segunda-feira, 9 de julho de 2018

O NECESSÁRIO REGIME DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA: AS CONFLITUALIDADES DO "TEMPO E DA URGÊNCIA"


Após a leitura atenta do novo regime de educação Inclusiva hoje [ontem] publicado em Diário da República, Decreto-lei nº 54/2018, de 6 de julho, que estabelece os princípios e as normas que garantem a inclusão, enquanto processo que visa responder à diversidade das necessidades e potencialidades de todos e de cada um dos alunos, através do aumento da participação nos processos de aprendizagem e na vida da comunidade educativa, constatamos que corresponde ao já previsto na Proposta que esteve em discussão pública, com a introdução de algumas alterações resultantes das propostas e pareceres de diferentes Organizações e Entidades de referência, algumas já avançadas em Comunicações Públicas e também através da Formação de Formadores desenvolvida pela DGE.


Colocamos em destaque a importância da convergência e interdependência do diploma da educação inclusiva com Decreto-Lei nº 55/2018, também publicado hoje [ontem] e que estabelece o currículo dos ensinos básico e secundário, os princípios orientadores da sua conceção, operacionalização e avaliação das aprendizagens, de modo a garantir que todos os alunos adquiram os conhecimentos e desenvolvam as capacidades e atitudes que contribuem para alcançar as competências previstas no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória. Este diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e prevê a gradualidade no que se refere à produção de efeitos (art.º 38º).
Neste âmbito, compreendemos a necessidade de planear e agilizar a preparação do próximo ano escolar/letivo mas saliento a conflitualidade que gera a publicação tardia do Diploma da educação Inclusiva face ao momento do ano escolar em que nos encontramos, pois apesar de o mesmo referir que “o presente decreto-lei produz efeitos a partir do ano escolar 2018-2019 (nº 1 do artº 41º) refere também no nº 2 do mesmo artigo que “sem prejuízo do disposto no número anterior, e do regime previsto no artigo 31.º, devem as escolas proceder à sua aplicação na preparação do ano letivo 2018-2019”. Refira-se que o artº 31.º para além de outros aspetos estipula que “o aluno que à data da entrada em vigor do presente decreto-lei se encontre abrangido pela medida currículo específico individual, prevista na alínea e) do artigo 16.º e no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, alterado pela Lei n.º 21/2008, de 12 de maio, deve ter o seu programa educativo individual reavaliado pela equipa multidisciplinar para identificar a necessidade de medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão e para elaborar o relatório técnico-pedagógico previsto no artigo 21º do presente decreto-lei (ponto 1) e que “o relatório técnico-pedagógico e o programa educativo individual referidos nos n.os 1 e 2 devem ser elaborados em momento anterior ao início do ano letivo a que se reporta a produção de efeitos do presente decreto-lei (ponto 6).
Nesta data e quando ainda desenvolvemos nas Escolas todo um conjunto de trabalho necessário à finalização do ano escolar que decorre e também à preparação do seguinte, tendo como base que, pelo menos na última semana deste mês, é suposto termos direito a gozar o nosso período de férias (docentes e famílias), pergunto se estarão criadas as condições (tempo e capacitação) para que os agrupamentos, os professores, incluindo os de educação especial em corresponsabilização com todos os restantes, procedam à análise dos processos destes alunos que garantam a aplicação das opções metodológicas subjacentes ao presente decreto-lei e que “assentam no desenho universal para a aprendizagem e na abordagem multinível no acesso ao currículo (…) modelos curriculares flexíveis, no acompanhamento e monitorização sistemática da eficácia do contínuo das intervenções implementadas, no diálogo dos docentes com os pais ou encarregados de educação e na opção por medidas de apoio à aprendizagem, organizadas em diferentes níveis de intervenção, de acordo com as respostas educativas necessárias para cada aluno adquirir uma base comum de competências, valorizando as suas potencialidades e interesses”. 
Salientamos aqui, de forma consciente e com um forte sentido ético e profissional, neste processo de transição das medidas e apoios a adotar para os alunos que atualmente se encontram abrangidos pela alínea e) do decreto-lei nº 3/2008, de 7 de janeiro, que venham a requerer medidas adicionais e até seletivas, a pertinência e necessidade da salvaguarda de tempo para desenvolver processos sérios, responsáveis, equilibrados e devidamente fundamentado através de processos colaborativos e reflexivos dos diferentes intervenientes, com base em evidências. 
Enquanto se aguarda a disponibilização do manual de apoio à prática inclusiva que “é elaborado e disponibilizado no prazo de 30 dias após a entrada em vigor do presente decreto-lei” (artº 32º, ponto 2) e a entrada em funcionamento das equipas multidisciplinares de apoio à educação inclusiva que deverá ocorrer também no prazo de 30 dias a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei (artº 35º), em que assenta o caráter de urgência destes casos se, de facto, foram os que mereceram uma atenção especial da parte de todos os envolvidos neste processo de revisão legislativa por se considerar que o Currículo Especifico Individual se tratava de uma medida muito restritiva, nem sempre corretamente aplicada por se traduzir em respostas educativas que, em muitos casos, se traduziam em processos de exclusão e discriminação de crianças e jovens?
É com o objetivo de prevenir que situações destas nunca mais se repitam, que estas crianças e jovens têm DIREITO ao desenvolvimento de um PROCESSO de reavaliação com base nos pressupostos que esta legislação, na nossa perspetiva muito bem, propõe. 
Neste contexto, não compreendemos em que medida o caráter de urgência desta transição possa garantir efetivamente uma “educação inclusiva onde todos e cada um dos alunos, independentemente da sua situação pessoal e social, encontram respostas que lhes possibilitam a aquisição de um nível de educação e formação facilitadoras da sua plena inclusão social. Sobretudo “nos casos em que se identificam maiores dificuldades de participação no currículo, cabe a cada escola definir o processo no qual identifica as barreiras à aprendizagem com que o aluno se confronta, apostando na diversidade de estratégias para as ultrapassar, de modo a assegurar que cada aluno tenha acesso ao currículo e às aprendizagens, levando todos e cada um ao limite das suas potencialidades” (Preâmbulo do decreto-lei nº 54/2018). 

É PRECISO FAZÊ-LO COM CARÁTER DE URGÊNCIA, SIM! 
MAS COM A SALVAGUARDA DO TEMPO MÍNIMO QUE GARANTA OS MESMOS DIREITOS E PERMITA AS MESMAS CONDIÇÕES, OS MESMOS INTERVENIENTES COM CAPACIDADE DE DECISÃO QUE O DIPLOMA PREVÊ PARA TODOS OS ALUNOS.

Esta nossa reflexão surge porque nos situamos, revemos e identificamos na necessidade urgente deste processo de mudança de paradigma de educação inclusiva, onde todos os alunos aprendam e atinjam o limite máximo das suas capacidades, a par da construção de percursos pessoais, sociais e profissionais de sucesso e congruentes com os desafios deste século. Por isso, consideramos que é fundamental que não haja o menor risco de que, nesta fase de transição normativa, algum aluno fique para trás, evitando que se verifiquem “disparidades e desigualdades no acesso, na participação e nos resultados de aprendizagem” já cometidos no passado. 
O que nos é exigido a TODOS é que tenhamos a capacidade e a competência para garantir o efetivo “acesso, na equidade e na inclusão, bem como na qualidade e nos resultados da aprendizagem de Todo e de Cada um dos alunos” (UNESCO, 2015).
É para isso que TODOS, mesmo TODOS temos que trabalhar!

Manuela Prata

Blogue: Incluso

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