assinaram uma petição, entregue na Assembleia Legislativa da Madeira, visando o debate de algumas questões que consideram importantes, entre as quais o "combate ao desgaste e envelhecimento dos docentes na RAM". Não se tratava de aprovar, em decreto, fosse o que fosse, mas apenas esclarecer e sensibilizar os representantes do povo para determinadas problemáticas. Não entendo as razões, mas a verdade é que tal pretensão foi chumbada. 

COMENTÁRIO

Bem fez o SPM, sobre este assunto, apresentar uma "Carta Aberta a Sua Excelência o Presidente da República, ontem entregue a Sua Excelência o Representante da República para a Madeira e um voto de protesto na ALRAM por ter ignorado 3.640 cidadãos", segundo li em comunicado.

Incompreensível esta decisão do órgão máximo da Autonomia, ao não querer escutar as preocupações que emergem dos cidadãos. Então, perguntar-se-á, para que é que aquilo serve? Trata-se de um facto que explica, por outro lado, sustento eu, uma continuada "escola política" assente no quero, posso e mando, que se dá ao luxo, nem de disfarçar, apenas de impor o que lhe interessa: o silêncio. É essa a imagem que fica, a imagem que, inclusive, esquece que larguíssimas centenas de professores também terão ajudado a que esta coligação fosse possível. E fala-se, por aí, na democracia participativa! Um logro.

Os comportamentos políticos de uma certa arrogância não fazem sentido no tempo que vivemos, depois de uma experiência de várias dezenas de anos face à qual as pessoas fartaram-se. A "maioria" foi-se e tornou-se necessária uma coligação para governar. Mas ao que parece a "escola política" não dá sinais de ter aprendido com o seu próprio passado. Mantém-se insensível ao que a democracia tem de mais valioso: a abertura ao debate. Lamentável.

quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Boas Práticas?


FACTO

No encontro de "Partilha de Boas Práticas", que reuniu dezenas de professores, o secretário da Educação condenou a "replicação dos modelos de sucesso", sublinhando que é "no âmbito da autonomia (que) cada escola (deve) perceber aquilo que se faz nas diferentes comunidades educativas (...) A autonomia é exactamente esse princípio da decisão local". Fonte: Dnotícias

COMENTÁRIO

Não. Assim, não. Não vale mentir ou confundir! Toda a comunidade educativa, do Porto Santo à Calheta, sabe que o sistema sempre esteve centralizado e padronizado. Todos sabem que existe uma espécie de patrão a quem têm de "obedecer". Todos sabem que existe uma hierarquia que define a burocracia e espera que todos, solenemente, acatem. E todos sabem que as direcções ou professores que procurem inovar, podem ter a inspecção à porta. O caso do Curral das Freiras é paradigmático. 

Portanto, uma vez mais, lá dizia o Professor Licínio Lima, em tom severamente crítico: "SEJAM AUTÓNOMOS NAQUILO QUE JÁ DECIDIMOS POR VÓS". Em poucas palavras disse tudo. Daí que faça parte da encenação política, assumir e dizer aos professores que os estabelecimentos de aprendizagem são autónomos. Não é verdade. De todo. 

Só mais um aspecto de relevante importância: "partilha de boas práticas". Que boas práticas poderão existir, pergunto, se a Escola (o sistema) mantém um figurino organizacional, curricular, programático e pedagógico que não possibilita iniciativas diferenciadas? Só boa vontade, convenhamos, não chega. "Boas práticas" dentro do mesmo quadro de análise, só pode conduzir a determinados acertos nas margens que não alteram as questões de natureza substancial, capazes de alterarem o velho pelo novo.

Senhoras e Senhores Professores, tenham presente que, para além do que aqui me trouxe, não são respeitados. Não esqueçam que uma petição assinada por 3.640 docentes, apresentada pelo SPM, no sentido de serem debatidas, na sede da AUTONOMIA (Assembleia Legislativa), algumas importantes questões que preocupam os professores, foi liminarmente rejeitada pela maioria política. E era só para debater e esclarecer. Não se tratava de aprovar fosse o que fosse. Mas nem isso! Como se pode falar de autonomia dos estabelecimentos de aprendizagem se nem a democracia, expressa na participação activa, é "tolerada"?

Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 27 de outubro de 2020

A oralidade

 

Amiudadas vezes confronto-me com pessoas, muitas jovens ainda na fase de estudantes de qualquer coisa, e noto, frequentemente, uma acentuada dificuldade na oralidade. Há muitos anos que assim é. Não é fácil manter um diálogo sobre um determinado assunto, pois constato alguma ausência de capacidade argumentativa, vocabulário adequado e correlação entre temas ou ideias. Genericamente, a língua é falada de forma, eu diria, rudimentar, com frases que quase terminam antes de começar e com sucessivas palavras da gíria popular, onde se junta o "formato" das mensagens via net que quase necessitam de tradutor. Noto, em suma, uma combinação de ausência de conhecimento e de capacidade de análise, conjugada com uma notória falência na verbalização.



Obviamente que existem muitas e relevantes excepções. Mas, penso eu, não constituem a regra. E dou comigo a magicar nos porquês deste quadro, em que as palavras parecem divorciadas do ritmo do pensamento. Muito mais em situações de natureza formal. Parece que a língua, como soe dizer-se, tem espinhos! Adiante. 

Ora, a escola é determinante no desenvolvimento dessa capacidade. Tenho por adquirido que o currículo e os programas são agentes de bloqueio. Há matéria para verter na cabeça dos alunos, a sala ainda é um espaço tendencialmente de escuta, onde falar para questionar ou exprimir posições muitas vezes é considerado perturbador, portanto, a mentalidade pedagógica, salvo raras excepções, não é geradora e potenciadora de dinâmicas que promovam a oralidade. Obviamente que outros aspectos concorrem para este défice, porém, quando o sistema ainda obriga ao silêncio, naturalmente que não se pode esperar que, em um determinado momento, a criança ou o jovem apresentem uma desejável desenvoltura quando lhes é solicitada uma pontual apresentação ou uma descrição sobre um quadro, uma fotografia ou um qualquer tema. Nem através da voz, muito menos com a expressão facial e todos os outros movimentos corporais que têm um papel importante na comunicação.

Isto não pertence à aprendizagem do Português ou de qualquer outra disciplina. É uma questão que deveria ter uma natureza transversal. A escola segmentada, excessivamente programática e enciclopédica, contribui, decisivamente, para coarctar a oralidade. Regresso a um texto de 2018: "como já alguém referiu o mais difícil é fazer calar os professores. Eles são portadores de uma vivência, de muitos anos, enquanto estudantes, sentados, obedientes e seguidores do manual". Ao atingirem o patamar da docência há qualquer coisa que os impele para: "agora é a minha vez". Por outro lado, existe uma hierarquia política que não lhes confere margem para uma profunda inovação pedagógica. Estão subordinados a um programa que tem de ser transmitido e metido à força porque existe a cultura dos exames, porque estão condicionados pelo sistema de avaliação de desempenho, portanto, torna-se mais fácil seguir a norma e o manual, página a página! Calar-se, ser moderador e promotor da pesquisa, da investigação, do pensamento, elaborar sínteses e do saber explicar são aspectos que o sistema continua a demonstrar dificuldade em aceitar. 

É um paradoxo, por exemplo, pedir que exponha e, depois, que se classifique a oralidade de um aluno, quando não se desenvolveram os processos que a ela conduzem. E para quê classificá-la, questiono, quando essa apreciação tem um alto grau de subjectividade? Mas a escola é isto: promove o silêncio, mas depois quer pessoas de excelente oralidade; não encoraja o pensamento, a inovação e a criatividade, mas depois deseja que na vida sejam empreendedores; defende, pela cultura existente, o individualismo, mas depois quer capacidade empresarial para trabalhar em grupo ou em rede. Repito, é um paradoxo. E assim sendo, só existe uma saída: desconstruí-la e reerguê-la com toda a paciência, porque a escola virou cápsula e vegeta na bolha que os adultos construíram! 

Ilustração: Google Imagens.

Texto inicialmente publicado no blogue: www.gnose.eu

sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Muito para além da Covid


"(...) As crianças estão a crescer num tempo diferente (...) brincar diferente por obrigação, não por imaginação. A criatividade está limitada e assim fica muito mais difícil aprender a escola e aprender a vida. (...) Os adolescentes andam tristes, amarrados, inibidos no seu potencial de conquista e sedução. (...) Viver em contranatura só é suportável porque o mundo digital existe e, apesar de todas as questões que até agora se levantavam, hoje é a sobrevivência. (...)"



