sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Outubro, mês de combate do bullying


Por Sónia Rodrigues
Educare
24-10-2019

20 de Outubro foi o Dia Mundial de Combate ao Bullying. Este fenómeno social, que pode ocorrer em qualquer parte do mundo, é mais frequente entre crianças e jovens no contexto escolar. O educare.pt foi conhecer os Projetos No Bully e Stop Bullying que atuam nas comunidades escolares.

Considera-se bullying todos os comportamentos agressivos, contínuos e intencionais com o claro objetivo de provocar mal-estar e controlo sobre outros e que normalmente envolve um desequilíbrio de forças e poder entre o agressor e vítima.
Para além do bullying físico, podemos considerar bullying verbal quando as palavras e os gestos são usados para ridicularizar e humilhar o outro; bullying relacional que implica exclusão, circulação de rumores ou até mesmo usar a vítima como bode expiatório e o cyberbullying muito comum e recorrente através das redes sociais e sms.

Inês Freire de Andrade conhece bem duas realidades. A realidade da vítima e a realidade de quem tenta acabar com este fenómeno. Alvo de exclusão numa primeira fase, foi no 9º ano que as coisas tomaram outros contornos e o bullying exercido sobre ela passou a ser mais verbal e relacional. ‘Foi uma enorme frustração perceber que havia pouca informação sobre como lidar com estas situações e que também não havia adultos disponíveis para perceber como intervir’, relata Inês.

Tendo sempre a própria experiência como base, Inês Freire de Andrade fundou, em 2016, juntamente com o marido e a mãe, a No Bully Portugal, uma associação sem fins lucrativos, que trabalha com escolas e os seus agentes, dotando-os com as ferramentas necessárias para prevenir, resolver e parar o bullying entre alunos.
‘Tentamos perceber qual era a metodologia que tinha mais resultados e quisemos saber mais sobre o projeto internacional No Bully, uma organização internacional, criada em 2003 nos Estados Unidos, com uma filosofia muito própria no combate ao bullying e com uma taxa de sucesso na ordem dos 90 por cento’ explica uma das fundadoras da No Bully Portugal.
Com recurso a valores que passam pela empatia, respeito, proatividade e inclusão, o sistema No Bully está preparado para capacitar todos os agentes escolares a lidarem com as situações de forma positiva e eficaz. A abordagem não prevê castigo, repreensão ou chamadas de atenção porque o método defende que se deve criar empatia junto dos praticantes de bullying e dos observadores, apostando num reforço positivo. Qualquer que seja a abordagem, despoletada pela escola ou até mesmo pela associação, é defendida a parceria a longo prazo e não a abordagem pontual, uma vez que acabam por ter um efeito pouco duradouro. O programa No Bully está projetado para um ano de intervenção, um ano letivo, que poderá ter regime de continuidade se for essa a vontade da escola. Durante este período considerado mínimo para um programa de sucesso, são feitas formações a todos os intervenientes da comunidade escolar, para que o envolvimento seja uma mais-valia no processo de identificação e anulação do bullying.
Apesar de não haver dados concretos ou atualizados, Luísa Marques, coordenadora de Educação para os Direitos Humanos da Amnistia Internacional Portugal considera que ‘o bullying é um fenómeno que continua muito presente, sobretudo nas escolas’.
Entre Setembro de 2014 e 2016, esta organização arrancou com o projeto Stop Bullying, desenvolvendo-o em seis escolas de norte a sul do país. Mas a escolha não foi aleatória. Implementado em simultâneo na Polónia, Irlanda e Itália, realidade comum e identificada nos quatro países envolvidos, as seis escolas selecionadas já tinham feito parte de um outro projeto que dava pelo nome de Escolas Amigas dos Direitos Humanos, com valores semelhantes à abordagem pretendida. ‘Se tivermos em conta os dados de 2013 disponibilizados pela Associação de Apoio à Vítima, o bullying era uma prática comum: 88% dos entrevistados conheciam vítimas de bullying, tendo 5% sido vítimas. E 55% dos casos aconteciam nas escolas e eram levados a cabo pelos pares. Perante estes dados considerámos que um projeto desta natureza poderia fazer a diferença na abordagem às situações de bullying’ justifica Luísa Marques.

Com o objetivo de reduzir o número de ocorrências de bullying e discriminação através da integração dos direitos humanos na vida da escola, com recurso á capacitação da comunidade escolar, o projeto Stop Bullying serviu para sensibilizar e informar, facilitando a criação de um ambiente seguro nas escolas com destaque para as práticas anti-bullying e anti-discriminação levando os jovens a adotar medidas preventivas dentro e fora das escolas.

‘Em Portugal, apurámos, através de um inquérito levado a cabo nestas escolas, que as principais motivações para o bullying eram a aparência física e a deficiência. Também concluímos que existia uma tendência para a normalização do bullying. Aceita-se o bullying como uma coisa normal, algo porque todos passámos e enfrentámos e que nos tornou mais fortes’ adianta a coordenadora de Educação para os Direitos Humanos da Amnistia Internacional Portugal. A perceção errada desta realidade também acaba por condicionar a avaliação da situação, mas permite trabalhar no desenvolvimento de ações de sensibilização mais direcionadas e específicas. Cerca de 48% dos 2400 alunos inquiridos não deram importância às situações de bullying de que foram alvo e maioritariamente também não recorreram a ajuda de adultos para travar o problema. Foi ainda identificado por este grupo de alunos fragilidades nos auxiliares por considerarem que estes não estavam preparados para intervir nestas situações.
No final do projeto Stop Bullying, os 2400 alunos, 142 professores e 94 assistentes operacionais envolvidos demonstraram maior conhecimento sobre bullying e formas de o prevenir, combater e lidar.
Também 75% dos professores notaram uma mudança nos comportamentos dos alunos considerando que se tornaram mais conscientes, mais preocupados com os outros e com ambiente escolar, além de conhecerem recursos para combater o bullying.
‘A nível global, os jovens e professores entrevistados no processo de avaliação notaram uma mudança substancial na atmosfera escolar, que se tornou mais amigável e onde houve um declínio na violência e incidentes de bullying. Os incidentes de bullying passaram a ser relatados com mais frequência e tratados sem atrasos. Além disso, foi reportado que as relações entre professores e alunos melhoraram’ reitera Luísa Marques.

Mas o combate ao bullying não se esgota aqui. Apesar de não haver propriamente um padrão definido, é necessária atenção redobrada para alguns sinais de alerta. O receio ou eventual recusa para frequentar a escola, quebra no rendimento escolar, lesões físicas ou até mesmo afastamento em relação a colegas e pais pode sugerir uma situação de risco iminente.

Com realidades tão diferentes e diversificadas, é importante que cada escola encontre e defina os seus próprios mecanismos de prevenção e combate ao bullying. Mas estas medidas só fazem sentido quando o mecanismo envolve todos os intervenientes da comunidade escolar nas várias fases do processo. ‘Obter as perspetivas dos diferentes elementos da comunidade educativa - de alunos, professores, assistentes operacionais, técnicos, direção da escola e pais – e do problema é importante para se conseguirem trabalhar soluções que sejam mais eficazes. Desta forma, as soluções são apropriadas por todos, cabendo a cada um uma parte da responsabilidade no combate a um fenómeno que é complexo e exige uma intervenção articulada’ defende esta coordenadora.
O projeto Stop Bullying deu origem a um manual onde reúne informação acerca do fenómeno mas é também um recurso educativo que disponibiliza uma série de ações participativas e refletivas sobre o tema.

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