quinta-feira, 29 de junho de 2023

A disparidade entre o sentimento da sociedade e o dos políticos


Da responsabilidade do Jornalista Miguel Fernandes Luís segui, na edição de ontem do Dnotícias, o resumo de uma conferência-debate no quadro de um designado "Fórum de Emprego". O jornalista conseguiu resumir em breves depoimentos e de uma forma muito acutilante as "lições" que se colocam ao emprego do (no) futuro. Uma síntese que dá "pano para muitas mangas"!



Sigamos os subtítulos dos vários depoimentos: 

"Atenção à evolução do mercado"; "Seguir o sonho e a felicidade"; "Inovar"; "Não ter medo de falhar"; "Ser activo na procura de emprego"; "Horários amigos das famílias"; "Dar formação"; "Aumentar salários"; "Bom ambiente de trabalho"; "Regras claras"; "Contar com a opinião do trabalhador"; "Procura do talento"; "Alterar o sistema de ensino: apelos a uma "ruptura cultural no sistema de ensino" (...) "As escolas deviam conseguir perceber quais são os talentos de cada criança e desenvolvê-los. Eu tenho um filho de 14 anos e olho para o sistema de ensino e é muito parecido com o da minha altura".

Parabéns ao Jornalista e às diversas figuras que produziram tão excelentes sínteses. Tudo aquilo é o que, directa ou indirectamente, a Escola não promove e que aqui, ao longo de anos, tenho feito eco, divulgando o que tantos têm evidenciado sobre o tema da aprendizagem com vida e para a vida. Encontramos naquelas posições o busílis do problema. Vou ponto por ponto: 

1. Evolução do mercado. A escola está fechada no interior dos seus muros e não consegue sequer colocar um escadote para espreitar e perceber o que se está a passar nos vários sistemas; 2. Seguir o sonho. A escola, talvez melhor dizendo, o sistema, produz(iu) um fato igual para todos quando devia ter presente que todos são diferentes e todos são portadores de sonhos; 3. Inovar. Pergunto, como? Se o sistema está centralizado e rigidamente hierarquizado, onde os professores e os alunos apenas funcionam como peças que alimentam o centro operacional, cumprindo o rigor dos manuais e dos exames; 4. Não ter medo de falhar. O sistema não possibilita o erro, pois baseia-se na transmissão vertical do "conhecimento" e, na ausência de investigação/experimentação própria, impõe uma avaliação permanente perante o que é considerado certo. 5. Ser activo. Impossível ou dificilmente concretizável, quando, durante anos, o sistema limita(ou) através da submissão a uma lógica de obediência cega a currículos, programas, notas e à sobrevivência; 6. Horários compatíveis com as famílias. Desde cedo, o sistema, tendencialmente, transporta para dentro da escola as lógicas nocivas do funcionamento da sociedade: a competição entre alunos (e também entre professores na ascensão na carreira), constituindo um sinal claro o facto de, em média, os estudantes, na compaginação das suas actividades semanais, dedicarem cerca de 56 horas de ocupação, face às cerca de 36/40 horas dos pais. Há estabelecimentos de educação abertos até às 23 horas. 7. Dar formação. Qual? Isto, quando os políticos não discutem os factores geradores de uma formação portadora de futuro, para a vida, e apenas se circunscrevem à rotina! 8. Bom ambiente de trabalho. A manter-se neste sistema, genericamente, a escola nunca beneficiará de um bom ambiente. Por um lado, porque tudo está previamente definido, tal como na fábrica, os horários, o processo de "fabrico", as estações de funcionamento e a avaliação do produto; por outro, porque as imposições colocadas aos professores na carreira docente e a falsa ideia que o aluno está no centro das políticas educativas, mostram-se incompatíveis com um ambiente favorecedor da aprendizagem; 9. Regras claras. Pois. repito, está tudo definido e quando falam de autonomia escolar aplica-se o que o Professor Licínio Lima disse: "sejam autónomos nas decisões que já tomámos por vós". Está tudo clarinho como água! Se se aprende assim, como alterar a mentalidade ziguezagueante? 10. Contar com a opinião do trabalhador. Exactamente isso. A escola, salvo raras excepções, porque é heterónoma, o aluno está ali para cumprir, não para ter opinião. As recentes declarações políticas sobre a posição dos alunos na Escola de Hotelaria constituem um exemplo claro. 11. Procura do talento. Houve um tempo que se viveu a histeria dos "sobredotados". Isso morreu. Hoje, o que a escola faz é esmagar o talento através da padronização. A confirmar está a declaração de um interveniente: "As escolas deviam conseguir perceber quais são os talentos de cada criança e desenvolvê-los. 12. "Alterar o sistema de ensino". A resposta encontra-se numa declaração também de um interveniente no Fórum:  Eu tenho um filho de 14 anos e olho para o sistema de ensino e é muito parecido com o da minha altura". Para quê mais palavras?

Em todo este processo só não acertaram no alvo duas figuras, exactamente políticas. De forma simplista, o presidente da Câmara do Funchal falou que "(...) quem trabalhar recebe, quem não trabalhar não recebe e vai para a rua (alteração da legislação laboral) e a vice-presidente que falou em "baixar os impostos". E, assim, parece-me, que para estas duas figuras o problema ficaria resolvido. Esquecem-se que os alunos de hoje, amanhã, serão empresários ou colaboradores das empresas.

Ilustração: Google Imagens.

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