sexta-feira, 8 de junho de 2018

SENHOR PRESIDENTE, O ESTADO NÃO TEM O "MONOPÓLIO DA EDUCAÇÃO"


O presidente do governo regional da Madeira declarou no decorrer de uma visita a uma escola "particular": "(...) Acho que o Estado não deve ter o monopólio da Educação. O Estado deve dar condições para as famílias e para os cidadãos escolherem qual a escola que querem estar e obviamente essa decisão cabe num princípio que é a liberdade de cidadania". Senhor Presidente, repita lá isso outra vez!


Desde logo, o Dr. Miguel Albuquerque sabe ou deveria saber que o Estado não tem o monopólio da Educação. Tanto assim é que, no plano Constitucional, é permitida a existência de dois sectores: o público e o privado. Só assim se justifica que o governo da Madeira, anualmente, entregue vinte e cinco milhões de euros ao sector privado. A declaração política do presidente não tem, neste quadro, qualquer fundamento. O Estado tampouco impõe às famílias o estabelecimento e o sector onde desejam colocar os filhos. Existe uma total liberdade. Liberdade até para optar pelo ensino doméstico. O que o Estado está obrigado, no plano da Constituição da República, é o de garantir o ensino universal até ao 12º ano. Se uma criança é inscrita em uma escola privada que disponha desde a creche ao 12º  ano e os pais podem suportar os encargos, pois bem, ao estabelecimento só é exigido o cumprimento dos planos curriculares e programáticos. O Estado nada tem a ver com os aspectos internos de natureza organizacional e pedagógica. Conclui-se, assim, que o Estado não tem o monopólio da Educação. 
Outra coisa é um governo que tem a obrigação de cumprir a Constituição, retirar o financiamento à escola pública para entregar aos estabelecimentos privados. Isto designa-se por demissão das obrigações constitucionais e tendencial privatização do sistema educativo. É o que acontece na Madeira, onde, anualmente, o governo injecta, no sector privado, milhões que acabam por fazer falta ao sector público. Quer o governo da República quer os das Regiões Autónomas tem uma responsabilidade e essa é a da garantia de uma oferta pública universal, inclusiva e com qualidade. Nas designadas falhas na oferta pública, pois aí, então, devem os governos garantir que ninguém seja prejudicado, apoiando estabelecimentos privados que cubram essas falhas na oferta. Só nestas circunstâncias. E sendo assim, no que concerne ao financiamento, primeiro, o sector público e, depois, o sector privado, apenas no caso de necessidade. 
Estando garantida a liberdade de escolha, deduz-se que, no privado, devem estar matriculados os que podem suportar os encargos. Ressalvo que nada, rigorosamente nada, tenho contra a existência do sector privado. Pelo contrário, no pleno respeito pela liberdade das famílias, o sector privado, complementar, faz todo o sentido. Não pode é ser privado e suportado, financeiramente, pelo sector público. Tão simples quanto isto. E há um outro aspecto que, aliás, já aqui equacionei. O sector privado tem as suas próprias dinâmicas, mas não significa que apenas ali exista competência transformada em resultados. Intencionalmente ou não essa ideia foi criada. Atentemos nestes dados: "(...) Enquanto as escolas privadas preparam melhor os alunos para os EXAMES, a formação no ensino público potencia o SUCESSO dos estudantes no ensino superior. As conclusões são de um estudo da Universidade do Porto, que acompanhou o percurso académico de 4.280 alunos. O estudo da Universidade do Porto debruçou-se sobre esses estudantes admitidos no ano letivo de 2008/09. Destes, 2.226 concluíram 75% das disciplinas nos primeiros três anos da universidade. Aqueles que tiveram melhores resultados eram provenientes de ESCOLAS PÚBLICAS. José Sarsfield Cabral, pró-reitor da Universidade do Porto, disse ao Público que “as escolas privadas têm grande capacidade para preparar os alunos para entrar (no ensino superior), mas o que se verificou foi que, passados três anos, estes alunos mostraram estar mais mal preparados para a universidade do que os que vieram da escola pública”. Estas conclusões vêm assim combater a ideia de fracasso do ensino público. “O desempenho dos estudantes no superior requer habilidades e capacidades que não são aquelas que decorrem de o aluno saber muito bem a matéria dos exames”, referiu.
Finalmente, fica claro que a posição do Senhor presidente do governo da Madeira não tem qualquer fundamento. Não existe monopólio. O que existe é um problema de base ideológica, elitista e de preconceito que o sector público é fraco. Não é. Notam-se naturais debilidades por falta de financiamento e porque, ali, convergem todos, desde ricos a pobres, enquanto que no outro sector, maioritariamente, estão lá porque, ou foram seleccionados ou a capacidade financeira é substancialmente diferente.
Ilustração: Google Imagens.

Sem comentários:

Enviar um comentário