quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Caso de Estudo? Chapéus há muitos...

 

Vasco Santana imortalizou a frase "Chapéus há muitos". Por aproximação eu diria que também "Case study" há para todos os gostos. Tal como os chapéus enfia quem quer. Ora bem, por várias razões, tenho pelo Dr. João Cunha e Silva consideração pessoal. Aliás, nas raras vezes que nos vamos cruzando na vida, a cordialidade e o respeito é mútuo. Portanto, aos que me lerem, peço que não confundam os quadrantes políticos que eu e ele protagonizámos ao longo da vida. Trata-se, apenas, de, democraticamente, estabelecer aqui um salutar contraponto.



Na sua habitual coluna "message" que assina no Dnotícias, escreveu hoje, na página 2, sobre aquilo que considera ser um "caso de estudo": a história dos manuais digitais com distribuição em curso na Região da Madeira. A determinada altura diz que a Samsung HQ enaltece que da Europa à Ásia os ditos manuais digitais tiveram "como inspiração o que está a ser desenvolvido na Região (...) exemplo pioneiro ao nível nacional e internacional". Espantoso, da Europa à Ásia! Ora bem, não acredito que o Dr. João Cunha e Silva não esteja por dentro deste importante tema e também porque sabe, muito melhor do que eu, sobretudo pelas importantes funções que desempenhou, as de vice-presidente do governo, que as empresas existem para venderem os seus produtos e produzirem lucros. E isso implica marketing e muita publicidade. Quantas não lhe passaram pelo seu gabinete pintando de cores garridas aquilo que, necessariamente, precisava de um outro tipo de abordagem! Permita-me Dr. João Carlos, a história da Samsung, do meu ponto de vista, é treta para consumo político. Nós, madeirenses, líderes na Europa e na Ásia! Caso de Estudo. "Só contaram prá você".

Levaria muitas páginas a explicar isto dos manuais digitais ou então aquela história das "salas de aula do futuro". Vou-me ficar por aquilo que, há poucos dias, o Professor Doutor Santana Castilho (Membro do VIII Governo Constitucional presidido pelo Dr. Francisco Pinto Balsemão), num encontro de professores, disse sobre a utilização dos manuais digitais. Sumariamente, assumiu que nos Estados Unidos, a implementação dos manuais digitais, iniciada há oito anos, foi abandonada, porque os cientistas concluíram que o desenvolvimento cognitivo das gerações mergulhadas no digital é equivalente ao das crianças de 8/9 anos de há 30 anos; por outro lado, são cinco vezes mais caros para além de ter crescido em 30% as doenças oftalmológicas. Explicou as razões e fez-se um sepulcral silêncio. Quando uma figura académica, autor de várias Obras e colunista do Público, espoleta uma situação destas, presumo que as campainhas de alarme deviam ter tocado de forma estridente nos ouvidos dos responsáveis políticos. O secretário da Educação devia, imediatamente, sentir-se preocupado e proceder à auscultação de todos os que directamente estão ligados ao sector. Com uma pergunta-chave tão simples quanto esta: "será que estamos no percurso certo ou teremos de arrepiar caminho?" Simples! Se os neurocientistas invocam que o que parece não é, então, que se estude e que se mude de orientação. Só lhe ficaria bem. Para sermos "exemplo para toda a Europa e Ásia"!

O problema da qualidade da aprendizagem e do futuro das novas gerações, entre muitos e muitos aspectos, não está, meu Caro Dr. João Cunha e Silva, na existência de manuais digitais em conjugação com algumas ditas salas de aula do futuro. O drama está no que deve ser o Sistema Educativo, no que deve ser a Escola do Século XXI, a sua organização interna, a mudança radical da mentalidade que obriga a actos rotineiros, no drama está nos currículos, nos programas extensos, complexos e desadequados, na cultura de aprendizagem, nessa meritocracia balofa que se alastrou, na reconversão da rede escolar e na tipologia dos edifícios, na formação dos professores, na burocracia, na doentia e obsessiva avaliação, na pobreza social e no respeito pelo sonho de cada um, rico ou pobre, onde a utilização da tecnologia, necessária e extremamente importante, não se esgote, genericamente, na colocação dos manuais em papel num tablet, mantendo intocável o formato pedagógico. Manter as traves-mestras do Século XIX só poderá dar "erro".

"Caso de Estudo" devia ser o facto de, numa Região Autónoma, com pouco mais de 40 000 alunos, a caminho de 50 anos de Autonomia, os indicadores serem, aproximadamente, estes: "65% da população da Madeira, com 15 ou mais anos, tem apenas até o 9º ano de escolaridade. O valor está acima da taxa nacional que, no ano passado, ficou pelos 61%. A Madeira continua a estar pior do que a média nacional, naquela que é a taxa de abandono precoce de educação e formação (jovens dos 18 aos 24 anos que estão fora do sistema de ensino e sem o secundário): 23% na Região e 14% no País". Fonte - DN-Madeira/Pordata/Jornalista Ana Luísa Correia / Junho de 2018. Refiro este estudo de 2018, pois, como se compreende, não é em quatro anos, de acordo com a mesma metodologia, que os dados venham a ser substancialmente diferentes.

Tudo isto significa que existe uma crónica teimosia em viver de modas e de aparências, onde o estudo fica sempre para mais tarde. Talvez possa dizer que a Escola está ao serviço da política e não a política ao serviço da Escola. E o Dr. Cunha e Silva percebe o que aqui deixo e, por isso, digo-lhe com consideração: oh Educação quando deixas de ser partidarizada, para que a Escola não seja "A Catedral do Tédio".

Ilustração: Google Imagens.

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