segunda-feira, 19 de junho de 2023

Uma vez mais... os famigerados "ranking's" (2022)

 

Assumiu o secretário regional da Educação da Madeira: "(...) nós não valorizamos muito os ranking's". Pois, assumo, também eu, com uma diferença, é que o político ainda valoriza alguma coisa (não muito) enquanto eu não valorizo rigorosamente nada. Diabolizo-os porque comparam realidades económicas, sociais e culturais completamente distintas. Por outro lado, diz o ministro: eles são "uma operação comercial (...) porque ignoram o contexto sócio-económico". Aí está, é verdade. Porém, comercial ou não, os exames e os dados saem do ministério, o que me parece uma crónica hipocrisia. Por mim, tal como li, sobre os ranking's do programa PISA, numa análise de Pablo Gentili, uns e outros são "um concurso de beleza da pedagogia". E em "concursos de beleza", na escola, não estou interessado.



Mas a pergunta que agora faço presumo que tenha o seu cabimento político: teria o secretário da Educação o mesmo posicionamento, se os lugares que os estabelecimentos de aprendizagem da Madeira apresentaram se situassem no topo nacional da aprendizagem básica? Talvez não! Não valoriza porque não lhe interessa, não por razões de pensamento estrutural. Que não o tem, é a minha modesta opinião. Até conseguiu aniquilar uma escola que, mantendo-se na fronteira das suas débeis regras, atingiu o pódio nacional. Refiro-me à escola do Curral das Freiras e transcrevo o que a edição do Jornal Público de então enalteceu: 

"(...) na freguesia mais pobre da Madeira e uma das mais carenciadas do país (Curral das Freiras), onde 92% dos alunos têm Acção Social Escolar e a internet não fazer parte das prioridades da maioria das famílias, existe algo supreendente. Numa vila enterrada num vale profundo, onde a única ligação com o resto do mundo faz-se por um túnel com quase 2,5 quilómetros, existe uma escola onde cabem todos os sonhos (saltou do lugar 1207º para 3ª no ranking nacional da época)".

Talvez, porque lhe falta(ou) pensamento e humildade para escutá-la e aceitá-la, bloqueou a sua autonomia pedagógica e anexou-a a uma outra, prejudicando as dinâmicas pedagógicas criadas. Não satisfeito, puniu o líder da escola através de um processo kafkiano. Processo que perdeu em Tribunal Superior. Em 2022, a escola (S. António) onde a do Curral das Freiras foi integrada quedou-se pelo 440º lugar. Conclusão primeira: não liga muito aos "ranking's" porque, primeiro, ninguém se atreva a ser inovador e criativo!

Ora bem, por aquilo que conheço da propaganda política, se outros tivessem sido os resultados, certamente que o Senhor Secretário cantaria a plenos pulmões os êxitos espelhados nos "ranking's". Porém, uma vez mais isso não aconteceu. Disse, laconicamente, não ligar "muito", mas, deduzo, que lá com os seus botões, ligue alguma coisa, talvez se enerve, porque, de facto, no sector público do Básico (9º ano), ter as escolas situadas entre o 213º e 1012º do todo nacional, com um dado relevante: todos com uma média inferior a 3 (numa escala de 0 a 5). É caso para dizer que para o político é melhor assobiar para o lado. Daqui a dias já ninguém fala disso, não é! Não liga muito, compreendo, mas como indicador global, talvez a situação o devesse conduzir a uma séria análise da situação. Mas não o fará. Quanto muito questionará as escolas sobre o insucesso da sua própria política centralizadora. Se fará, não sei, porque este quadro talvez interesse, porque um povo que não desfrute de uma aprendizagem de qualidade, vulnerável fica à cantilena que lhe vendem no plano político. Será?

Há muito a fazer por uma escola de sucesso. Começa, a montante, por uma imprescindível actuação nos desequilíbrios sociais existentes, nas famílias e no combate à pobreza, na economia, na empregabilidade com salários decentes, na cultura e mentalidade que conduza, desde cedo, a saber desenhar o futuro, no pleno respeito pelos talentos e sonhos de cada um, nos currículos e programas disparatados porque desconexos com a vida real, pela aceitação que o professor, hoje, não pode ser um submisso face a absurdas lógicas hierárquicas ou um "magister dixit" desde logo porque "(...) o mais alto ensinamento do mestre não está no que diz, mas no que não diz" - Carl Rogers), pela aceitação que não existem duas escolas iguais, nem grupos de professores iguais, o que impõe uma total autonomia pedagógica, por uma nova estrutura da rede escolar, porque escolas com mais de 400 alunos deixam de ser escolas para se tornarem fábricas, enfim, o que está em causa não é se ficou no lugar x ou y do "ranking", é verdade, mas sobretudo o que lá se faz que seja portador de vida e para a vida. Pelo caminho seguido corre-se o risco de, todos os anos, o "chefe" da Educação assumir que não liga "muito" ao que se passa debaixo dos seus olhos de actor/espectador.

A muita propaganda mediática sobre os manuais digitais, salas do futuro, robotização, páginas e páginas de "ponto e vírgula", exposições, atribuição de prémios no quadro de uma meritocracia balofa, tudo isto conduz ao desastre, porque não há uma interligação entre todas as áreas que compõem o sector(es) e porque não são conhecidos os objectivos finais de uma dada política. Impõe-se, por isso, uma reflexão que conduza à mudança estrutural do pensamento que caracteriza o sistema.

Ilustração: Google Imagens.

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