terça-feira, 22 de agosto de 2023

Políticos e Professores leiam, por favor!


Por 
Víctor Cerqueira
Psicólogo Clínico

Nota
O meu Amigo Professor José Sacadura fez-me o favor de remeter este texto sobre Educação, sugestivamente baseado na afirmação: Portugal falha, porque falha a Educação. Vale a pena ler.


Portugal falha, porque falha a educação 1


Sempre me fez confusão, ninguém perguntar a razão de tantos e tantos relatórios (diagnósticos) ficarem nas gavetas ministeriais, ou outras.
Ficam na gaveta porque nós não temos capacidade de análise, síntese e de avaliação.

Nunca desenvolvemos estas capacidade no ensino. O nosso ensino tem como base a memória.
Pergunte a si mesmo o que é que mais lhe exigiam na escola?

E esta capacidade, a memória, em termos de taxionomia dos objetivos educacionais, no domínio cognitivo (Bloom e outros) é, digamos, o mais básico. Segue, a compreensão, (percebem porque temos dificuldade na matemática?) a aplicação, (percebem porque os médicos pedem tantos exames complementares?) a análise, (percebem porque há decisões judiciais com milhares de páginas?) a síntese e a avaliação.

Sempre de exigência superior em termos cognitivos.

Estas questões são pouco ou nada consideradas no ensino/aprendizagem, (já tenho escrito sobre o assunto em diversos fóruns), pois o que mais temos são "eruditos" na educação. Muitos no ministério, (alguns até foram ministros e secretários de estado) outros na formação (?) de Professores, outros ainda nas Universidades e ainda, na comunicação social.

Mas será que têm orgulho nos resultados? Já alguma vez tiveram a humildade de os avaliar?

Pois, não sabem como fazer...nem lhes interessa.

Portugal falha, porque falha a educação 2


Quando referi, no texto anterior, o processo didático referente ao desenvolvimento cognitivo defendido por Bloom e outros (taxionomia dos objetivos educacionais, no domínio cognitivo) tentava chamar a atenção para a questão didática na formação de Professores sem as quais não alteraremos este estado de coisas.

(didática – Ciência que estuda os métodos e técnicas para ensinar (Priberam ))

Que didáticas são utilizadas nas Escolas Superiores de Educação e nas Universidades no que diz respeito a formação de Professores?

Desenvolve-se processos de ensino/aprendizagem que promovam, tanto quanto possível, a individualização do ensino na sala de aula? Desenvolve-se processos didáticos que promovam o raciocínio critico? Mas também o raciocínio prospetivo? Desenvolve-se competências, enquanto futuros docentes, de autodesenvolvimento pedagógico/didático promovendo a sua autonomia? Desenvolve-se competências para a promoção, efetiva, do sucesso escolar/educativo dos alunos? Desenvolve-se competências nos futuros docentes para serem promotores efetivos de mudanças socias dos seus alunos, sem influencias político/partidárias, enquanto futuros agentes sociais promovendo e sensibilizando para a necessidade de que o elevador social esteja(sempre) presente no ato de educar?

Ou como me parece, continuamos com uma elevada “carga” de mais do mesmo? A verdade é que a novas e menos novas gerações de encarregados de educação continuam num registo em que se valoriza a nota, sobre todas as coisas, muito associada a uma competição que afasta, quem por razões, muitas vezes (quase sempre), tem mais dificuldade (s) de aprendizagem ou outras.
Continua a haver as disciplinas mais e menos importantes. Façam um esforço de honestidade intelectual pessoal, e imaginem que o vosso filho/a ficava retido/a por não ter notas às disciplinas seguintes: música, educação física e educação visual e tecnológica.

Sinceramente como reagiriam?

Seria assim tão fora do contexto se eu dissesse que estas disciplinas (e outras) só estão no currículo porque é suposto e seria um escândalo mundial se não estivessem, mas que nas cabeças de muitíssimas pessoas “não interessam para nada”?

Afinal o que mudou na nossa mentalidade nos últimos 60/70 anos?

O que de FACTO mudou nas nossas escolas e nos processos didáticos de uma maneira geral no nosso País?

Quando você, Pai/Mãe vai à Escola, que diferenças substanciais nota em relação à escola onde andou?
Nota: há bons exemplos de escolas com didáticas ativas e inovadoras (para o sistema habitual) mas, infelizmente, são excepções.

Porque se admiram que não avancemos vigorosamente para um melhor futuro??

Portugal falha porque falha a educação 3


A questão da avaliação dos alunos.

O ensino/aprendizagem no nosso país tem como centro de todas, mas todas as preocupações, a avaliação dos alunos.

O nível de insucesso dos nossos alunos ronda os 30% (talvez menos actualmente, fruto das dificuldades burocráticas que se levantam para a retenção dos alunos) e, segundo os Professores, não é real. Ou seja; se os Professores tivessem total autonomia na avaliação dos alunos o insucesso seria MUITO maior.

Vejamos alguns, poucos, exemplos lá de fora.

A Dinamarca instituiu sete anos (7) anos de escolaridade obrigatória em 1814. Há mais de 200 anos. A Suíça, obrigou a nove (9) anos de escolaridade em 1872.

