quarta-feira, 26 de outubro de 2016

AFINAL, A CULTURA DO CHUMBO NÃO AJUDA A MELHORAR


Um estudo da Universidade Nova de Lisboa, "Será a Repetição de Ano Benéfica para os Alunos?", concluiu que reprovar alunas do 4º ano com mau desempenho escolar tem um efeito positivo muito reduzido e, entre os rapazes, não traz qualquer vantagem. (aqui) Os investigadores concluíram que, afinal, "o efeito geral da retenção na progressão escolar de um aluno de baixo desempenho é negativo". E sugerem: sendo "Portugal um dos países da OCDE com a mais elevada taxa de retenção e cada chumbo representar elevados custos para o sistema de ensino, que esses recursos financeiros deveriam ser usados em políticas educacionais alternativas mais eficazes no apoio aos alunos com baixo desempenho".


É sempre importante a existência de novos estudos, mesmo a sua replicação, com protocolos iguais ou não, porque ajudam a compreender a situação e sobretudo a fazer despertar os responsáveis pela política educativa para os erros que cometem. Inclusive os professores. Este estudo tem pelo menos esse mérito, o de colocar na discussão pública aquilo que, por ignorância ou cegueira ideológica, muitos tentam fazer crer. Não estava à espera de outros resultados, simplesmente porque sou um defensor da avaliação contínua e da intervenção precoce, o que significa, por um lado, uma posição totalmente contrária à existência de exames no Ensino Básico, por outro, que pouco vale tentar recuperar aos dez anos um somatório de incapacidades cognitivas que deveriam, anos antes, ter sido diagnosticadas e merecedoras de actuação. É o que há muito assumem os investigadores em Educação. Mesmo no plano da Economia há estudos que traduzem (um deles é o de James Heckman, Nobel da Economia) o significado multiplicador no futuro de cada euro investido precocemente. São dele estas palavras: "(...) tentar sedimentar num adolescente o tipo de conhecimento que lhe deveria ter sido apresentado há dez anos sai algo como 60% mais caro". 
A propósito, li, tem já algum tempo, uma entrevista com Joaquim Azevedo, investigador e professor da Universidade Católica, doutorado em Ciências da Educação. "Se há mais de 20 anos se concluiu, a nível internacional, que o modelo escolar está esgotado, por que não se faz uma reforma profunda em vez de mudar pormenores, instabilizando alunos, professores e famílias? O especialista, nessa entrevista, cita os exemplos do ensino na Finlândia e nos jesuítas catalães. (...) O modelo escolar vem do século XVIII - até vem de antes, mas desenvolveu-se mais a partir de então - e tem imensas dificuldades em adaptar-se à nova realidade. O mundo mudou muito". Pois mudou, mas há quem prefira manter os olhos colados no passado.
Pelo interesse desta longa entrevista, um dia destes aqui publicá-la-ei. Porque tem muito a ver com este estudo, sobre o que é hoje a escola enquanto "produtora de chumbo", que se nega a acompanhar o que a ciência já desvendou.
Ilustração: Google Imagens.  

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