Estes são excertos de uma excelente opinião hoje publicada pela Psicóloga Manuela Parente. O artigo tem uma larga abrangência interpretativa que eu diria estar muito para além da Covid. Presumo que a autora, que habituou os leitores a considerarem o mundo para além das palavras, expressa convicções e preocupações que não se confinam (que mal esta palavra me soa!) ao estado pandémico que sobre nós se abateu. O "brincar", a "imaginação", a "criatividade", o "aprender a escola e a vida", a "tristeza", a "conquista", a "sedução", a "sobrevivência", isto é, em um parágrafo escreveu dez palavras de profundo significado, que trazem no seu bojo uma história que vem de longa data, muito antes desta vida de acentuados "medos" que muitas vezes impedem "suportar os desequilíbrios instalados".

Ora bem, contextualizando tudo isto na formação básica desejável, sinto que tais preocupações têm vindo a passar ao lado dos responsáveis políticos. Muito mais que decorar "definições" e conceitos disto e daquilo, que morrem no dia seguinte após o teste de avaliação, muito mais do que enfiar cabeça abaixo tanta tralha sem ter em conta as incertezas da vida real, melhor seria preparar para "aprender a escola e a vida".

É, por isso, que cada vez mais vejo a escola pelo ângulo da cultura no sentido lato da palavra e não pela "cultura enciclopédica". É por essa via que estruturamos e atenuamos os desequilíbrios de que fala a Drª Manuela Parente; é por essa via que relegamos o supérfluo e nos concentramos no essencial, no conhecimento portador de futuro; é por essa via que despertamos a curiosidade, as vocações e os interesses; é por essa via que é criamos o escudo tendencialmente protector perante tantos agentes de tensão.

Obviamente que tudo isto está muito para além da Covid. Nem souberam aproveitar este período de angústia para começar a desenhar uma escola com vida e de aprendizagem da VIDA, onde tudo cabe, todo o conhecimento é possível, quando subordinada a um formato organizacional, curricular, programático e pedagógico distintivo. Lamentavelmente, continuam a oferecer mais do mesmo!

A Psicóloga sabe do que fala... mas escutá-la é muito difícil. Dá trabalho. Vivemos tempos de ensurdecimento.

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Constatações


Nota prévia

Nutro enorme respeito pelas pessoas, sejam elas de profissões ditas como menos qualificadas, como por aqueles que possuem elevadas qualificações académicas. Todos são importantes para que a sociedade funcione. Outra coisa é o meu olhar quando essas pessoas desempenham cargos ou funções de natureza política. Portanto, fique claro que não confundo pessoas com desempenhos políticos, sejam de que partido forem.



Posto isto, hoje, li uma declaração política e um artigo de opinião. Na mesma edição do Dnotícias. Disse o secretário regional da Educação: 

"(...) Não deixa de ser interessante a ponderação de que estes números só seriam menos drásticos se a taxa de abandono escolar não fosse equivalente a zero, como efectivamente é, e se a taxa de sucesso fosse particularmente baixa, o que também não acontece, bem pelo contrário. Numa palavra, a ausência de casos de abandono da escolaridade obrigatória e o aumento dos casos de sucesso, também estão a fazer diminuir, por razões aceitáveis e aplaudíveis, o número de matrículas. (...)" 

Por outro lado, li no artigo do Dr. Rui Caetano, um Professor com larga experiência no sector da Educação, inclusive, em cargos de direcção de um estabelecimento de aprendizagem:

"(...) A taxa de abandono escolar ou de atividade de formação entre os jovens dos 18 aos 24 anos era de 13,7% em 2019, segundo dados do Observatório de Educação, sob a tutela da Secretaria Regional, porque o Eurostat, vamos lá saber porquê, deixou de publicar a taxa de abandono escolar precoce na Região a partir de 2016, nessa data, situava-se nos 23,2%. A estrutura de habilitações dos desempregados inscritos atualmente no Instituto de Emprego mostra que cerca de 46% desses cidadãos sem emprego possuem habilitações inferiores ao 3.º ciclo do ensino básico, demonstrando grandes  dificuldades em encontrarem trabalho devido à falta de competências e qualificações. E se incidirmos a atenção nos trabalhadores em funções, por conta de outrem, observamos que 31.743 trabalhadores possuíam apenas o ensino básico ou menos. Ao analisarmos a situação dos “nem nem”, jovens com idades entre os 15 e os 34 anos que não se encontram empregados nem frequentam qualquer sistema de educação, formação ou estágio, no final de 2019, a Madeira apresentava uma percentagem de 13,1%. As taxas de escolarização e de conclusão do ensino secundário dos jovens, na Região, entre os 20 e os 24 anos, rondam os 71,2%, isto é, quase 30% dos jovens madeirenses não concluem o ensino secundário. (...)"

