quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Será a relação avós-netos um porto de abrigo seguro?


Durante o confinamento avós e netos não coabitantes viram as suas casas encherem-se de saudades. Os netos mais pequeninos nem compreendiam a ausência dos avós, o que aumentava mais a mágoa de todos. A relação avós-netos tornou-se tema de muitas crónicas nos meios de comunicação social. E ainda bem! Tanto avós como netos beneficiam com a existência de um relacionamento frequente e saudável. As vantagens alargam-se aos pais das crianças.



- É verdade que os avós sentem mais saudades dos netos do que dos filhos? - perguntou a mãe de um adolescente a uma amiga, avó de um menino de pouco mais de um ano, quando se reencontraram após o confinamento. Estava incrédula e parecia até algo preocupada.

- Sim, foi o que senti. Mas não é possível comparar. O amor pelos filhos não diminui quando se lhe acrescenta o amor pelos netos – respondeu a amiga, procurando tranquilizá-la.

Durante o confinamento avós e netos não coabitantes viram as suas casas encherem-se de saudades. Os netos mais pequeninos nem compreendiam a ausência dos avós, o que aumentava mais a mágoa de todos. A relação avós-netos tornou-se tema de muitas crónicas nos meios de comunicação social. E ainda bem! Tanto avós como netos beneficiam com a existência de um relacionamento frequente e saudável. As vantagens alargam-se aos pais das crianças.

Do que sentiram com a impossibilidade de estarem com os netos durante o confinamento, falam vários escritores numa reportagem do jornal Público do dia 11 de maio: António e Isabel já viram os netos, Alice não vê a hora de os reencontrar.

O sorriso marca a cara dos avós quando pensam nos seus netos ou quando antecipam o momento do novo reencontro. Ir buscá-los à escola, ficar com eles enquanto os pais trabalham ou simplesmente almoçar com um neto já adolescente ou adulto são momentos de prazer correspondido que melhoram o bem-estar emocional de uns e outros. Avós e netos que convivem frequentemente beneficiam de uma rede social alargada a gerações mais distantes, com vantagens para todos. A competência de crianças e jovens para estabelecerem relações interpessoais com pessoas de diferentes níveis etários sai reforçada, a par com uma maior abertura e capacidade para se colocarem no lugar no outro. Quanto aos avós, têm uma melhor possibilidade de conhecer e compreender melhor a geração mais jovem. A nível cognitivo, as vantagens são, igualmente, mútuas: com uma sabedoria acumulada ao longo da vida, os avós podem, por exemplo, ajudar os netos a olhar para um qualquer problema de forma mais abrangente e com um repertório de estratégias de resolução mais diversificado; os netos, por seu turno, poderão, eventualmente, ajudar os avós a lidar melhor com as novas tecnologias. As histórias de vida e da família que os avós não se cansam de contar aos netos dão a estes um enraizamento mais sólido da sua identidade familiar, além de reforçarem os laços de afeto e de constituírem um inestimável acervo de memórias. Os desafios colocados pelo relacionamento com os netos promovem, nos avós, uma estimulação cognitiva bastante protetora das suas capacidades intelectuais.

Mas não são só avós e netos os beneficiários da relação entre ambos. Os pais que podem contar com o apoio dos avós para cuidarem dos seus filhos saem também a lucrar. Que o digam os pais que não precisam de se preocupar com o desfasamento entre o seu horário de trabalho e o horário da escola, ou os casais que gostam de sair de vez em quando e podem contar com os avós para ficarem com os seus filhos.

Finalmente, gostaria de ressalvar a necessidade de os avós respeitarem os princípios educativos dos pais e não quererem sobrepor-se a eles. Infelizmente as relações entre avós e netos ou entre avós e os pais dos netos não são sempre idílicas. As tentativas de sobreposição dos avós aos pais na educação dos netos encontram-se, muitas vezes, na base de conflitos que comprometem essas relações.

Dos seus avós, que considera que eram “heróis perfeitos”, diz Valter Hugo Mãe: “serão sempre o meu porto de abrigo” (In Serei sempre o teu abrigo, 2020, Porto Editora). Vou mais longe: os avós são um porto de abrigo seguro para os netos e os netos são um porto de abrigo seguro para os avós.

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ARMANDA ZENHAS
Professora aposentada. Doutora em Ciências da Educação pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto. Mestre em Educação, área de especialização em Formação Psicológica de Professores, pela Universidade do Minho. Autora de livros na área da educação.
Professora profissionalizada nos grupos 220 e 330. Licenciatura em Línguas e Literaturas Modernas, nas variantes de Estudos Portugueses e Ingleses e de Estudos Ingleses e Alemães, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Professora profissionalizada do 1.º ciclo, pela Escola do Magistério Primário do Porto.

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