sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Antes de aprender é preciso descobrir a beleza das coisas


Por
FRANCISCO SIMÕES
Escultor
JM / 13/08/2021 

Quando comecei a ensinar os meus alunos a plantar morangueiros, tomateiros, feijões e flores não iniciei a actividade mostrando e utilizando os sachos, as pás, as enxadas, as tesouras.




Mostrei-lhes os terrenos disponíveis, mostrei-lhes jardins, hortas, parques infantis. Chamei a atenção para as árvores, para as suas belas formas, os seus troncos e folhas, as suas lindas cores, pedi-lhes que tocassem e vissem, sentissem com as mãos as texturas.

Pedi-lhes que fechassem os olhos e inspirassem o perfume das árvores, das flores e do campo.

Finalmente, chegados aos terrenos da escola mostrei-lhes e expliquei para que serviam e como utilizar as ferramentas.

Quando comecei a ensinar os meus alunos a desenhar não lhes dei papel nem lápis, mostrei-lhes a natureza, as montanhas da Serra d’Água, o mar na vila da Ribeira Brava, os peixes e os frutos no mercado, mostrei-lhes pedras, madeiras, plásticos, ferros, tecidos, cartões e pedi-lhes que, de olhos fechados, fossem vendo com o tacto a diferença das temperaturas e das texturas de cada matéria que estávamos tacteando.

Mostrei-lhes que podíamos falar com a natureza. Que uma flor murcha me estava a dizer que tinha sede, que um fumo lá ao longe me estava a dizer que havia fogo ou que as nuvens muito escuras me estavam a avisar que poderia chover. Só finalmente lhes dei papel e lápis para desenharem o que já tinham aprendido a ver com os sentidos todos.

Quando comecei a ensinar-lhes poesia comecei por ouvir muitos poemas, cantar muitos poemas e por teatralizar outros e, finalmente, eles começaram a escrever contos poéticos fascinantes e, por palavras ditas e escritas, abriam o mundo encantado que existia na caixa mágica das suas imaginações.

Quando lhes ensinei matemática, recolhíamos os frutos das nossas hortas em grupos pares ou dezenas, constituíamos conjuntos, estabelecíamos comparações percentuais e elaborávamos estatísticas.

Finalmente fazíamos contas para completar com precisão o que tínhamos matematicamente compreendido.

A beleza da matemática, a beleza das letras e da poesia, a beleza das formas, das cores dos desenhos vem da experiência da beleza sentida em cada coisa. Essa experiência da beleza das coisas chega antes das próprias coisas.

Depois chegam os livros, cada livro é um mundo com muitas portas e muitas janelas para abrirmos e descobrirmos e inventamos novos mundos, novas experiências e novas coisas belas.

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