quinta-feira, 20 de outubro de 2016

PRÉMIOS DE MÉRITO ESCOLAR. A HONRA DE UNS CORRESPONDE À DESONRA DOS DEMAIS.

Há muitos anos eram os "quadros de honra" que pontificavam. Felizmente, não me lembro de ter pertencido a esse grupo de eleitos. Fui mediano, graças a Deus. Algumas vezes abaixo da média. Participei, sim, em muitas outras situações que, ainda hoje, reconheço a importância que tiveram nas minhas opções de vida. Licenciei-me, fiz um Mestrado, trabalhei em diversos âmbitos e sempre fui feliz. Esse percurso de vida deu-me consistência, responsabilidade e abertura ao Mundo. Conheço tantos assim. Vem isto a propósito do que venho a assistir, sobretudo nos últimos anos, à atribuição a crianças de prémios por mérito escolar. Em alguns casos, até, prémios monetários. Tenho uma posição muito clara a este respeito: discordo. Que no final do secundário, já em uma condição de jovem-adulto, se distinga a capacidade técnica, científica, humana e cultural, aceito. Nas primeiras fases, não, obrigado. Não é da meritocracia que necessitamos. Nem entre crianças, nem entre escolas com os famigerados "ranking´s", tampouco entre professores através de um indecoroso sistema de avaliação de desempenho!


Considero errado que tragam para dentro da Escola, particularmente para o Ensino Básico, ou que dela façam o espelho das práticas correntes de natureza empresarial. Esse mundo cão da competição desenfreada deve ficar à porta, como exemplo negativo de uma sociedade desestruturada. A escola não deve assumir uma concepção mercadológica, uma valorização precoce e obsessiva quando a perspectiva que a deve nortear é a da formação global, o gosto pelo conhecimento, pelo pensamento universal que conduz à descoberta e pelo sentido da responsabilidade. Não se constrói o futuro com prémios, mas com humildade e com uma permanente pedagogia pelo saber. Não está em causa, apenas, a questão da diversidade na origem das crianças, as culturas que chegam à escola, tudo quanto se esconde a montante da escola, concretamente, as questões económicas, financeiras e sociais ou, ainda, os aspectos consequentes da diferenciação entre eleitos e os outros. A questão central está em perceber como se pode falar de uma escola integradora quando se percorre o caminho contrário. Ao mito do quadro de honra de uns opõe-se, parece-me óbvio, o quadro da desonra dos demais. Depois, entre múltiplas variáveis, o "bullying", porque uns são os dotados e outros os menos favorecidos. A honra constrói-se na aprendizagem democrática, na solidariedade, nos princípios e valores humanistas, na cidadania, na cultura, no respeito, no rigor de saber estar com e não contra. Por aí se percorre o caminho da  excelência. “Educar a mente sem educar o coração não é educação”- Aristóteles. Mas estas são considerações genéricas, não tão genéricas quanto isso, sublinho, quando o Básico constitui a etapa determinante da motivação, o alicerce sobre o qual, a prazo, paulatinamente, se edificam os pilares e as traves-mestras dos andares superiores do conhecimento. Lamentavelmente, até já destacam o mérito escolar de crianças e jovens institucionalizados. A correria pela pseudo-excelência anda desenfreada: são entidades bancárias interessadas, são governos, são autarquias, são instituições diversas e são conselhos pedagógicos que se movimentam nesse sentido. Para que servirá isso? Para as crianças nada, para o mediatismo dos adultos, certamente que sim. Vaidades que, em muitos casos, se pagam bem caro ao primeiro tropeção. Ocorre-me questionar: e quantos ditos "excelentes" se tornam em medianos profissionais, enquanto outros se afirmam pela diferença, pela criatividade e inovação? A vida é muito mais que prémios.
Relacionado com este tema, há dias, li um interessante texto no blogue "Ser mãe é tramado": "(...) O meu filho, assim como tantos outros miúdos, que até podem ter notas baixinhas, deviam estar no Quadro com Honra. Pelo esforço, pela evolução que se exigem, pela capacidade de se superarem e corrigirem os próprios erros, pela verdade, a sua verdade, pelo sentido crítico, pela imaginação. Enfim, pela capacidade de crescimento interior, social e humano. Mas isso é Honra que a escola não consegue ver, quanto mais reconhecer. Infelizmente vai-se ficando pelos quadros".
Pensemos nisto e debatamos isto.
Ilustração: Google Imagens.

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