sábado, 8 de abril de 2017

"CAMAS DE PEDOPSIQUIATRIA ESTÃO SEMPRE OCUPADAS"


É o título de mais uma importante, porque muito oportuna, entrevista ao Psiquiatra Dr. Ricardo Alves. Clarificou: "(...) É algo preocupante (...) que tem a ver com vários factores. A sociedade quer tudo para ontem. As pessoas não têm tempo para respirar, para falhar, para aprender e lidar com a frustração. A nossa geração aproveitou a adolescência para brincar, para errar, para fazer asneiras e aprender. Hoje não há essa hipótese e ao falharem julgam que já nada faz sentido (...)". Excelente síntese. Palavras do médico, que não não deixou de conseguir o seu objectivo académico e toda a sua formação até à especialidade, tendo desfrutado de tempo para "brincar, errar, fazer asneiras e aprender". Será que ninguém consegue ouvir este especialista, os investigadores, os professores, os psicólogos, os sociólogos ou a mensagem dos grandes pedagogos?


Nos últimos sete anos, segundo os dados recolhidos pelo jornalista Élvio Passos (DN-Madeira) a média de suicídios na Região foi de dois por mês e as tentativas de suicídio de 39 também por mês. São múltiplos os factores que estão nas causas, mas o significado maior, em síntese, parece-me ser este: a sociedade está profundamente doente. E o que é mais preocupante, para além dos graves dramas sociais vividos por toda a Região, é o facto dos jovens estarem a ser vítimas deste colapso social. O drama não é novo. A 22 de Novembro de 2009 escrevi no meu blogue: "(...) Hoje, com grande oportunidade, o DN-M insere um importante trabalho da autoria do Jornalista Ricardo Duarte Freitas sobre as causas do suicídio. A páginas tantas, o juiz do Tribunal de Família e Menores, Dr. Mário Silva, sugere uma reflexão sobre o actual modelo de sociedade que estamos a construir para os jovens. "O suicídio e o parassuicídio (tentativa de suicídio) são problemas que, naturalmente, me preocupam e que me levam a reflectir sobre o modelo de sociedade que estamos a construir, nomeadamente para os nossos jovens, com a busca exaustiva da perfeição aos vários níveis e com expectativas por vezes excessivamente altas". Passados sete anos, questiono, o que mudou perante tão sério alerta? Que medidas estruturantes foram tomadas? O que mudou no sistema educativo no quadro da Autonomia? Que políticas sociais, onde se incluem as políticas de emprego e de família, travaram este tenebroso caminho? Responda quem souber.
O que se constata, cada vez mais, é o aumento de antidepressivos. Desconheço o consumo na Madeira, mas, Portugal no seu todo, no ano passado, o consumo foi de quase oito milhões de embalagens. Significativo! Passámos da "Sociedade da Manufactura para a Sociedade de Mentefactura", na feliz síntese de Luís Cardoso. É verdade que, o que hoje está em causa, não é o músculo mas a cabeça e sobretudo a FACTURA. E as crianças começam, desde muito cedo, embaladas nessa lógica competitiva e suicidária. Pressionadas até ao tutano pelas acéfalas avaliações escolares, por uma abstrusa meritocracia e quadros de honra, por currículos e programas que não respeitam o tempo e a sua cadência. Importante é a medição como se a educação fosse uma corrida. A folha de Exel, meticulosamente criada com percentagens para isto e para aquilo que ditam um nível ou uma nota final, está primeiro que a criança e o verdadeiro conhecimento. Cumprir o manual tornou-se paranóico, quando se sabe que a maioria do que é transmitido e respondido nos testes de avaliação (fundamentalmente no Ensino Básico), é para esquecer ou pouca relevância tem para a vida. O adulto é que manda e com enorme desfaçatez assume que a criança está no centro das preocupações educativas! Não está. A criança está cada vez mais na margem e, portanto, não é estranha uma revolta silenciosa que alguns designam por indisciplina. Dizem: não sabe estar quieta, perturba, fala muito com os outros, faz muitas perguntas, etc., curioso, porém, é que ninguém se questiona sobre as causas, se é no processo que está o erro! Porque há uma diferença muito significativa entre a má educação (cumprimento de regras) e o desajustamento ao processo imposto e que a muitos nada diz. Há tempos o Juiz Conselheiro, hoje jubilado, Laborinho Lúcio, ele que não é docente, mas evidencia uma leitura sistémica do processo, veio transmitir que não tarda o dia que as crianças dirão que têm um adulto dentro de si. E nesta anormal perspectiva do sistema educativo, lamentavelmente, embarcam governantes, professores e muitos pais. Que os governantes não saibam ou não queiram, bom... tolero-os. Já dos professores, não aceito. Eles que às centenas recorrem ao atestado médico por depressão, esgotamento, exaustão emocional, mental e física intensa (síndrome de Burnout - "queima até ao fim" que afecta 30% dos docentes portugueses)eles que sofrem a dureza do trabalho em função do desajustamento dos alunos por causas sociais diversas, sofrem com a violência da escola e na escola, que muitas vezes se sentem sós, perdidos entre a loucura das exigências e a incompetente atitude dos governantes, entendo eu, aos professores deveria competir-lhes a revolta expressa em uma só palavra: CHEGA! Têm preferido o silêncio. A doença ao grito.
Ilustração: Google  Imagens.

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