Portugal implementou o ensino obrigatório do 7º 8ºe 9º no decorrer da última década do século passado. (José Afonso Baptista, Público 22 de outubro 1995).

Aqueles países acabaram com o insucesso escolar. A progressão dos alunos é automática e, no entanto, a exigência é muita e a selecção também.
A questão que sempre me pôs, é o de que as crianças daqueles países devem ser muito mais inteligentes e capazes do que as nossas.
Será?!

Quando se retém (chumba) um aluno o que é que se vai fazer com ele no ano de repetição? Na (grande) maioria dos casos MAIS DO MESMO!

Quais os alunos que chumbam mais? De uma maneira geral os mais carenciados sócio/economicamente.

As consequências psicológicas são visíveis e nada agradáveis. Se já se vem com o estigma da origem social a reprovação acentua a baixa estima: “não dou para os estudos”, por vezes esta baixa estima que é interpretada (e bem?) como exclusão, desenvolve a agressividade e a violência.

Esta violência, muitas vezes funciona como uma “arma” de afirmação e de “poder” sobre os outros.

Países como: Suécia, Noruega, Finlândia, Dinamarca, Japão…aboliram radicalmente a reprovação. Outros admitem-na em condições excepcionais (José Afonso, Público 22 de Outubro 1995) e nem por isso deixaram de fazer selecção.

A propósito do desenvolvimento cognitivo que referi no primeiro artigo, permitam-me chamar a atenção para o seguinte: Trump foi acusado de 37 crimes o documento de acusação TEM 40 PÁGINAS.

Alguém acredita que isto seria possível por cá?

O problema é que não sabem porquê.

A razão é simples; NÃO DESENVOLVEMOS A CAPACIDADE DE ANÁLISE E DEPOIS DE SINTESE e não temos consciência disso por que não nos interrogamos do porquê de certas situações.
Simplesmente NÃO mudamos!!!

Portugal falha porque falha a educação 4


Ao jeito de conclusão

Uma das grandes virtudes do Portugal de abril, talvez a mais importante na minha opinião, foi ter conseguido por TODAS as crianças na escola.

Mas a massificação do ensino acarreta as suas dificuldades: desde logo o abaixamento do nível de aprendizagem, passar de um sistema eminentemente elitista e selectivo para um sistema de acesso de todos à aprendizagem, naturalmente, trouxe um abaixamento de nível.

Nada importante, considerando o facto de termos TODOS os meninos e meninas na escola.

A questão da massificação do ensino, nunca levantou um verdadeiro debate de como teriam de funcionar as escolas para incorporar todas as crianças, oriundas de diversos contextos sociais e económicos. Muitas destas crianças, nomeadamente das zonas rurais do interior, nunca tinham bebido leite ao pequeno almoço, nem sabiam o que isso era…

Como sempre, lá fomos “desenrascando” com mais ou menos qualidade, com muitíssima dedicação, e muito AMOR. Também com muito pouca reflexão (?) sobre a formação dos Professores e quem os devia formar.

Foram os estágios nas escolas, depois a formação em exercício, mais tarde vieram das ESES e das Universidades. Vieram os Professores com a formação “integrada”. Qual a qualidade? Diversa, e dependendo muito das Escolas e Universidades de onde vinham.

Teorias? Muitas, e supermodernas, maioritariamente originárias de países que para além de nada terem a ver connosco em termos sócio/económicos e de desenvolvimento, tinham feito a sua massificação há muitos anos atrás, alguns, séculos atrás. (ver artigos anteriores) NOTA: aos chamados estágios funcionaram BEM!!

NUNCA houve um verdadeiro programa para a educação no nosso País. Que devia começar pela formação dos Professores, até à organização das escolas e turmas, passando naturalmente pelos currículos escolares que são uma “manta de retalhos” que também vai sendo mudado conforme os “apetites” de quem está no momento no poder. Ou seja; um programa de cima a baixo.

Uma das razões desta situação é que as discussões (?) são quase sempre (?) inquinadas por (pre)conceitos ideológicos sabendo nós que a educação NÃO é neutra.

Pensar que meter nas escolas crianças (muitíssimas) que veem de lares disfuncionais, com déficits brutais de competências sociais (até de linguagem) numa escola, ela própria (progressivamente) disfuncional foi acender o fósforo num lago de gasolina.

A escola foi-se degradando ano após ano, com problemas sérios de disciplina, diria, quase generalizados.

E nada, mas mesma nada, de fundo foi sendo feito. E, também, sem uma avaliação RIGOROSA da formação de Professores em TODAS as instituições. Avaliação essa que deve deve ser PERMANENTE.

A autonomia pressupõe RESPONSABILIDADE e escrutínio.

E agora?

Não sei, sinceramente não sei, mas penso que o retorno ao essencial é fundamental, ou seja, a formação dos Professores nomeadamente em termos didáticos tendo em conta a nossa realidade e as nossa necessidades de desenvolvimento.

Vem-me sempre à memória o que o Marquês fez na (minha) Universidade de Coimbra. Promoveu todos os Padres a cónegos, e depois reformou-os, contratou novos docentes, muitos deles estrangeiros…

Victor Cerqueira
22/08/2023

Sem comentários:

Enviar um comentário