terça-feira, 23 de maio de 2023

É pela cultura que a aprendizagem se faz


Vi-os por todo o lado e lembrei-me, vezes várias, por aproximação, de Carlos do Carmo: "(...) Parecem bandos de pardais à solta". Uma vez mais, vi-os em catedrais, museus, palácios, praças, por todo o lado grupos de alunos com professores, à descoberta do que se estende para além do que a vista alcança. Vi-os alegres, vivos, interessados, tirando notas e sentindo o pulsar da verdadeira vida que não se resume àquele espaço, por vezes mórbido, da sala de quarenta metros quadrados, onde o mundo se fecha nos cubículos labirínticos dos currículos e programas impostos. Por vezes exclamei: é pela cultura que tudo o resto trazemos por arrasto. Estes alunos estão a escrever o seu futuro!



Não essa cultura sinónima de um conhecimento profundo e específico sobre qualquer área, mas aquela que absorvemos, integramos e que permite a leitura do mundo, a plasticidade de compreensão e o transfere para tudo o resto. Um exemplo comezinho: mais do que saber datas históricas, interessa perceber e conjugar a compaginação dos temas ao longo dos tempos. De resto, tudo na vida se apresenta interligado. Portanto, mais do que saber e papaguear o manual escolar com o fim último de responder ao que consideram certo (!), a cultura permite uma visão dialéctica no quadro das contradições. E por aí tudo se aprende. 

Não os vi de tablet entre mãos, vasculhado o manual digital, antes olhando e certamente reflectindo, com a importante e potenciadora presença dos tutores, a vida e toda a ciência em unidade. Não os vi sentados a escutar, voltados para a frente e em atitude não desestabilizadora, interminavelmente, o professor a debitar seja lá o que for do manual. E num determinado momento, quando vi um desses "bandos" de crianças, talvez em idade equivalente ao pré-escolar português, no museu do espantoso escultor francês Auguste Rodin (1840/1917) confirmei que a aprendizagem se conduz por aí, negando a segmentação das disciplinas nessa visão tendencialmente unívoca e estática, antes compaginando o que se vê com tudo o que rodeia e que dela faz parte. Até onde nos pode levar, de forma integrada, pergunto, Le Penseur de Rodin!

E assisto a adultos que atafulham em manuais digitais (que outros países já abandonaram) um pressuposto conhecimento, criam, pomposamente, "salas do futuro", quando a grande sala de aprendizagem não tem paredes, não tem tecto, não tem cadeiras nem mesas, faz-se em qualquer sítio ligando intimamente tudo. Não significa que a sala (tradicional) também não seja importante para a aprendizagem e descoberta, predominantemente em grupo, mas a vida real é muito mais que disciplinas conjugadas com aquela obsessão pelas avaliações, relatórios e processos burocráticos absolutamente discordantes da importância de dar asas aos talentos e aos sonhos de cada um. Ao contrário de um fatinho à medida de cada um, continuam a preferir a fábrica que produz um único fato para todos.

Tanto que gostaria de ver "bandos de pardais à solta" pelas nossas cidades escrevendo o seu futuro!

Ilustração: Google Imagens

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