segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

QUAL DEVE SER A FUNÇÃO PRIMEIRA DO CONSELHO PEDAGÓGICO?


Pertenci a muitos Conselhos Pedagógicos. Sempre me questionei sobre a verdadeira importância do que ali fazia. E porquê? Pela substancial diferença entre as suas competências, fundamentalmente, as que se fundam na orientação pedagógica de uma escola e as determinações hierárquicas bloqueadoras de qualquer sentido de mudança. Percorrendo a legislação e a generalidade dos regulamentos internos, que desenvolvem os normativos, damos conta que a maioria salienta, em uma das alíneas, que compete ao Conselho Pedagógico "(...) aprovar o desenvolvimento de experiências de inovação pedagógica (...)". Só que, a realidade é bem diferente. A discussão da inovação por ali não passa, nunca passou, apenas são tolerados alguns acertos nas margens mantendo o âmago intocável. 


Sempre foi assim. Discute-se o óbvio, o dia-a-dia, algumas preocupações, elaboram-se pareceres, mas sempre sem qualquer rasgo de mudança. Ah, e faz-se a acta, com todos os pormenores, para que conste, embora o seu destino, tarde ou cedo, seja o arquivo morto! Mais um pormenor: todos anotam as "decisões", para transmitir na reunião de departamento e, sucessivamente, até ao grupo de disciplina. São as rodas dentadas do sistema. Tantas vezes recordo o pedagogo Rubem Alves quando disse que "para os burocratas o que interessa é o que vem no relatório, não as crianças".
Escrevo em jeito de desabafo, com conhecimento de causa, porque tais reuniões sempre me angustiaram. Quantas vezes, nas minhas reflexões, me questionei sobre o significado real de uma alínea das ditas competências do conselho pedagógico, enunciada com estas ou outras palavras: "(...) Dar orientações sobre a uniformização dos procedimentos a tomar para as planificações, critérios de avaliação, matrizes, informação-prova, e outros documentos de natureza pedagógica sob proposta dos departamentos curriculares (...)". A minha pergunta teve sempre uma resposta plausível: é a hierarquia política que determina e a escola obedece. Falam em "uniformizar procedimentos" quando desejável seria a diferenciação em relação a outros, porque aí reside o estímulo portador de futuro. O problema é que a verdadeira autonomia é para ser falada e não aplicada. Como bem definiu o Professor Licínio Lima: "sejam autónomos nas decisões que já tomámos por vós". Portanto, mudar o conceito de escola, alterar os procedimentos, romper com a velha cartilha da decomposição da aprendizagem por disciplinas, alterar o formato de "aula" que vem do Século XIX (e até um pouco antes), rasgar o velho conceito de avaliação e essa doentia sequência "transmissão da matéria constante do manual, estudo (?) e avaliação", gerar, paulatinamente, as mudanças pelas quais "gritam" as crianças, os jovens e  os investigadores, fazer corresponder a aprendizagem aos novos tempos no quadro de uma postura prospectiva, bom, isso é coisa que, genérica e definitivamente, não está nos propósitos dos conselhos pedagógicos. Quem pensa de forma diferente, dizem, é utópico. E deveria estar na agenda das reuniões, mesmo considerando a actual e muito pouco séria legislação, porque há formas de contorná-la. E qual paradoxo, à partida, ali se sentam, os professores com mais anos de serviço, os potencialmente mais experientes, certamente, os que mais leram e investigaram, aqueles que mais vezes analisaram situações e se questionaram, mas não, nada acontece, exceptuando um movimento aqui e outro ali, com resultados, porém, sempre limitados pelo olho felino do poder político! Poucos ou nenhuns se atrevem.
A rotina de anos parece ser preferível à inovação. A rotina, aliás, tem sido transmissível e deu cabo do pensamento de quem governa e que, por isso, não concede, sequer, o benefício da dúvida àqueles que consideram necessário abrir novos caminhos na sequência do que a ciência vem demonstrando. Para isso, claro, necessário se tornaria, todos os dias, ser utópico. Porém,não deixam. Professores com quem me cruzo dizem-me, abertamente, que se sentem exaustos, que a indisciplina tomou conta da escola, que é difícil "aguentá-los", que há sinais angustiantes da síndrome de Burnout, esse distúrbio psíquico de carácter depressivo absolutamente devastador, e, curiosamente, poucos se interrogam sobre as causas mais substantivas. 
Um qualquer Conselho Pedagógico poderia eliminar uma grande parte das suas atribuições (alguns regulamentos internos dão a volta ao abecedário no número de alíneas), que em nada, rigorosamente nada alteraria o figurino administrativo e gestionário, porém, não deveria demitir-se da sua função primeira: determinar o ponto de situação da escola, estudar, profundamente, todas as variáveis, mormente as causas do abandono, do insucesso, da indisciplina ou da insatisfação de professores e alunos, mergulhar no conhecimento dos sistemas de sucesso que romperam com as rotinas, para, finalmente, propor, por etapas, uma nova dinâmica pedagógica, até à sua consolidação. Mas isso, parece-me, não será atingível a curto prazo, fundamentalmente, por uma claríssima incompetência dos que se julgam detentores da verdade absoluta. Para estes, importantes são os "objectivos e as metas" ditados no topo, com a vergasta da avaliação de desempenho para quem não cumpra. Até um dia.
Ilustração: Google Imagens.

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