FACTO
"Carta do leitor" publicada na edição de hoje do DN-Madeira:
"Muito objetivamente: como se explica o desfasamento entre os resultados escolares – um longo percurso – e os resultados de um exame realizado em poucas horas? Certamente, não me compete a mim explicar; cabe-me, contudo, questionar enquanto mãe preocupada e indignada, onde residem as falhas? Pois, só podemos melhorar se identificarmos os erros. Não terão os alunos (aqueles que se aplicam o ano todo) estudado o suficiente? Não estarão os professores a ensinar de forma correta e adequada ao Programa exigido pelo Ministério da Educação? Não estarão as escolas direcionadas para um ensino de qualidade, correção e justeza? Que descalabro nacional foi este? E porquê somente em determinadas disciplinas? Urge uma análise séria, transparente e profunda! Alguém que a faça, por favor! (...)" - Filomena Costa.
COMENTÁRIO
Esta carta, por múltiplas razões, não só é oportuna como formula questões que deveriam ser objecto de profunda reflexão. Sobre esta matéria já aqui defendi a minha posição e, embora corra o risco de ser repetitivo, regresso ao assunto com algumas breves notas susceptivas de provocarem o debate. Sublinha a leitora: "(...) só podemos melhorar se identificarmos os erros". Aqui está o cerne da questão. O problema é que ninguém quer identificar os erros. Os políticos andam entretidos com as margens do problema e não com o âmago. Discutem, por exemplo, se o ano escolar deverá ter três trimestres ou dois "semestres", aspecto de somenos importância, mas não discutem as verdadeiras questões da autonomia gestionária, as questões da diversidade, os currículos, os programas e os paradigmas pedagógicos. O sistema está refém de uma mentalidade confusa e incongruente, que tem vindo a passar por gerações sucessivas, incapaz de, corajosa e paulatinamente, procurar novos caminhos. Os próprios pais e encarregados de educação, genericamente, sobrevalorizam este tipo de escola, claramente desfazada do tempo que estamos a viver, até porque nunca lhes ofereceram uma alternativa. Ninguém se mostra interessado em mexer no núcleo, onde quase tudo está por fazer, talvez no pressuposto infantil que se alicerça no receio de trocar o conhecido pelo desconhecido. Dá muito trabalho! E sendo assim, jogam com balofas meritocracias e com um "campeonato de vintes" enquanto espectáculo mediático. Fico por aqui nas considerações sobre as quais tantas vezes me tenho posicionado, mas deixo uma pergunta baseada em um cálculo simples e elaborado em números que apenas pretendem ilustrar a caricata situação dos exames:
Entre o 5º e o 11º medeiam 7 anos. Admitamos uma média de nove disciplinas por ano. Cada disciplina dispõe, em média, de três avaliações formais por período, o que significa nove por ano. Multiplique-se nove avaliações por nove disciplinas e obtemos o valor de oitenta e uma avaliações por ano. Em sete anos um aluno, neste sistema, é avaliado, em média, repito, 567 vezes pelos professores, afora outras avaliações, muitas, até, de natureza subjectiva. Grosso modo, é avaliado entre 500 e 600 vezes. Pergunto: em uma escola séria, honesta, de rigor e qualidade serão necessários exames?
Acrescem, ainda, as provas de 4º ano e os anos sujeitos a aferição do sistema. Para quê? Se desejam aferir o sistema, basta que, aleatoriamente, escolham, por ano, um determinado número de alunos e apliquem um teste. Se bem delineado, os resultados, com margens de erro pouco significativas, poderão ser extrapolados para a população geral.
Quanto ao 12º ano, ainda é necessário um exame de acesso. Mas convicto estou que, mais cedo que tarde, o formato será outro.
Muito poderia discorrer sobre este posicionamento. Não se trata de quadros de facilismo, pelo contrário, não abdico de um sistema organizacionalmente pensado no conhecimento. E tudo é possível aprender! É, por isso, que me encontro nos antípodas deste sistema que não conduz ao saber, que não respeita vocações e projectos de vida e que se entretém em debitar matéria para avaliar e logo de seguida esquecer.
Ilustração: Google Imagens.
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