segunda-feira, 28 de maio de 2018

A OBSESSÃO PELA AVALIAÇÃO

As escolas são todas diferentes, mas os exames são iguais para todos. Os públicos são distintos, as origens sociais diversas, os professores diferentes, as culturas locais díspares, como podem, então, os exames serem iguais para todos? É uma pergunta que desde há muito me intriga. Não apenas por isso, mas porque rejeito o conhecimento enciclopédico e defendo o pensamento crítico. De que interessa, hoje, a memorização e o domínio das respostas do manual, quando tudo muda no instante seguinte? Quando tudo se apresenta de forma complexa, integrada e quando as palavras de ordem constituem um misto de criatividade, inovação e competência?


Recentemente, li uma assertiva síntese de Alexandre Homem Cristo (Observador): "(...) Sem pensamento crítico ou capacidade para articular as diferentes informações, pouco distinguirá o jovem que conhece uma determinada data histórica daquele outro jovem que, em dois cliques, a descobriu pesquisando no Google (...)". A questão situa-se, portanto, entre a memorização sem sentido, a repetição exaustiva e cansativa e o PENSAMENTO CRÍTICO e interligado. O fulcro das mudanças no sistema educativo reside aqui, no completo desacerto entre as multi-respostas que a vida impõe e que exigem pensamento interligado, plasticidade e adaptabilidade e o quadro de referências, genericamente estático, salvo algumas excepções, que enforma o sistema de aprendizagem. E assim sendo, que sentido fará, em um mundo dominado pela tecnologia e pela informação, a sua utilização nos estabelecimentos de aprendizagem ainda seja, lamentavelmente, muito condicionada, senão impedida, quanto muito experimentalmente tolerada, facto que conduz à pergunta: qual o fundamento em perpectuar um sistema arcaico, obcecadamente, centrado na avaliação "do que é dado" e não no verdadeiro conhecimento? É óbvio que aquilo que é debitado para logo ser esquecido não traz no seu âmago qualquer pensamento crítico e aprendizagem. 
Ora, uma cultura de exigência e de conhecimento percorre, necessariamente, outros caminhos em qualquer área ou domínio. A descoberta do gosto pelo estudo, a sua dinâmica ao longo das etapas do crescimento, o interesse, o esforço e a dedicação, entre tantos outros factores, não se interiorizam e conquistam com repetido "paleio de cátedra", com palestrante de um lado, repetindo o manual, receptores do outro, mas como Albert Einstein sintetizou: "a única fonte de conhecimento é a experiência". Isto significa que quando apenas se avalia a memória, não é possível determinar de forma fiável as aprendizagens. Mas é essa a cultura dominante, entre professores e pais. As "notas" e os "níveis" estão doentiamente em tudo, do Português à Matemática, da Educação Física à Música, do ballet às academias disto e daquilo! Pior, ainda, do pré-escolar ao Ensino Básico, naquela etapa da vida onde as perguntas deveriam ser prioritárias às respostas.
Escrevo estas linhas quando o relógio marca 19:40 de Domingo, 27. Estou aqui, em um canto da sala, frente ao computador, para que não me esqueça de pensamentos que me assaltaram, depois de uma muito agradável festinha de anos de um dos meus netos. Os amigos de escola estiveram toda a tarde eufóricos, vivendo e convivendo. Uma mãe aproximou-se e despediu-se. Então, já vai? "Tenho de ir, porque ela ainda tem de rever "Estudo do Meio" para amanhã! Compreendi. Infelizmente. Apetecia-me dizer-lhe que o estudo (vivência) deste meio (o convívio) era, neste contexto, mais importante que a revisão do outro "Estudo do Meio". Enquanto um é irrepetível, o outro, a qualquer momento, repetir-se-á no dia-a-dia das experiências vividas. Para com os meus botões desabafei, que maldita avaliação de tudo que nem ao Domingo as deixa em paz! Isto, no dia que li um artigo de Leonor Ribeiro (Público): "(...) Desenganem-se as escolas e professores quando julgam que ao aplicar um teste estão a avaliar melhor, a ser mais objetivos. Pois os testes são subjetivos na sua natureza, desde a forma como são elaborados, até à forma como é feita a sua aplicação e classificação". 
Ora, avaliar, enquanto importante instrumento susceptível de provocar intencionais mudanças no processo pedagógico, de construção e de reconstrução, é uma coisa; outra, é esta obsessão despida de qualquer significado, como se o aluno fosse uma simples folha de Excel, onde se percorrem várias percentagens sumativas até chegar à determinação, subjectiva, de um nível ou nota. Como salientou Marta Darsi, a própria "acção de avaliar carece de avaliação para que a mesma se possa renovar, constantemente, diante das novas situações de aprendizagem". Por seu turno, Alonso et al. (1992) sintetizou: "ela deveria deixar de ser, quem merece uma avaliação positiva e quem não, para converter-se em, que ajuda precisa cada qual para seguir no processo de construção". Nesta perspectiva, a avaliação deveria tornar-se em instrumento de acção, para os professores e para os alunos, nunca uma forma de "medir" o que foi retido pela memorização descontextualizada e sem pensamento. Apenas mais um desabafo, na sequência de um artigo, de uma mãe condicionada pelo sistema e de uma aluna sujeita a uma escola sem pensamento! Porque, infelizmente, a cultura é a de estabelecimento de ensino e não a de estabelecimento de aprendizagem.
Ilustração: Google Imagens.

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