sábado, 12 de novembro de 2016

COMPORTAMENTOS DISRUPTIVOS E AS RECEITAS PARA QUEM FERE AS "NORMAS DO CONTEXTO"


Hoje, debrucei-me sobre um artigo, muito interessante, o paradigma de escola que deveríamos ter e aquele que é "oferecido" pelo sistema educativo português. O dia e a noite. Uma leitura de gozo pleno, não apenas porque se coaduna com o pensamento que estruturei ao longo de muitos anos, mas pela evidência dos argumentos em contraponto com a retrógrada missão da Escola. É capaz de se tornar fastidioso, mas hei-de repetir até à exaustão a necessidade de repensar tudo para de novo partir. A propósito, há dias escutei uma gasta justificação na abordagem aos "comportamentos disruptivos" por parte de alguns alunos. Isto é, aos comportamentos que acabam por "interromper o seguimento normal de um processo", concretamente, na sala de aula. É evidente que só escutei o que a peça enalteceu, pelo que desconheço o enquadramento geral da sessão. Porém, a ideia com que fiquei foi a de uma formação para professores no quadro dos jovens ditos "indisciplinados". 


A Psicóloga Clínica Dora Pereira sublinhou: "(...) estamos a falar de crianças e jovens cujo comportamento desafia as regras e as normas do contexto em que estão inseridos, quer pelo comportamento agitado, quer verbalmente agressivos, por vezes até provocador (...)". Ora, a questão que se coloca é exactamente essa, a das "regras e normas do contexto". Para uns, a criança ou o jovem deve ali estar convenientemente sentado, a ouvir o debitar de um dado programa do currículo, não se agitando e não questionando; para outros, onde me incluo, há "regras e normas do contexto" absolutamente ridículas e contrárias a uma pedagogia de sucesso. Li, no Público, tem já um certo tempo, um trabalho interessante embora com excessivas lacunas. A páginas tantas o jornalista questionava: "o insucesso dos alunos é maior porque eles são indisciplinados ou eles são mais indisciplinados porque têm insucesso? João Lopes, Doutorado em Psicologia da Educação, assumiu: "os alunos portam-se mal porque têm insucesso académico". Logo, a solução para o problema reside na promoção do sucesso escolar, concluiu. Como é que se consegue o sucesso, é a pergunta óbvia com uma resposta não menos óbvia: mudando o paradigma organizacional de escola e o paradigma pedagógico, sublinho eu. A indisciplina não se resolve com técnicas avulsas, como li algures, que "os professores têm de ser ensinados a gerir a indisciplina nas salas de aula", tampouco com o "estatuto do aluno", com "cartas de convivialidade" ou com o tão badalado reforço da autoridade dos professores.. Por essas vias, andarão sempre atrás do problema, ao jeito de bombeiros sofredores e angustiados perante o crescendo de fogos (focos) da dita "indisciplina". 
Curiosamente, ou talvez não, não se assiste a uma preocupação orientada e integrada para as causas dos problemas. Inclusive, os de natureza social, de mentalidade e de cultura que se encontram para além da escola. Não se fala da desestruturação da sociedade a todos os níveis. Assiste-se sim, a uma tentativa de colocação de pensos rápidos em feridas que são profundas e que necessitam de uma postura completamente distinta.
Nesse trabalho jornalístico do Público, li esta desenquadrada posição do Doutor João Lopes: bastam "meia dúzia de regras, que têm de ser deixadas claras logo no primeiro dia". Depois, perante um cenário em que um aluno insulta um professor, a reacção deve ser "rápida, directa e muito visível", do género expulsar da sala de aula e suspender o aluno, se for preciso. O que não se pode fazer "nunca, mas mesmo nunca", é deixar passar em claro, "porque é a acumulação de pequenas coisas que torna difícil a vida dos professores". A um doutorado, confesso, com o devido respeito pela pessoa, esperava que fosse muito mais além do que foi o pensamento há 50, 70, 80 anos. Só não falou da régua ou da "menina de cinco olhos". Porque esse é o círculo vicioso da indisciplina e a marca de um sistema desajustado do tempo que estamos a viver. O rigor, a disciplina, a aprendizagem séria e apaixonada não se conseguem por essas vias. Porque eles regressam e, naturalmente, farão o mesmo ou pior. 
Em contraponto, trago em memória o Professor José Pacheco de quem escutei mais ou menos isto: eu era um excelente professor. Preparava tudo ao pormenor e, um dia, questionei-me, se eu dou bem "as aulas" e muitos deles não aprendem, desinteressam-se e tornam-se indisciplinados, então não será que é pelo facto de eu "dar aulas" que eles não aprendem? Apenas este desabafo do Professor, não do Psicólogo, conduz a muitas interrogações, sobre os currículos, as disciplinas, os programas e os rotineiros actos pedagógicos. Eu sei que um outro caminho é muito mais difícil, porque abdica dos formatos impingidos pela hierarquia política, mas também sei que é o mais seguro e apaixonante para todos: o da reorganização de uma escola compaginada com os múltiplos interesses dos que lá vão para aprender, uma escola compaginada com as diversas ofertas educativas existentes fora do ambiente escolar e uma nova abordagem do estudo através do que já é comum se designar por "fenómenos complexos". Chegaremos lá, certamente, a formatos pedagógicos radicalmente diferentes, à autonomia de cada escola e à autonomia de cada aluno, à secundarização do manual, do sumário e do teste, a uma escola onde se aprenda para a vida e onde vigore o interesse pelo conhecimento e pela responsabilidade. 
Declarou o Professor Universitário Alexandre Quintanilha: "EU VIVO PORQUE SOU CURIOSO". É esta mensagem que deve ser incorporada nos alunos, mas que o sistema educativo teima em não permitir. Ilusão minha? Não, é o que já se vai fazendo por tanto lado. 
Ilustração: Google Imagens.

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