Ora bem, não existe aqui lugar a qualquer equívoco. São duas posições completamente antagónicas. A do secretário da Educação baseia-se em palavras que, com boa vontade da minha parte, diria constituírem percepções sem fundamento; a do Dr. Rui Caetano assenta em números estatísticos constantes em documentos oficiais. Acredito, portanto, nos estudos e não em palavras de circunstância.

Mas esta confrontação factual explica, por um lado, que o poder político não olha a meios para atingir os seus fins; por outro, explica a falência do sistema. Os números apresentados são demolidores, não existindo qualquer forma de os contrariar. Trata-se de uma realidade sentida. O leitor que retire as suas conclusões.

Ilustração: Google Imagens.


ARTIGO DO DR.  RUI CAETANO


Os sucessivos governos do PSD-Madeira falharam nas políticas relacionadas com a formação e a educação dos madeirenses, apesar dos milhões e milhões de euros de fundos europeus disponíveis para este eixo de desenvolvimento. A inexistência de uma visão estratégica e de uma vontade em investir nas qualificações dos madeirenses, enquanto pilar do nosso desenvolvimento sustentável, são evidentes e, por muito que tentem esconder, as estatísticas desmascaram o insucesso. 
A taxa de abandono escolar ou de atividade de formação entre os jovens dos 18 aos 24 anos era de 13,7% em 2019, segundo dados do Observatório de Educação, sob a tutela da Secretaria Regional, porque o Eurostat, vamos lá saber porquê, deixou de publicar a taxa de abandono escolar precoce na Região a partir de 2016, nessa data, situava-se nos 23,2%. 

A estrutura de habilitações dos desempregados inscritos atualmente no Instituto de emprego mostra que cerca de 46% desses cidadãos sem emprego possuem habilitações inferiores ao 3.º ciclo do ensino básico, demonstrando grandes dificuldades em encontrarem trabalho devido à falta de competências e qualificações. E se incidirmos a atenção nos trabalhadores em funções, por conta de outrem, observamos que 31 743 trabalhadores possuíam apenas o ensino básico ou menos. 

Ao analisarmos a situação dos “nem nem”, jovens com idades entre os 15 e os 34 anos que não se encontram empregados nem frequentam qualquer sistema de educação, formação ou estágio, no final de 2019, a Madeira apresentava uma percentagem de 13,1%. 

As taxas de escolarização e de conclusão do ensino secundário dos jovens, na Região, entre os 20 e os 24 anos, rondam os 71,2%, isto é, quase 30% dos jovens madeirenses não concluem o ensino secundário. 

O investimento na qualificação dos quadros da administração pública segue o mesmo rumo. Ora, segundo o relatório da Direção Regional da Administração Pública de 2019, nos últimos 5 anos, as ações de formação alcançaram somente 11,6% dos funcionários e, no último ano, apenas 1,2% dos funcionários públicos participaram em ações de formação. 

Apesar desta dura realidade, que deveria exigir uma verdadeira aposta nas qualificações dos madeirenses, o PDES 2030, todavia, é pouco ambicioso na definição das prioridades para o eixo da educação e da formação. 

As linhas estratégicas definidas não são suficientes para se promover a mudança necessária da escola, das práticas pedagógicas e da formação profissional. Os objetivos traçados e as metas inscritas não apresentam uma ideia no sentido de se investir numa estratégia regional que inicie a estruturação de um novo modelo educativo, um modelo de escola diferente, assente nas aprendizagens, promotor de competências, de conhecimentos e do saber fazer, maior diversidade, mais inclusivo, mais próximo das exigências, dos desafios da sociedade de hoje e das expetativas dos alunos e das alunas. 

Como tem sido visível, o PSD e o CDS insistem no mesmo modelo de desenvolvimento assente no betão armado e não pretendem substituí-lo por outro, baseado no valor acrescentado, que exigiria mão-de-obra qualificada, com salários elevados. Ou seja, não só não mudam, como repetem o mesmo e mais forte – baixos salários e mão-de-obra desqualificada. Usando as palavras de Charles Talleyrand noutras circunstâncias, não aprenderam nada (o PSD) nem esqueceram nada (o CDS), aliás, no caso do CDS, esqueceram tudo - o que disseram. 

Rui Caetano